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Arquitetura do sono

No documento MARIA ODETE PEREIRA AMARAL (páginas 54-58)

ABREVIATURAS E SIGLAS

CAPÍTULO 2 – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2. Arquitetura do sono

A arquitetura do sono refere-se à quantidade e distribuição de estados específicos do sono. As medições da arquitetura do sono incluem as quantidades absolutas de sono REM e de cada fase de sono NREM (em minutos), a quantidade relativa de sono REM e das fases de sono NREM (expressas como percentagem do tempo de sono total) e a latência entre o início do sono e o primeiro sono REM (latência REM). Poder-se-á por isso considerar que o conceito de arquitetura do sono se refere à distribuição dos estados e fases durante toda a noite.

O processo do sono consiste numa sequência de fases distintas, que se sucedem por ciclos e de uma forma previsível. Com as observações do registo do EEG, foi possível estudar o sono e reconhecer que este não é um processo homogéneo. Atualmente o seu estudo é mais detalhado devido à conjugação de alguns meios de diagnóstico, designada por polissonografia. As várias fases do sono são delimitadas e caracterizadas de modo objetivo utilizando três registos indispensáveis: o EEG, para registo da atividade elétrica cerebral, onde são determinados os padrões e a intensidade resultantes da excitação durante o sono e vigília; o eletromiograma (EMG), para registo da atividade elétrica muscular, neste caso utilizado para registar os movimentos do queixo, pois este movimento funciona como critério na identificação da fase REM; e o eletro-oculograma (EOG), que é utilizado para registar os movimentos dos olhos. Assim, através do resultado gráfico destes registos (hipnograma) são caracterizados os

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dois estados fundamentais de sono: o sono NREM e o sono REM e as suas respetivas fases.

O sono REM é também designado por sono rápido, paradoxal ou dessincronizado, e o sono NREM ou Não-REM é também denominado de sono ortodoxo, sincronizado ou tranquilo(42). Este último engloba quatro fases que representam uma progressiva profundidade do sono(14,42).

No sono NREM acontece um relaxamento muscular comparativamente à vigília, mantendo-se, todavia, uma tonicidade basal contínua. O EEG exibe aumento progressivo de ondas lentas, conforme se avança da fase I para a fase IV do sono NREM. Ocorre diminuição da atividade do sistema nervoso autónomo simpático e aumento do tónus parassimpático para níveis mais elevados comparativamente com a vigília. As frequências respiratória e cardíaca, o débito cardíaco, a pressão arterial, o diâmetro pupilar e os movimentos intestinais permanecem sem mudanças abruptas(14). A fase 1 do sono NREM, designada de semi-vigília e caracterizada por um sono superficial em que o indivíduo é acordado facilmente, corresponde à fase do adormecer, representa uma transição da vigília para o sono e caracteriza-se ainda por contrações musculares bruscas. Em adultos saudáveis, perfaz cerca de 5% do tempo gasto a dormir. A fase 2 do sono NREM (sono ligeiro), sem movimentos musculares e oculares, representa cerca de 50% do tempo de sono. As fases 3 e 4 do sono NREM, designadas de sono lento, constituem o sono profundo. Correspondem aos níveis de sono mais profundos em que a pessoa dificilmente é despertável e ocupam cerca de 10-20% do tempo de sono. O sono profundo é extremamente importante e benéfico para o organismo, para a memória, para a produção de anticorpos e renovação da energia do corpo, incluindo do cérebro.

No sono REM, durante o qual os olhos se movem rapidamente em várias direções, a respiração apresenta-se mais rápida, irregular e profunda, a frequência cardíaca, a tensão arterial e o diâmetro pupilar aumentam. Nesta fase ocorrem os sonhos. Apesar de ser um estado profundo no respeitante à dificuldade em despertar o indivíduo, exibe um padrão eletroencefalográfico que se assemelha ao da vigília com olhos abertos, ou mesmo do sono NREM superficial (fase I), sendo este um dos seus aparentes paradoxos. Além disto, apesar da atonia muscular que caracteriza este estado, observam-se movimentos corporais cíclicos e erráticos, de diversos agrupamentos musculares, principalmente na face e nos membros, bem como emissão de sons. Ou

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seja, mesmo com a inibição motora, há emancipação cíclica da atividade muscular de localização multifocal, constituindo outro aparente paradoxo. Este estádio ocupa cerca de 20-25% do tempo total de sono e ocorre ciclicamente com uma periodicidade de quatro a seis episódios por noite, alternados com períodos de sono lento. Geralmente surge a intervalos de 60 a 90 minutos após a primeira progressão da fase 1 até à fase 4 do sono. Sendo os episódios mais longos e menos espaçados no fim da noite uma vez que o sono lento apresenta uma distribuição diferente (dominante no início da noite). Em indivíduos saudáveis o sono REM surge após a fase 4 do sono NREM(14,42,43).

As características gerais do sono NREM e REM estão resumidas na Tabela 1.

Tabela 1 – Modificações fisiológicas durante o sono REM e NREM e diferenças na polissonografia

Processo fisiológico NREM REM

Atividade cerebral Diminuída em relação à vigília

Aumentada nas áreas motora e sensorial enquanto noutras áreas é similar ao NREM

Frequência cardíaca Diminuída em relação à vigília Aumenta e varia em comparação ao NREM

Pressão arterial Diminuída em relação à vigília Aumenta (até 30%) e varia em comparação ao NREM

Atividade nervosa simpática Diminuída em relação à vigília Significativamente aumentada em relação à vigília

Tónus muscular Idêntico à vigília Ausente

Circulação sanguínea

cerebral Diminuída em relação à vigília

Aumentada em comparação com NREM, dependendo da região cerebral

Respiração Diminuída em relação à vigília

Aumenta e varia em comparação ao NREM mas pode apresentar pausas breves; tosse suprimida

Resistência das vias aéreas Aumentada em relação à vigília Aumentada e com variações em relação à vigília

Temperatura corporal

Regulada em valor basal inferior à vigília; arrepios apenas presentes a temperatura inferior à vigília

Sem regulação; sem arrepios e sem sudorese; temperatura aproxima-se da temperatura ambiental

Excitação sexual Ocorre pouco frequentemente Mais frequente do que NREM

Polissonografia

Aumento progressivo das ondas lentas no EEG (20 a 50% de ondas delta em sono fase III; mais de 50% em sono fase IV)

EEG com predomínio de ritmos rápidos e de baixa voltagem.

Ausência de movimentos oculares

rápidos Movimentos oculares rápidos.

Progressiva redução dos movimentos corporais

Movimentos cíclicos e mioclonias multifocais; emissão de sons

Fonte: Adaptado de Sleep Disorders and Sleep Deprivation: An Unmet Public Health Problem http://www.nap.edu/catalog/11617.html.

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Resumidamente, o sono inicia-se pela fase 1 do sono NREM, após um período de latência inferior a 30 minutos, sendo que este período pode ser extremamente diminuto nos indivíduos com privação de sono ou muito cansados. Após alguns minutos na fase 1 (aproximadamente 10 minutos), verifica-se a passagem para a fase 2, em que o sono se torna progressivamente mais profundo, sendo mais difícil o despertar. O primeiro período da fase 2 é relativamente breve (10 a 25 minutos), dado que o sono tende a tornar-se mais profundo até à fase 3. Após 30 a 60 minutos, iniciam-se as fases 3 e 4 caracterizadas por um sono lento e profundo. Decorridos aproximadamente 90 minutos, inicia-se o primeiro sono REM. Com esta fase, que pode durar entre 5 a 10 minutos e onde está patente uma atividade cerebral semelhante ao estado de vigília, completa-se o primeiro ciclo NREM-REM do sono. Seguem-se mais quatro a cinco ciclos com progressão idêntica; a duração do sono paradoxal é progressivamente maior com o decorrer da noite, em oposição à do sono lento profundo, que diminui.

Desta forma, cumprem-se cerca de 5 a 6 ciclos de sono NREM-REM, durante uma noite de oito horas de sono. Os despertares podem ocorrer a qualquer momento durante o sono, a partir de qualquer estado, seja de forma espontânea ou provocados por fatores extrínsecos ou situações patológicas. É comum que o indivíduo não tenha consciência destes despertares, especialmente quando de curta duração e não relacionados com ocorrências anormais.

O modo como os estados e as fases do sono se sucedem ao longo de uma noite, num sono normal, obedece a uma determinada ordem. Essa sequência é ilustrada no hipnograma do sono, que permite visualizar a arquitetura do sono, conforme representado na Figura 2.

A arquitetura do sono é variável ao longo do ciclo vital, pois a distribuição dos períodos de sono REM e sono NREM não é uniforme ao longo da vida. Com o envelhecimento diminui a frequência e a duração dos períodos de sono profundo (NREM) e aumentam os períodos de sono REM (Figura 2). No hipnograma do sono de um indivíduo de jovem pode verificar-se que a quantidade de sono profundo é maior e os despertares são em número reduzido. Por sua vez, o hipnograma do sono de um indivíduo idoso caracteriza-se por uma reduzida quantidade de sono profundo e um número de despertares aumentado.

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Figura 2 – Hiponograma do sono de individuo jovem e de indivíduo idoso

Fonte: Paul Montgomery and Lindsay D Shepard (2010). Insomnia in older people. Reviews in Clinical Gerontology, 20, pp 205- 218. doi:10.1017/S095925981000016X.

No documento MARIA ODETE PEREIRA AMARAL (páginas 54-58)

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