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CAPÍTULO 2 Diversidade de conhecimento e uso de plantas na comunidade do Bonete, Ilhabela, São Paulo.

2.3.2. Análise quantitativa dos dados

A análise quantitativa dos dados foi realizada através de medidas de diversidade (Ludwig & Reynolds, 1988; Magurran, 1988; Krebs, 1989; Gotelli & Entsminger, 2001) que permitem avaliar a intensidade de uso de recursos por populações humanas, comparar diferentes áreas e avaliar o esforço amostral (Begossi, 1996).

Foram escolhidos os índices de diversidade de Shannon-Wiener (H'), equidade ou evenness (E), PIE Hurlbert's (pie), dominância (D), além da riqueza esperada, usada para gerar curvas de rarefação (Magurran, 1988; Krebs, 1989; Begossi, 1996; Brower et al., 1998; Gotelli & Entsminger, 2001). Estas medidas foram calculadas a partir do total de plantas citadas em todas as categorias de uso e, separadamente, nas categorias de plantas usadas na alimentação, plantas medicinais, plantas empregadas na construção de canoas e plantas usadas como lenha, considerando o uso feito por homens, mulheres, pessoas menores de 40 anos e pessoas com 40 anos ou mais.

O cálculo de índices de diversidade ecológica baseia-se no número e abundância de espécies em uma comunidade amostrada (Magurran, 1988; Krebs, 1989). Para calcular estes índices a partir de dados etnobotânicos é preciso obter o número de plantas citadas por cada informante para determinado uso (Begossi, 1996). Espécies biológicas e variedades intra-específicas não foram consideradas nas análises quantitativas, apenas as etnoespécies17, definidas como o nome comum ou vulgar dado a uma ou várias espécies citadas durante as entrevistas (Hanazaki et al., 2000). Assim, uma etnoespécie pode designar mais de uma espécie como o boldo (Plectranthus amboinicus (Lour.) Spreng. e Vernonia condensata Baker) e capororoca (Myrsine ferruginea (Sw.) R.Br. ex Roem. & Schult., Myrsine umbellata Mart.e Myrsine venosa A.DC.) ou pode abranger variedades de uma mesma espécie, como ocorre com a banana (Musa X paradisiaca L.) e a mandioca (Manihot

esculenta Crantz).

A abundância de uma planta ou etnoespécie no cálculo dos índices de diversidade é dada pelo número de pessoas que citou cada planta. O inventário de plantas de cada entrevistado registra a ocorrência de etnoespécies nas seis categorias de uso previamente definidas. Cada planta do conjunto total de dados foi citada por pelo menos uma pessoa, em pelo menos uma categoria de uso.

O índice de Shannon-Wiener (H') mede o grau médio de incerteza em prever a espécie a que pertence o próximo indivíduo de uma amostra, escolhido

aleatoriamente (Ludwig & Reynolds, 1988). Este índice considera o número de espécies numa amostra e as abundâncias relativas das espécies (no caso dos dados analisados neste estudo, o número de citações de cada etnoespécie, considerando o conjunto de entrevistados). Ele foi adaptado ao estudo de comunidades animais e vegetais a partir de uma função derivada da teoria da informação (Krebs, 1989). Para os teóricos da informação, esta função pode prever a próxima letra contida numa mensagem (Krebs, 2001). A incerteza contida na informação deve ser considerada sinônimo de diversidade (Krebs, 1989) e, portanto, quanto maior a incerteza, maior a diversidade (Williams et al., 2005).

Há dois componentes da diversidade combinados na função de Shannon- Wiener: o número de espécies e a heterogeneidade do conjunto de indivíduos no total de espécies da comunidade (Krebs, 1989). Números maiores de espécies indicam maior diversidade, bem como, distribuições mais uniformes de indivíduos no conjunto das espécies também aumentam a diversidade.

A equidade (evenness) pode ser medida de várias formas. A diversidade de espécies de uma amostra expressa pela sua riqueza, onde todas as espécies apresentam a mesma abundância de indivíduos, representa a diversidade máxima de uma comunidade (Hmax). A razão entre a diversidade de Shannon-Wiener (H') e a diversidade máxima (Hmax) é a forma mais simples de medir equidade (evenness) (Krebs, 2001). A equidade varia entre 0 e 1 e fornece uma estimativa da distribuição do conhecimento e do uso das plantas entre os entrevistados. Assim, valores altos de equidade sugerem que as plantas são usadas de forma mais homogênea numa população, enquanto valores baixos podem indicar dominância no uso de poucas plantas ou especialistas na população (Begossi, 1996; Begossi et al., 2002).

Os índices de diversidade de Shannon-Wiener e equidade (evenness) foram calculados a partir das fórmulas contidas em Magurran (1988). A comparação estatística entre os valores dos índices de Shannon-Wiener foi feita pelo teste t proposto por Hutcheson (1970) e Magurran (1988).

O índice PIE de Hurlbert (pie) calcula a probabilidade de um encontro interespecífico, ou seja, ele expressa a probabilidade de dois indivíduos escolhidos

aleatoriamente na amostra representarem duas espécies diferentes. O índice pie é facilmente interpretado como uma probabilidade e não é influenciado pelo tamanho da amostra, embora a variância aumente com amostras pequenas (Gotelli & Entsminger, 2001).

O índice de dominância D é a fração da comunidade representada pelas espécies mais comuns. Ele é sensível ao tamanho da amostra (Gotelli & Entsminger, 2001), mas pode ser útil para identificar plantas que são bem conhecidas por toda a população ou muito utilizadas.

As comparações dos valores de pie e D foram feitas através de teste de hipótese sugerido por Gotelli & Entsminger (2001), utilizando as médias e variâncias desses índices. Por exemplo, para decidir se a diversidade de conhecimento, medida pelo pie, é diferente entre duas categorias comparáveis, como homens e mulheres do Bonete, realizou-se a rarefação de pie, da maior amostra18

até o maior nível de abundância da amostra menor. Se o valor observado do índice da amostra menor estiver contido no intervalo de confiança (95%) gerado pelo índice esperado da amostra maior, para o mesmo nível de abundância, então aceita-se a hipótese nula, de que não há diferença significativa na diversidade dos dois grupos.

A rarefação é um método estatístico que estima valores esperados de diversidade numa amostra aleatória (Krebs, 1989) e permite comparar esta diversidade em amostras de tamanhos diferentes (Magurran, 1988). Neste estudo, foram analisadas curvas de rarefação da riqueza esperada de plantas utilizadas e conhecidas no Bonete, em função do número de citações de plantas dos entrevistados no Bonete, conforme sugerido por Gotelli e Colwell (2001) e realizadas com dados etnobotânicos de populações caiçaras por Begossi (1996c) e Rosato et al. (1999).

Os índices pie e D e as riquezas esperadas das curvas de rarefação foram calculados pelo software ECOSIM (Gotelli & Entsminger, 2001) que gera resultados a partir de modelos nulos19. Os modelos nulos baseiam-se no princípio da hipótese

Amostra com o maior número de citações de plantas.

Um modelo nulo é um modelo gerador de padrões baseado na randomização de dados ecológicos ou em amostragens aleatórias de uma distribuição conhecida ou imaginada. No modelo nulo, alguns elementos dos dados são mantidos constantes e

nula, ou seja, os padrões encontrados nos dados não refletem forças ou mecanismos biológicos, apenas representam variações aleatórias ou efeitos de amostragem. Como em muitos outras áreas da ciência, o uso de modelos nulos é controverso e há críticas estatísticas e filosóficas contra e a favor deste método. Em ecologia de comunidades, a hipótese nula pode se apresentar de várias formas, mas tipicamente ela afirma que as distribuições das espécies refletem colonização e extinção ao acaso, sujeitos a restrições ou diferenças conseqüentes da intensidade de amostragem. A hipótese alternativa afirma que as ocorrências das espécies não são independentes e refletem processos biológicos e ecológicos. (Gotelli & Entsminger, 2001).