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D) Textura do solo original e teor em matéria orgânica

3.3. Carbono no sistema

3.3.1. Armazenamento de carbono nos horizontes minerais do solo

A intensificação das mobilizações do solo foi acompanhada por um aumento da acumulação de carbono em profundidade, nomeadamente na camada 30-60 cm (Quadro 3.3.1), o que pode estar relacionado com a inversão das camadas do solo, por efeito da mobilização. O incremento do teor de matéria orgânica ao longo do perfil pode funcionar como um indicador do grau de mistura do solo causada pela mobilização (Alcázar et al., 2002), pelo que é lícito inferir-se que a aumentos da intensidade de mobilização correspondem graus de mistura mais elevados (Quadro 3.3.1). Por outro lado, a mineralização da matéria orgânica e as trocas gasosas com a atmosfera processam-se de forma mais rápida nas camadas superficiais, sendo nas profundidades 0-5 e 5-15 cm dos tratamentos de mobilização mais intensiva (RCVC e RCLC), onde se registam os teores mais baixos de carbono, possivelmente associados ao efeito do incremento de oxigenação, uma vez que se verificou uma redução da massa volúmica aparente com o aumento da intensidade de mobilização. A este propósito, Dick et al. (1998) salientam que o acréscimo do arejamento em profundidade, por efeito da mobilização, pode também acelerar a mineralização da matéria orgânica em camadas menos superficiais.

Quadro 3.3.1 – Armazenamento de carbono (kg m-2) por profundidade do solo, segundo os tratamentos (n=15) (média ± erro padrão).

Prof Tratamentos

(cm) TSMO SMPC RCAV SRVC RLVC RCVC RCLC

0-5 0,86±0,10a 0,86±0,07ac 0,86±0,07a 0,69±0,06ad 0,60±0,05bcd 0,56±0,06bde 0,33±0,07e 5-15 1,25±0,15a 1,48±0,16a 1,37±0,08a 1,32±0,15a 1,20±0,13a 1,09±0,14b 0,72±0,15b 15-30 1,41±0,19a 1,39±0,07a 1,55±0,16a 1,53±0,13a 1,45±0,13a 1,42±0,17a 1,33±0,18a 30-60 1,33±0,33ab 1,09±0,10ab 0,98±0,10b 1,65±0,14ab 1,82±0,17a 1,63±0,11ab 1,58±0,17ab

De um modo geral, nas duas primeiras classes de profundidade (0-5 e 5-15 cm), os tratamentos de mobilização mais intensiva (RCVC, RCLC) apresentam teores de carbono significativamente mais baixos em relação aos de intensidade média/baixa. Nas camadas mais profundas (15-30 e 30-60 cm), geralmente não se observam diferenças significativas na concentração de carbono (Quadro 3.3.1). A quantidade de carbono nos tratamentos de mobilização ligeira (SMPC, RCAV) é similar à do solo original (TSMO), provavelmente devido ao baixo grau de mistura de horizontes (Alcázar et al., 2002).

Mais de 65% de carbono encontra-se armazenado entre os 15 e os 60 cm de profundidade nos tratamentos RLVC e RCVC, atingindo o tratamento RCLC nesse intervalo de profundidade cerca de 75% do total de carbono armazenado no solo (Figura 3.3.1). 0% 20% 40% 60% 80% 100% TSMO SMPC RCAV SRVC RLVC RCVC RCLC 0 - 5 cm 5 - 15 cm 15 - 30 cm 30 - 60 cm

Figura 3.3.1 – Distribuição percentual da massa de carbono (kg m-2), segundo a profundidade do solo e o tratamento.

Os tratamentos de mobilização ligeira (SMPC, RCAV) registaram um aumento de armazenamento de carbono nas camadas superficiais, nomeadamente entre os 15 e os 30 cm, com decréscimos a partir daí; ao contrário, os tratamentos RLVC, RCVC e RCLC mostram decréscimos acentuados nos primeiros 30 cm de solo e acréscimos na camada 30-60 cm (Figura 3.3.2). A mobilização para além de misturar e soterrar horizontes, quebra os agregados e expõe as superfícies organo-minerais, anteriormente protegidas, à acção dos organismos decompositores (Post & Kwon, 2000). Estes autores referem que ocorrem perdas de carbono durante o período de estabelecimento de novas plantações enquanto o ganho de resíduos orgânicos não é suficiente para compensar as perdas por mineralização.

-1,4 -1,2 -1 -0,8 -0,6 -0,4 -0,2 0 0,2 0,4 0,6 SMPC RCAV SRVC RLVC RCVC RCLC Tratamentos Var iaçã o de C ( kg m -2 ) 30 - 60 cm 15 - 30 cm 5 - 15 cm 0 - 5 cm

Figura 3.3.2 – Variação do teor de carbono do solo (kg m-2), relativamente ao solo original (TSMO).

O decréscimo do teor de carbono no solo, após a instalação dos povoamentos, é frequentemente atribuído à preparação do terreno (Turner & Lambert, 2000). Neste sentido, quanto mais intensa for a perturbação mecânica causada no solo maior será o impacto no decréscimo do teor de carbono, por aceleração da decomposição da matéria orgânica e aumento das perdas por erosão hídrica (Turner & Lambert, 2000). Todavia, é de salientar que, neste ensaio, o efeito da erosão hídrica na transferência de carbono foi pouco relevante (ver Ponto 3.2.3.2). Compton et al. (1998) fazem notar que a mobilização produz um efeito importante, a curto prazo, no armazenamento de carbono no solo. No entanto, Paul et al. (2002), numa revisão bibliográfica acerca do tema, não encontraram efeitos do nível de perturbação do solo na variação do carbono em povoamentos com idade inferior a 10 anos. Os mesmos autores sugerem que o decréscimo do carbono após a reflorestação ou florestação pode ser predominantemente atribuído à falta de vegetação e de ganhos de carbono pelo solo, e menos à perturbação causada pela preparação do terreno. Post & Kwon (2000) referem que a quantidade de material orgânico quando da instalação dos povoamentos, depende do passado histórico da gestão do solo, o que frequentemente é desconhecido.

Quando se consideram isoladamente os tratamentos com armação do terreno em vala e cômoro (SRVC, RLVC, RCVC) ocorrem duas situações. A linha de plantação (LP), que corresponde à zona mais afectada pela mobilização (inversão de camadas) e a entre linha de plantação (EL), com ripagem do solo em RCVC e sem ripagem em SRVC e RLVC. Os dados registados no Quadro 3.3.2, são esclarecedores do efeito da inversão de camadas no

armazenamento de carbono em profundidade na LP. Todavia, a maioria dos estudos realizados em sistemas florestais são baseados em amostras colhidas na entre linha de plantação, fora das áreas mais perturbadas (Paul et al., 2002). Na EL a variação do carbono em profundidade segue o padrão normal (diminui com a profundidade), pelo que o efeito do riper é muito menos visível que o efeito da lavoura com charrua pesada (LP). Porém, a EL do tratamento RCVC apresenta valores de carbono significativamente mais baixos que as EL dos tratamentos SRVC e RLVC, estando provavelmente associados ao efeito da ripagem. Por outro lado, a preparação do terreno contribui para uma diminuição da massa volúmica do solo e incrementa a variabilidade espacial do carbono, o que dificulta a percepção da significância estatística das variações do carbono no solo por efeito da mobilização (Paul et al., 2002).

Quadro 3.3.2 – Armazenamento de carbono (kg m-2) na linha de plantação (LP) e na entre linha de plantação (EL) por profundidade do solo, nos tratamentos SRVC, RLVC e RCVC (n=15) (média ± erro padrão).

Profundidade Tratamentos

(cm) SRVC RLVC RCVC

LP EL LP EL LP EL

0-5 0,42±0,07b,a 0,95±0,09a,a 0,36±0,06b,a 0,85±0,06a,ab 0,38±0,07b,a 0,76±0,08a,b 5-15 0,95±0,16b,a 1,66±0,17a,a 0,68±0,14b,b 1,74±0,16a,a 0,84±0,15b,ab 1,34±0,17a,b 15-30 1,61±0,26a,a 1,46±0,08a,a 1,40±0,21a,a 1,55±0,13a,a 1,64±0,31a,a 1,19±0,10a,b 30-60 2,20±0,24a,b 1,05±0,06b,a 2,62±0,36a,a 0,99±0,13b,a 2,25±0,19a,b 0,96±0,09b,a A primeira letra indica que para o mesmo tratamento e profundidade, médias seguidas da mesma letra não difere significativamente a situação linha de plantação da entre linha de plantação (p<0,05). A segunda letra indica que para a mesma profundidade e situação (linha ou entre linha), médias seguidas da mesma letra não difere significativamente os tratamentos (p<0,05).

Na linha de plantação (LP), o teor de carbono sofreu uma redução considerável até aos 15 cm de profundidade, aumentando a partir daí quando comparado com a entre linha de plantação (EL) (Quadro 3.3.3). Razões anteriormente apontadas explicam este comportamento.

Quadro 3.3.3 – Acréscimo (valores positivos) ou redução (valores negativos) do teor de carbono do solo (kg m-2), na linha de plantação (LP) relativamente à entre linha de plantação (EL). Entre parêntesis valores percentuais.

Profundidade Tratamentos (cm) SRVC RLVC RCVC 0-5 -0,53 (-55,8) -0,49 (-57,6) -0,38 (-50,0) 5-15 -0,71 (-42,8) -1,06 (-60,9) -0,50 (-37,3) 15-30 0,15 (10,3) -0,15 (-9,7) 0,45 (37,8) 30-60 1,15 (109,5) 1,63 (164,6) 1,29 (134,4)

A quantidade de carbono armazenada no solo segue a sequência bloco I> bloco II> bloco III (Quadro 3.3.4), sendo a distribuição do carbono nas várias profundidades idêntica nos três blocos (Figura 3.3.3).

Quadro 3.3.4 – Armazenamento de carbono no solo (kg m-2), segundo os blocos (n=35) (média ± erro padrão).

Profundidade Bloco (cm) I II III 0-5 0,89±0,05b 0,63±0,05ab 0,53±0,05a 5-15 1,72±0,09b 1,03±0,06a 0,87±0,07a 15-30 1,83±0,12b 1,28±0,06b 1,21±0,06a 30-60 1,72±0,15b 1,14±0,09a 1,28±0,08a

Para a mesma profundidade, médias seguidas da mesma letra não diferem significativamente (p<0,05).

Bloco I Bloco II Bloco III 0% 20% 40% 60% 80% 100%

Bloco I Bloco II Bloco III Total

0 - 5 cm 5 - 15 cm 15 - 30 cm 30 - 60 cm

Figura 3.3.3 – Distribuição percentual da massa de carbono (kg m-2) por profundidade do solo, segundo os blocos.

O teor de carbono na entre linha de plantação (EL) é em todos os blocos, até aos 15 cm, significativamente mais elevado em relação à linha (LP). A partir dessa profundidade tende a não seguir um padrão uniforme mas frequentemente apresenta valores superiores na linha de plantação (LP) (Quadro 3.3.5).

Quadro 3.3.5 – Armazenamento de carbono (kg m-2) na linha de plantação (LP) e na entre linha de plantação (EL), por profundidade nos blocos I, II e III dos tratamentos SRVC, RLVC e RCVC (n=15) (média ± erro padrão).

Profundidade Bloco I Bloco II Bloco III

(cm) LP EL LP EL LP EL

0-5 0,59±0,08b 1,05±0,07a 0,32±0,04b 0,91±0,07a 0,25±0,04b 0,65±0,06a 5-15 1,37±0,17b 2,19±0,07a 0,56±0,09b 1,57±0,14a 0,55±0,07b 0,98±0,10a 15-30 2,40±0,33a 1,45±0,12b 1,22±0,12a 1,52±0,11a 1,06±0,09a 1,26±0,09a 30-60 3,31±0,28a 0,93±0,07b 2,11±0,13a 0,93±0,08b 1,63±0,12a 0,97±0,13b

Para o mesmo bloco e profundidade, médias seguidas da mesma letra não difere significativamente a linha de plantação da entre linha de plantação (p<0,05).

Relacionados com os resultados obtidos nos blocos podem estar a textura e o rápido turnover das raízes finas essencialmente da vegetação herbácea, que influenciam marcadamente a dinâmica do carbono (Dick et al., 1998; Wang & Gong, 1998; Paul et al., 2002). Os blocos I e II apresentam as maiores quantidades de biomassa e o bloco I o maior teor de partículas finas (limo e argila). A elevada superfície específica da argila conduz à formação de complexos organo-minerais que protegem o carbono da oxidação microbiana, aumentando a sua estabilidade (Grigal & Berguson, 1998; Post & Kwon, 2000), pelo que os resíduos orgânicos decompõem-se mais rapidamente em solos arenosos que em solos argilosos. Grande variedade de compostos orgânicos do solo está intimamente associada com as partículas minerais (Post & Kwon, 2000). Existe discrepâncias entre estudos que relacionam a quantidade de carbono armazenada no solo com a textura. Uns referem que a variação do carbono é pouco importante em solos argilosos (Percival et al., 2000), enquanto outros indicam que taxas de acumulação de carbono no solo estão directamente relacionadas com o teor de argila (Lugo et al., 1988). Esta diversidade de resultados pode estar relacionada com a composição dos minerais de argila (Percival et al., 2000) ou com o período de tempo considerado após a florestação (Dick et al., 1998), tendo os solos argilosos elevado potencial de acumulação de carbono a longo prazo (Paul et al., 2002). Os compostos orgânicos envolvidos nos complexos organo-minerais podem demorar décadas até sofrerem mineralização (Post & Kwon, 2000), podendo definir-se como instável a matéria orgânica que desaparece em poucos anos (Balesdent et al., 1998). Existe uma grande variação no período de tempo e na taxa a que o carbono se pode acumular no solo, dependendo da produtividade vegetal, das condições físicas, químicas e biológicas do solo, do passado histórico dos ganhos de carbono e das perturbações que ocorrem no solo (Post & Kwon, 2000).