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ANÁLISES SOBRE OS FUNCIONÁRIOS DAS FACÇÕES DE COSTURA DOS

4. ANÁLISE DOS RESULTADOS

4.1. ANÁLISES SOBRE OS FUNCIONÁRIOS DAS FACÇÕES DE COSTURA DOS

Com o impulso massivo da terceirização para as facções de costura, casos graves de violação dos direitos dos trabalhadores já foram notificados, onde, os principais eram os de trabalho sem carteira assinada e o pagamento de salários abaixo do subsídio mínimo pago

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Empresas as quais as facções de costura prestam serviço. (und)

nacionalmente. Esses problemas reforçam ainda mais a capacidade predatória que a terceirização implica nas localidades em que se inserem, com traços de precarização do trabalho.

Todavia, por outro lado, temos a existência de uma população castigada por problemas ambientais, principalmente a seca, para quem o que importa é o recebimento dos salários ao fim do mês, a fim de driblar as situações difíceis vividas.

A lógica aplicada à produção faccionista busca a equidade em custos do que é cobrado pela realização do mesmo serviço na China, onde a mão de obra prestada às grandes marcas é barata, com inúmeros casos de trabalho escravo e condições precárias de trabalho. Ou seja, o que para nós, no Brasil, já é considerado mão-de-obra barata, na China vai muito além, pois, o valor pago aos funcionários chega a ser 30% menor do que o recebido no Brasil, por jornadas mais longas de trabalho. O Brasil ainda possui outros ou países que tem condições de trabalho similares, nesse cenário de precarização das relações trabalhistas visando a maximização de lucros, e um deles faz fronteira conosco: trata-se do Paraguai.

No Brasil o custo final de uma calça jeans (peça mais confeccionada na região seridoense) chega a custar 35% a menos que no Brasil, custo esse que está intimamente ligado ao custo da mão de obra que é 35,5% menor que aquele observado na mão de obra brasileira, segundo dados da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP). Esta, reitera que o custo da calça jeans produzida no Brasil é de US$ 7,75 enquanto no Paraguai os valores caem para US$ 5,73.

A diferença de remuneração nominal média nas atividades terceirizadas são inferiores às atividades não terceirizadas (DIEESE, 2017).

Ainda segundo o DIEESE (2017, p.8), no plano nacional, a diferença de remunerações entre terceirizados e contratados formalmente, nos anos de 2007 a 2014, mantinha a média entre 23% e 27%. No último período registrado na pesquisa, o mês de dezembro de 2016, a remuneração média das atividades tipicamente contratantes era de R$ 2.639,00 enquanto as atividades terceirizadas eram de R$ 2.021.

Os dados em nível nacional de todas as atividades tipicamente terceirizadas11 geram

uma discussão interessante sobre valores salariais: enquanto a média salarial de atividades de terceirizados gira em torno de dois salários mínimos, as facções de costura pagam apenas um salário mínimo, e em algumas por produtividade. Ou seja, o vencimento mensal dos

11 Atividades de apoio; Manutenção e reparação; Serviços especializados; Atividades de monitoramento;

funcionários das facções depende do quando produzem, se atingirem as metas estipuladas, recebem o salário por completo, caso contrário, apenas um valor proporcional.

No âmbito de salários recebidos, foi constatado na pesquisa de campo realizada, que existem diferenças na forma como a mão de obra é remunerada no município de Cruzeta: duas facções pagam seus funcionários com base no salário mínimo; uma facção em Cruzeta e outra em Acari concretizam pagamento de acordo com a produção12, no sistema de metas, variando

de R$ 600,00 no sistema de metas à R$ 1405,50 em vencimento fixos, como dispostos no gráfico abaixo:

Gráfico 3: Salário recebido por funcionários das facções de costura dos municípios de Acari e Cruzeta. Fonte: Elaboração Própria (2017).

Outra constatação interessante que difere do âmbito nacional e até mesmo internacional, diz respeito à remuneração por gênero, ou seja, nas facções de costura do Seridó Oriental Potiguar os salários pagos aos funcionários não possuem diferenciação por gênero.

E, vale ressalvar que a inserção masculina nas facções de costura, quebra o preconceito de que costura é atividade feminina. Hirata (1997) pontua que o atual processo de precarização das relações trabalhistas possui um caráter novo, e que precarização estaria presente, principalmente, no trabalho do gênero feminino. Ora, apesar de termos noção de que

12 Vale ressaltar que em denúncias recentemente publicadas no livro Modeslavar (“Escravos da Moda”)

funcionários de fábricas de costura em Myanmar trabalham doze horas por dia, para receberem 15 cêntimos à hora, que equivalem à R$,0,04 no Brasil.

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Salário recebido por funcionários das facções de costura dos municípios de Acari e Cruzeta. (und)

a terceirização da produção de confecções para as facções de costura no Seridó Oriental Potiguar promove a precarização, de maneira oportunista, também constatamos, através de observações, que a lógica predatória de maximização de lucros e minimização de custos não seleciona gênero, pois precariza as relações de trabalho de ambos os sexos.

Segundo uma proprietária de facções, o rendimento nas atividades é similar entre os gêneros, e que o tratamento é igual dentro da unidade de produção. Porém, pondera (de um modo machista, mesmo que sem intenção) que o gênero feminino requer diferença de tratamento, tendo em vista problemas familiares e ciclos menstruais, que segundo ela, afetam o rendimento no trabalho.

O gráfico 4 demonstra a participação por gênero nos municípios de Cruzeta e Acari:

Gráfico 4: Sexo dos funcionários de facções de costura dos municípios de Acari e Cruzeta. Fonte: Elaboração própria (2017).

Ainda em relação aos gráficos 3 e 4, grosso modo, devem ser levados em consideração, os espaços territoriais em que as atividades são desempenhadas, e que os salários mais altos são pagos nos grandes centros.

Porém, quando analisada a discrepância salarial em território estadual, chama a atenção, os valores recebidos por funcionários das empresas sediadas na capital quando comparados aos dos funcionários das facções de costura que prestam serviço a essas empresas.

Assim, na região seridoense, os funcionários recebem um salário mínimo, em valores atuais de R$ 937,00 para jornadas de 44 horas semanais, enquanto na Região Metropolitana

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Sexo dos funcionários de facções de costura dos municípios de Acari e Cruzeta. (und)

Masculino Feminino

de Natal, as costureiras além de receberem um salário base, também recebem bônus por produtividade que alcançam os R$ 300,00/mês e plano de saúde. Como dito em entrevista pela Presidente do Sindicato das Costureiras (SINDCONFECÇÕES), “aqui na capital nós não recebemos menos do que mil reais”, tendo em vista que os benefícios das costureiras foram assegurados em comum acordo entre sindicato e empresas da RMN13, o que não se estende às

demais regiões do Estado, justamente pela dificuldade encontrada em fazer acordos com as empresas terceirizadas (facções seridoenses).

A substituição/transferência da mão-de-obra das peças de confecções da Região Metropolitana de Natal para o Seridó Oriental Potiguar preocupa a presidente do Sindicado das Costureiras ao relatar que “em dezembro de 2014 a Guararapes tinha 10 mil funcionários, e agora cerca de 8,5 mil funcionários” que representa, ainda, metade do total de funcionários existentes na empresa no ano de 2010.

Almejando detectar a prática de um fenômeno recorrente no território seridoense, o da dupla jornada de trabalho, buscamos respostas dos funcionários das facções sobre o desempenho de demais atividades que fossem extras às inerentes ao processo de terceirização. Nos resultados obtidos, apenas um dos funcionários possuía duas profissões, era mecânico aos finais de semana. Constou-se ainda que funcionárias do gênero feminino praticavam a dupla jornada de trabalho, desempenhando atividades nas facções de costura e estendendo sua jornada de trabalho aos afazeres domésticos, enquanto donas de casa.

O gráfico 5, abaixo, quantifica funcionários de facções que tenham outra fonte de renda. Assim, destes, 31 não possuem outra fonte de renda, 3 possuem outras fontes de renda, pagas em forma diária (mecânico) e duas outras entrevistadas que recebem pensões (alimentícia):

Gráfico 5: Quantidade de funcionários das facções de costura que possuem outro tipo de renda. Fonte: Elaboração Própria (2017).

13 Região Metropolitana de Natal.

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Possuem Outra Fonte de Renda. (und)

Outra análise interessante pertinente a esse gráfico está na ausência de respostas sobre o recebimento de programa de transferência de renda, como o bolsa família. Mas, caberia uma análise mais aprofundada, a fim de esmiuçar se de fato não há o recebimento por parte dos funcionários com filhos ou se não houve declaração intencional de não recebimento. Apesar de ser um gráfico simples, com apenas duas informações constatadas, constatamos que a quantidade de funcionários sem outras ocupações secundárias, ocorre porque os entrevistados, em alguns casos, na condição de primeiro emprego, são recém-egressos do ensino médio e com a necessidade de se inserirem no mercado de trabalho.

O gráfico anterior dá entrada ao gráfico 6 que retrata a discussão de faixa etária dos funcionários das facções, que traz o expressivo número de funcionários entre os 26 a 30 anos. Assim, por meio das entrevistas realizadas, constatou-se que membros desse grupo ingressaram ainda jovens no ramo faccionista e viram no setor a possibilidade de crescimento profissional e independência financeira. Isto se deve ao fato deque, a maioria não tem emprego pregresso, daí eles terem nas facções seu único meio de sobrevivência:

Gráfico 6: Faixa etária de funcionários de facções de Costura dos municípios de Acari e Cruzeta. Fonte: Elaboração própria (2017).

O gráfico 7 mostra-nos o grau de instrução desses indivíduos que trabalham nas facções.

Interessa notar aqui que, a grande maioria dos entrevistados possui o Ensino Médio completo e são estimulados a irem além em seus estudos, através dos cursos profissionalizantes direcionados ao setor produtivo das facções. Estes, são previstos no

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Faixa etária de funcionários de facções de costura dos municípios de Acari e Cruzeta. (und)

18 anos à 20 anos 21 anos à 25 anos 26 anos à 30 anos 31 anos à 35 anos 36 anos à 40 anos 40 anos ou mais

escopo do Pró-Sertão em conformidade com o Pronatec do Governo Federal, principalmente, cursos de Vestuário (IFRN) e Corte e Costura (SENAI).

Os entrevistados com nível superior completo, dois, desempenham funções administrativas e contábeis nas facções de costura, porém, com salários iguais aos dos demais funcionários com apenas nível médio completo. Apenas gerentes e proprietários que estão inseridos no chão de fábrica possuem salários14 diferenciados dos demais funcionários,

diferença de meio salário mínimo.

A maioria dos cargos ocupados é de funcionários com Ensino Médio completo, seguindo a tendência nacional de ocupações nos setores terceirizados, segundo o DIEESE (2017).

Diante das condições estruturantes de emprego e renda, que passam por um período de dificuldades de criação de novos postos de trabalho, e, na maioria dos casos, o corte dos postos de trabalho existentes faz com que os jovens entre 18 e 25 anos, dos municípios estudados, e sigam a mesma tendência dos funcionários de 26 a 30 anos, devido a impossibilidade de inserção em outras atividades econômicas.

Gráfico 7: Escolaridade dos funcionários das facções de costura dos municípios de Acari e Cruzeta. Fonte: Elaboração própria (2017).

14 Rever gráfico 3, na página 57.

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Escolaridade dos funcionários das facções de costura dos municípios de Acari e Cruzeta. (und)

Ensino Fundamental Incompleto Ensino Fundamental Completo Ensino Médio Incompleto Ensino Médio Completo Ensino Superior Incompleto Ensino Superior Completo Não Estudou

Os proprietários explicam que os funcionários que hoje estão trabalhando em suas facções, que tem idade entre 26 a 30 anos, o estão porque possuem cursos disponibilizados por eles mesmos para absorverem os com bons rendimentos de produção para suas empresas. Com isso, veem nessa nova leva de funcionários, mais jovens, a mesma possibilidade de permanência, tendo em vista os cursos aos quais estão inseridos e todo o incentivo por parte dos proprietários para a qualificação.

Levando em consideração todos os fatos narrados acima, buscando entender as entrelinhas da busca massiva de jovens e adultos ao setor faccionista, iremos constatar alguns fenômenos que estão arrolados a seguir:

a) o interesse dos proprietários em oferecer cursos de prática em corte e costura são uma face de dois gumes, há um interesse (compreensível) para além da capacitação dos alunos, pois futuramente esses alunos serão seus funcionários, então os “treinos” de formação já servem como um seletivo disfarçado dos seus “colaboradores”, por outro lado, o curso serve também para quem tem interesse em trabalhar por conta própria, como relatado pelos proprietários “existiram pessoas que continuaram nas facções e outros que quiseram seguir por conta própria até mesmo montando seus próprios estabelecimentos de costura”;

b) os tipos de ocupações em atividades desenvolvidas nos municípios que, exceto os cargos do funcionalismo público e comércio local, são tão precários quanto os das facções de costura, como as mineradoras de ferro, as cerâmicas e a agricultura: esta última que está estagnada em decorrência da severa seca que assola a região; e, finalmente,

c) a quantidade deficitária de postos de trabalho nos municípios de Acari e Cruzeta, e em todo o Rio Grande do Norte, para absorverem os indivíduos em situação de desocupação.

Os desdobramentos desses fenômenos citados anteriormente serão debatidos no subitem a seguir, que apresentará os resultados obtidos sobre a visão dos proprietários de facções de costura, representantes governamentais e funcionários de facções sobre a terceirização da produção, e, a consequente precarização das relações trabalhistas nas facções de costura do Seridó Oriental Potiguar.

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