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5 RESULTADO E DISCUSSÃO

5.1 ANÁLISE DOS SEGMENTOS DA CAPOEIRA E SEUS DISCURSOS EM RELAÇÃO

5.1.4 Análise da visão cultural

O discurso em Genebra, proferido pelo então da Cultura Gilberto Gil (item 3.2.2), antecedendo o registro patrimonial, enalteceu e exaltou grandes virtudes da capoeira, e relatou a importância do seu papel para a sociedade mundial, principalmente por representar uma herança de mestiçagem étnica e de uma identidade brasileira diversificada, mas que convive harmoniosa, capaz de produzir reflexões aos países intolerantes e com históricos xenofóbicos. Essas afirmações oportunizaram avaliações profundas também aos detentores desse conhecimento, sobre se a capoeira conquistou o mundo não apenas pela sua plasticidade, mas também pelos seus valores históricos e filosóficos. As pessoas que carregam consigo o conhecimento da capoeira devem estar munidas também de bons valores e propósitos transformadores e educacionais. O Brasil, por intermédio da capoeira, serviu de exemplo de pacifismo, de tolerância e convivência entre opostos, para justificar seu registro como patrimônio imaterial da cultura brasileira. Deveria então a capoeira avançar nesse sentido, e suas lideranças estarem imbuídas por esses sentimentos na prática, já que a capoeira possui tantos valores, seus propagadores também deveriam replicá-los.

A capoeira sozinha não é nada; ela precisa dos transmissores do conhecimento, da mesma maneira que o esporte por si só não educa ninguém. Estamos tratando de instrumentos extremamente valiosos, mas que necessitam de pessoas altamente hábeis para manuseá-los.

Figura 7 - Grupo Beribazu em apresentação no MinC, para o então Ministro Gilberto Gil em novembro de 2005.

Uma das grandes virtudes da capoeira é sem dúvida sua capacidade de agregar tanta diversidade em uma única iniciativa. Ela está inserida nos mais diversos contextos sociais, espalhados pelo mundo, questionando regimes autoritaristas e impositores. Corroborando essa linha de pensamento, o diretor-geral da UNESCO, Koichiro Matssura (2004), no prefácio do Informe Mundial sobre Cultura: diversidade cultural, conflito e pluralismo, defende a ideia de que um mundo autenticamente rico em conhecimento deve ser um mundo culturalmente diverso.

A diversidade não precisa ser entendida como oposição a identidade. Amanda Alves e José Barros (2012) tratam a temática com destacada propriedade. Falam-nos que a articulação entre as noções de identidade e diversidade cultural abandonam uma exclusão primária e, apesar das tensões, podem assumir a possibilidade de coexistência e complementaridade (ALVES; BARROS, 2012).

A capoeira enaltecida pela capacidade de promover diálogos interculturais, no que tange a identidades e diversidades culturais mundiais, deve ter a capacidade, também, de resolver seus conflitos internos relacionados. Organizar políticas públicas na instância cultural

envolve o saber operar com as possibilidades dialógicas, bem como com os enfrentamentos e conflitos gerados. O pluralismo é condição para uma sociedade democrática, contudo a existência de diversidade estética e de formatações de capoeira, não impede a coesão em relação a padrões comportamentais e aspectos éticos e morais, ou a possibilidade de diálogo.

Mestre Acordeon75, ao falar da capoeira, relata que a arte sempre lhe provocou fortíssimas emoções, e discorre a respeito das alegrias e das tristezas, mostrando também uma coexistência de sentimentos:

O potencial da capoeira me proporcionou momentos de grande intensidade emocional, tanto momentos de alegria extraordinária, quanto momentos de profunda tristeza...Alegria de ver a modificação daqueles que a capoeira arrebatou e lhes deu sentido e diretriz na vida; alegria de relembrar momentos em que ouvi Mestre Bimba contar histórias de profundo saber; alegria de me sentir capoeira.

A maior tristeza é ver tanta intolerância que nos enfraquece e enfeia a capoeira. Essa intolerância nos leva a querer impor nossos valores e opiniões, assumindo que nossa capoeira é a mais eficiente, a mais tradicional, a mais organizada, a melhor de todas. Assim, os menos atléticos não podem se beneficiar da capoeira, os que não querem brigar se tornam covardes, os que não se engajam numa causa política são comprados, os que são brancos são usurpadores da cultura negra, os que são negros são radicais e racistas (depoimento público: MESTRE ACORDEON, 2000, p.11-12).

Com grande sabedoria, o Mestre complementa suas observações, colocando que as manifestações culturais refletem as características do povo. Com a capoeira não é diferente, já que ela é o resultado do sentir e do perceber dos brasileiros. Ele conclui:

A capoeira é reflexo de cada um de nós, como somos, como nos sentimos perante a vida e como nos expressamos. O fato de gostarmos de capoeira deveria ser um ponto de união entre as pessoas que veneram a mesma arte e se autodesenvolvem através da mesma manifestação cultural (depoimento público: MESTRE ACORDEON, 2000, p.11-12).

Nossas matrizes culturais são diversificadas, pois recebemos influência dos europeus, dos africanos e dos índios nativos. Nossa fala, nossa culinária, nossas vestes, nosso cotidiano

75 Ubirajara Guimarães Almeida (Mestre Acordeom) nasceu em 1943 em Salvador. Formado por Mestre Bimba, é considerado um dos seus maiores discípulos, juntamente com Mestre Camisa Roxa. Em mais de 50 anos de prática, gravou CDs, publicou livros e diversos artigos em revistas. Produziu documentários e ganhou título honorífico na Universidade de Wisconsin-Madison, em reconhecimento aos seus 30 anos de trabalho contínuo com a capoeira na cidade de Berkeley, São Francisco – EUA.

é multicultural. Por exemplo o instrumento musical denominado de pandeiro76 no Brasil, utilizado amplamente na capoeira, é considerado como um dos instrumentos mais antigos e primitivos, tido como um derivante do tambor. Existem registros que falam da sua existência no paleolítico, outros falam que é de origem fenícia, outros falam que ele é oriundo do antigo Egito. Com formato quadrado (adufe), sem a presença de platinelas, é utilizado nos países árabes. Assim, suas variações são registradas na Europa, Ásia e África. O modelo utilizado no Brasil chegou por intermédio dos portugueses, que o utilizavam em suas festividades e ritos religiosos. Com isso, não podemos esperar, ou exigir certa pureza em nossa cultura, ou mais, o exemplo mostra a tarefa quase impossível de se buscar o puro e o tradicional.

Mestre Fábio, em sua entrevista, nos disse também que se tratarmos a capoeira em estilos teremos ainda mais variações, preferindo entendê-la por intermédio das vertentes. Além das já conhecidas formatações, como a capoterapia e a capoeira adaptada para pessoas com deficiências físicas e cognitivas, ele enumera a seguintes existências:

Ginga acrobática, aerocapoeira, hidrocapoeira, capoeira evangélica, capoeira escolar... O viés da tradição na capoeira é nostálgico e acrítico em relação à cultura e a realidade da práxis social. Existem várias formas de se jogar capoeira angola, por exemplo. O próprio filho do mestre Bimba, utiliza somente a metodologia ensinada pelo seu pai? (entrevista direta: MESTRE FÁBIO, 2013).

Uma das grandes preocupações, listadas pelo Mestre estão relacionadas também aos aspectos ritualísticos, ao respeito ao mestre e as dinâmicas de roda. Com a massificação do esporte, ficou cada vez mais difícil organizar uma roda de capoeira para dezenas de pessoas, e é impossível não adaptar metodologias quando se leciona para mais de uma centena de pessoas, ou em realidades muito específicas. Em apoio às ideias do mestre, questionamos: como manter certas tradições que foram feitas para momentos que envolviam números muito mais reduzidos de pessoas? Um exemplo são as múltiplas rodas acontecendo simultaneamente para contemplar o número altamente elevado de capoeiristas nos grandes eventos, tendo uma única liderança para conduzir tudo. São dificuldades atuais e naturais, criadas pela própria expansão da capoeira, e dificultam o controle minicioso dos acontecimentos. Querer cercear as mudanças e o dinamismo da capoeira e da cultura é como intencionar guardar água entre os dedos.

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Para saber mais pode-se verificar os estudos do folclorista Luis da Câmara Cascudo, bem como o trabalho de Edgar Nunes Rocca, denominado Ritmos Brasileiros e seus instrumentos de percussão, ou ainda visitar os sites:

http://pt.scribd.com/doc/60730739/HISTORIA-DO-PANDEIRO http://www.percussionista.com.br/instrumentos/pandeiro.html

Existir tantas inserções de capoeira, que se adere a diversos contextos, adequando-se aos diferentes extratos sociais, poderia ser visto como virtude, e demonstração de valor e de importância sócio cultural. Mestre Falcão77 integra o rol dos mestres que entendem o pluralismo da capoeira desde seus primórdios, e trata a dicotomia, historicamente recente, entre Angola e Regional, como matrizes, essências importantes, mas que integram um espectro maior, inserindo elementos cariocas, pernambucanos e paraenses. E complementa dizendo:

A capoeira já era diversa antes da Angola e da Regional. A tradição envolvendo essas escolas relaciona-se a fortes projetos identitários, de busca de valorização e poder. As práticas culturais são inevitavelmente ressignificadas. A cultura é dinâmica, assim como sua essência. A capoeira sempre foi plural, existe no meio pouco exercício de alteridade, a história demonstra a diversidade e assim deve ser, senão vira autoritarismo (entrevista direta: MESTRE FALCÃO, 2013).

Mestre Fábio e Mestre Falcão demonstraram preocupação no campo dos valores. O primeiro relatou necessidade de maior cuidado com a figura do mestre, com o detentor do saber popular em seu papel de formador de opinião e liderança social. Mestre Falcão abordou a necessidade de maior alteridade entre as lideranças. Saber se colocar no lugar do outro talvez seja uma das maiores virtudes humanas – estar aberto ao contraditório, saber ouvir, refletir e se transformar. Dotar-se da capacidade de autoavaliação, e promover reformas interiores e algo extremamente nobre e atitude digna de Mestre.

Mestre Suíno ressaltou a importância da diversidade, mas alerta para não movimentarmos padrões já acordados na capoeira, que fazem com que a arte flua por todo mundo. E em termos de jogo e movimento, o Mestre conclui que existem movimentos contemporâneos também nas escolas tradicionais de Angola e Regional nos dias atuais.

77 José Luiz Cirqueira Falcão, Mestre Falcão, atuou durante 11 anos na Fundação Educacional do Distrito Federal, implantou e coordenou o Centro de Aprendizagem de Capoeira C.A.C. Mestre em Educação Física pela UFRJ e doutor pela UFBA, publicou diversos livros e artigos. Foi professor adjunto na graduação e pós- graduação da UFSC e leciona atualmente na UFGO. É integrante do Grupo de Estudos da Capoeira (GECA) e do Núcleo de Estudos Pedagógicos da Educação Física (NEPEF), e sócio pesquisador do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte.

Assim, seguimos analisando o posicionamento do Mestre Delmar78, e destacamos sua importante inserção. Ele desenvolve trabalho em Porto Alegre, RS, totalmente voltado para a educação especial, com uma proposta inclusiva.

Levamos a capoeira para pessoas que não estão inseridas na capoeira, nem no mercado de trabalho e nem na própria sociedade. Ao mesmo tempo, tiramos essas pessoas de seu ambiente e aproximamos de um melhor convívio social. O meu dia a dia é na periferia, estou diretamente nas vilas, nas comunidades. Trabalho também com os grupos de risco, que são os que têm problemas com a drogadição e até com a própria prostituição.

Não concordo com essa questão de capoeira na olimpíada, esse negócio de disputa. A capoeira tem que permanecer com a riqueza que ela tem, gosto de ver a capoeira brincada, jogada, e a capoeira com respeito... Espero que eu possa dar essa mesma entrevista daqui a 30 anos (entrevista direta: MESTRE DELMAR, 2013).

A citação acima oportuniza algumas reflexões e provoca o pensamento de que os propósitos e a capacidade das intervenções da capoeira devem estar acima das críticas relacionadas a variações estéticas. A intervenção do Mestre, incentiva a nos pautarmos mais nesse sentido, ao invés de ficar tipificando a capoeira e criando diversos estereótipos que demarquem de forma exacerbada as diferentes identidades. As roupas e os penteados, por vezes caricaturais, em busca de um poder advindo de uma pseudo africanidade, não podem valer mais do que as atitudes e intervenções de um mestre.

A vertente culturalista foi a que mais acreditou nas ações governamentais e nas políticas públicas que ocorreram nas gestões dos Ministros Gilberto Gil e Juca Ferreira. A política dos editais, apesar de receber críticas pela forma burocrática, contemplou muitos trabalhos e diferentes grupos e vertentes, e com isso ganhou certa credibilidade. E muitos mestres dialogaram e deram suporte para a formatação do apoio governamental, nas audiências públicas. A decepção maior dos seus representantes foi, uma vez mais, pela interrupção abrupta do fomento a capoeira na Gestão da Ministra Ana de Hollanda.

Os evolvidos buscavam medidas que dessem subsistência aos detentores do saber a ser preservado. Acreditou-se que com o registro de Patrimônio Imaterial, a capoeira receberia

78 Delmar Perroni, Mestre Delmar iniciou capoeira em 1979 e desenvolveu trabalhos além do Rio Grande do Sul, no Uruguai. Tornou-se uma das grandes referências na relação da capoeira com a inclusão social. Em 2006, iouà oà p ojetoà Capoei aà pa aà C es e à e volve doà pa e iasà o à “e eta iasà u i ipaisà eà e p esasà particulares. Para saber mais verificar: http://capoeiraparacrescer.blogspot.com.br/

ações políticas preservacionistas de forma perene, e não uma atenção específica de um líder governista.

Um ponto bastante explorado, entre os entrevistados, desse seguimento, foi que houveram prêmios, mas não houve uma política pública que proporcionasse a autossustentação do capoeirista, com formas contratuais, ou vinculações a instituições que o empregasse formalmente. Mestre Kinkas, por exemplo, falou que quando as lideranças governamentais perceberam o número de pessoas que precisariam ser atendidas, houve certo recuo.

No intuito de promover uma facilitação didática, relacionada a definição de posicionamentos das vertentes, organizamos uma tabela esquemática que demonstra os diferentes enquadramentos e perspectivas nesse cenário. A definição a que chegamos, foi baseada na coleta de dados e nos anos de convívio no meio. Temos a plena certeza que outras formas de percepção, no cenário descrito, poderão acontecer, bem como modulações relacionadas a certos posicionamentos. Assim, não queremos promover uma ação estanque, deixamos a estrutura esquemática aberta a percepções comunicantes, e também como alicerce para estudos futuros.

Quadro1: Estrutura esquemática relaciona ao posicionamento das vertentes sobre as ações governamentais.

Vertentes Percepção das ações do governo

O que esperavam, com o apoio governamental

Visão prospectiva Esportiva Apresentam certa

indiferença em relação ao enquadramento da capoeira pelo viés cultural. Alguns buscam apoio direto,

junto as lei de incentivo ao esporte e as ações promovidas pelo Ministério do Esporte. Fomento da capoeira com caráter competitivo e midiático, mas com

parcerias e patrocinadores também na iniciativa privada. Evitando vinculação única e exclusiva a uma agenda governamental. Globalização da capoeira, sob esse enquadramento competitivo, incentivando a participação de organismos internacionais e parcerias com as embaixadas brasileiras no exterior. Apresentam a ressalva de que as atividades culturais da capoeira devam também

coexistir. Federativa Apresentam desacordo absoluto em relação ao registro da capoeira com patrimônio cultural. Não aceitam

apoio e incentivo a diversificação da

Consulta prévia aos representantes da principal federação

de capoeira. Esperavam um apoio

nos moldes e nos formatos já delimitados pelas

Distanciamento de qualquer iniciativa cultural, modulação da capoeira para

adentrar ao universo olímpico e participar dos grandes eventos esportivos mundiais, sob as normas de uma federação exclusiva.

capoeira. federações. Prezam pela capoeira competitiva e totalmente padronizada.

Culturalista Foi a vertente que mais apoiou e acreditou nas ações governamentais desse período. Valorizaram as ações inclusivas e o apoio as mais diversas formas de capoeira. Enalteceram essa aproximação da capoeira com Estado

e compreenderam o fato como um marco

histórico.

Esperavam um apoio em maior escala e ações perenes, bem

como respostas e intervenções definitivas relacionadas às problemáticas compreendidas nos chamamentos públicos. Esperavam também políticas que

promovessem a autossustentação do

capoeirista e não apenas premiações.

Retomada do processo de apoio, hoje considerado extinto, implantação dos

projetos caracterizando ações do Estado brasileiro, e não momentos isolados de

gestões governamentais. Incentivo a todas as iniciativas de capoeira, principalmente com caráter

formativo e educacional

Purista Apresentam ampla desconfianças em relação as ações do governo. Reconhecem a capoeira, exclusivamente, pelas escolas de Angola e Regional, assim todo

apoio fora desse contexto foi repudiado. Entende a

Bahia como foco irradiador da capoeira para o mundo, devendo assim as suas lideranças receber atenção e apoio diferenciados. As lideranças da capoeira Angola, especificamente, entendem sua capoeira como “mãe” de todas as outras, ou seja, a mais original,

devendo então receber a principal

atenção preservacionista, fora

deste contexto não participam. Ações mantenedoras do tradicionalismo, atenção especial às escolas de capoeira nesse formato. Participação direta

dos mestres nas tomadas de decisão, exclusão de apoio às iniciativas que não se

enquadrem no seguimento tradicional.

Desacreditam, em sua maioria, na relação do Estado com a capoeira.

Porém nessa visão, qualquer ação futura deve ter uma participação perene

e efetiva das lideranças mais tradicionais, em todo

processo de apoio à capoeira. E devem, efetivamente, gerar a autossustentação das escolas tradicionais e principalmente dos “velhos

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Buscamos utilizar nesse trabalho a memória social, além da sua possibilidade como instrumento analítico e de organização teórico conceitual. Propusemos uma ação literal, capaz de ligar o debate atual aos elementos históricos, metodológicos, intelectuais e também a fala dos mestres e suas ações pioneiras. Aprendemos que a memória revela o peso do tempo, revela a sociedade pré-concebida que espera o enquadramento dos nascituros. A memória é o tempo passado revivido, que faz com que se alavanquem também causas que tardam a entrar em pauta. É o tempo que diz que uma mentalidade precisa renovar-se, é o tempo que liga passado ao futuro em busca de esperança. São os fatos trazidos cronologicamente em busca de continuidade, enumerados na tentativa de frear possíveis retrocessos.

Neste trabalho, uma das percepções mais claras, foi a frustração da comunidade da capoeira pela falta de continuidade de um ciclo que os capoeiristas perceberam que não se fechou.

Aproveitamos o momento conclusivo para ressaltar as principais problemáticas percebidas, não somente no que tange à capoeira, mas envolvendo as políticas públicas em geral no nosso país. Existe uma dificuldade histórica de promover ações transversais e intersetoriais nos órgãos nacionais. Ministérios distintos envolveram-se com a temática da capoeira, mas uma instituição, por vezes, não tinha a mínima ideia do que a outra estava fazendo. Vamos ainda além: em um mesmo órgão, setores diferentes trabalharam com a mesma temática sem saber o que acontecia na porta ao lado. O tema, já especificado, no item (3.3.2, Capoeira e o registro do intangível), por intermédio dos estudos de Luiz Renato Vieira (2012), é um alerta para rompermos esse ciclo burocrático, compartimentado, envolvendo entraves e políticas setoriais, que impedem o andamento das questões mais simples.

Existiu uma movimentação e uma grande vontade política em um primeiro momento, que levou a capoeira ao seu registro patrimonial. E também uma segunda etapa, em que o MinC publicou, em 2009, edital de concurso para Apoio à Formulação e Implementação do Programa Nacional de Salvaguarda e Incentivo à Capoeira. O referido programa obteve dotação orçamentária de R$ 1.599.294,8179. A gestão desse valor ficou sobre a responsabilidade da OSCIP “Intercult”, vencedora do edital. A essa organização coube viabilizar os encontros nacionais denominados de Pró-Capoeira, tratados na pesquisa, para

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As informações orçamentárias descritas foram utilizadas com base no artigo de Luciano Medina,

de o i adoà áà“alvaàGua daàeàoàOfí ioàdoàMest eàdeàCapoei a:àu à et ospe toàsobre o programa nacional de salvagua daàeài e tivoà àp ati aàdaà apoei aà oàB asil ,à ueàt atouàoàte aà aà evistaà OàCapoei a àdeà ºà ,à 2013.

escutar a sociedade civil interessada na concretização de políticas públicas para a capoeira. Alguns editais e prêmios aconteceram contemplando a capoeira, naquele dado momento, mas com a mudança da gestão na pasta da cultura, os projetos praticamente findaram-se, dando espaço a outras prioridades.

Outras tentativas de retomar a temática da capoeira no governo aconteceram de forma tímida, ainda mais desarticulada, e por vezes, cômicas, por pessoas que querem começar um novo ciclo de pesquisa para conhecer as necessidades da capoeira e seus anseios, como se nada ainda tivesse sido feito anteriormente, principalmente na esfera estadual. Desconhecedores totais, do ciclo anterior, alguns eram movidos apenas por oportunidades pessoais. Dessa forma, com todo o aparato organizado nesse trabalho comprovou-se, mais uma vez, que mudam os gestores e tudo se desconstrói. Assim são as políticas de governo no Brasil.

Relacionado, agora, a organização interna da capoeira, foram percebidas mobilizações que merecem relevo, as denominadas “Confrarias”, verificadas no item 3.4.4. Esse modelo já

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