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Análise sob a luz das teorias de finanças e economia comportamental

3.4 ANÁLISE FINANCEIRA

3.4.1 Análise sob a luz das teorias de finanças e economia comportamental

Diante das observações feitas nos indicadores financeiros obtidos a partir das demonstrações de resultados e dos balanços patrimoniais da Taurus, não é possível chegar a uma fundamentação que explique a multiplicação do valor da empresa observada em outubro de 2018.

Mesmo havendo uma correção do aumento expressivo no valor de mercado da empresa em momento posterior, isso não exclui o questionamento aqui feito, pois apesar de uma reação contrária ter ocorrido nas cotações, como é possível observar no gráfico abaixo que mostra o movimento das ações preferenciais da empresa (que possui forte correlação com as ações ordinárias), como previsto no estudo de reação exagerada de De Bondt e Thaler (1985), falta compreender o que levou o investidor, que negociou ações da empresa nos picos de preço observados entre os dias 17 e 21 de outubro de 2018, a tomar a decisão de aceitar aqueles níveis de preço das ações da empresa, diante de indicadores financeiros ainda desfavoráveis naquele momento e sem dados concretos que indicassem uma evolução dos mesmos.

Figura 13 – Evolução dos preços das ações preferenciais da Taurus nas eleições de 2018

Fonte: Retirado de Uol Economia

Sob o conceito de Saliência nos preços das ações, poderia se afirmar que a atenção do investidor foi atraída para o início da escalada de preço das ações entre o final de setembro e começo de outubro, como se observa abaixo, que até o dia 10 desse mês, já havia mais do que dobrado em relação ao início do mês anterior, sem que houvesse nenhuma nova divulgação de resultados. Sendo isto verdade, o investidor teria desprezado todo histórico recente de desempenho da empresa, apostando que o retorno obtido pela valorização dos papéis da empresa continuaria em um caminho ascendente.

Figura 14 – Evolução dos preços das ações preferenciais da Taurus nas eleições de 2018

Diante da expectativa que havia na época, de um candidato em destaque nas pesquisas para Presidente da República, favorável a uma flexibilização do comércio de armas, podemos questionar se o mercado poderia estimar uma mudança de grande impacto para o mercado de armas brasileiro, mesmo diante dos problemas de imagem sofrido pela empresa, devido aos processos judiciais que apontavam supostos problemas de qualidade, recorrentes em seus produtos. Dificilmente tal estimativa poderia ser concreta, visto que a própria empresa se reservava, até o momento, em não apresentar estimativas favoráveis em relação ao seu desempenho financeiro nem para o mercado brasileiro em seus relatórios (guidence). Adicionalmente, os diversos apontamentos por parte de auditorias externas sobre a incerteza da continuidade das operações da empresa e os indicadores norte americanos, principal mercado da Taurus, mostravam uma tendência de baixa na demanda por armas de fogo.

A teoria da perspectiva nos mostrou que escolhas que apresentem possibilidade de resultados muito elevados, levam os indivíduos a apostarem nas chances que isso ocorra, mesmo diante de probabilidades remotas ou desconhecidas, uma aposta típica de loteria, esperando encontrar no mercado de ações um verdadeiro bilhete premiado sem fundamento.

Fica claro que pode ser realmente difícil generalizar uma interpretação de qual seriam as perspectivas de ganhos ou de perdas para os investidores, já que não há como saber a intenção de cada um que negocia ações no mercado. Confrontadas com as lacunas encontradas nas avaliações que seguem os métodos da teórica clássica financeira, as teorias comportamentais podem preencher lacunas vazias, mostrando que a racionalidade dos agentes é limitada diante dos eventos observados e descrevendo padrões de comportamento que levam a efeitos do tipo “manada” onde a euforia pode contagiar diversos indivíduos que buscam ganhos extraordinários, a seguir “cegamente” em uma mesma direção. Porém, essas teorias ainda não trazem uma solução definitiva para se deduzir que é possível prever todos os interesses dos agentes do mercado.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os eventos abordados neste trabalho parecem desafiar a hipótese de mercados eficientes, fundamental para a interpretação dos métodos tradicionais de avaliação financeira. Os dados referentes a empresa, levantados para essa análise, não sugerem nenhuma racionalidade daqueles que aceitaram comprar uma ação da Taurus, aos altos preços observados em meio ao período eleitoral de outubro de 2018. As estimativas para o mercado de armas de fogo mais concretas existentes naquele momento, também não suportariam racionalmente apostas tão altas realizadas naquele período, tendo em vista que o mercado mais relevante para a empresa, os EUA, não apresentava expectativas de expansão e nem se poderia esperar alguma surpresa de lá, visto que é um mercado muito amadurecido em relação às armas de fogo.

A empresa divulgava no segundo trimestre de 2018 um Ebitda positivo, depois de diversos períodos negativos, reforçado, nos relatórios da administração da empresa, de ser fruto de uma forte reestruturação que vinha sendo realizada, tanto na qualidade de seus produtos e lançamento de novas linhas, como no planejamento financeiro, diante do enorme endividamento da empresa. Porém, pode ser difícil creditar a isso a valorização das ações naquele momento, tendo em vista que esse plano já vinha sendo alardeado pela empresa há alguns anos, e também, pela observação de que as divulgações dos relatórios financeiros não coincidem com os eventos citados.

Resta observar, os acontecimentos que poderiam influenciar os investidores diante das negociações observadas, no caso, a possível eleição de um candidato notoriamente pró-armas. Jair M. Bolsonaro já declarava publicamente suas críticas a legislação altamente restritiva para compra de armas por civis no Brasil. Apesar de também ser notório quanto a suas críticas ao fato de só haver uma empresa privada atuando na fabricação de armas no País, principalmente diante das restrições de importação desse produto.

Mesmo que aceitemos a ideia de que, naquele momento, o possível futuro Presidente viesse a reduzir as regulamentações restritivas para esse mercado, seria de um otimismo exacerbado inferir que há um enorme mercado reprimido para armas de fogo no Brasil, depois de mais de uma década de legislação restritiva vigorando, e por se tratar de um produto de alto valor diante da renda da população brasileira, apesar de não ser impossível.

Da mesma forma que é valido pensar que o possível futuro Presidente naquela época poderia facilitar as compras de armas para o mercado civil, poderia também, abrir o mercado nacional para diversas empresas estrangeiras atuarem aqui, aumentando fortemente a

competição em licitações de compra de armas de fogo para as forças policiais, principais clientes da Taurus no Brasil.

Ficou claro que alguns conceitos da economia comportamental e da vertente de finanças comportamentais, podem descrever supostas razões para o comportamento que se observou no objeto deste estudo. Mesmo os conceitos da teoria comportamental levantados e utilizados nesta análise, possuem dificuldades em serem normativos em suas aplicações, pois geralmente se deparam com aplicações que podem envolver demasiada subjetividade, o que os leva a seguirem uma linha mais descritiva.

Apesar disso, pode-se afirmar, que mesmo sem sacramentar soluções para as questões de julgamento nas volatilidades de valor aqui estudas, essas teorias colaboram para preencher lacunas que claramente existem na teoria clássica de finanças. Como a teoria clássica exclusivamente não pode corroborar os movimentos observados, talvez possamos supor que a receita ideal para entender um cenário como esse, necessite de mais ingredientes além da hipótese de mercados eficientes, não necessariamente a descartando.

Algo que se poderia buscar, além do evento de subida dos preços das ações naquele período de 2018, seria uma compreensão para os valores de mercado médios que a empresa já vinha sendo negociada antes dos picos de preço, dado que os indicadores financeiros necessitariam de premissas muito otimistas para se chegar até mesmo aos patamares observados em períodos anteriores. Fatores como os intangíveis da empresa poderiam ser analisados para se buscar alguma base de valor que ajude a fundamentar o valor de mercado diante do seu desempenho. Algo que também pode ser analisado, em estudos futuros, é a eventual influência do efeito dotação descrito no capítulo 1, que distorce o julgamento de valor de um bem quando em posse do julgado, sobre ações com valores unitários muito baixos.

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