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Análise qualitativa das imagens noticiadas: ética e princípios do jornalismo aplicados

Capítulo 4 – Análise de conteúdo

4.2. Análise qualitativa das imagens noticiadas: ética e princípios do jornalismo aplicados

A ética e os princípios regrados do código deontológico do jornalismo português devem também estar presentes nas imagens que são utilizadas para acompanhar as notícias no jornalismo impresso e online.

Além da difusão de fotografias que afetam a privacidade da vítima, também o tratamento dado às mesmas deve respeitar o sentido de ética e bom senso, apesar da emergência dos meios digitais como forma de adicionar maior informação e detalhe a uma notícia. Assim sendo, a manipulação de fotografias pessoais da vítima por parte dos jornais tabloides, como o jornal brasileiro Extra, é, de facto, uma das questões que afetam valores do jornalismo que, tal como exposto no código deontológico, devem ser respeitados. O não respeito por esses mesmos valores concluem que todo o tipo de jornalismo que assim o pratique não integra o verdadeiro sentido do jornalismo.

Vejamos, as imagens que acompanham as notícias analisadas do Jornal de Notícias são fotografias de Duarte Lima bastante formais, três das quais semelhantes ou repetidas em várias notícias, tratando-se apenas de fotografias tipo passe do político. As fotografias fazem parte do arquivo do grupo de media no qual o JN está inserido (Global). Nas sete notícias analisadas do JN apenas quatro incluem fotografias: uma é acompanhada por um vídeo das últimas imagens de Rosalina Ribeiro e as restantes duas não integram imagens, apenas texto.

No jornal Público apenas três notícias são acompanhadas de fotografias. As fotografias estão identificadas e são repetidas em duas das notícias analisadas. A terceira imagem utilizada é a mesma utilizada numa das notícias do JN. Uma outra

notícia do Público ao invés de ser acompanhada por imagens, faz-se acompanhar por um vídeo de uma entrevista ao político.

Ambos jornais portugueses apresentam fotografias contextualizadas com a notícia, objetivas e sem qualquer tipo de manipulação.

Quanto ao Correio da Manhã, todas as notícias são acompanhadas por imagens de Duarte Lima, no entanto nem todas se encontram em condições para serem publicadas num meio de comunicação social. Apesar de todas as fotografias estarem identificadas, três delas encontram-se desfocadas e outras três foram inclusivamente cortadas. Este tipo de tratamento reflete claramente pouco brio profissional, assim como pouco cuidado e atenção aos detalhes das notícias e a sua coerência.

As notícias analisadas em todos os jornais de referência brasileiros, Folha de S. Paulo, Estado de S. Paulo e O Globo não são acompanhadas por quaisquer imagens.

Por outro lado, o tabloide brasileiro Extra apresenta em todas as suas notícias fotografias do político português assim como de Rosalina Ribeiro e nenhuma das imagens utilizadas está identificada. Vejamos, a primeira notícia do jornal Extra analisada é acompanhada de uma imagem do político português, Duarte Lima, que, apesar de não ser em nada chocante ou ofensiva na ótica do jornalismo visual e a ética referente ao mesmo, tal como referido por Jorge Pedro Sousa (2001), no manual de jornalismo impresso, é visível a edição da imagem, de forma a acrescentar uma moldura à mesma (p. 99). Tal como referido, este não é o exemplo de uma manipulação na qual a violência ou ofensa é visível, contudo, não deixa de haver um tratamento desnecessário a uma imagem cujo objetivo é apenas ilustrar, sem interferir no seu conteúdo, a informação relatada. Isto é, adornos e alterações desnecessárias a imagens que acompanham as notícias não cumprem com os requisitos da objetividade, imparcialidade e ética profissional jornalista.

O mesmo acontece na segunda notícia do Extra, através do tratamento da imagem publicada na notícia. De notar que na segunda notícia surge também uma ligação para um vídeo que sugere mostrar as últimas imagens da vítima no dia em que faleceu. A música utilizada no vídeo pode também sugerir um tom de mistério, inquisição e subjetividade, desnecessários para a partilha de informação, acabando por enquadrar o vídeo numa perspetiva parcial da realidade.

No que diz respeito à terceira notícia do jornal Extra analisada neste trabalho é utilizada para acompanhar a notícia, mesmo antes do lead, uma imagem demasiado ilustrativa e sensacionalista com o título “Herança Maldita”. Além de ser utilizado um adjetivo e o mesmo subentender acusação, parcialidade e sensacionalismo, também é feita alusão a sangue nessa mesma imagem. Nem a utilização da imagem, o tratamento e a manipulação que lhe é dada, nem o discurso que a mesma apresenta são reflexo da ética e dos princípios respeitados pelo jornalismo. Mais ainda, o tratamento dado à imagem apresenta, evidentemente, o objetivo de direcionar e condicionar a interpretação da mesma, revelando uma visão parcial do jornalista, ao invés de apresentar fotografias dos envolvidos no caso como informação visual adicional, deixando ao critério de cada leitor a sua interpretação. Existe, portanto, um claro abuso de efeitos especiais ou elementos visuais que, segundo Jorge Pedro Sousa (2001), integra um dos pontos fixados na abordagem da manipulação digital de fotografias (pp.107-108).

Na verdade, e segundo Jorge Pedro Sousa (2001, p. 104), existem no código deontológico dos jornalistas portugueses, diversos princípios que podem ser aplicados ao jornalismo imagético, sendo eles:

 “O jornalista deve combater (...) o sensacionalismo.” (art.o 2);

 “O jornalista deve usar meios leais para obter (...) imagens (...). A identificação como jornalista é a regra e outros processos só podem justificar-se por razões de incontestado interesse público.” (art.o 4);

 “O jornalista não deve identificar, directa ou indirectamente, as vítimas de crimes sexuais e os delinquentes menores de idade, assim como deve proibir-se de humilhar as pessoas ou perturbar a sua dor.” (art.o 7);

 “O jornalista deve recusar o tratamento discriminatório das pessoas em função da cor, raça, credos, nacionalidade ou sexo.” (art.o 8);

 “O jornalista deve respeitar a privacidade dos cidadãos (...). O jornalista obriga- se, antes de recolher (...) imagens, a atender às condições de serenidade, liberdade e responsabilidade das pessoas envolvidas.” (art.o 9)

Como podemos verificar, pelo menos um dos princípios acima descritos não é respeitado no tratamento imagético dado pelo jornal Extra, o qual se refere à não utilização do sensacionalismo como moldura a fim de manipular a informação.

Adicionalmente pode ser inferido que o horror é incluído, de igual modo, no leque de itens que classificam a abordagem da manipulação digital de fotografias preconizada por Jorge Pedro Sousa (2001, p. 105) e que fazem parte do tratamento imagético da terceira notícia do Extra.

Por outro lado, nas restantes notícias analisadas do Extra (quarta, quinta sexta e sétima), as imagens utilizadas são meramente informativas, sem qualquer tratamento imagético subjetivo. Contudo, na sexta e sétima notícia são utilizadas demasiadas fotografias pessoais da vítima, entrando desnecessariamente no contexto íntimo dos envolvidos, como forma de ilustrar a informação divulgada.

Podemos concluir então que o tratamento das imagens do jornal brasileiro Extra não tem como fundamento a moralidade, a ética ou os princípios regrados pelo código deontológico do jornalismo.

Segundo Jorge Pedro Sousa (2001), “as questões ligadas à geração e manipulação digital de imagens são, talvez, das mais relevantes para o fotojornalismo atual, especialmente no que diz respeito à ética e à deontologia profissionais”(p. 112). Isto é, a utilização da tecnologia digital da imagem é cada vez maior, numa era em que o digital já se encontra integrado e enraizado na realidade social. O sensacionalismo e espetacularização de acontecimentos não se relacionam em nada com o sentido de ética e bom senso, pelo contrário não são sequer representados no código de conduta do jornalismo.

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