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reformador” de Henrique Galvão (1934-1941)

Introdução

Este capítulo tem como objectivo analisar as estratégias adoptadas na EN pelas administrações de António Joyce (1934-1935) e de Henrique Galvão (1935-1941), abordando a estrutura institucional criada, os principais intervenientes e mediadores, bem como as mudanças na programação musical. Será também apresentado o contexto de emergência da rádio pública, evidenciando os principais intervenientes que se envolveram no movimento de discussão em torno da necessidade de criação de tal estrutura. A análise incidirá ainda nas principais linhas políticas que influenciaram a estratégia delineada pelas duas administrações da EN, suas diferenças e os momentos de mudança interna e externa que marcaram as políticas de programação que afectaram a vida da rádio pública e a suaprodução musical.

1.1) Os antecedentes da rádio pública (1920-1933)

A história da rádio em Portugal divide-se, como noutros contextos coevos, em períodos que registam diferentes utilizações das possibilidades daquele meio tecnológico. Como refere Rogério Santos (2005:49-71), existiram algumas experiências que contribuíram durante o período da I República para o desenvolvimento da Telegrafia/Telefonia Sem Fios (TSF) em Portugal. Ainda que a história das primeiras transmissões radiotelegráficas, que carecem de uma investigação de fundo, seja significativa para entender o modo como essa tecnologia foi utilizada em diferentes contextos, interessa sobretudo perceber o momento em que surgiram as emissões radiofónicas com grelhas de programação regulares e elaboradas de modo continuado. As movimentações de vários amadores no sentido de regulamentar o enquadramento da TSF marcaram o interesse de legalizar a instalação dos postos emissores, evidenciado no pedido efectuado no final de 1923 à Administração Geral dos Correios e Telégrafos (AGCTT). A introdução do altifalante na década de 20 permitiu que a rádio fosse ouvida por mais pessoas, deixando de ser um acto de procura de sons dos “senfilistas”.

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Tal mudança foi apenas possível quando os emissores de faísca e receptores de galena foram substituídos por aparelhos tecnologicamente mais desenvolvidos, com a utilização das válvulas e do altifalante, que substituiu, em 1925, o auscultador.

A segunda metade dos anos 20, em consequência da visibilidade da rádio entre os amadores, assistiu a um florescimento de várias estações emissoras, comummente referidas como “rádio minhocas”, que transmitiam com alguma regularidade. Destacam- se neste período a Rádio Condes (1925), a Hertziana (1928), a Rádio Motorola (1929), em Lisboa, e a Ideal Rádio (1925), a Rádio Porto (1925) e a Sonora Rádio (1929), no Porto.

A expansão traduziu-se na fundação, em 1926, da Rede dos Emissores Portugueses (REP), sendo que “em 1929 havia cerca de 70 amadores, número que subiu para 274 em 1931” (Santos 2005:71). O aumento deveu-se, em parte, à emergência de uma nova geração ligada à radiodifusão e adeptos da ideologia autoritária que substituiu a primeira geração de radiófilos republicanos. A mudança foi visível no papel que viriam a desempenhar figuras como o Conde de Penha Garcia (1872-1940) ou o Capitão Jorge Botelho Moniz (1898-1961), este último responsável pela fundação da Rádio Parede em 1928 e, posteriormente, uma figura de destaque à frente do Rádio Clube Português (RCP), fundado em 1931.

Os anos 30 marcam, por isso, um novo período da radiodifusão em Portugal, não apenas pela fundação do RCP e de outras rádios de menores dimensões,22 mas também pela publicação do estatuto de radiodifusão que consignava, ao abrigo do Decreto-lei n.º 17.899 de 29 de Janeiro de 1930 “o monopólio do estado em todo o território da república” (art.º 1.º) através do direito deste na atribuição de “licenças para o estabelecimento e exploração de estações emissoras experimentais ou para estudos científicos, na área da sua jurisdição” (art.º 5.º). A abertura de concurso público para a “aquisição do material e instalação de duas estações emissoras e uma retransmissora de

relais deixava antever o interesse do estado no lançamento de uma rádio estatal que era

preenchido, até ao aparecimento da Emissora Nacional de Radiodifusão, pelo RCP (Santos 2005, Silva 2010b).

Começaram então as movimentações no sentido de se lançar o projecto para a criação de uma estação emissora estatal. Em 1931, João Antunes Guimarães (1877-

22 A Alcântara Rádio (1931), o Clube Radiofónico de Portugal (1931), a Rádio Amadora (1932), a Rádio

Graça (1932), a Rádio Luso (1932) e a Rádio São Mamede (1933), em Lisboa; a Rádio Porto (1925), a Ideal Rádio (1925), a Sonora Rádio (1929), o Rádio Clube Lusitânia (1932) e a Invicta Rádio (1932), no Porto (Silva 2010b:1080).

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1951),23 que foi, entre 1929 e 1932, Ministro do Comércio e Comunicações nos governos de Ivens Ferraz (1870-1933) e Domingos de Oliveira (1873-1957), abriu um concurso público que previa a construção de um emissor de onda média em Lisboa (O

Século, 17/10/1931). No mesmo ano, o director do Jornal O Século, Pereira Rosa (1885-

1962) liderou a iniciativa de organizar o I Congresso Nacional de Radiotelefonia (O

Século, 8/11/1931) ao qual aderiram várias estações emissoras.24 O apoio à iniciativa parecia unânime, assim como o desejo de criar uma estação emissora oficial: “O sr. D. Eugénio de Avillez, Presidente da Rede dos Emissores Portugueses, aplaude a iniciativa tomada pelo “Século”. Fala o emissor que primeiro fez ouvir a voz de Portugal na Austrália e na Rússia: “os emissores particulares desejam a Emissora Nacional” (O

Século, 18/11/1931).

A mobilização e o entusiasmo em torno da possibilidade da criação de uma emissora do estado encontram-se documentados nos periódicos, com informações quanto à aplicabilidade de tal emissor: “Para o desenvolvimento do turismo no nosso país, muito contribuirá a instalação da Emissora Nacional” (O Século, 20/12/1931), bem como ao acompanhamento do processo de aquisição do material necessário à sua construção: “No vapor ‘Baron Forbes’ deve chegar brevemente a Lisboa, vindo de Glasgow, com a 1.ª remessa de material para a Emissora Nacional, carga especialmente constituída pela ferragem destinada às antenas e por 18 caixotes com diversos acessórios (...)” (Diário de Notícias , 02/02/1932).

No programa do I Congresso Nacional de Radiotelefonia, foram várias as moções apresentadas que marcariam, com maior ou menor influência, o futuro enquadramento da radiodifusão em Portugal. Uma parte da discussão passou pela definição do regime legal da radiodifusão, tendo como opções o monopólio total do estado como verificado em Inglaterra, ouo modelo misto desenvolvido em França, com espaço para a iniciativa privada (Artº. 7,25 Decreto-Lei 22.783 Junho de 1933). O engenheiro Arantes e Oliveira (1907-1982),26 que pertenceu à direcção do RCP,

23 João Antunes Guimarães (1877-1951), católico conservador, estava próximo do núcleo duro de Salazar.

Foi um dos principais defensores do ruralismo salazarista, considerando que a excessiva industrialização ocorrida nos anos 20 havia deslocado para os centros urbanos muitos trabalhadores rurais, enfraquecendo assim tal actividade. Ao longo da sua carreira política ocupou os cargos de Presidente da Comissão Central da União Nacional (1932), Presidente da Província do Douro Litoral e Vogal da Comissão Administrativa dos Portos do Douro e de Leixões, e.o.

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Os postos CT1B0, CT1EB e CT1DH foram os primeiros a aderir (O Século, 13/11/1931).

25 “As emissoras nacionais de radiodifusão serão exploradas diretamente pelo Estado ou por entidades

particulares em regime de concessão”.

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Arantes de Oliveira (1907-1982), concluiu o curso de Engenharia Civil da antiga Escola Militar em 1929, alcançando em 1947 o posto de Major. Leccionou várias disciplinas relacionadas com a engenharia

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durante o período correspondente à Guerra Civil de Espanha (1936-1939), apresentou uma proposta intitulada A Organização da Radiodifusão Nacional e o papel das

emissoras particulares de onda média, que contribuiu para a definição do regime misto

posteriormente adoptado pelo Estado (Carvalho 1996:683), na qual se previa o funcionamento de postos emissores particulares, embora com a proibição da publicidade, como de resto ficaria regulamentado no Decreto-Lei n.º 22.784 de 29 de Junho de 1933. Tal proibição marcava o claro controlo que a AGCT queria sobre a radiodifusão em Portugal, criando as regras necessárias de um monopólio estatal que, ainda que permitisse a existência de rádios privadas, condicionava o acesso destas à publicidade, que constituía, por seu turno, um dos principais meios do seu financiamento.27 O RCP, através do seu director, o Capitão Botelho Moniz, contestou tal medida e travou uma luta com a AGCT e com Couto dos Santos. Apenas em 1936, foi permitido ao RCP a transmissão de publicidade, autorizada pelo ministro das obras públicas e comunicações Silva Abranches (1888-1939),28 que assumira funções naquele ano, depois do afastamento estratégico de Duarte Pacheco no âmbito de uma reestruturação do governo de Salazar.29 Por outro lado, o Decreto-Lei n.º 22.783 de 29

militar nos anos 30 e 40, passando à reserva em 1952. Ocupou diversos cargos na Câmara Municipal de Lisboa, destacando-se a direcção dos Serviços de Urbanização e Obras. Marcelo Caetano considerou-o discípulo de Duarte Pacheco, com quem manteve alguma proximidade. Foi nomeado, em 1947, director do Laboratório Nacional de Engenharia Civil, e, em 1954, Ministro das Obras públicas, cargo que manteve até 1967. Assumiu então, nesse ano, a função de Presidente do Conselho Superior de Fomento Ultramarino e de Administrador da Companhia de Diamantes de Angola e, entre 1970 e 1972, o de Governador-geral de Moçambique, sendo depois nomeado membro vitalício do Conselho de Estado (Carvalho 1996:683-5).

27A medida em torno da proibição da publicidade radiofónica foi particularmente contestada pelo Rádio

Club Português e resultou numa ampla discussão em vários periódicos da época. Logo em 1934, Couto dos Santos, administrador da AGCT, enviou uma carta ao Ministro das Obras Públicas e Comunicações referindo que “(...) Fui então procurado pelo Sr. Capitão Botelho Moniz, Director do RCP que me entregou o requerimento junto. Nele se requer o consentimento, com carácter provisório, para continuar a fazer publicidade, baseando-se precisamente na disposição legal que servira de base à circular (§ 3º, art. 15º do Decreto nº 22.784), e alegando que se trata de uma questão de vida ou de morte para o RCP visto que as suas receitas não chegam para pagamento de compromissos que tomou para o seu estabelecimento. Conquanto saiba que o espírito do decreto foi o de proibir, sem restrições, a publicidade, quer-me parecer, lendo bem o texto legal, que a sua redacção se presta efectivamente à interpretação que lhe pretende dar o RCP. E, por isso, me permito solicitar a V. Ex.ª se digne indicar-me como devo proceder, parecendo-me no entanto que, a dar-se consentimento a uns, se deve dar a todos” (FPC/ECS).

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Joaquim José de Andrade e Silva Abranches, natural de Viseu, concluiu o curso de Engenharia da Escola Militar em 1912, alcançando no ano seguinte o posto de Tenente. No âmbito da I Guerra Mundial, esteve na Batalha de La Lys (1918), regressando no mesmo ano a Portugal, onde foi condecorado com a comenda da Ordem de Torre e Espada. Ocupou diversos cargos na Companhia dos Caminhos de Ferros e no Governo, destacando-se, neste último, o cargo de Ministro das Obras Públicas e Comunicações (1936- 1938) e Ministro da Guerra –interino- (1936) (Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira 1945:847, vol. 28).

29 Duarte Pacheco foi afastado em 1936 após a não aprovação da proposta de lei sobre a Urbanização da

Costa do Sol, por questões quanto ao direito de propriedade e aos interesses privados da região a urbanizar. Segundo Franco Nogueira, referindo-se a Duarte Pacheco: “No país, este é popular e admirado

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de Junho do mesmo ano criou uma taxa a ser paga pelos proprietários de aparelhos receptores de radiodifusão, constituindo um importante rendimento para a AGCT.

A proposta apresentada no supracitado congresso por João Boto de Carvalho (1900-1960),30 um dos fundadores do Rádio Club Português, intitulada A organização

dos programas da Emissora Oficial, revelava a preocupação com a orientação de

programação de tal estação emissora: “As normas de carácter geral a que obedecerá a organização dos programas da emissora oficial devem ser previamente formuladas por uma comissão, constituída por elementos representativos do pensamento e da actividade nacionais” (Boto de Carvalho 1932).

No seguimento do Congresso, o Eng.º Duarte Pacheco, que sucedera a João Antunes Guimarães na pasta das Obras Públicas e Comunicações, fez aprovar em 1933 um conjunto de medidas que visavam relançar uma política de renovação das telecomunicações no país e garantir que “os trabalhos de montagem da Emissora Nacional em onda média prosseguem com celeridade, tudo fazendo prevêr que a sua inauguração será feita em prazo não superior a seis meses”, sendo igualmente importante “promover a organização dos serviços radioelétricos e dos Estúdios da Emissora Nacional, em condições de não iludir as esperanças que todos põem na realização de tam importante melhoramento (...)” (Decreto-Lei 22.783, Junho de 1933). Outro assunto abordado no documento legal consistia na nomeação de uma Comissão Administrativa dos Estúdios e uma Comissão de Programas da Emissora Nacional. A primeira poderia se “nomeada livremente pelo Ministro das Obras Públicas e Comunicações e de entre individualidades de elevada cultura artística, musical ou literária, especializadas em assuntos de radiodifusão” sendo que “nela poderão ter representação os organismos oficiais que tenham a seu cargo relacionados com a radiodifusão”. Por seu turno, a Comissão Administrativa dos Estúdios seria “constituída pelo director artístico dos Estúdios, que será o presidente da Comissão de Programas,

mas o seu dinamismo por vezes atrabiliário lesou muitos interesses particulares; politicamente tem a oposição dos meios da União Nacional e da ortodoxia do regime; e uns e outros pretendem o seu afastamento” (1977:351, Vol. II). Com o afastamento, regressou ao Instituto Superior Técnico, com um sentimento de grande injustiça pela medida de Salazar. No entanto, teve sempre presente que regressaria um dia ao seu cargo, facto que se verificou em 1938, nomeado presidente da Câmara Municipal de Lisboa e Ministro das Obras Públicas e Comunicações, cargos que ocupou até à data da sua morte, em 1943.

30 João Boto de Carvalho (1900-1960), advogado, licenciado em Direito pela Universidade de Lisboa. Foi

fundador do Rádio Club Português e presidente da sua Assembleia Geral, acumulando ainda com o cargo de director da Associação Jardins-Escola João de Deus. Foi também deputado à Assembleia Nacional na legislatura de 1938-1942 (Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira 1945:990, vol. 4).

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pelo director técnico dos Estúdios, que será o engenheiro director das estações emissoras, e por um vogal comercialista” (ibid.).

Estavam assim lançadas as bases para a fase experimental da EN, que iniciou, de acordo com o Jornal O Século, a 25 de Maio de 1934, com a realização de “experiências de resistência que se prologarão durante 3 dias (...)”, com a transmissão do “concerto de uma orquestra e em seguida discos de música” (O Século 26/05/1934). Ainda em 1934, a gestão da Emissora Nacional foi entregue nas mãos da recém-empossada Comissão Administrativa, denominação atribuída à direcção, desempenhando um papel fundamental como meio de propaganda, disseminação ideológica e centralização da produção musical.

1.2) A Comissão Administrativa de António Joyce (1934-1935)

A primeira administração da EN, nomeada em 1934 preocupou-se, num primeiro momento, em ultrapassar as dificuldades técnicas provenientes das deficitárias condições de emissão e recepção das ondas hertzianas, como de resto foi frequente noutros países (Méadel 1994; Santos 2005), e na integração dos recursos artísticos existentes fora da EN nos seus quadros, como orquestras, cantores e compositores. O início das sessões experimentais da EN, em 1933, teve o objectivo técnico de testar a capacidade do emissor de 20 kW colocado em Barcarena, através da qualidade de emissão e recepção das ondas Hertzianas. Em 1934 foi nomeada uma comissão administrativa pelo ministro Duarte Pacheco, paralevar a cabo a organização interna e estratégia de programação radiofónica da EN. De acordo com o Decreto-Lei 22.783 de Junho de 1933, “os serviços de radiocomunicações” estariam subordinados ao “Ministério das Obras Públicas e Comunicações por intermédio da Administração Geral dos Correios e Telégrafos”.

A AGCT, encabeçada por Couto dos Santos, figura próxima de Duarte Pacheco, escolheu alguns dos seus quadros superiores para delinear o plano técnico e financeiro

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da estação oficial, com a nomeação do Engenheiro Manuel Bívar (1906-1993)31 para o

cargo de director técnico e Jorge Braga32 para as funções de director financeiro (Diário de Lisboa, 21/06/1934).

A Comissão Administrativa da EN foi presidida por António Joyce (1888-1964), uma figura com várias ligações ao campo musical enquanto compositor e regente de orfeões (Brissos2010:664-665). Ao longo do seu percurso profissional, ocupou cargos públicos como o de Governador Civil de Bragança, Secretário-geral do Governo Civil de Lisboa, e secretário particular do Presidente da República Teixeira Gomes. Durante o período da República, para além da regência do Orfeão de Coimbra, esteve presente na Conferência da Grande Guerra em 1917, auxiliando o ministro dos Estrangeiros. A sua actividade política manteve-se após no período da Ditadura Militar e Estado Novo, com várias publicações sobre assuntos administrativos políticos e civis. No entanto, a escolha de António Joyce prendeu-se com o seu conhecimento musical, adquirido na Real Academia dos Amadores de Música, assim como a actividade musical que desenvolvera enquanto director do Orfeão Académico de Coimbra e o conhecimento que revelava da música tradicional, tendo escrito o Relatório do Júri Provincial da

Beira Baixa: IV — Acerca das canções populares de Monsanto e Paul, publicado no

periódico Ocidente, em 1939 (Id. ibid.:665). Destacavam os periódicos da época o “seu sincero e inabalável patriotismo”:

“O sr. Dr. António Joice, a cargo de quem fica a parte artística da Emissora, é uma pessoa que, além da sua competência excepcional em assuntos musicais e da sua cultura geral, tem demonstrado várias vezes e em ocasiões bem diferentes o seu sincero e inabalável patriotismo, a sua isenção absoluta em servir o País. Escolhendo-o para director artístico da nossa primeira estação de radiodifusão o sr. Ministro das Obras Públicas e Comunicações teve assim a preocupação de confiar tão delicado serviço a um técnico de conhecidos méritos que não tem de prestar agora as suas provas iniciais - e de servir mais uma vez os interesses da nação.” (Diário de Lisboa, 21/06/1934).

31 António Manuel Santiago Barjona de Freitas Weinholtz Bivar (1906-1993) cursou engenharia no

Instituo Superior Técnico, especializando-se depois em Radiotelefonia em Nova Iorque. Integrou os quadros da Administração Geral dos Correios e Telégrafos em 1933, com a função de fiscalizar a construção de uma emissora nacional. A 1 de Maio de 1934 foi promovido a adjunto da Direcção dos Serviços Radioeléctricos, assumindo em Abril de 1935 a direcção dos mesmos (Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira 1945:758, vol. 4). Desde a inauguração da Rádio Pública que desempenhou a função de director técnico da EN, da qual foi presidente da direcção desde 02/02/1974 até ao afastamento compulsivo em 08/06/1975. Para além de representar Portugal nos mais importantes congressos internacionais de radiodifusão, integrou, a partir de 1950, o Grupo de Estudos de Televisão que planificou a implementação técnica da Televisão em Portugal. Coordenou ainda várias equipes de estudo para a expansão da radiodifusão em Angola e Moçambique (ibid., actualização de 1981:270, vol. 2).

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Não existe informação sobre Jorge Braga, com excepção do cargo que ocupou como Director dos serviços de contabilidade da Administração Geral dos Correios e Telégrafos nos anos 30.

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A nomeação da comissão administrativa da EN evidenciava duas grandes linhas de orientação - a técnica e a “artística”- procurando também para os seus quadros colaboradores que possuíssem um perfil caracterizado pelo patriotismo e que fossem “defensores dos interesses da nação”. Por outro lado, apesar da preocupação de servir o Estado Novo, nenhum dos decisores nomeados estava directamente ligado à propaganda do regime, provocando, como será abordado, uma tomada de posição de algumas figuras de destaque que definiam o centro orgânico e ideológico dessa área específica de acção.

1.2.1) A Emissora Nacional como instrumento de acção política

No período inicial da Emissora Nacional, a propaganda representou, um campo de conflito entre os interesses de algumas instituições do Estado Novo. Na primeira administração, pelo menos até 1935, a propaganda não seria uma prioridade da EN, com reflexo na programação comummente categorizada nos periódicos da época como “artística”. A rádio pública não podia, segundo alguns sectores do regime, remeter o seu plano de acção a questões técnicas e artísticas. A propaganda do regime, a sua disseminação e inculcação deviam constar entre as prioridades da estratégia da rádio do estado a par da cultura(Diário de Lisboa, 21/06/1934).

No entanto, tais estratégias que orientassem o “poderoso instrumento de cultura e propaganda” (ibid.) nem sempre foram delineadas de modo claro pela administração de António Joyce, nem tinha sido esclarecido pelo Estado Novo que papel teria a EN na representação dos seus ideais e na sua rede de instituições estatais, sobretudo no que respeita à propaganda. A dependência directa do MOPC e da AGCTT, colocando a EN sob a alçada directa de Duarte Pacheco, bloqueou de modo inequívoco, neste período inicial, um possível domínio do SPN, e as intenções do seu director, António Ferro, de transformar a rádio pública num meio inequívoco de propaganda do regime. Álvaro Contreiras, proprietário e director da revista Rádio-Ciência, publicação periódica dedicada aos assuntos radiofónicos, foi uma das figuras que questionou qual devia ser o rumo ideológico da EN. No artigo O Secretariado de Propaganda é a única entidade