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A compreensão de como os dados oriundos de fenômenos ocorridos no espaço se distribuem constitui hoje um grande desafio para a elucidação de questões centrais em diversas áreas do conhecimento (CÂMARA et al., 2001a). Entender de que forma esses dados se organizam no espaço e quais as relações existentes entre eles, constituem os princípios básicos da Análise Espacial.

Segundo TEIXEIRA (2003), pode-se conceituar a Análise Espacial como qualquer processo de apresentação, manipulação, análise, inferência e estimação de dados espaciais, os quais podem ser definidos como qualquer tipo de informação que possa ser caracterizada no espaço em função de um determinado sistema de coordenadas, absoluta ou relativa (CÂMARA et al., 2001a). De fato, a posição que os dados ocupam no espaço é de fundamental importância neste tipo de análise, sendo em geral as características das entidades espaciais divididas em dados locacionais, que dizem respeito exclusivamente à sua posição no espaço, e dados de atributos, que especificam as características não-espaciais (TEIXEIRA, 2003).

CHOU (1997) considera como dados espaciais todos aqueles que possam ser apresentados em forma de mapa. Sendo assim, a simples visualização da distribuição dos dados representados nos mapas já pode ser considerada como um tipo de análise espacial. Segundo TEIXEIRA (2003), apesar de intuitiva, este tipo de análise permite aos analistas tentarem estabelecer relações de influências entre os dados ou mesmo estimar relações de causa-efeito, sendo uma prática comum a boa parte dos profissionais da área de Transportes que as utilizam com o intuito de tentar estabelecer relações de influência entre os dados disponíveis, baseando-se, na maioria das vezes, apenas na sua experiência e juízo de valor.

Com o advento dos SIG, essas análises tornaram-se cada vez mais difundidas, sem, no entanto, serem aprofundadas. A prática comum dos profissionais de transporte ainda tem se limitado à utilização apenas das formas mais simples de análises espaciais, como a visualização de mapas temáticos, quando já existe um conjunto poderoso de técnicas, denominado Estatística Espacial, que permite estabelecer critérios quantitativos de agrupamento e dispersão de dados espaciais, determinar o grau de dependência espacial entre as observações e modelar a forma como essa dependência se manifesta, sendo estas técnicas de fundamental importância para a compreensão do comportamento dos fenômenos de transportes, devido ao seu caráter eminentemente espacial.

Desta forma, serão discutidos de mais detalhadamente nos tópicos seguintes, as características básicas deste tipo de análise, sendo descritos os níveis de análises existentes e as principais ferramentas, para então serem aprofundadas as discussões sobre a estatística espacial e as ferramentas de análise exploratórias em áreas, por serem estes os temas de maior interesse neste trabalho.

4.1.1 Níveis de Análise Espacial

Na Análise Espacial, as observações dos dados espaciais podem ser classificadas e analisadas em quatros grupos, conforme a sua forma de representação no espaço, a saber: análise de padrões pontuais, análise de áreas, análise de superfícies e análise de redes.

Na análise de padrões pontuais, os eventos são representados por pontos localizados no espaço e os atributos são alocados apenas nestes pontos de ocorrência do evento, como no caso dos acidentes de trânsito. Neste tipo de análise, o objetivo é identificar os padrões de distribuição espacial e a existência de agrupamentos (clusters). De acordo com TEIXEIRA (2003), em geral nestas análises não existem atributos associados aos eventos, importando na verdade apenas o número de ocorrências por unidade de área (intensidade do evento), a localização das mesmas no espaço, e a existência ou não de dependência espacial (autocorrelação) entre as observações.

Na análise de áreas, os dados encontram-se agregados em sub-áreas, tais como setores censitários, distritos ou zonas de tráfego; pressupondo-se a homogeneidade intrazonal dos dados. Esse tipo de análise tem como objetivo identificar a existência de padrões de distribuição espacial, de áreas críticas e de tendências espaciais de crescimento, auxiliando o entendimento da ocorrência de determinado fenômeno (QUEIROZ, 2003).

No entanto, a principal restrição da análise dos dados agregados em áreas relaciona-se ao Problema da Unidade de Área Modificável (MAUP) (WRIGLEY et al, 1996), que se refere aos problemas gerados devido tanto às variações no nível de agregação das áreas, denominados efeitos de escala, como das alterações nas suas fronteiras, denominados efeitos de zoneamento. No primeiro caso, os efeitos se referem à tendência, dentro de um sistema de unidades de áreas modificáveis, de se obter diferentes resultados estatísticos para um mesmo conjunto de dados quando a informação é agrupada em diferentes níveis de resolução espacial, como setores censitários e distritos.

Já os efeitos de zoneamento, segundo RAMOS (2002), referem-se à variabilidade dos resultados estatísticos obtida dentro de um conjunto de unidades de áreas modificáveis em função das várias possibilidades de agrupamentos em uma dada escala, e não em função da variação do tamanho dessas áreas; isto é, a diferença nos resultados é gerada devido a simples alteração das fronteiras. Vale

ressaltar que este problema nunca poderá ser removido, pois está associado a divisões territoriais, e o que se pode fazer ao usar estas ferramentas é minimizar o seu efeito (RAMOS, 2002)

TEIXEIRA (2003) destaca que, na área de transportes, o Problema da Unidade de Área Modificável pode ser facilmente percebido quando da definição das zonas de tráfego, que geralmente são grandes para corresponder a um conjunto de setores censitários ou bairros, ou para obedecer a separadores físicos como rios, avenidas e aeroportos. O mesmo autor afirma ainda que muitas vezes uma mesma zona de tráfego engloba conjuntamente um bairro de classe alta e uma favela. Como a zona é trabalhada em termos da média dos valores socioeconômicos, um pequeno número de domicílios apresentando padrão econômico muito alto ou muito baixo (outliers) causa distorções significativas na média da zona, comprometendo a qualidade do plano elaborado.

No caso da análise de superfícies, os atributos e variáveis observados são analisados de forma contínua no espaço, sendo representados por uma superfície. Neste tipo de análise admite-se uma variação contínua do atributo analisado com o intuito de se identificar a intensidade da ocorrência do evento e a variabilidade espacial das observações. Esta variabilidade, ou a forma de distribuição dos dados no espaço, é medida pela isotropia. Se o fenômeno observado varia de forma uniforme em todas as direções, diz-se que o fenômeno é isotrópico; se o fenômeno varia de modo irregular para direções distintas, caracteriza-se a anisotropia do fenômeno (CÂMARA et al., 2001a). Um outro aspecto relacionado à análise de superfícies é o fato de a mesma se mostrar superior à análise por áreas nos casos em que o problema da descontinuidade nas fronteiras se mostre significativo. Entretanto, para regiões com características de homogeneidade, a análise agregada em áreas é muito mais simples, e requer menor esforço computacional (CÂMARA et al., 2001a).

Segundo TEIXEIRA (2003), a análise de redes é típica do setor de transportes e consiste inicialmente de operações básicas que permitem avaliação da estrutura da rede no que se refere à sua complexidade, conectividade, topologia, impedância e acessibilidade. De acordo com CHOU (1997), a complexidade e conectividade da rede são caracterizadas pela quantidade de nós e ligações existentes; já a topologia, que é considerada um elemento crítico na caracterização de sistemas, relaciona-se à conectividade entre os nós e ao sentido e existência de restrições de fluxo nas ligações. A impedância pode variar segundo o tipo de problema analisado, sendo distância, tempo e custo de viagem valores típicos de impedâncias de rede, mas

estando o analista livre para atribuir à rede qualquer atributo de impedância que achar conveniente. Por fim, a acessibilidade indica o grau de facilidade no deslocamento a partir de um dado nó da rede para qualquer outro.

Como problemas típicos de análise de redes, CHOU (1997) destaca os problemas de roteamento, como o do caixeiro viajante, que busca o menor roteiro para se passar por todos os nós da rede, e o do carteiro chinês, que busca o menor roteiro para se passar por todos os arcos da rede, e os problemas de identificação de caminhos mínimos, com ou sem restrição de capacidade. LORENA (2003) também destaca os problemas de localização de facilidades que visam o provimento do melhor acesso possível a elas, considerando-se as condições de oferta da rede.

4.1.2 Ferramentas de Análise Espacial

A classificação mais usual das ferramentas de análise espacial é a proposta por ANSELIN (1992) e consiste no agrupamento das ferramentas em quatro tipos diferentes, como apresentado na Figura 4.1. As ferramentas de seleção englobam os mecanismos de consulta a banco de dados por meio de amostragem ou agrupamento dos dados analisados, a apresentação destes em mapas temáticos e a sua sumarização através de estatísticas descritivas, métodos gráficos e numéricos.

As ferramentas de manipulação são utilizadas na geração de novos dados espaciais, a partir de dados espaciais ou não, e que estejam situados em uma ou mais camadas de análises (TEIXEIRA, 2003). Segundo CHOU (1997), as análises realizadas em uma única camada são chamadas horizontais e referem-se às operações de manipulação, seleção e classificação de entidades. Já as análises de múltiplas camadas, ou análises verticais, permitem a manipulação de dados em camadas separadas e o exame e a estimativa das relações entre as mais diversas entidades, destacando-se as operações de sobreposição de camadas, de agregação dos dados e de análise de proximidade.

Com relação à análise exploratória, suas ferramentas permitem descrever e visualizar distribuições espaciais, descobrir padrões de associação espacial (aglomerados espaciais), sugerir a existência de instabilidades espaciais (não- estacionaridade) e identificar observações atípicas (valores extremos) (CÂMARA et al, 2001b). Esses métodos têm como finalidade descrever o fenômeno analisado sem efetuar muitas mudanças nos dados originais, através de técnicas de visualização dos dados, de forma a detectar padrões, elaborar hipóteses e estimar modelos espaciais (WISE et al, 1998).

Figura 4.1: Ferramentas da Análise Espacial

Fonte: ANSELIN (1999) apud Câmara et al (2001a)

Além disso, CARVALHO (1997) afirma que essas ferramentas são essenciais ao desenvolvimento da análise confirmatória que, em geral, é sensível ao tipo de distribuição, à presença de valores extremos e à ausência de estacionariedade. Este ramo da análise espacial envolve o conjunto de modelos de estimação e procedimentos de validação necessários para implementar análise de componentes espaciais, sendo o ferramental de Estatística Espacial, discutido no próximo tópico, assim como da Econometria Espacial, de grande importância na implementação deste tipo de análise (TEIXEIRA, 2003).