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1. INTRODUÇÃO

1.3. Apresentação da Pesquisa

O ensino de História, durante muito tempo, baseou-se na tradição que levava o aluno a limitar o seu conhecimento a acontecimentos históricos específicos, de uma determinada época, grupo social, comunidade ou território. Desse modo, muitas pessoas ainda acham que a disciplina de História é uma complexa reunião de datas, fatos, lugares e personagens de outra época. Talvez por isso se pense que a disciplina trata do passado longínquo de sociedades das quais nem os estudantes nem os educadores participaram e, por isso, não tem significado para a formação social.

Esse tipo de ensino não incentiva questionamentos e nem debate aos conteúdos estudados em sala de aula, formando alunos inabilitados para relacionar tempos distintos e compreender o mundo em que vivem. A autora Helenice Ciampi (2003) enfatiza que o desinteresse dos alunos com a disciplina vincula-se ao ensino positivista, baseado na

transmissão de verdades históricas inquestionáveis a serem memorizadas e reproduzidas e de conhecimentos desconectados da realidade dos estudantes e, portanto, pouco significativos.

Na contramão desse tipo de ensino, propõe-se que o educador trabalhe em sala de aula com unidades temáticas, estabelecendo relações entre o passado e o presente, sem negligenciar a temporalidade, e procure relacionar conhecimentos históricos com vivências e experiências dos estudantes para, a partir da compreensão do processo histórico, contribuir para que o aluno reflita sobre seu presente, sobre a relação entre vivências individuais e sociais em sua historicidade e pense sobre seu agir social.

Esse panorama de reflexões sobre o lugar e o papel do ensino de História tem se estabelecido como um campo fértil de pesquisa que contempla, sob diversos olhares, investigações teórico-metodológicas que tomam por objeto o ensino dessa disciplina e partem do princípio da necessidade de se construir fundamentos que respondam a perguntas como: O se espera alcançar com o ensino de História? O que é significativo, válido e importante ensinar aos alunos nas aulas de História? Como, para que e por que ensinar História? O que mais interessa, por exemplo, aos alunos jovens e adultos que já possuem uma experiência de vida, social, cultural e profissional? Ronaldo Cardoso Alves (2011) afirma que tais questionamentos revelam a necessidade de se pensar e construir um referencial de História que permita às pessoas a construírem suas identidades e colocarem-se de forma ativa diante dos problemas de orientação temporal nos diversos espaços da sociedade.

As inquietações acerca da função social da História e suas relações com a vida humana prática também podem ser pensadas e analisadas de acordo com o olhar do professor. Nesse sentido, pergunta-se: O que faz o professor de História na sala de aula? Quais as metodologias, os materiais didáticos, os recursos que utiliza para desenvolver o processo de ensino em História? Como avalia o alcance dos objetivos pretendidos nesse processo? Como compreender a experiência profissional dos sujeitos que trabalham com o ensino de História? (FONSECA, 2000).

É nesse viés que a presente pesquisa se amparou ao propor compreender como profissionais do ensino de História na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA) constroem o processo de ensino histórico junto aos estudantes jovens e adultos, e qual o sentido da História para sua formação cidadã. Ou seja, buscamos entender os saberes e as práticas de professores do ensino de História na modalidade EJA e o sentido que procuram dar para sua atuação docente.

Para isso, registramos, por meio de recurso audiovisual, as narrativas de seis profissionais do ensino de História que lecionam em escola municipal de Uberlândia-MG na

modalidade EJA – anos iniciais (1º ao 5º ano) e finais (6º ao 9º ano), em relação à construção do processo de ensino junto aos estudantes jovens e adultos. O que se aspirou foi entender o planejamento das aulas, a seleção de conteúdo, as estratégias didáticas que utilizam para desenvolver o processo de ensino de História, a avaliação do alcance dos objetivos pretendidos nesse processo, como lidam com as especificidades desse segmento e as experiências marcantes ao longo da trajetória como professor de História EJA.

Sendo assim, era de fundamental importância que as fontes para esse estudo fossem produzidas por e com os sujeitos dessa história, ou seja, a pesquisa foi feita levando em consideração a oralidade. A história oral ganhou relevância no desenvolvimento desse projeto de pesquisa, pois “grande parte da evidência oral oriunda da experiência pessoal direta é preciosa exatamente porque não pode provir de nenhuma outra fonte. É inerentemente única” (THOMPSON, 1992, p. 307). Evidentemente, com isso, firmamos nossa opção por uma história subjetiva, que não busca uma verdade, mas caminhos para novas interpretações, que dialoga com a ideia de (re) construir e compartilhar saberes e experiências à luz das práticas docentes.

A opção pela história oral como método privilegiado de investigação que se pretendeu realizar, portanto, é mais que um impulso de modismo, posto que ela tem feito muitos adeptos, principalmente no Brasil. É um caminho metodológico na realização dos estudos que implica rigor no trato das narrativas e valorização do conhecimento do sujeito e do saber que com ele pode ser construído. Nesse sentido, a história oral não é um fim em si mesma, e sim um meio de conhecimento. Seu uso tem se propagado e com isso vem surgindo diferentes formas de trabalho, com o que se chama de “fonte oral”. Queremos sublinhar que nesse boom da história oral surgiram diferentes linhas de trabalhos e que a escolhida para a elaboração desse projeto foi a sintetizada por J. C. Sebe Bom Meihy. Fazer essa definição significa respeitar critérios éticos e metodológicos que nortearam o desenvolvimento dessa pesquisa. Critérios como a existência de uma relação sujeito-sujeito, em contraposição a sujeito-objeto, que passa a exigir do pesquisador um posicionamento diferente frente ao seu “objeto” de estudo. A experiência do indivíduo passa a ser valorizada e contribui para uma história mais viva, mais comovente e mais verdadeira.

As narrativas registradas em vídeos passaram, em um primeiro momento, por uma decupagem, com o objetivo de analisar categorias/temáticas e abordagens semelhantes e diferentes entre cada narrativa, e selecionar os temas que definiram os produtos audiovisuais que foram criados. Em seguida, a pesquisadora selecionou os trechos mais significativos de cada depoimento para cruzá-los na produção audiovisual, promovendo, assim, a transcriação dos vídeos.

A partir disso, dois produtos audiovisuais foram apresentados, quais sejam: os vídeos de cada entrevista na íntegra e um documentário temático cruzando diferentes narrativas. Ambos os produtos estão disponibilizados na plataforma digital “Observatório do Ensino de História e Geografia”, a qual é melhor explicitada ao longo desse trabalho. Assim, as histórias orais foram registradas e editadas, possibilitando leituras e interpretações posteriores e permitindo ao leitor a compreensão daquilo que os narradores contaram e que desejaram ver transmitido a outros.

Com isso em mente, o movimento de realizar essa pesquisa em escolas municipais da cidade de Uberlândia-MG pretendeu ampliar o olhar sobre a EJA e contribuir para a compreensão de sua especificidade, tendo em vista a própria diversidade desta área que, como analisaremos, atravessou e atravessa instabilidade nas políticas públicas nos diversos níveis do governo.

Além disso, as entrevistas realizadas, gravadas e divulgadas podem colaborar para a valorização e a visibilidade social da ação docente no processo de ensino de História na Educação Básica, na especificidade da EJA. Outrossim, trazem benefícios históricos- educacionais, uma vez que são analisadas questões que demonstram a necessidade de garantir aos jovens e adultos uma educação que atenda às suas expectativas, aos seus interesses e às suas particularidades. Portanto, tratou-se de um projeto de pesquisa fundamentado na produção de entrevistas como fonte privilegiada, com o intuito de constituir um acervo de narrativas para a consulta do público.

Em relação a estrutura dessa Dissertação, esta se divide em duas partes, além dessa introdução e das considerações finais. A primeira delas apresenta o embasamento conceitual e a historicização da díade que essa pesquisa aponta – a Educação de Jovens e Adultos e o ensino de História. A segunda parte versa sobre o estudo das narrativas docentes por meio da História Oral, e delineia os referenciais metodológicos da pesquisa, relatando procedimentos como a seleção dos entrevistados, a realização das entrevistas, a análise das narrativas audiovisuais e a produção do documentário. Abrange, ainda, o levantamento de produções audiovisuais similares, ou seja, elaboradas a partir de narrativas gravadas com diferentes grupos sociais, e as formas de divulgação dos produtos audiovisuais e usabilidade pelo público-alvo, especialmente pelos profissionais do ensino de História da EJA, e pela sociedade como um todo.