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CAPÍTULO III ESTÁGIO

2. Atividades desenvolvidas

2.2. Animação Sociocultural

Uma ação a nível da Animação Sociocultural significa ter presente a perspetiva tridimensional respeitante às suas estratégias de intervenção, isto é ter em conta a dimensão etária para a qual é planeada, neste caso concreto jovens adolescentes, o espaço de intervenção, um Lar de crianças e jovens institucionalizados e por fim o âmbito temático, um pequeno projeto no âmbito da Animação Musical (Lopes, 2007). Assim, passo a apresentar o mesmo, denominado pelos intervenientes escrever o certo por palavras tortas.

A escolha do tema

Na reunião preparatória com a Diretora do Lar foi-me aconselhado a desenvolver um projeto em pequeno grupo, que não fosse muito ambicioso, pois os utentes encontravam-se no último período do ano letivo e estavam com o tempo livre muito reduzido. Informei a Diretora que trazia uma ideia, que queria trabalhar na área da expressão musical e apresentei-lhe uma planificação de forma muito resumida. Ela concordou com a mesma e afirmou que nenhum dos utentes do Lar tem atividades no âmbito da música, o que corroborou o meu conhecimento apriori da situação.

Posto este ponto prévio, passo a apresentar o meu projeto. É do conhecimento empírico que em Almada, e na restante zona geográfica denominada Margem do Sul do Tejo, o principal interesse musical dos jovens é o Hip-Hop e os seus derivados, nomeadamente o Rap e o Dj. É neste contexto musical que se pretende desenvolver o projeto e intervir junto dos jovens institucionalizados nomeadamente os maiores de 14/15 anos. Isto deve-se ao facto de, em Almada e arredores, estarmos perante um grande número de população desfavorecida e a existência de vários bairros sociais. Os jovens oriundos desta faixa populacional, muitos de etnias diferentes, trazem este seu gosto para as escolas e transmitem esta cultura a outros jovens de outros estratos sociais.

O Rap, desde os seus primórdios nos anos 70 do século passado, não é apenas um género de música, é uma forma de crítica social, de expressão e descrição de uma determinada realidade. Hoje assume ainda uma faceta mais intimista, sendo por vezes uma forma autobiográfica de

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expressão. A definição da palavra, isto é, a conjugação de rhythm and poetry revela o seu espírito artístico. Nascido numa contexto sociocultural desfavorecido, mais concretamente nos EUA, nos guetos afro-americanos, rapidamente se solidificou como uma arma de contestação, mas também como modo de evasão de uma envolvente desprotegida e angustiante (Neves, 2004). Este estilo musical, que engloba a figura do MC (rapper) e o DJ, integra um movimento cultural mais amplo, o Hip-Hop, que inclui a vertente de dança, e o graffiti, o seu componente artístico pictórico que evoluiu para uma corrente artística própria que é a arte urbana (Neves, 2004). O Hip-Hop diz respeito a uma cultura juvenil própria com um vocabulário específico e até com um dress code diferenciador, fazendo parte das tribos urbanas que começaram a aparecer nas últimas décadas do século XX.

Metodologia

Embora existam fases definidas para levar a cabo um projeto desta natureza a passagem temporal entre etapas dependerá do processo colaborativo entre técnicos e residentes (Bandeira, A., Marques,M., Cunha, P., & Ranchordas, P., 2007). Simplificando e tendo em conta que os projetos estão sempre em construção até ao momento conclusivo a metodologia mais adequada a implementar segue os seguintes passos:

a) recolha de dados e a sua análise - entrevistas aos utentes e dados possíveis estatísticos; b) construção de um diagnóstico da situação - caracterização da população-alvo, identificação do grupo de interessados num projeto musical;

c) estabelecimento dos objetivos gerais e específicos a atingir; d) planificação das atividades;

e) avaliação dos resultados obtidos (Serrano, 2008) .

Diagnóstico

Para elaborar o diagnóstico e identificar uma necessidade foram utilizadas duas vias: a da constatação de que não existia nenhum projeto ou atividade musical no Lar e a realização de entrevistas informais ao público-alvo de forma a conhecer as suas expectativas e localizar as necessidades existentes. Como não conhecia a grande parte dos jovens institucionalizados, optei por me relacionar com eles primeiro, aproveitando o desempenho de outras funções que atrás

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descrevi e fui percebendo os seus gostos musicais. Depois, evitando registos escritos, pois intimidam e enfastiam os jovens residentes, e respeitando o código de confidencialidade que tive de assinar no início do estágio, fiz entrevistas informais a alguns jovens selecionados por mim. Perguntei se gostariam de participar numa atividade no âmbito musical do Hip-Hop, sendo eles os intervenientes, antevendo-se a interação com músicos e produtores da área. Todos mostraram interesse, embora se denotasse alguma reserva quanto à construção de letras e a respetiva transformação das mesmas em canções, onde porventura eles seriam os cantores. Dado o reduzido tempo para levar a cabo esta ação, construí, assim um pequeno grupo de três jovens, dois rapazes e uma rapariga (que se tinham sinalizado mutuamente como possíveis intervenientes) e, perante tal cenário, considerei estarem reunidas condições para a implementação de um projeto desta natureza.

Logo senti um constrangimento já identificado antecipadamente em reunião prévia com a Animadora. O Lar de Crianças e Jovens é um local onde vivem jovens institucionalizados e está montada toda uma estrutura de ocupação dos mesmos fora da instituição. Os utentes têm um plano de ocupação dos tempos livres fora da instituição e têm horários variados. É difícil conseguir juntá- los em atividades dentro do Lar e esse é um problema a resolver. Uma das soluções será trabalhar individualmente, e construir todo o projeto por parcelas, até conseguir chegar à atividade final: a gravação de uma canção com a participação de todos os intervenientes.

Neste momento existe um plano de ação no âmbito da Animação e dele não consta nada relacionado com a música. Estava, assim, encontrada a necessidade e sabe-se que esta proposta encontrará por parte dos jovens uma forte adesão.

Planificação

Objetivos gerais e específicos

Foram, assim, delineadas prioridades e previstos os principais recursos passa-se à fase de apontar objetivos gerais, a saber:

 promover a liberdade de expressão através da música;

 incentivar a valorização pessoal através de aprendizagens relacionadas com o autocontrolo comportamental e de socialização;

 contribuir para a construção de um projeto de vida, melhorando as competências sociais dos jovens;

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 potenciar a ação terapêutica da música, nomeadamente na capacidade que tem em fomentar outro tipo de comunicação e favorecer atividades que permitam a libertação do stress acumulado;

 valorizar a realização de novas aprendizagens e aquisição de diferentes competências, o que contribui para o crescimento da autoestima;

 fomentar a possibilidade da experimentação e criação musical e desenvolvimento artístico dos jovens.

Foram também delineados objetivos mais específicos, a saber:

 potenciar as apetências musicais dos jovens (gosto pelo Hip-Hop) de forma construtiva e utilitária;

 incentivar o processo criativo individual na perspetiva do saber fazer;

 valorizar o esforço individual de forma a cimentar um processo de autoconhecimento e auto estima;

 dar liberdade de intervenção aos jovens na escolha dos temas a abordar, criando um caminho de conhecimento interpares que vise a ideia de que não estamos sós;  facilitar o contacto dos jovens com artistas do meio durante o processo criativo e

também na consecução da atividade final;

 desenvolver o espírito de grupo e a capacidade social de cada um dos intervenientes.

Cronograma

O período estimado para o desenvolvimento do projeto foi aproximadamente o de três meses e implicou sessões de trabalho após o término do estágio. Em seguida apresenta-se, na Tabela nº 3, o cronograma da ação, tendo em conta a calendarização, as ações e seus objetivos.

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Tabela nº 3 - escrever o certo por palavras tortas - Planificação das atividades

Calendarização Ações Objetivos das Ações

Abril

Fase Diagnóstica

Delineação de objetivos gerais e específicos Entrevistas informais Conhecer a população-alvo Identificação de necessidades Delimitação do objeto de intervenção Organização de questões logísticas Maio

Estabelecimento de contactos com vista ao estabelecimento de parcerias (Madkutz, Estraca e Mynda Guevara). Organização de um horário de trabalho com os jovens

Captação de recursos humanos e logísticos

Reunião com todos os jovens e apresentação do projeto com o tema (as vivências passadas), os objetivos e a metodologia de implementação do mesmo. Por sugestão dos jovens encontrou-se o título do projeto, acertou- se o trabalho no âmbito das experiências de vida em sentido metafórico. A temática sugerida foi aprovada por todos.

Aprofundar o conhecimento sobre a população-alvo

Foram mostrados aos jovens diversos espetáculos de referências musicais do agrado do grupo (no caso Hip-Hop e Rap).

Dado o conhecimento musical dos intervenientes e respetivas vivências e

Implementação da parte prática do projeto

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etnias, espera-se que exista uma continuada troca de ideias e experiências. Por dificuldades de conciliação de horários cada um trabalha individualmente com o animador e em fase mais avançada haverá nova reunião de conjunto.

A partir do momento que existem os três documentos com as letras propostas pelos intervenientes, resultado do trabalho feito de forma individual e com o animador é pedido que cada um junte os textos de forma a que a canção tenha uma letra com sequência.

Introdução de práticas de auto e heteroconhecimento.

Utilização dos recursos humanos, logísticos e financeiros

Encontro, no Lar, do grupo com o produtor e músicos, que conferiram um arranjo final ao trabalho realizado.

Desenvolvimento de

competências sociais e musicais (com a ajuda probono do produtor, MadKutz e dos, músicos e letristas Estraca e Mynda Guevara). Criação de um beat.

Moderação dos trabalhos a cargo do animador

Encontros do grupo para ensaios e acertos finais.

Junho

Gravação, no Lar, da canção com coatuação da Mynda Guevara e produção de MadKutz

Gravação da canção para futura distribuição pelos intervenientes.

Avaliação do projeto – Ficha de autoavaliação aos intervenientes e parcerias (Anexo III)

Dinamização de processos de auto e heteroavaliação

Avaliação do impacto do projeto

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Avaliação

Feita a análise das fichas de avaliação do projeto considero os objetivos atingidos. As parcerias qualificaram o projeto de inovador e fizeram sugestões como a gravação de um videoclip. Esta gravação implicaria mais tempo de trabalho, mais recursos e ultrapassar algumas questões burocráticas como o direito de imagem dos intervenientes.

Dado o período de tempo disponível e os constrangimentos das condições de trabalho foi feito o possível. Os intervenientes consideraram o projeto bom, embora, nem sempre tenha sido fácil a exposição dos seus mais profundos sentimentos. A conciliação dos horários de trabalho do grupo foi um aspeto negativo apontado.

Seria necessário mais tempo, envolver mais jovens e possivelmente mais recursos, para que o resultado final tivesse mais impacto, como por exemplo a realização de um espetáculo.

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