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ZIZEK, Slavoj (2010), Viver no Fim dos Tempos, Lisboa, Relógio d’ Água.

Apêndice 1- Entrevistas 1.1 Guião das entrevistas

1.2 Transcrição das entrevistas

1.2.3 António Dias Emílio N

P- Claro.

R- Não é essa a vocação dos municípios, tem é que haver um diálogo com quem o faça e uma visão integrada que depois se traduza na prática. Eu penso que do ponto de vista teórico e conceptual não vamos à procura de modelos que não existam e que não tenham sido testados, temos é que ter capacidade de reproduzir os processos a nível deste território. Mas eu creio que a Rota poderá ser muito importante para o desenvolvimento de toda esta região. Sim.

P- Muito obrigada.

R- Ora essa, se precisar de mais alguma coisa depois disponha. P- Está bem.

1.2.3 António Dias Emílio N

º Entrevistado Instituição Local Data

3 António Dias Emílio Junta de Freguesia

de Fanhões Sede da Junta 2013-05-28

P: Queria de todo de começar por agradecer a sua disponibilidade em participar nesta entrevista. Nós estamos, na Junta de Freguesia de Fanhões, e eu vou começar por lhe perguntar o seu nome, a sua profissão e a sua atividade. R: Chamo-me António Dias Emílio, a minha profissão, que já não exerço na medida em que já sou reformado, foi durante muitos anos a de serralheiro mecânico e civil; e neste momento também sou autarca, há oito anos nesta junta de freguesia.

P: Portanto já tem uma vasta experiência enquanto autarca.

R: Além destes oito anos eu já sou autarca nesta freguesia desde 1976…

P: Ah, então é mesmo larguíssima. Olhe, a minha primeira pergunta é…gostava de saber a sua opinião sobre o objectivo ou o propósito da Rota Histórica das Linhas de Torres. Em muita documentação e até mesmo documentação oficial publicada pelas entidades que fazem parte da Rota, ela é apresentada como um produto cultural e turístico, o Sr. Presidente concorda com esta designação?

R: Eu concordo, mas como dizia há pouco ela tem de ser mais divulgada no campo estudantil. Porque eu acho que é uma área que deve ser explorada. E atendendo que até no concelho temos escolas que vão até ao 12º ano, com deslocações de vária ordem a esses centros. Tenho a certeza de que isso era uma mais-valia. Se for só para ficar assim, provavelmente não terá o êxito que deveria ter. Por isso é que eu digo que através de protocolos com as escolas, deve ser muito mais divulgada do que é.

P: Sim. No fundo já respondeu em parte à segunda pergunta... eu gostaria de saber: na sua opinião, quais são os aspectos mais interessantes que este projeto contém? Uma vez que houve várias coisas, não houve só a intervenção arqueológica, a histórica, ou a dinamização, houve e continua a haver percursos pedestres e provas associadas, o protocolo com os escuteiros…das várias coisas que já foram feitas; na sua opinião quais são as mais interessantes?

R: Eu acho que de uma forma geral a maior parte das que focou são interessantes. As pessoas hoje já frequentam os circuitos pedestres, bastante gente anda aí agora nesta altura do Verão, que é propícia a isso. Eu sei de muita gente que faz esses percursos. Mas há mais do que isso, como é óbvio. Do resto eu não sou um expert, por exemplo em termos de arqueologia. Tem uma procura muito grande, aqui a nossa área, pelas escolas. Aliás nós temos andado ali em Casaínhos a pintar e todos os dias, em Casaínhos e Fanhões, eu vejo já alunos…eu sei lá… já da faculdade ou coisa assim…E fazem bastantes deslocações ou de autocarro ou em carros. E com os professores, devem ser turmas, porque a nossa serra é rica nisso. Portanto, também devíamos aproveitar essa parte, juntar isso.

P: A parte do património geológico, não é? R: Exatamente.

P: De facto esta serra é um campo de trabalho para os estudantes de geologia. R: É verdade, de muitos.

P: Quase todos vêm aqui fazer trabalho de campo.

R: Todos os anos eles aí vêm, e nesta fase final agora das escolas é todos os dias. Acho que era muito interessante, porque nessa área a nossa freguesia, como sabe, toda a gente sabe, é bastante rica nisso.

P: Claro. Na sua opinião do que conhece do projeto considera que os recursos envolvidos foram razoáveis e adequados?

R: Não sei, é sempre difícil responder a isso, não é? Mas pelo aquilo que pareceu, pelo menos houve o envolvimento da Câmara Municipal e dos técnicos.

P: E até da Junta que nos ajudou também muito, sim.

R: Exatamente. Nós, no que fomos solicitados, respondemos. Estou convencido de que os outros também, mas obviamente na parte que nos toca, se por ventura houver novamente mais envolvimento, nós estaremos sempre. Para mim pelo menos, como não tinha visto outra coisa do género, o envolvimento foi bom, foi salutar e abrangente. E isso obviamente à nossa freguesia deu uma visibilidade bastante grande. Isso foi notório. E é como eu digo, as pessoas também depois nos cafés…

P: Comentavam... R: Comentaram isso.

P: No seu ponto de vista quais são os objetivos mais positivos e os menos positivos? Pela sua experiência. R: Menos positivos não sei… pelo menos positivo foi o Centro em Bucelas, eu acho que isso foi bastante positivo. Acho que para Bucelas é de facto uma mais-valia. Em relação a nós foram identificadas situações na nossa freguesia em que antes se passava por lá e era mais um local...Faltava a identificação e a divulgação do que era aquilo, do que existia ali.

R: Agora vamos a ver é se as pessoas preservam, porque isso é que é sempre o tal problema, se as pessoas preservam e não estragam aquilo que de bom existe.

P: Pois, naquilo que foi feito e que diz respeito agora à manutenção. R: Exatamente.

P: Portanto, já falou que esta oferta pode trazer vantagens, não é? R: Sim, sim, sim.

P: Para a freguesia e para a região.

R: Isso. Aquela zona do Alto do Andrade, ou como lhe queira chamar… que dá entrada direta aos dois fortes que nós temos, e devido às acessibilidades estarem mais ou menos garantidas e mais ou menos em bom estado (e essa agora é a minha preocupação), eu sei que ao domingo é muito visitado e depois comentado, pessoas de outras áreas, de outras localidades. Já me têm feito chegar essa mensagem, e obviamente é sempre bom ouvir as pessoas a dizerem o que existe na nossa freguesia.

P: Quanto a si o que é que pode distinguir esta oferta cultural ou esta Rota de outro tipo de património? Acha que ela tem qualquer coisa que a distingue, ou pode associar outros aspectos que a tornam de algum modo única? Estou a pensar por exemplo na valência geológica, ou outra, não é? Acha que isso pode ser rentabilizado e diferenciador?

R: Oiça, é como eu já lhe disse…talvez por estar agora muito em voga, as pessoas procuram estes caminhos, estas situações. Por aquilo que as pessoas são incentivadas face à vida de hoje, assim elas têm o seu bocado de lazer, e aí eu acho que isso é uma mais-valia.

P: Sim.

R: Não há dúvida nenhuma que as pessoas vão, e ao mesmo tempo são acordadas para uma realidade que não sabiam, que desconheciam por completo; e agora vão casais, e às vezes grupos. Agora há grupos de pessoas, alguns casais, a maioria são senhoras, fazem esses percursos, que antes desconheciam por completo… toda a beleza que está aí na serra... logo isso é uma mais-valia, e que a diferencia das outras, não há dúvida nenhuma. P: Pois, porque de facto tem a componente paisagística, não é?

R: Exatamente! Exatamente. P: Que é de grande relevância.

R. É, é. E a nossa serra, a serra onde isto está implantado…junto à Serra dos Barros, e a encosta de Ribas, são locais, que, não conhecendo eu a totalidade do país, parece-me que devem ser dos mais belos deste país. E estão na nossa freguesia.

P: Sim, têm uma vista fantástica.

R: Pois, e as pessoas como têm os acessos, os acessos estão bons, e com facilidade deslocam-se, tanto encostam um carro como fazem tudo aquilo a pé.

P: Claro, claro.

R: Veem quer para um lado, quer para o outro, abarcam toda a baixa da zona sul onde apanham o Tejo e a Expo; e de lado de cima têm toda a serra, inclusive se forem a Montachique veem a parte de Mafra toda.

P: Claro. Sim, sim.

R: Portanto devem ser belezas únicas! P: Sem dúvida.

P: Na sua opinião este projeto pode considerar-se um projeto concluído, ou, em alternativa, um projeto ainda em aberto? Ainda há muito por fazer?

R: Não sei… eu penso que ainda é capaz de haver mais para fazer sobre isso, agora obviamente que carece de vários apoios.

P: Sim.

R: De várias entidades e, desculpe, mas tenho que insistir na educação, para complementar. P: Sim.

R: Acho que aí, na minha opinião, é aquela que mais se encaixava neste projeto para complementar e para ter uma divulgação muito maior.

P: Claro. Na sua opinião a proximidade com Lisboa pode ser uma mais-valia, ou não? No sentido de atrair públicos que não sejam só públicos locais. Ou até mesmo escolas, não é, quando digo públicos, são públicos também escolares ou estrangeiros, o que seja.

R: Estar perto de Lisboa é uma mais-valia, isso é indesmentível. Eu já vivo nesta freguesia (tenho sessenta e seis), há sensivelmente cinquenta e três anos. Dantes a gente estava muito longe de Lisboa, havia uma camioneta que demorava uma hora daqui ao Saldanha; por exemplo, hoje em 10 minutos faz-se até ao Marquês em tempo normal.

P: Sim.

R: Felizmente o país para essa área acordou um bocado, pelo menos a zona norte e a zona também oriental da freguesia ficou bem servida de acessibilidades. E por isso com facilidade, bastante facilidade até, as pessoas deslocam até aqui, e de facto não só cidadãos nacionais, mas muita gente estrangeira. E temos alguns a viver aqui na nossa freguesia, casais, não são muitos, mas estão alguns. E facto gostam da beleza, e lembro-me de um casal que mora ali no fundo da Serra de Ribas, moram lá, Ribas de Cima. É um sinal que de facto gostaram de uma forma geral da freguesia…das pessoas, e nomeadamente deste projeto. E esses divulgam a outros, pois eu sei que têm contactos com outros casais amigos, isso é bom, não há dúvida nenhuma.

P: É bom a proximidade com Lisboa. Na sua opinião como é que será possível envolver cada vez mais os agentes locais, seja não só a participação que tem sido feita através da autarquia e Junta de Freguesia, mas a população, as associações. De que modo é que vê esse envolvimento cada vez mais crescente? Qual será talvez a estratégia mais adequada na sua opinião?

R: Acho que ela está implementada. Implementada não na prática do dia a dia, isso ainda está um bocadinho longe, porque tem a ver já com a nossa vida global. Houve uns anos bons, em que não pensávamos tanto na crise…vivíamos uma vida livre e isso dava ânimo para outras situações. Agora há uns anos que mudou e se calhar infelizmente vai continuar, e isso deixa as pessoas apreensivas. Para além das suas horas de trabalho e do lazer de casa, têm que pensar, será que amanhã tenho emprego, ou não? Uma série de coisas... E eu acho que quando isto desaparecer, e se Deus quiser vai desaparecer, acho que as pessoas ficarão libertas para voltarem novamente àquilo que eram. E terem mais tempo para estas situações. E depois há muita gente que nunca esteve nem vai estar nessa onda de querer fazer parte do que quer que seja. Mas isso sempre foi, sempre vai ser. Isto para dizer que hoje existe muito menos gente.

P: As pessoas estão menos disponíveis talvez por causa da questão da crise, não é? R: Exatamente. Da crise que ocupa bastante o dia inteiro.

P: Claro.

R: Porque uma pessoa pode estar a trabalhar, mas não deixa de pensar se amanhã terá emprego, ou se tem que comer… e isso ocupa o espírito das pessoas, e estas divergem, está a perceber?

P: É mais difícil arranjar…

P: …digamos assim, uma associação, não é? R: Exatamente.

P: Associação no sentido de trabalhar coisas mais em comum. Nota essa dificuldade.

R: Eu, como Presidente de Junta, sou o Presidente do CLAS de Loures; o CLAS é uma organização nacional de ação social. E nós temos n associações que fazem parte dele, mas também elas faltam quando são as reuniões. E há outros que vão menos vezes. E também há aqueles que são assíduos. Mas nota-se que a sociedade mudou, a grande preocupação das pessoas, e nós também aqui preocupamo-nos um bocado com aqueles infelizmente que não têm que comer…

P: Claro, estão numa situação difícil.

R: As pessoas não estão é motivadas para abraçar qualquer ideia...

P: Têm outras preocupações que lhes preenchem o seu tempo disponível e até mental, digamos assim. R: É. É.

P: Será assim, não é?

R: Exatamente, hoje o problema é esse.

P: Claro. O que é que gostava, enquanto Presidente de Junta da Freguesia, que acontecesse em relação com a Rota? Tem na área da Junta de Freguesia, digamos assim, uma parte da Rota. E tem mais do que um circuito, tem o circuito de Ribas, mas depois há uma série de circuitos pedestres, para visitar a Anta de Casaínhos, visitar Salemas, que já está noutra freguesia, mas pronto, há uma série de percursos pedestres que a Câmara organiza e que têm cada vez mais público. Mas apesar disso o que é que podia ser feito, por parte dos técnicos da Câmara Municipal de Loures, em colaboração com a Junta de Freguesia, no sentido de divulgar ou valorizar mais o que tem de bom este território? Porque tem muitas outras coisas, tem uma igreja que é fantástica, tem muitas outras valências... acha que se pode fazer mais?

R: Há um monumento que fez eco durante muito tempo e de que se fala às vezes… P: A anta de Casaínhos, não é?...

R: …mas a Câmara Municipal aí, na minha opinião, cometeu um erro. Na minha e na opinião das pessoas, cometeu um erro. Quando de facto foi descoberta a anta nos anos…

P: Sim, salvo erro, penso eu, na década de 60…

R: Exatamente. O que é que acontece, naquele terreno onde está inserida? Têm que se dar uma solução àquilo. Porque tem lá uma casa dentro da área, portanto particular… Se aquilo é de interesse público, tinha que ter feito logo na altura o devido projeto para àquilo, e acabava-se com problema.

P: Pois, há o problema de que é privado, portanto não se pode intervir porque é privado.

R: Exatamente. E não tem uma entrada digna direta lá. Porque num lado entra-se, mas é um portão onde está a casa do senhor. E do outro lado é só um autêntico caminho de cabras para lá. Depois há outra situação que ocorreu nos anos setenta e tal, aquilo que a Anta tinha de valor foi-se embora. Aquilo agora que lá está é um monte de pedras.

P: Não, tem parte dos esteios. Sim, o espólio está no Museu dos Serviços Geológicos.

R: Ora aí está! Exatamente. Levaram…eu não sei, levaram porque se calhar alguém mandou, mas… se ela estivesse lá completa com o devido acesso, com tudo, porque houve tempo suficiente, estamos a falar na democracia, trinta e tal anos…quer os acessos, quer todas as envolventes, então sim, era um motivo de interesse e de visita. Não fazendo isso perdeu-se um bocado do fio do que é a Anta. Quando as pessoas chegam e perguntam pela Anta, dizemos, bem a Anta é ali, mas depois…

R: …um terreno cheio de erva de uma altura que tapa aquilo tudo, pronto, não dá, não dá, e é uma pena. É uma pena, porque se era ali que ela estava, é ali que devia estar devidamente conservada, mas de fácil acesso para quem quisesse visitar, quer os da freguesia, quer os de fora.

P: Esse problema aí também o conheço, enquanto técnica de arqueologia, é o problema da questão do direito do terreno. Enquanto não houver uma entidade pública que compre uma parte daquela parcela - penso eu, na minha opinião, quer a Câmara Municipal de Loures, quer a Junta de Freguesia, porque não estou a ver o Estado a comprar, a administração central - não há forma de se poder fazer ali qualquer coisa, porque de facto aquilo é privado, está dentro de um quintal.

R: Exatamente.

P: O que é uma pena, na minha opinião. R: Exatamente.

P: Porque há até informação suficiente para repor os esteios que faltam, porque já fizemos escavações, sabemos onde é que eles estavam colocados, repor o que estava, e valorizar o monumento. Pôr uma placa explicativa e melhorar o acesso, mas temos sempre ainda esse problema da propriedade por resolver.

R: Mas a propriedade é grande, e deviam ter feito na altura um destaque só para a Anta, com acesso pelo outro lado, pela parte mais estreita.

P: Sim, no caminho.

R: E fazer depois o acesso. Ora, se este lado tem um portão do senhor, ok. Então faz-se um destaque, com vedação ou rede - nem era preciso ser alvenaria, mas em rede - abarcando toda aquela zona da Anta com o acesso do lado de baixo, um acesso digno, porque pode ser feito, nada impede.

P: O senhor conhece os herdeiros? É que eles agora são vários. O senhor Bettencourt faleceu, não é? R: Exato.

P: E eu já falei com uma herdeira, ou melhor ela era a representante dos herdeiros todos, devia ser talvez a cabeça de casal ou assim considerada, que é uma senhora que nem vive ali. E acho que cultiva e que vem ali de vez em quando.

R: Exato.

P: E eu uma vez fui lá visitá-la, e ela deu-me o número de telefone e disse-me que havia de facto muitos herdeiros, e que estavam em partilhas. Penso que ainda não chegaram a um consenso, não sei. Mas eu até pensei, na altura, logo, fazer um contacto com o Senhor Presidente, para saber se eventualmente conhece alguém, se vive cá alguém desses herdeiros…

R: Não, cá não.

P: … no sentido de que nem que fossem eles a cederem uma parte do terreno, uma parcela pequenina... eles também não podem fazer ali nada, aquilo está classificado.

R: Exatamente. A Câmara Municipal tem técnicos habilitados para o efeito, para fazer o estudo. Era uma questão de fazer o levantamento daquilo…

P: O levantamento está feito.

R: Exatamente, é uma questão só de fazer uma divisória, isto é de interesse estatal, neste caso da Câmara, o senhor era pago obviamente ao preço de lei, e “daqui para ali é dos senhores”, ok. E depois daquela área do monumento fazer então uma recuperação.

P: Um projeto de reabilitação… R: Exatamente.

R: Exatamente; e de valorização, para que quem nos quisesse visitar ir também a esse monumento. Que tem bastante interesse, aliás. Disso sabemos nós. E é uma pena não estar valorizado. Mas é assim. E, então, temos a