• Nenhum resultado encontrado

Antes de adentrarmos na seção de análise do objeto de pesquisa, uma breve recapitulação do que foi discutido até aqui sobre os pensamentos que guiam a TAR e pelos quais estudos de comunicação devem se orientar, na visão de Lemos (2013): Segundo a ontologia plana (LATOUR, 2005), humanos e não-humanos estão em mesma posição; não é possível se definir nada a partir de uma essência apriorística, mas através das associações; não existe transcendência, mas subsistência; tudo se dá a partir de ações advindas de associações através de mediação, tradução ou delegação; as controvérsias tendem a caminhar para a pontualização, a transformação em caixas-pretas, até que novas controvérsias as abram novamente (transforme-as em caixas translúcidas ou cinzas); a nossa percepção de mundo se dá por inscrições híbridas através das quais se constrói a realidade; a sociedade e fluxo e movimento constante, sempre se remodelando como um magma (VENTURINI, 2009), que se solidifica por um tempo para depois retornar ao estado líquido e adquirir novas formas; o social não é uma estrutura externa que dá existência às controvérsias, mas sim é remodelado ao passo que as controvérsias acontecem. O social não é causa, mas consequência da constante reconfiguração das associações; e as escalas são construções humanas, não há hierarquias nas redes e sim aninhamentos de redes umas dentro das outras (DI FELICE; TORRES; YANAZE, 2012).

Isso posto, discutiremos como a Teoria Ator-Rede se aplica enquanto metodologia a esta pesquisa. A TAR tem como metodologia proposta para a compreensão da construção do social a Cartografia de Controvérsias (CC) (VENTURINI, 2009). Lemos diz que essas cartografias

nada mais são do que formas de “desenhar” a distribuição das ações, de seguir os actantes, de visualizar os diagramas da mediação, agenciamentos e de revelar cosmogramas. São os mapas gerados pela sociologia da mobilidade. Podemos dizer que a CC é um conjunto de técnicas para explorar e visualizar polêmicas, questões emergentes em determinados agrupamentos, o movimento, a circulação da ação e a fluidez das mediações, revelando as diversas dimensões que compõem uma rede sociotécnica. (LEMOS, 2013, p; 110).

Trata-se de entender e representar o fluxo da sociedade no momento de suas controvérsias, ou seja, antes de as redes se tornarem caixas-pretas. Nesse tipo de observação é possível compreender como se dá a formatação de uma rede sociotécnica (composta de humanos e não-humanos), percebendo suas posições como actantes ou intermediários e a constante dinâmica disputa de força presente na relação.

As ações que merecem ser escolhidas para serem estudadas são aquelas em que os actantes ainda não estão harmonizados. São aquelas em que as traduções estão vivas, quentes, em andamento, onde a circulação é mais intensa e inacabada. É aqui que podemos ver o social se formando, revelando questões de diversas ordens [...]. Por isso, o trabalho da TAR é descrever as controvérsias a partir do mapeamento dos seus rastros. (LEMOS, 2013, p. 111).

Como vimos anteriormente, uma das principais preocupações da Teoria Ator-Rede é a de que não existem essências, nem transcendência, nem estruturas que baseiam o social e definem as relações, o que faz com que ela seja efetivamente uma teoria de percepções a

posteriori, evitando categorias prévias. Trata-se mais de exploração do desconhecido do que

de caçada a características e categorias já dominadas. Para Venturini: “Não há definições para aprender; premissas para honrar; hipóteses para demonstrar; procedimento para seguir; correlações para estabelecer…” (VENTURINI, 2009, p. 259). Portanto, a Cartografia de Controvérsias não requer um método específico a ser seguido (VENTURINI, 2009; LEMOS, 2013; SILVA, 2016).

É importante perceber que a TAR não requer um método específico, mas ao mesmo tempo não exclui qualquer método. É uma teoria que, para Latour requer apenas que se observe e descreva a controvérsia.

Encontramos diversos estudos em que a Cartografia de Controvérsias é aplicada para rastrear debates acerca de assuntos polêmicos. Em Lemos (2016), vários casos desse tipo são tratados por autores diversos, como a discussão sobre a autoria de um seriado de TV (ARAÚJO, 2016) e a polêmica morte do João Goulart (ALVES JÚNIOR, 2016). Também encontramos abordagem semelhante aplicada em investigação sobre o debate acerca do desenvolvimento sustentável (SILVA, 2016). Mas o presente estudo se aproxima mais de discussões que buscam compreender novas etapas de práticas notadamente sociotécnicas, como o avanço do automatismo na fotografia (LEMOS; PASTOR, 2016) e a importância do não-humano na construção da narrativa cinematográfica (SAMPAIO, 2016). No presente caso, analisamos como se dá a relação entre humanos e não-humanos e quais os resultados práticos provenientes de um novo modelo de transmissões jornalísticas: as transmissões via

live stream, mais precisamente através da plataforma Live, do Facebook.

Lemos baseia-se em McBride (2000) e Brooks e Atkinson (2004) para sugerir etapas para o estudo de mídias locativas, as quais podemos aproveitar no estudo sobre transmissões stream:

a) Identificar atores (humanos e não-humanos); b) Investigar os actantes e como age cada um deles;

c) Mapear interações entre esses actantes e intermediários, descrevendo as relações em termos de mediação, delegação e pontualizações;

d) Construir um modelo ou mapa que possibilita entender as relações e as conexões fortes e fracas, bem como avaliar a complexidade dessas relações;

e) Identificar irreversibilidades dos eventos e as hierarquias e diferenças de poder entre os diversos actantes (deve-se mostrar quais as funções, as posições, quem decide, as necessidades instauradas etc.);

f) Identificar inibidores e promotores que podem surgir da tecnologia, dos usuários ou do lugar.

Essas etapas não se apresentam como um esquema completo, visto que outras etapas podem surgir ao longo da observação, nem tampouco são etapas absolutamente indispensáveis, mas se mostram como um interessante caminho a seguir a fim de rastrear controvérsias e compreender a estruturação do social.

CAPÍTULO 5

RESULTADOS: LIVE STREAMING E TECNOLOGIA MÓVEL

NA COBERTURA JORNALÍSTICA DO SPORTV NAS

OLIMPÍADAS 2016

As Olimpíadas Rio 2016 foram a 31ª edição da era moderna dos jogos olímpicos de verão, sendo a primeira realizada no Brasil e na América do Sul. A Rio 2016 aconteceu de 05 a 21 de agosto deste ano e contou com um orçamento de R$ 39 bilhões43 para a realização do evento. 11558 atletas de mais de 200 países disputaram medalhas em 42 esportes44, divididos em diversas modalidades. Mais de 140 mil pessoas participaram da organização, entre membros do comitê organizador, profissionais contratados e voluntários45. Os jogos ainda atraíram o fluxo de 1,17 milhão de turistas na cidade-sede, sendo 410 mil vindos de outros países.

Documentos relacionados