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Apelação Cível Remessa Ex Officio

No documento rdj105 (páginas 181-200)

2007011108372-2 Relator - Des. Fernando Habibe Quarta Turma Cível

ementa

Apelação cível. Remessa oficial. Responsabilidade civil do estado. Morte de nascituro. Danos moral e material.

1. A morte de nascituro decorrente da falta do serviço médico adequado em hospital da rede pública causa danos moral e material pelos quais o Estado responde objetivamente.

2. O valor arbitrado para compensar o dano moral mostra-se proporcional e razoável, além de atender à finalidade da condenação e à capacidade financeira do ofensor, razões pelas quais não comporta redução.

3. A indenização assegurada pelo STF 491 também se aplica ao natimorto, com base na mesma presunção de que a criança cresceria e, no devido tempo, exerceria atividade remunerada e contribuiria em prol da família.

4. O valor e o período da pensão foram fixados em consonância com a jurisprudência. 5. As despesas com o funeral devem ser ressarcidas.

6. Honorários de sucumbência redimensionados para atender ao CPC 20, § 4º.

acórdão

Acordam os Senhores Desembargadores da 4ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, Fernando Habibe - Relator, Arnoldo Camanho de Assis - Revisor, Antoninho Lopes - Vogal, sob a presidência do Senhor Desembargador Antoninho Lopes, em proferir a seguinte decisão: dar parcial provimento ao recurso, maioria, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasília (DF), 25 de julho de 2012.

relatório

Cuida-se de remessa oficial e de apelo (114-128) do réu contra a sentença (103- 110) da 2ª Vara da Fazenda Pública que o condenou a pagar aos autores: 1) pensão equivalente a um salário mínimo, na proporção de 50% para cada autor, entre 24 de janeiro de 2019 a 24 de janeiro de 2030, reduzida para 1/3 a partir de 25 de janeiro de 2030 até 24 de janeiro de 2065, extinguindo-se a obrigação com o falecimento do beneficiário ou na data em que o natimorto completaria 65 anos de idade ; 2) R$ 50.000,00, para compensar dano moral, igualmente divididos entre os autores, corrigidos monetariamente e acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês a partir da sentença; 3) R$ 2.233,00, para ressarcir despesas funerárias, corrigidos e acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês, a partir da citação. Sustenta a inexistência do dever de indenizar, uma vez que a condição de natimorto não decorreu de erro médico, mas, sim, de acidente automobilístico sofrido pela mãe durante a gestação.

Assevera que os médicos da rede pública de saúde dispensaram à autora todos os cuidados necessários, não havendo por parte deles erro, omissão, negligência ou imperícia, o que evidencia a ausência de causalidade entre o atendimento médico e o resultado morte.

Entende indevida a condenação ao pagamento de pensão, por não ser possível afirmar que a criança cresceria e contribuiria para o sustento da família, sublinhando que o STF 491, mencionado na sentença, refere-se a filho menor que já ajudava nas despesas familiares, e não a natimorto.

Insurge-se contra o valor fixado para compensar o dano moral, porque dissonante da jurisprudência desta Corte de Justiça, razão pela qual pede a sua diminuição. Pleiteia, por fim, a redução da verba honorária.

Em contrarrazões (132-141), os autores defendem o acerto da sentença e a condenação da ré por litigância de má-fé.

votos

Consta da guia de atendimento (24), datada de 30/12/04, que a autora sofreu trauma decorrente de acidente automobilístico no oitavo mês de gravidez. Por sua vez, a guia (22) emitida em 19/01/05 noticia que ela, com idade gestacional de quarenta semanas, compareceu à unidade hospitalar para avaliação sem apresentar queixas e que a gestação estava em curso.

O médico J.R. da S.L., que realizou o parto, declarou (90) que o feto estava vivo quando da internação da autora, e morto ao nascer.

Não há nenhum elemento indicativo de que a morte do feto esteja relacionada com o acidente de carro sofrido pela autora praticamente um mês antes da sua internação. Tem-se, isto sim, laudo (29) do Instituto de Medicina Legal atestando que o óbito foi causado pela aspiração, pelo feto, de líquido amniótico meconial, levando-o a sofrimento intraútero.

Conforme a solicitação de necropsia (18), assinada pelo mesmo Dr. J.R. da S.L., a autora deu entrada no pronto socorro de obstetrícia às 09h55min do dia 24/01/05, já em trabalho de parto, assim permanecendo até as 16h50min, quando finalmente o parto foi realizado.

O relatório (56) do médico citado evidencia a falta de obstetras em número suficiente para atender à demanda da maternidade do Hospital do Gama:

“(...) Alego ainda que antes de mandar a gestante para sala de parto tinha terminado de fazer dois partos quase ao mesmo tempo, enquanto os outros colegas (Dr. A. e Drª R.), encontravam-se no centro cirúrgico fazendo uma cesariana.”

Resta claro, pois, que, em razão do número insuficiente de médicos, a autora não teve atendimento pronto e adequado, o que resultou na morte do seu filho.

A propósito, lembre-se da conclusão dos peritos do IML (29) quanto à causa determinante do óbito: “BRONCOASPIRAÇÃO MACIÇA DE LÍQUIDO AMNIÓTI- CO MECONIAL; SOFRIMENTO FETAL INTRA-ÚTERO.”

Não obstante o considerável período em que a autora permaneceu em trabalho de parto - das 09h55min às 16h50min -, não há, conforme observado na sentença,

registro algum do quadro clínico do feto, o que autoriza a conclusão de que o sofrimento fetal sequer foi diagnosticado.

Esse quadro probatório dá conta, com sobras, da falta do serviço que, sem dúvida, resultou na tragédia que, da mãe/autora, recebeu o seguinte relato (88):

“(...) chegou ao Hospital do Gama entre 9h e 9:30 h da manhã; que sentia dores fracas; que foi levada para a sala de pré-parto; que a enfermeira estourou a bolsa; que ficou na sala, deitada numa cama até por volta das 17:30 e 18h, quando foi conduzida para uma segunda sala, na qual estava uma outra mulher; que a médica que acompanhou o pré-natal indicou o parto cesariana, em razão de, na primeira gravidez da autora o bebê ter se enrolado no cordão umbilical; que na segunda sala foi aplicado soro com remédio para dor; que após a aplicação do soro a depoente permaneceu sem acompanhamento médico ou de enfermeira; que na sala estava apenas a segunda mulher; que a depoente sentia muitas dores e gritava; que o médi- co e as enfermeiras afirmavam que não estava na hora e saiam; que a depoente caiu da cama; que a depoente tentou fazer o parto usando a cama como apoio para aux- iliá-la; que a depoente ficou muito fraca, até porque tinha passado o dia sem comer; que a depoente ficou roxa e desmaiou; que a acompanhante de quarto da depoente começou a gritar; que entraram quatro pessoas, dois homens e duas mulheres, um deles o médico que realizou o parto; que davam tapas no rosto da depoente e diziam para a depoente se levantar porque a depoente era muito pesada; que tais pessoas brigavam com a depoente, mas a depoente não conseguia se levantar; que a depoente caia para um lado e para outro; que a depoente foi levada para a sala de parto e aí realizaram o parto; que o neném nasceu morto (...).” Os elementos constitutivos da responsabilidade civil do Distrito Federal acham- se evidenciados, malgrado o seu desmedido esforço para descaracterizá-los. O serviço médico devido à autora e aos seu filho não funcionou a contento, houve demora no atendimento e incapacidade de diagnosticar o sofrimento do feto, daí resultando o fatídico evento que, sem sombra de dúvida, traduz dano moral in re ipsa e também rende ensejo ao pensionamento, além da indenização das despesas suportadas.

A responsabilidade é objetiva (CF 37, § 6º). A mãe e o feto achavam-se sob os cuidados do Estado que estava obrigado a prestar-lhes, mas não prestou, o melhor atendimento, aí incluída a prontidão.

Seja como for, ainda que se quisesse resolver a questão sob o prisma da responsabilidade subjetiva, melhor sorte não assistiria ao réu, por ser evidente que foi a inoperância do Estado a causa do evento danoso.

“A qualificação do tipo de responsabilidade imputável ao Estado, se objetiva ou subjetiva, constitui circunstância de menor relevo quando as instâncias ordinárias demonstram, com base no acervo probatório, que a inoperância estatal injustificada foi condição decisiva para a produção do resultado dan- oso.” (STF, 2ª T., AI 600.652 AgR, Min. Joaquim Barbosa, julgado em 2011).

Quanto à pensão, não se cuida de direito sucessório, como sugere o réu ao afirmar que o feto nasceu morto e que, por isso, não transferiu direitos aos pais.

A criança só não nasceu com vida em virtude do péssimo atendimento dispensado à autora no Hospital do Gama. Relembre-se, a par da conclusão do IML, a afirmação do médico que a atendeu quando de sua entrada naquela unidade hospitalar (90): “o feto estava vivo quando a parturiente foi internada e estava morto quando realizado o parto”.

A mesma presunção que se infere do STF 491 - qual seja, a de que o menor cresceria e exerceria atividade remunerada - também cabe no presente caso: não fosse a falta do serviço público, a criança nasceria com vida e, no devido tempo, trabalharia e ajudaria a família. Não se trata de sucessão.

Carece de razoabilidade, data venia, o entendimento segundo o qual o pensionamento é admitido em razão da morte do recém-nascido, mas não quando o feto nasce morto em virtude da inoperância do serviço público de saúde. A propósito, atente-se, mutatis mutandis, para o precedente do TJSP:

Ementa: RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - ERRO MÉDICO - AUSÊN-

CIA DE ATENDIMENTO MÉDICO-HOSPITALAR ADEQUADO - COMPROVAÇÃO CONJUNTO PROBATÓRIO QUE APONTA PARA A DESÍDIA E IMPERÍCIA DOS PREPOSTOS DA RÉ - EMBORA A CULPA RESTE EVIDENTE, BASTA O NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE A CONDUTA DO AGENTE E O EVENTO DANOSO PARA CARACTERIZAR A RESPONSABILIDADE ESTATAL - INTELIGÊNCIA DO ART. 37, § 6o, CF - RECURSO DO IAMSPE DESPROVIDO DANO MORAL - MORTE DE NAS- CITURO PORQUE OS MÉDICOS QUE ATENDERAM A PARTURIENTE NÃO ADOTA-

RAM AS PROVIDÊNCIAS EXIGÍVEIS PARA A ESPÉCIE - FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO - VALOR CORRESPONDENTE A 500 SALÁRIOS-MÍNIMOS PARA A PARTURIENTE - MONTANTE RAZOÁVEL - COMPENSAÇÃO DA VÍTIMA PELA INDESCRITÍVEL DOR SOFRIDA - A INDENIZAÇÃO, CONTUDO, NÃO PODE CON- STITUIR FONTE DE ENRIQUECIMENTO A BANALIZAR O INSTITUTO - RECURSOS DO IAMSPE E DA AUTORA DESPROVIDOS DANOS MATERIAIS - PENSÃO DE UM SALÁRIO MÍNIMO MENSAL, MAIS DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO, DA DATA EM QUE A FILHA DA AUTORA COMPLETARIA 14 ANOS ATÉ SEU 69° ANIVERSÁRIO - CABIMENTO - SOLUÇÃO ADOTADA PELA JURISPRUDÊNCIA -PRESUNÇÃO DE QUE OS FILHOS PRESTAM AUXÍLIO FINANCEIRO AOS PAIS NAS FAMÍLIAS HU- MILDES -IMPOSSIBILIDADE, PORÉM, DO PAGAMENTO DA PENSÃO EM PARCE- LA ÚNICA, OU QUE A MESMA SEJA REVERTIDA EM FAVOR DE TERCEIROS, CASO A BENEFICIÁRIA FALEÇA -RECURSO DA AUTORA DESPROVIDO DANOS MATE- RIAIS - CUSTEIO DE TRATAMENTO PSICOLÓGICO DESPESAS NÃO COMPRO- VADAS -FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS QUE CONSIDEROU O ABALO PSICOLÓGICO SOFRIDO - RECURSO DA AUTORA DESPROVIDO DANOS MATERIAIS - DESPESAS COM FUNERAL - PEDIDO NÃO FORMULADO NA INICIAL - SENTENÇA CORRETA, DIANTE DO PRINCÍPIO DA ADSTRIÇÃO AO PEDIDO - RE- CURSO DA AUTORA DESPROVIDO HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MAJORAÇÃO - INADMISSIBILIDADE -VERBA BEM FIXADA PELA SENTENÇA, DIANTE DA SU- CUMBÊNCIA RECÍPROCA - RECURSO DA AUTORA DESPROVIDO INDENIZAÇÃO - TERMO INICIAL DOS JUROS MORATORIOS E CORREÇÃO MONETÁRIA - DATA DA OCORRÊNCIA DO EVENTO DANOSO - SÚMULAS 43 E 54 DO E. STJ - RECURSO DA AUTORA PROVIDO NESSE TÓPICO APELO DO IAMSPE DESPROVIDO, PAR- CIALMENTE PROVIDO O APELO DA AUTORA. 0088249-54.2005.8.26.0000 Apelação Com Revisão/DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO, Relator(a): Renato Nalini, Comarca: São Paulo, Órgão jul- gador: 1ª Câmara de Direito Público, Data do julgamento: 28/07/2009, Data de registro: 03/11/2009, Outros números: 4246565300, 994.05.088249-1. O valor mensal da pensão (um salário-mínimo) está em harmonia com o STF 490 ao passo que o período de pagamento e a redução para 1/3 também se apresenta conforme a jurisprudência. Também é devido o ressarcimento das comprovadas despesas com o funeral.

Por outro lado, o valor arbitrado para compensar o dano moral, que é in re ipsa, não comporta redução.

Esse valor responde à discricionariedade judicial, informada pelos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, assim como pelo caráter punitivo e pedagógico da condenação, sem perder de vista o potencial financeiro do ofensor e a impossibilidade de fomentar-se o enriquecimento ilícito da vítima.

A importância de R$ 50.000,00, a ser divida entre os autores (R$ 25.000,00 x 2), não discrepa dos parâmetros adotados por esta Corte em casos análogos (acórdãos 427.192; 429.283; 513.384; 371.823).

Relativamente à irresignação do apelante quanto ao valor arbitrado a título de honorários advocatícios, assiste-lhe razão.

A verba honorária foi fixada em R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Entretanto, cuida-se de causa sem maior complexidade, razão pela qual reduzo o valor dos honorários para R$ 2.000,00 (CPC 20, § 4º).

Por fim, não vejo configurada litigância de má-fé pro parte do réu, que se limitou a exercer regularmente o seu direito de defesa, cabendo o acréscimo de que a sentença sujeita-se a remessa necessária.

Posto isso, provejo parcialmente o apelo e a remessa oficial apenas para reduzir o valor dos honorários advocatícios para R$ 2.000,00 (dois mil reais).

Des. Arnoldo Camanho de Assis (Revisor) - Com o Relator. Des. Antoninho Lopes (Vogal) -

I.

Os autores requereram a condenação do DISTRITO FEDERAL no pagamento de indenização no valor de R$ 631.113,00 (seiscentos e trinta e um mil e cento e treze reais) a título de danos morais pelo falecimento de seu filho recém-nascido em decorrência de erro médico e, também, ressarcimento das despesas relativas aos serviços póstumos.

A sentença acolheu parcialmente o pedido e condenou o Distrito Federal a pagar uma pensão aos autores de 01 salário mínimo e, também, uma indenização de R$ 50.000,00, a título de danos morais, na proporção de 50% para cada autor. Ainda,

impôs a obrigação de ressarcimento das despesas de funeral de R$ 2.233,00 e a pagar honorários de advogado de R$ 5.000,00, respondendo cada parte com metade desse tanto em razão da sucumbência recíproca.

O recurso do Distrito Federal afirma que o neonato já estava morto antes da realização do parto e defende a necessidade de comprovação de culpa para se pensar em indenização. Busca o julgamento de improcedência dos pedidos formulados, ou, ao menos, a redução do valor dos danos morais e dos honorários de advogado. O voto relator apenas reduziu os honorários de advogado para R$ 2.000,00. Manteve o resultado da sentença recorrida ao argumento de que a morte da criança decorreu do número insuficiente de profissionais de saúde para prestação de atendimento adequado.

II.

Há de se entender, data vênia, que embora a vida e à saúde sejam direitos fundamentais a serem garantidos pelo Estado, não se há de perder de vista que isso somente será possível mediante a elaboração de políticas públicas que repartam os recursos necessários de forma mais eficiente possível, o que na prática nem sempre ocorre.

O direito à saúde é um dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e outros agravos, regido pelo princípio do acesso universal e igualitário, bem como às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação (art. 196 da Constituição Federal), o que evidencia a sua dúplice natureza de direito individual e coletivo.

Assim, o direito à saúde cria uma relação jurídica obrigacional do Estado com a sua população a demandar a execução eficiente de uma política pública que o concretize. Contudo, mesmo que as ações e serviços nesse âmbito ostentam relevância pública, isso não leva a que sejam impostas obrigações de forma indistinta e de cumprimento muitas vezes impossível.

No caso em exame, a apelada deu entrada no pronto-socorro da obstetrícia do Hospital Regional do Gama-DF em 24.01.2005 às 09h55 em período pré-parto, que evoluiu com parto normal com “feto em morte aparente ao nascer”, culminando com o óbito as 16h50, tendo como causa morte o “sofrimento fetal intra-uterino” (fls. 28/29).

Foi relatado pelos médicos responsáveis pelo parto que os dados de internação da apelada referiam-se a gravidez de baixo risco e que foi feito controle do período de dilatação sem intercorrência, cuja duração foi de 06 horas e 35 minutos. E, também, que “antes de mandar a gestante para sala de parto tinha terminado de fazer dois partos quase ao mesmo tempo, enquanto os outros colegas (Dr. A. e Dra. R.) encontravam-se no centro cirúrgico fazendo uma cesariana” (fls.55/56). Mesmo não se olvidando que os serviços de saúde devam ser os mais eficientes possíveis, as informações constantes dos autos demonstram que foi feito o possível para concretizá-lo, não somente para a apelada, mas também para as outras gestantes que se encontravam em trabalho de parto.

Não se há de desconhecer que para os hospitais do Distrito Federal e para o seu serviço de saúde em geral acorrem pessoas de todos os locais, impondo a que os profissionais que foram instalados na Saúde desdobrem-se, trabalhem muito e, por isso, dão conta, com muita dificuldade, do que lhes é cometido a fazer. Isso está no relato médico de fls.55/56.

Do “Boletim EPIDEMIOLÓGICO DE DST/AIDSDO DISTRITO FEDERAL, de julho/2009, Número 01/2009 extrai-se o seguinte:

“Quanto à população, o DF tem 2.434.033 habitantes (segundo dados do IBGE, 2007), distribuídos em 29 regiões administrativas, tendo como área territorial total 5.822,1 km2, o que representa em termos de densidade pop- ulacional de aproximadamente 400 hab./km2. No entanto, devido às pre- cárias condições socioeconômicas da região de entorno, acorre às estruturas de saúde do DF aproximadamente quatro milhões de pessoas. Tal situação traduz uma complexidade e representa um desafio aos profissionais e ser- viços que atuam na atenção e na promoção à saúde dessa população” (www.saude.df.gov.br/sites/100/163/00008259.pdf)

Dessa forma, uma prestação eficiente de um serviço estatal e uma maior cautela nas decisões judiciais que imponham uma obrigação ao Estado devem harmonizar-se para a efetiva concretização dessas garantias, tendo como parâmetro o princípio da reserva do possível.

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que “o entendimento de que o Poder Público ostenta a condição de satisfazer todas as necessidades da coletividade ilimitadamente, seja na saúde ou em qualquer outro segmento,

é utópico; pois o aparelhamento do Estado, ainda que satisfatório aos anseios da coletividade, não será capaz de suprir as infindáveis necessidades de todos os cidadãos. Esse cenário, como já era de se esperar, gera inúmeros conflitos de interesse que vão parar no Poder Judiciário, a fim de que decida se, nesse ou naquele caso, o ente público deve ser compelido a satisfazer a pretensão do cidadão. E o Poder Judiciário, certo de que atua no cumprimento da lei, ao imiscuir-se na esfera de alçada da Administração Pública, cria problemas de toda ordem, como desequilíbrio de contas públicas, o comprometimento de serviços públicos, dentre outros. O art. 6º da Constituição Federal, que preconiza a saúde como direito social, deve ser analisado à luz do princípio da reserva do possível, ou seja, os pleitos deduzidos em face do Estado devem ser logicamente razoáveis e, acima de tudo, é necessário que existam condições financeiras para o cumprimento de obrigação. De nada adianta uma ordem judicial que não pode ser cumprida pela Administração por falta de recursos” (cf. Acórdão da Primeira Turma no RMS nº 28.962/MG, relator Min. Benedito Gonçalves, DJe 03/09/2009, LEXSTJ vol.242, p. 55)

III.

De outro lado, em nenhum instante nestes autos ficou provada a negligência dos agentes da saúde do Distrito Federal e nem mesmo sendo válido o argumento de que o hospital não continha profissionais em número suficiente para o atendimento, quer porque era razoável a quantidade de médicos e enfermeiros para esse fim (não mostrado qualquer incidente anterior), quer porque não se podia exigir do Governo do Distrito Federal que, fazendo previsões aleatórias, designasse outros tantos profissionais para atendimento de pessoas, de fora, que aqui buscam os serviços da Saúde.

IV.

Dou provimento total ao recurso para reformar a sentença recorrida e ter por improcedentes os pedidos formulados na inicial. Os honorários, agora devidos pelos autores, ficam fixados em R$2.000,00 (dois mil reais).

Esse é o voto.

decisão

Apelação Cível

2007011118336-9 Relator Designado - Des. Sérgio Rocha Segunda Turma Cível

ementa

Ação de reparação de danos. Morte por choque elétrico. Companhia energética de Brasília. Culpa concorrente reconhecida. Valor da indenização por danos morais. Razoabilidade. Ausência de prova da renda da falecida. Pensionamento devido no patamar de 2/3 do salário-mínimo. Divisão proporcional da pensão entre os dependentes. Limite temporal da pensão. 24 (vinte e quatro) anos das filhas. pensão do companheiro. Data em que a falecida completaria 65 (sessenta e cinco) anos. Apelação parcialmente provida.

No documento rdj105 (páginas 181-200)