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Perturbações do sono

No documento MARIA ODETE PEREIRA AMARAL (páginas 67-71)

ABREVIATURAS E SIGLAS

CAPÍTULO 2 – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

5. Perturbações do sono

As alterações dos padrões de sono estão intimamente relacionadas com a diminuição da sensação de bem-estar, da saúde, da regulação da emoção, do desempenho e produtividade, da memória, do funcionamento cognitivo e de interação social(1). Existem várias propostas de classificação e diagnóstico das inúmeras perturbações do sono. Em 1979, a Association of Sleep Disorders Centers e a Association for the Psychophysiological Study of Sleep publicaram a Classificação Diagnóstica dos Distúrbios do Sono e Vigília (Diagnostic Classification of Sleep and Arousal Disorders). Esta classificação baseava-se na sintomatologia e agrupava as perturbações do sono em quatro categorias principais: transtornos de iniciação e manutenção do sono; transtornos de sonolência excessiva; transtornos do horário de sono-vigília e parassónias. Em 1990, a American Academy of Sleep Medicine editou, em associação com a European Sleep Research Society, Japanese Society of Sleep Research e Latin American Sleep Society, a primeira versão da Classificação Internacional das Perturbações do Sono (International Classification of Sleep Disorders - ICSD).

A segunda versão da Classificação Internacional das Perturbações do Sono (ICSD-2, 2005) fornece a descrição detalhada das perturbações do sono divididas em oito categorias principais: insónia; perturbações do sono relacionadas com a respiração; hipersónias; perturbações do ritmo circadiano do sono; parassónias; perturbações do sono associadas a doenças do movimento; sintomas isolados, aparentes variações da normalidade e problemas não resolvidos; e outras perturbações do sono.

Para além de sociedades médicas dedicadas ao estudo do sono, outras associações médicas foram identificando o potencial patológico das perturbações do

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sono. Entre 1958 - ano da primeira edição do Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM-I), que não traz qualquer menção aos distúrbios do sono – e 2000 – data da publicação do Diagnostic and Statistical Manual, Fourth Edition, Text Revision (DSM-IV-TR) – a American Psychiatric Association foi reconhecendo a importância dos distúrbios do sono.

No Diagnostic and Statistical Manual, Third Edition - DSM-III (1980) os distúrbios do sono ainda não são valorizados como entidade integrada e aparecem como grupo diferenciado mas relacionado com o trabalho por turnos. Na revisão desta classificação feita sete anos depois (Diagnostic and Statistical Manual, Third Edition – Revised; DSM-III-R), ainda há referência aos distúrbios do sono do trabalho por turnos, mas há já uma diferenciação de três tipos de transtornos persistentes do horário do sono- vigília: tipo frequentemente alternante, tipo avançado ou retardado e tipo desorganizado. A característica fundamental dos transtornos do horário de sono-vigília é uma incompatibilidade entre o ritmo circadiano do sono-vigília do indivíduo e o horário de sono-vigília exigido pelo seu ambiente. Esta incompatibilidade resulta em queixas de insónia (quando o indivíduo tenta dormir mas é incapaz de o fazer) ou de sonolência diurna (quando o indivíduo é incapaz de permanecer alerta quando a vigília é necessária). A DSM-III-R alerta ainda para o relógio biológico, ou ritmo circadiano endógeno do indivíduo, assim como para as diferenças individuais na tolerância ao trabalho por turnos.

No DSM-IV-TR as perturbações do sono aparecem classificadas como doenças do foro mental e estão organizadas em três grandes secções segundo a etiologia: as perturbações primárias do sono que se subdividem em parassónias e dissónias; as perturbações do sono relacionadas com outra perturbação mental; e as outras perturbações do sono(42). As dissónias são perturbações primárias do início e manutenção do sono ou de excessiva sonolência, caracterizadas por perturbações na qualidade, quantidade ou horário do sono, e incluem a insónia(42).

Os problemas do sono na adolescência surgem, frequentemente, devido a perturbações tanto na qualidade como na quantidade do sono. As perturbações na quantidade do sono resultam da dificuldade em adormecer e/ou manter o sono resultante, muitas vezes, de maus hábitos de sono. As perturbações da qualidade do sono resultam de despertares frequentes e repetitivos(61). Na adolescência ocorre,

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concomitantemente com a maturação pubertária, um atraso nos horários de deitar e levantar.

Os estudos mostram que este atraso de fase do sono é influenciado por fatores biológicos (as modificações fisiológicas da puberdade influenciam os horários de sono, pois causam atraso no “relógio biológico”, tornando os adolescentes mais vespertinos e com dificuldades em adormecer em horários precoces) e sociais (principalmente os horários escolares). Ou seja, os ritmos de sono-vigília do adolescente estão submetidos a várias imposições ligadas ao trabalho escolar, às distrações e à vida em grupo/social e também às modificações fisiológicas pubertárias e isto pode resultar em diminuição do tempo de sono, bem como em défice na sua qualidade, num aumento da sonolência diurna durante os dias letivos e aumento da duração do sono aos fins de semana.

O contexto sociocultural influencia sobremaneira o padrão de sono neste grupo etário. O adolescente deseja sair à noite, ver televisão, conversar/ouvir música, utilizar as novas tecnologias e deitar-se tarde. No período escolar a hora de levantar mantém-se fixa, embora exista uma redução de sono noturno e uma diminuição de sono lento. Assim, um sono mais ligeiro é acompanhado habitualmente por dificuldade em adormecer, resultante do atraso na hora de deitar favorecido pelos novos hábitos sociais, e por dificuldade em despertar pela manhã(62). Desta forma, a síndrome de atraso de fase do sono, frequentemente diagnosticada em adolescentes, resulta de uma aprendizagem de maus hábitos de sono, através de uma combinação de práticas de deitar inconsistentes e de um estabelecimento inadequado de limites por parte dos pais ou cuidadores. Os horários de dormir e acordar tornam-se mais tardios, principalmente em situação de menor imposição dos horários escolares (férias e fins de semana)(63,64). Um estudo realizado com 27700 estudantes franceses dos 15 aos 20 anos revelou que três quartos dos adolescentes têm, durante a semana normal de atividades, uma duração de sono inferior (1 a 5 horas) ao das férias(62).

Paralelamente, os jovens relatam uma diminuição na qualidade de sono ao longo da adolescência, o que também é verificado nos estudos realizados com estudantes, sugerindo que esta tendência presente nos adolescentes pode manifestar-se em adultos jovens(65).

Os problemas relacionados com o sono, como a insónia, o atraso de fase do sono e a irregularidade nos padrões de sono, são comuns em adolescentes e estão associados

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a uma variedade de efeitos negativos na saúde e outras consequências a nível individual, familiar e comunitário. Nas sociedades atuais, os adolescentes estão igualmente submetidos à pandemia de sono de qualidade pouco satisfatória - vivem cada vez mais segundo os horários dos pais, os dias acabam por ser cada vez mais longos e cansativos e vão para a cama mais tarde do que o recomendável - apesar da importância deste fator como indicador da sua saúde e bem-estar. O sono é considerado um fator primário no desenvolvimento dos adolescentes, influenciando muitos aspetos do seu dia-a-dia. Dormir o número de horas recomendado permite manter um bem-estar biológico, cognitivo, social e psicológico. Assim, os problemas de sono na adolescência são considerados fatores de risco que urge combater.

A sesta deve ser encarada como um hábito cada vez mais importante. Pela crescente importância atribuída ao sono, torna-se indispensável que profissionais da área da saúde e da educação assimilem as medidas de higiene do sono como fundamentais para criar bons hábitos de sono na população e as transmitam à comunidade em geral, designadamente aos adolescentes e pais/encarregados de educação.

Os erros da higiene do sono são diversos e têm aspetos distintos nas diferentes idades. Nas crianças os erros são, muitas vezes, induzidos pelos pais, podendo estar relacionados com horários tardios ou irregulares, dificuldade em estabelecer regras relativamente ao horário de deitar e ao processo de adormecer, dificuldade em estabelecer “limites” ao tempo consumido a ver TV ou brincar com o computador, relações conflituosas do casal, problemas de dependência ou de instabilidade psicológica(14). Paradoxalmente, a perturbação do sono pode resultar de um excesso de preocupação dos pais em relação aos filhos(14). Em adolescentes são frequentes os erros motivados pelo tempo gasto ao telemóvel (em chamadas de voz ou com mensagens), ao computador, a ver TV e a jogar consola. Se não existirem regras bem estabelecidas, o sair à noite contribui de forma muito importante para a desestruturação dos hábitos de sono. Em pessoas idosas ou deprimidas são mais comuns outros erros: não sair, não interagir, estar tempo demais na cama.

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No documento MARIA ODETE PEREIRA AMARAL (páginas 67-71)

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