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2. EJA E O ENSINO DE HISTÓRIA

2.1. A Educação de Jovens e Adultos no Brasil e em Uberlândia-MG

2.1.7. Tecendo considerações – A EJA como um direito público subjetivo

Portanto, como proposto inicialmente, tratamos aqui a reconstrução histórica da EJA no Brasil, situando-a no contexto do direito à educação. Com vistas a revisar a legislação e compreender as transformações pelas quais ela passou, apresentamos abaixo um quadro que traz os principais marcos legais que embasam essa modalidade, compreendendo que é nesse contexto de normatizações que vai se delineando a política educacional para a Educação de Jovens e Adultos que se busca implementar.

Quadro 1 – Histórico das principais bases legais da EJA (1988 – 2017)

Constituição Federal de 1988

Incorpora, no Artigo 208, o dever do Estado em efetivar o direito de todos ao ensino fundamental público e gratuito, independentemente da idade.

Lei de Diretrizes e Bases – LDB 9.394/96

Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. A EJA passa a ser uma modalidade da educação básica nas etapas do ensino fundamental e médio, e a usufruir de uma especificidade própria.

Parecer CNE/CEB nº 11/2000

Se ocupa das Diretrizes da EJA, dos cursos e exames próprios dessa modalidade de ensino, e estabelece as funções reparadora, equalizadora e qualificadora, preconizando que a EJA vai além da função de suprir a escolaridade perdida.

58 Documento de caráter normativo, que estabelece os direitos de aprendizagem para todos os estudantes da Educação Infantil e do Ensino Fundamental de Minas Gerais. A normatização deste documento se deu através da Portaria SEE n° 1528, de 28 de dezembro de 2018, e da Resolução nº 470, de 27 de junho de 2019, disponíveis em: https://curriculoreferencia.educacao.mg.gov.br/index.php/educacao-infantil-e-ensino-fundamental/historico- de-elaboracao. Acesso em: 30 mar. 2020.

Resolução CNE/CEB nº 1/2000

Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos. Abrange os processos formativos da EJA como modalidade da Educação Básica nas etapas dos ensinos fundamental e médio, nos termos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

Parecer CNE/CEB nº 6/2010

Altera elementos que dizem respeito aos parâmetros de duração dos cursos, idade mínima para ingresso nos cursos e certificação dos exames de EJA.

Resolução CNE/CEB nº 3/2010

Institui as Diretrizes Operacionais para a EJA, mantendo os princípios, os objetivos e as Diretrizes formulados no Parecer CNE/CEB nº 11/2000. Amplia o alcance de aspectos relativos à duração dos cursos e idade mínima para ingresso nos cursos e exames de EJA;à certificação nos exames de EJA e à Educação de Jovens e Adultos desenvolvida por meio da Educação a Distância (EAD).

Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica - 2013

Traz um resumo do que legalmente se aplica nos sistemas de ensino quanto aos aspectos: cursos de EJA, organização curricular e exames supletivos. Sublinha que o projeto político-pedagógico e o regimento escolar viabilizarão um modelo pedagógico próprio para essa modalidade de ensino. Aborda sobre a Educação Profissional referindo-se à articulação da modalidade com o Ensino Médio regular.

Plano Nacional de Educação – PNE (Lei nº 13.005/2014)

Com vigência de 10 (dez) anos, este documento determina diretrizes, metas e

estratégias para a política educacional. Em relação à EJA, articula-se três metas: Meta 8 (Elevação da escolaridade/ Diversidade), Meta 9 (Alfabetização de jovens e adultos) e Meta 10 (EJA Integrada à Educação Profissional).

Base Nacional Comum Curricular (BNCC) – 2017

Norteia os currículos dos sistemas e redes de ensino, bem como as propostas pedagógicas de todas as escolas públicas e privadas ao longo das etapas e respectivas modalidades no âmbito da Educação Básica, em todo o Brasil. Não dá orientações específicas para a elaboração do currículo da EJA, por considerar que esse segmento está incluído na educação regular e no conjunto de direitos de aprendizagem.

Fonte: Autoria própria com base nos estudos sobre os marcos legais da Educação de Jovens e Adultos (2020).

Como já apontado, é nos anos 80 que a Constituição dará o passo importante em direção a uma nova visão de Educação de Jovens e de Adultos. O inciso I do Art. 208 determina que o dever do Estado para com a educação é efetivado mediante a garantia da Educação Básica e gratuita dos 4 aos 17 anos de idade, “assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria”.

A LDB reitera esse mandamento e determina a oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com características e modalidades adequadas às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se, aos que forem trabalhadores, as condições de acesso e permanência na escola. Além disso, elimina a expressão “ensino supletivo”, embora mantenha o termo “supletivo” para os exames, mas dentro de uma nova concepção. Portanto, desde que a EJA passou a fazer parte constitutiva da LDB, tornou-se modalidade da Educação Básica e é reconhecida como direito público subjetivo na etapa do Ensino Fundamental.

Assim, apesar de algumas pequenas marcas históricas antecedentes que remetem à EJA, foi somente a partir da segunda metade do século XX que percebemos que o pensamento pedagógico e as políticas de educação escolar de jovens e adultos adquiriram identidade e

formato próprio, valorizando essa modalidade educativa e consolidando no Brasil um sistema de educação básica.

Diante do exposto, ao menos no plano formal, a EJA vem se constituindo, em meio a um jogo de interesses conflitantes, como uma oportunidade significativa de melhorar as condições de vida, de superar a exclusão, de reconstruir as experiências adquiridas ao longo da vida, de ressignificar e articular os conhecimentos obtidos dentro e fora da escola, enfim de transpor as barreiras que impediram jovens e adultos de ter acesso à escolarização na idade própria.

À vista do que foi tratado nessa seção, é indiscutível que a educação é direito do cidadão. Parece uma afirmação trivial, mas em um país como o Brasil, onde quase 12 milhões de pessoas estão analfabetas,59 essa frase deveria ecoar com mais força. A EJA, enquanto “modalidade estratégica do esforço da Nação em prol de uma igualdade de acesso à educação como bem social”, apresenta-se como uma oportunidade para essa população que está analfabeta ou que não concluiu a Educação Básica e que não só poderia, como deveria cobrar esse direito (BRASIL, 2000, p. 22). Não obstante, a história da EJA enquanto um direito é recente no Brasil, tendo em vista que legalmente foi garantida na Constituição de 1988, que estabeleceu pela primeira vez a educação como direito do cidadão, inclusive para aqueles fora da “idade própria”, se é que existe uma idade própria para se educar.

Ora, ainda hoje esse direito não é acessível para a população, que tem a ideia da educação como um favor e não como um direito que lhe cabe. Nessa perspectiva, ao longo da nossa história, temos a Educação de Jovens e Adultos sendo tratada de uma forma muito filantrópica, como uma doação ou um agraciamento. Essa construção histórica de pensamento pode ser explicada, em partes, em razão de uma questão cultural no Brasil, em que as pessoas acreditam ser vergonhoso tentar mudar de vida depois de se tornar adulto ou depois que passou da “idade própria” para estudar.

Aliás, a EJA, na medida em que afirma a igualdade de todos como sujeitos de direito, rompe com a lógica de que uns valem mais do que os outros, enfrentando as desigualdades como desafios a serem superados pela sociedade brasileira. Fomentar o atendimento às demandas diversas na educação pode contribuir para a transformação social e

59 No Brasil, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) 2018, a taxa de analfabetismo das pessoas de 15 anos ou mais de idade foi estimada em 6,8% (11,3 milhões de analfabetos). Informações mais detalhadas disponíveis em: https://educa.ibge.gov.br/jovens/conheca-o-brasil/populacao/18317- educacao.html. Acesso em: 16 mar. 2020.

para a formulação de propostas educativas que coloquem esses sujeitos, com necessidades e expectativas de educação, como protagonistas (BRASIL, 2008).

Todos os esforços feitos pelo Brasil, no sentido de integrar a EJA a um sistema nacional de educação que ofereça oportunidade de acesso, garantia de permanência e qualidade a jovens e adultos para a conclusão dos estudos, demonstram que a garantia é pequena, considerando o número de brasileiros que não possuem educação básica e a oferta existente, que ainda está longe de corresponder às necessidades reais dos estudantes.

Cada vez torna-se mais claro que as necessidades básicas de aprendizagem dessa população só podem ser satisfeitas por uma oferta permanente de programas que necessitam institucionalidade e continuidade, superando o modelo dominante nas campanhas emergenciais e iniciativas de curto prazo, que recorrem a mão-de-obra voluntária e recursos humanos não- especializados, características da maioria dos programas que marcaram a história de educação de jovens e adultos no Brasil (HADDAD & DI PIERRO, 2000, p. 126).

Por fim, durante anos, a preocupação central do governo era apenas alfabetizar a população que jamais tinha ido à escola ou que frequentou pouco os bancos escolares. Ao propor as campanhas nacionais de educação de jovens e adultos, o objetivo maior era qualificar os migrantes rurais, de forma a garantir o uso de mão de obra necessária para sustentar o crescimento da produção industrial, que já o Brasil estava em pleno desenvolvimento e não poderia parar. E, nesse sentido, torna-se cada vez mais importante conhecer os profissionais que atuam na EJA Municipal de Uberlândia-MG atualmente, para compreender as transformações e permanências nesse cenário.

2.1.8. Analfabetismo e EJA Integrada à Educação Profissional - indicadores Brasil x