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2.5. Breves considerações sobre o ensino-aprendizagem do léxico em PL2/PLE 1 Abordagem léxico-cognitiva

2.5.2. Aprender/saber uma palavra

Definir “palavra” torna-se difícil devido à falta de rigor científico e à falta de consenso entre as várias ciências e áreas que se interessam pela realidade linguística, como, por exemplo, a filosofia da linguagem, a linguística, a psicolinguística, etc.

Intuitivamente, definiríamos “palavra” como sendo um conjunto de carateres ou letras com uma ou mais sílabas delimitado por um espaço. Contudo, esta definição diz apenas respeito ao significante, daí surgirem expressões, como termo, vocábulo, lexema, unidade lexicalizada, etc. Porém, a palavra é também significado.

Richards (apud LEIRIA, 2006) já em 1976 advertiu para:

o facto de aprender uma palavra ser muito mais do que aprender o seu significado, e foi o primeiro a fazer uma lista dos diferentes tipos de conhecimento de que um falante de L2 tem de dispor para a usar como se fosse um falante nativo. (LEIRIA, 2006: 14).

A palavra, segundo Vygotsky (1998: 12), subsiste quando acompanhada de outras palavras, ou seja, desprestigia-se enquanto entidade independente, quando isolada: “Uma palavra que não representa uma ideia é uma coisa morta, da mesma forma que uma ideia não incorporada em palavras não passa de uma sombra.” O contexto é, portanto, onde a palavra assume o seu significado, determinando-o. Com isto não se pretende afirmar que a palavra só existe como unidade de significado no texto, porém,

61 devido à dialética que se motiva entre a palavra e o texto, o texto privilegia um dos traços semânticos da palavra. (LEFFA, 2000: 21).

De acordo com Jackendoff (1995), o significado das palavras assenta num sistema de combinações em que ocorre uma interação entre estruturas conceptuais e regras de inferências. Estas últimas incidem em dimensões pragmáticas e heurísticas. O referido autor propõe que se entenda a estruturação concetual como uma perceção concreta que se consubstanciam com representações motoras e conceções abstratas. “The structure of the world we experience is in large part determined by internal mental constructs of potentially great abstraction.” (JACKENDOFF, 1995: 53).

No entanto, impõe-se a questão: o que significam as palavras? O significado é apenas um fragmento da estrutura concetual que está intimamente ligada à memória a longo prazo, em conjunto com uma estrutura fonológica e sintática: “the words one knows consist of stored concepts linked with stored concepts elements of linguistic expression.” (ibidem)

Jackendoff (apud LEFFA, 2001), na esteira das teorias de Chomsky e Piaget, apresenta quatro fatores que concorrem para o significado de uma palavra, a saber: a associação entre o conceito expresso pela palavra e a perceção e ação que esse significado advoga; interação com regras de inferência; relação com o restante léxico (relações de hierarquia – conhecimento concetual e relações intralexicais) e ainda a interação existente entre a palavra e os restantes padrões gramaticais da língua a que pertence. Todas estas componentes têm efeitos na construção do significado de uma palavra.

A ênfase do léxico é a maneira mais eficiente de se aprender uma língua porque todos os outros aspetos – da fonologia à pragmática – decorrem naturalmente de componentes que estão dentro das palavras. (LEFFA, 2000: 39)

62 Por conseguinte, a aprendizagem do significado de uma palavra pressupõe um processo de construção ativo que, por sua vez, requer a construção de um conjunto de combinatórias:

learning a word meaning is to be viewed as constructing a structured combination out of the primitives and principles of combination available in the conceptual Well-Formedness Rules. Word learning is therefore conceived of as an active construction process, not just a passive process of association (…). (JACKENDOFF, 1995: 58-59).

Essa construção pode dar-se inatamente ou pela aprendizagem. Seguindo as teorias piagetianas, verificamos que se há um determinado conjunto de princípios de combinatórias possíveis, esse conjunto de regras possibilita também a existência de um número infinito de conceitos possíveis (ibidem). Dito de outro modo, dentro do sistema há sempre conceitos a ser construídos ou criados que ainda não existiam. Além disso, o aprendente conceptualiza o significado segundo paralelismos linguísticos que se fazem com base em associações, assimilações, padrões de inferência ou estruturas simbólicas. Se o sistema permite um determinado número de possibilidades, apenas parte delas são concretizadas por cada aprendente.

Concluímos, assim, que aprender uma palavra requer muito mais do que aprender o seu significado, existindo léxicos diferentes, pois há também canais diferentes de input e output. Para saber uma palavra é necessário saber como se pronuncia e se escreve; conhecer a sua estrutura de base, as derivações e flexão mais frequente; reconhecer as suas propriedades sintáticas e semânticas; a sua adequação pragmática e as suas relações sintagmáticas e paradigmáticas. (LAUFER, 1997:141). Lauffer (1997: 140-155) adianta mesmo que certas classes de palavras são mais difíceis de aprender do que outras, elencando-as segundo o seu grau de dificuldade, aqui ordenadas de modo ascendente, a saber: nomes; verbos; adjetivos e advérbios. Embora os verbos ocupem um lugar

63 mediano, eles são essenciais no desenvolvimento lexical, contrariamente aos nomes, por exemplo. Na verdade, quanto mais nomes o léxico de um aprendente tiver, menor é a riqueza do seu léxico:

há evidência suficiente para considerar os nomes, os verbos e os adjetivos como classes relativamente separadas no léxico mental, enquanto os advérbios têm comportamentos muito diversificados. Quanto às preposições, elas diferem muito entre si no que respeita o seu conteúdo semântico, e cada uma delas também pode variar bastante consoante o contexto linguístico. (AITCHISON, 1994: 107)

Verificamos que a aprendizagem do léxico é um processo complexo e heterogéneo em que vários fatores intralexicais intervêm, como, por exemplo: a dimensão do léxico a aprender; a aprendizagem do significado das palavras; as conexões de significado que o aprendente vai estabelecendo para constituir o seu léxico mental, sendo bastante difícil “medir” a aprendibilidade de uma palavra, identificando o porquê de umas serem mais fáceis e outras mais difíceis de se aprender.

Vários estudos têm, nos últimos anos em linguística, considerado estas questões, pois encaram o léxico como componente central para a comunicação e para a aquisição de uma LE:

language teaching has always been a discipline dependent on the theoretical capacities of parent disciplines such as psychology, linguistics, pedagogical methodology. The discontinuity that characterizes the history of language teaching – the succession of new waves in teaching methods – is due to misapplication of findings from parent disciplines, and to the lack of an independent theoretical basis for teaching itself. (PIENEMANN, 1989:52, citado por LEIRIA, 2006: 137)

Para além de tentar indicar o modo como se processa a aprendizagem do léxico, diferentes teorias linguísticas têm-se dividido quanto ao modo como se deve processar

64 essa aprendizagem, se explícita ou implicitamente. Ocupar-nos-emos desta questão no ponto que se segue.