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Introdução

Neste capítulo analisarei as principais mudanças e as estratégias de programação de acção da rádio pública durante a administração de António Ferro (1941-1949).

O início da II Guerra Mundial teve um grande impacte no modo como a rádio pública reequacionou os seus objectivos, um traço comum a diversas instituições do Estado Novo. O reforço do monopólio estatal, através de um controlo mais rigoroso e estreito do funcionamento das rádios privadas, constituía uma das principais medidas a operar neste novo cenário. Foi neste quadro que António Ferro desenvolveu a acção geral da EN. A sua aproximação à rádio estatal, até à tomada de posse, leva a analisar os pontos de contacto com SPN/SNI dirigido por Ferro, nomeadamente de que modo o incentivo à produção artística já implementado no organismo público responsável pela propaganda, foi fundamental na reestruturação dos serviços da EN. Interessa, portanto, sublinhar quais as mudanças estruturais que ocorreram sob a alçada de António Ferro e os pressupostos ideológicos já enunciados enquanto director do SPN. Pretendo destacar de que modo a reestruturação da programação e da produção musical se apoiou nos pressupostos do projecto de “aportuguesamento”, bem como a manutenção dos “mitos fundadores” do Estado Novo (Rosas 2001), como, por exemplo, as questões do império e do mundo rural. Neste sentido as relações institucionais com a FNAT foram fundamentais na criação de novos espaços de mediação e inculcação ideológica, como o programa Serões para trabalhadores, lançado em 1941, com a colaboração de ambas as instituições. Tal como nas anteriores administrações, a questão dos públicos e do papel que a EN devia ter na sociedade portuguesa constitui um vector transversal aos diversos conteúdos temáticos e discursos da administração em análise.

2.1) O monopólio estatal em tempo de guerra

O final da administração de Henrique Galvão foi marcado por dois assuntos decisivos: o futuro da EN no âmbito do Estado Novo e da sua rede de instituições, e o

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reforço do monopólio estatal nos assuntos da radiodifusão em particular, com o aumento do poder sobre as pequenas rádios privadas.

O Decreto-Lei n.º 29.937 de 21 de Setembro de 1939 previa a proibição das instalações radioeléctricas emissoras particulares com excepção dos proprietários que efectuassem um pedido especial de funcionamento. Os proprietários deviam assim suportar os encargos correspondentes à presença de um “fiscal permanente do Governo junto das respectivas instalações” (ibid.). Também a emissão de noticiários e publicidade radiofónica dependeria das condições posteriormente afixadas pelas entidades responsáveis. O estado assegurava que os emissores privados eram controlados a diversos níveis pelos fiscais do governo, que respondiam directamente ao SPN e à Presidência do Conselho, esta última responsável pela Emissora Nacional a partir de 1940.67

As rádios juntaram-se em dois grandes grupos centralizados que transmitiam a partir de Lisboa e do Porto, com os horários de emissão bem definidos. Em Lisboa, os Emissores Associados em Lisboa e no Porto os Emissores Reunidos do Norte juntavam as pequenas rádios privadas, sendo que o RCP e a Rádio Renascença mantinham as emissões em separado, gozando de um regime de excepção devido à sua dimensão. A centralização radiofónica na capital ficou a cargo da Rádio Peninsular e no Porto as emissões eram realizadas a partir do Portuense Rádio Clube com um horário acordado entre todas as estações e aprovado pelo SPN/SNI.

A censura da parte falada, sobretudo dos serviços noticiosos, era um dos principais objectivos da colocação dos fiscais do governo junto das estações emissoras. Não obstante, o controlo ia muito além dos conteúdos noticiosos em tempo de guerra. Os fiscais do governo reportavam também outros assuntos que visavam a manutenção do monopólio do Estado de modo a impedir o crescimento das rádios privadas. Como exemplo deste controlo, o Estado manteve durante cerca de uma década a “sufocante” situação de proibição da publicidade que impedia a angariação de verbas através do

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“(...) com efeito o decreto nº 31.320 de 19/3/1940, estabelece no seu artigo 2º que “passa a ficar subordinada à Presidência do Conselho - exclusivamente no que respeita à sua acção de propaganda e orientação de programas - a Emissora Nacional de Radiodifusão, o mesmo se observando, excepto na parte técnica, em relação aos emissores e postos radio-telegráficos receptores particulares”. Cabe pois, à presidência do conselho, a orientação e produção radiofónica, incluindo, é claro, noticiário e publicidade. Segundo o despacho do Senhor Presidente do Conselho, de 15 de Maio de 1940, essa orientação seria dada da seguinte forma: “Os fiscais permanentes junto das emissoras particulares receberão as directivas da Presidência do Conselho através do SPN, incumbindo-lhe exercer a censura prévia de todos os textos a radiodifundir, incluindo o noticiário e a publicidade, de harmonia com as instruções que receberem.” (Documento de 18/08/1943. ANTT/SPN/SNI cx. 1395).

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aluguer de tempo da emissão.68 O estado procurava manter o seu domínio ao proibir a expansão das estações radiofónicas privadas e assim o interesse de possíveis facções oposicionistas da ordem estado novista. Ilustra esta afirmação o pedido de 1944 efectuado pelo Rádio Clube Lusitânia, do Porto, para transmitir “publicidade artística”69

e criar vários agrupamentos musicais, nomeadamente uma “Orquestra Sinfónica Popular”, “Orquestra Ligeira ou de Baile”, e.o. ANTT/SPN/SNI/Caixa n.º1395/Processo n.º 213511. 05/12/1944).

Este tipo de pedido carecia de autorização do SNI, que considerava a iniciativa privada como um verdadeiro perigo para a ordem da nação. A resposta ao pedido de 9 de Março de 1945 sintetiza, de algum modo, o procedimento geral do SNI no que respeita à manutenção do monopólio radiofónico do estado, uma vez que poderia transformar-se em “arma contra o Estado Novo” e onde “a falta de idoneidade política e de condições técnicas não podem servir de alicerces a tamanha obra, onde o dinheiro e instituições secretas fatalmente domariam.” (ibid.).

Os fiscais do governo junto das estações emissoras procuravam controlar o seu funcionamento, representando e impondo a ideologia do Estado Novo. Pelo menos neste período de centralização era fundamental não confiar às estações privadas o desenvolvimento local da produção musical e dos serviços informativos autónomos, vetando, como no caso acima identificado, a possibilidade de expansão e crescimento do sector. Ainda assim, as rádios privadas procuravam meios de resistência ao controle, que permitisse o recurso indirecto a publicidade.70 No entanto, a política do Estado no

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A sobrevivência das rádios privadas não podia depender apenas das receitas provenientes das quotas pagas pelos seus associados: “É que na verdade, sem que seja necessário consultar, uma a uma, a posição actual das finanças das diferentes emissoras que inspiram hoje esta nossa crónica, fácil a todos se torna compreender - sabida que a única fonte de receita existente é a que provém da reduzida cotização mensal dos seus poucos sócios - os encargos que acarreta a manutenção decente, diária e nos nossos dias sobremaneira ingrata, no campo material, duma estação radiodifusora.” (Rádio Nacional, 31/03/1946).

69 Publicidade intercalada ou incluída em números musicais. 70

Existem vários registos que indicam a resistência dos emissores centralizados à proibição de publicidade, procurando contornar o problema: “Á excepção do Rádio Club Lusitania e em menor escala o Rádio Pôrto, todos os postos emissores particulares desta cidade vêm de há muito radiodifundido música a pedido dos ouvintes, mas anunciada por forma que reputo imprópria. Tenho chamado emensas vezes a atenção dos directores dos postos para êsse facto, mas sem proveito, pois se durante uma semana cumprem as instruções que lhes dou, logo a seguir voltam a reincidir. Esses postos anunciam, dum modo geral, da seguinte forma: Vamos tocar a música.... a pedido da Exma. senhora Dª... moradora na rua... em homenagem ao Senhor... morador na rua....; outras vezes dá-se o inverso: é um senhor qualquer, morador na rua...nº... que dedica a música á Exma Senhora Dª... da rua... nº... com os desejos de muita felicidade.(...) Os postos em questão defendem-se dizendo que os solicitantes são associados ou amigos dos postos e assim têm de lhes fazer a vontade, e quando lhes digo que estou de acôrdo neste ponto, mas para êsse efeito devem durante cada emissão reservar 20 ou 30 minutos para tocar músicas pedidas, sem anunciar quem lh'as pede ou a quem são dedicadas, respondem-me, que – ‘isso não satisfaz os seus associados ou amigos.’ O posto já mencionado, R. Club Lusitania iniciou há tempos uma campanha

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controle das actividades radiofónicas almejava enquadrar a actividade das rádios privadas no âmbito de uma política nacionalista. Numa circular escrita por um fiscal do governo às rádios centralizadas de Lisboa em 1943, surge de modo inequívoco a intenção e objectivo do regime de centralização, que visava também o controlo da parte musical numa luta contra os “crimes musicais de importação”:

“A Política Cultural do Estado Novo tem sido dirigida em louvável sentido nacionalista que busca motivos da tradição fonte de inspiração e ensinamento. Á radiodifusão, quando inteligentemente orientada, pode caber honroso papel de colaboração na obra espiritual de expansão do vasto folclore Português. (...) É pois de aconselhar que cada posto, e em cada emissão transmita, de preferência no começo, meia hora de música portuguesa, onde cabem as canções regionais, os fados e guitarradas, córos, operetas, música de revista com motivos populares e patrióticos, sólos de instrumentos, enfim, numa palavra, obras ou produções que vigorem o sentido exacto dum sádio nacionalismo. A bem da Nação, D. Couceiro da Costa; Fiscal do Governo junto das Estações Radiodifusoras Centralizadas de Lisboa.” (ANTT/SPN/SNI/Caixa n.º1140/ Processo n.º 213510, 17/12/1943).

O cenário de Guerra tornara as rádios privadas, agora centralizadas, num meio de disseminação ideológica apetecível, tomando inclusive parte na propaganda dos países beligerantes, com conhecimento do SPN/SNI, como o caso da rádio Voz de Lisboa, que “fez contrato com os serviços de propaganda alemães” (ANTT/SPN/SNI Caixa n.º 1140/Processo n.º 215518).

O final da Guerra trouxe consigo um ambiente de contestação por parte dos pequenos emissores, que iniciaram os pedidos para o termo da centralização que prejudicava a expansão das rádios privadas. O SPN/SNI de António Ferro não condescendeu com tais pedidos até final da década, altura em que permitiu que algumas estações abandonassem este regime, passando assim a utilizar os seus próprios emissores, mas mantendo a fiscalização do governo: “A fim de obstar a que, separando- se os postos emissores particulares viessem eventualmente a cair sob influências estranhas, sugerimos então que cada posto tivesse o seu fiscal próprio” (ANTT/SPN/SNI/Caixa n.º 1440, 07/07/1949).

A permissão de descentralização das rádios no final dos anos 40 marcou um novo momento na actividade das rádios privadas em Portugal. No entanto, mesmo após o pedido de descentralização, continuou a ser garantido o sistema de fiscalização, como

contra esta forma de radiodifusão de música a pedido, não dirigida aos postos, mas sim aos próprios rádio-ouvintes solicitantes, campanha essa que felicitei, mas sem resultado palpável. Conta-me que a insistência dos postos provem do facto de receberem dinheiro (em geral 20 escudos) pela satisfação de cada pedido e que vivem da receita assim obtida. Embora o decreto -lei nº 29937 de 21 de Setembro de 1939 não inclua na competência do Fiscal do Governo a sua intervenção em casos desta natureza (...)” (ANTT/AOS/SPN/SNI/ Caixa 1395.10/03/1945).

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aconteceu, por exemplo com a Rádio Graça.71 Foi, portanto, este o cenário que permitiu controlar a expansão, a actividade e o controlo das pequenas rádios privadas potencialmente subversivas e garantir o monopólio estatal.

2.2) A autonomia da Emissora Nacional: o caminho para a nomeação

de António Ferro

O papel da EN na orgânica do regime começou a ser reavaliado no final dos anos 30, antes do dealbar da II Guerra Mundial. Em 1938 colocava-se como questão principal quem deveria controlar da EN? Se numa primeira fase de instalação técnica e consolidação orgânica fazia sentido que a rádio do estado funcionasse na dependência da AGCT e do MOPC, o aproximar das comemorações dos centenários relançou um debate discreto acerca da autonomia da EN.

Ainda durante a sua administração, Henrique Galvão enviou um projecto que serviria de base à alteração do regime jurídico da radiodifusão em Portugal, estipulado pelo Decreto-lei n.º 22.783 de 1933. O projecto, assinado também por Pires Cardoso e Manuel Bívar, foi enviado ao Ministro das Obras Públicas e Comunicações a 20 de Maio de 1938, 5 dias antes da renomeação de Duarte Pacheco para o cargo, e antecipava a importância da EN no quadro das Comemorações dos Centenários, assim como levantava questões acerca da sua autonomia e controle pelo Estado:

“A Emissora Nacional vai, por ventura, entrar em novo período de desenvolvimento. As comemorações de 1939 e 1940 não podiam deixar de conceder-lhe um lugar primário, no domínio das realizações em projecto, como instrumento imprescindível da sua expansão, através do Império Português e de todo o Mundo Civilizado. (…)” (FPC/AGCT- Projecto enviado a Duarte Pacheco. 20/05/1938).

O documento, anexo à proposta de lei, parte de duas premissas que a administração da EN queria ver debatidas e que definiam os dois problemas a resolver:

“a)- Um problema de posição:- Qual o departamento do Estado a que devem ficar subordinadas as Emissoras Nacionais?

71 Numa carta dirigida ao Chefe de Gabinete da Presidência do Conselho, A. Tavares de Almeida refere

que: “Pede-nos o Posto Emissor Rádio Graça que, de Harmonia com a autorização que lhe foi concedida pelos serviços Radioeléctricos dos CTT de se descentralizar, isto é, de passar a emitir os seus programas através de emissor próprio, lhe seja nomeado o respectivo fiscal do governo.

A fim de obstar a que, separando-se os Postos emissores particulares viessem eventualmente a cair sob influências estranhas, sugerimos então que cada Posto tivesse o seu fiscal próprio. Como porém ainda não foi aprovado por Sua Exª. o Presidente do Conselho, o fiscal do Governo Dr. Cale Guimarãis em substituição do Snr. Couceiro da Costa, como o vencimento dos fiscais é inferior a 500$00, tomamos por isso a liberdade de sugerir, caso sua Ex.ª o Presidente do Conselho o considere justo, que o mesmo fiscal fique a receber, logo que nomeado a importância de 500$00 de cada um dos postos que gradualmente venham a separar-se do centralizador. (...)”(ANTT/SPN/SNI. Caixa 1440, 07/07/1949).

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b)- Um problema de comando:- Para os três serviços próprios das Emissoras Nacionais- Administrativos, de Produção, e técnicos- um comando único, ou a sua sujeição a organismos diversos?” (ibid.).

No desenvolvimento da primeira premissa, é notório o modo como a administração de Galvão procura evitar que a EN passe a ser controlada pelo SPN/SNI de António Ferro. Não que exista alguma referência àquele dirigente ou instituição do Estado, mas pelo modo como é assinalado que a EN teria de começar a:

“Ceder face a outras [funções] mais importantes, e que respeitam à vida espiritual, política, e social do Estado. (…) Bastará considerar a Rádio no tríplice aspecto, que é o mais visível, da “Cultura, Recreio, e Informação” para se lhe não negar uma função preponderante e insubstituível no quadro institucional.

Mas se acrescentarmos o alcance vasto da Rádio no domínio da propaganda política, sem cometermos o erro de a considerarmos apenas um instrumento desta propaganda; se não esquecermos os seus extraordinários benefícios como elemento de ligação da Mãe-Patria e das Colónias, promovendo a coesão e unidade imperiais; se não perdermos de vista o seu carácter de utilíssima embaixatriz que pode “acreditar” um Estado no concêrto das nações; se tudo isto considerarmos, além do muito que fica por dizer, a feição da rádio, como meio de comunicações inferioriza- se grandemente, e quasi desaparece” (ibid.).

A argumentação tinha como objectivo realçar que seria um “erro” considerar a EN apenas como um instrumento de propaganda, uma vez que ela se inseria numa teia de relações institucionais mais ampla, sendo, por isso, difícil definir quais os organismos a que deveria estar sujeita, em virtude das “afinidades com vários Ministérios, principalmente: Educação Nacional, Colónias, Interior, Negócios Estrangeiros, e Obras Públicas” (ibid.).

O comando da EN constituía o outro problema a ser resolvido: quem iria controlar a EN e qual o impacte desse controlo nos serviços administrativos e técnicos? Para a administração de Galvão era fundamental que os três serviços fossem coesos e “intimamente ligados e interdependentes, por forma a garantirem o fim último que é a emissão de programas”, sendo que “teoricamente, o comando único parece ser a melhor resolução a adoptar. Alguns anos de experiência, conduzem-nos também, praticamente, à mesma conclusão” (ibid.).

A alteração ao regime jurídico proposta pela administração de Galvão previa a criação da Junta Autónoma da Radiodifusão Nacional (JARN), directamente dependente da Presidência do Conselho, “para onde transitarão todos os serviços que actualmente competem à Comissão Administrativa dos Estúdios das Emissoras Nacionais, e mais aqueles que lhe forem atribuídos” (ibid.). Esta medida significaria a autonomia administrativa e financeira relativamente à AGCT, garantido que todos os serviços de

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radiodifusão nacional ficariam subordinados à JARN. No entanto, de acordo com a

Base II da proposta de documento legal, “a censura de programas dos postos

particulares e a orientação dos mesmos programas, pertencem à Junta Autónoma da Radiodifusão, mas a Administração Geral dos CTT manterá a superintendência no ponto de vista técnico” (ibid.). Colocando-se sobre a alçada da Presidência do Conselho, respondendo apenas a Salazar, a JARN conseguiria um único comando sem depender dos ministérios, da AGCT e de outras instituições públicas, em particular do SPN/SNI.

A autonomia administrativa e financeira da EN relativamente à AGCT ficou apenas consignada no Decreto-Lei 30.752 de 14/09/1940, 72 que promulgou a organização definitiva dos serviços da EN (completada em 1942 ao abrigo do Decreto- Lei 32.050). O documento legal marcava uma importante viragem na vida da rádio pública em Portugal, definindo de forma clara duas orientações. Por um lado procurava “assegurar a audição de programas radiofónicos em todo o território do Império Português e nos principais núcleos de portugueses fixados no estrangeiro” (Decreto-lei 30.752, 14/09/1940). Por outro lado, e na sequência do reforço do monopólio estatal, “exercer, no domínio interno, uma acção contínua como instrumento de cultura, educação, propaganda e recreio e, no domínio internacional, contribuir para um melhor e maior conhecimento de Portugal no estrangeiro” (ibid.).

Como sinal político, Salazar e Duarte Pacheco consertavam uma nova estratégia, reformulando o rumo para a EN em tempo de guerra. A discussão não se colocava apenas no potencial que este meio de comunicação poderia desempenhar na manutenção da propaganda vocacionada para os grandes pilares ideológicos de império, mundo português e nação. O desenvolvimento da II Guerra Mundial exigia uma atitude prudente em torno do papel das principais instituições do Estado Novo, com a adopção, na EN, de medidas de contenção orçamental, em 1940, na sequência “das repercussões económicas resultantes da guerra” (Ordem de Serviço n.º 40, 07/09/1940).

O decreto-lei 30.752, de 14 de Setembro de 1940, visava resolver em parte algumas das contingências financeiras que impediam o crescimento da rádio pública em

72 O cumprimento das disposições presentes neste documento legal implicou a organização e distribuição

do trabalho no quadro da EN. Esta mudança na orgânica da rádio pública foi efectivada com efeito a partir do dia 27 de Novembro de 1940, foi assinada pelo director interino Pires Cardoso e previa no seu artigo 6º “Que fiquem prestando ao serviço na “Secção de Programas Musicais” e nos departamentos abaixo designados, os seguintes funcionários: Orquestras Privativas - César Leiria (Encarregado do Serviço), Música Gravada - Margarida Brandão (Encarregada do Serviço), Lina Sans Ciana Rua, António Mendes Padeira, Maria Fonte Santa e Alberto Telo; Concertos, recitais e folclore - Artur Santos (Enc. De Ser.); Variedades e arranjos radiofónicos - Francisco Bruno de Herédia (Enc. De Ser.) com a colaboração de Artur Santos. (Ordem de Serviço n.º 51, 25/11/1940).

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Portugal, nomeadamente através da definição de um Plano de Radiodifusão Nacional (PRN) que previa a expansão de emissores regionais, uma melhor cobertura nacional, a reorganização interna da EN e a autonomia relativamente à AGCT. A EN podia agora arrecadar directamente todas as receitas provenientes das taxas de radiodifusão do território nacional e de 50% das cobranças efectuadas nas províncias ultramarinas, ficando os restantes 50% receita da ACGT. O documento contemplava ainda a possibilidade de pedir um empréstimo para suportar o investimento público de implementação do Plano Nacional de Radiodifusão.

As mudanças operadas em 1940, com o afastamento de Henrique Galvão e a entrada em vigor do Decreto-lei citado, tiveram de imediato consequências nas chefias da EN, com várias nomeações internas73 de carácter temporário, a 9 de Novembro de 1940 (Ordem de Serviço n.º 46, 9/11/1940), que deveriam ser asseguradas até novas