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III. O MINISTÉRIO PÚBLICO FRENTE AOS PLANOS DE SAÚDE COLETIVOS

3. Inquérito civil

3.9. Arquivamento do inquérito civil

No arquivamento do inquérito civil não há interferência do judiciário. A Lei nº 7347/85 deixa integralmente a cargo do Ministério Público a tramitação do referido instrumento, cabendo ao Conselho Superior da instituição, o reexame necessário.

Finalizando as investigações e concluindo o órgão ministerial não ser caso de propositura de ação civil pública, caso em que os autos do inquérito civil instruiriam a petição inicial, deverá promover seu arquivamento, fundamentadamente, encaminhando os autos para controle do Conselho Superior, nos termos do artigo 9º, § 1º, da Lei da Ação Civil Pública. Observe-se que, mesmo que tenha sido tomado compromisso de ajustamento de conduta, os autos serão remetidos ao órgão superior para reexame, inclusive quanto ao próprio ajustamento de conduta.

O Conselho superior, após a análise do caso, poderá homologar o arquivamento, caso em que estará o inquérito civil encerrado, ou poderá tomar outra decisão, como determinar a propositura da ação civil publica ou o prosseguimento das investigações, convertendo a decisão em diligência. Neste caso, de determinação de propositura da ação ou de novas diligências, a decisão passa a ser do Conselho Superior, designando-se outro promotor de justiça, que agirá por delegação do Conselho superior, para prosseguir no caso. Ao determinar a propositura da ação, poderá o conselho superior, inclusive, definir desde logo o objeto da ação e os pedidos a serem feitos.

Embora arquivado o inquérito civil, os co-legitimados poderão propor ação civil pública, pois, homologação do arquivamento não gera nenhum óbice. Com efeito, como esclarecem Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery81 “a decisão administrativa do MP (pelo CSMP) arquivando o

IC não faz coisa julgada, podendo ser reaberto se existirem novas provas. Arquivado o IC, qualquer outro co-legitimado não está impedido de propor a ACP, podendo fazê-lo mesmo quando ainda estiver em andamento o IC. O arquivamento do IC não limita o direito de ação do co-legitimado que tenha ou não se manifestado ou juntado documentos na fase de exame da promoção de arquivamento pelo CSMP”.

Como observa Hugo Nigro Mazzilli82, “a instauração do inquérito civil

sequer é pressuposto processual para que o Ministério Público compareça a juízo: o inquérito pode ser dispensado se já existirem elementos necessários para propor a ação. Recomenda-se, porém, seja desde logo instaurado ao iniciar-se uma investigação, para evitar-se o mau vezo de apurarem-se fatos de relevância, sem método ou continuidade, e sem controle algum”.

Assim, não sendo o inquérito civil condição para a propositura de ação civil pública, evidentemente, seu arquivamento não impede o ajuizamento pelos demais legitimados, havendo apenas certa controvérsia com relação ao próprio Ministério Público poder ajuizá-la nestas condições, em razão do contido no artigo 111 da mencionada Lei Complementar paulista nº 734/93, que criou, também indevidamente, norma sobre a impossibilidade de reabertura do inquérito civil arquivado, sem que haja novas provas e até mesmo vedando a propositura da respectiva ação civil pública neste caso, criando um absurdo óbice que não existe para os demais legitimados.

Hugo Mazzilli83 menciona que, havendo novas provas, parece

incontroverso que a reabertura das investigações e, até mesmo a existência de noticia sobre novas provas a autorizaria, pois, se nem a sentença de improcedência da ação civil pública por falta de provas impede novo

82MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo, cit., p. 385. 83Id. Ibid., p. 324 e 329.

ajuizamento de ação com base em novas provas, com mais razão podem ser reabertas as investigações.

Quando não tiverem surgido novas provas, ainda assim, será possível a reabertura das investigações, em qualquer situação, com decisão devidamente fundamentada, resultante de uma nova analise, não obstante o aludido artigo 111 da Lei 734/93 que, pelos mesmos motivos acima referidos, é de flagrante inconstitucionalidade, inclusive considerando-se que a Lei da ação Civil Pública, que disciplina o inquérito civil, não faz qualquer restrição à sua reabertura, o que está em harmonia com a tutela dos interesses metaindividuais.

A mesma opinião tem Luis Roberto Proença84, para quem, sendo ato administrativo o arquivamento do inquérito civil, pode ser revisto pela Administração, desde que entenda equivocada a decisão anterior e, lembrando Hugo Mazzilli, menciona que “o arquivamento do inquérito civil não cria direito adquirido nem transforma a matéria fática subjacente aos autos arquivados em situação jurídica que deva ser respeitada ou em direito subjetivo que deva ser tutelado. A reabertura do caso apurado em inquérito civil já arquivado não fere direitos nem gera efeitos retroativos contra direitos, estes sim os verdadeiros limites contrários à revogação do ato administrativo. De todo inaplicável, pois, ao inquérito civil o tratamento dado às hipóteses de arquivamento do inquérito policial”.

Neste diapasão, podemos afirmar que o inquérito civil – dentro do qual está inserida a decisão de arquivamento -, tem natureza jurídica de procedimento administrativo, assim caracterizado segundo Carvalho Filho85, em razão de dois aspectos: "em primeiro lugar, tramita na via administrativa do Ministério Público, que com ele se prepara para o exercício do direito de ação. Além disso, espelha seqüência formalizada de atos e atividades dos órgãos ministeriais, de interessados e de terceiros, com vistas à formação do convencimento por parte do órgão que o preside.”

Assim, não há impedimento para reabertura das investigações de inquérito civil já arquivado, nem para o ajuizamento da respectiva ação civil pública.

Não obstante haver necessidade de a promoção do arquivamento do inquérito civil ser expressa e fundamentada, há a possibilidade de ocorrência do denominado arquivamento implícito que, para Hugo Mazzilli86

constitui-se em grave irregularidade, pois o arquivamento deve ser claramente submetido ao controle do Conselho Superior do Ministério Público. O arquivamento implícito pode ocorrer, por falha ou descuido, nos seguintes casos: a) quando haja vários atos ilícitos, em tese, e o promotor de justiça só enfrente expressamente a falta de base para o ajuizamento da ação civil pública apenas quanto a alguns desses atos na promoção de arquivamento; b) quando haja vários possíveis autores ou responsáveis

85CARVALHO FILHO, José dos Santos. Ação civil pública. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Júris,

1999. p. 222.

pelas ilegalidades e, na promoção de arquivamento, o promotor de justiça não enfrente expressamente a ausência de responsabilidade de algum deles; c) quando o promotor de justiça proponha a ação civil pública, mas esta que não cobre todos os atos ilícitos ou todos os possíveis responsáveis pelas ilegalidades.

Em todos estes casos, o promotor deve expressamente promover o arquivamento do quanto não incluído na ação civil pública, encaminhando cópia do inquérito civil com a respectiva promoção do arquivamento parcial, para o devido controle a ser exercido pelo Conselho Superior. Mas, se não o fizer, ocorrerá o indesejado arquivamento implícito, caso em que deverá o controle do arquivamento ser sempre feito pelo Conselho Superior do Ministério Público e não pelo juiz da ação civil pública (o que ocorre no processo penal em caso de arquivamento implícito do inquérito policial). Caso haja o arquivamento implícito do inquérito civil e independente de ter ou não havido revisão deste arquivamento pelo Conselho Superior do Ministério Público, a qualquer momento os co-legitimados à ação civil pública podem ajuizar sua ação, já que possuem legitimação concorrente, autônoma e disjuntiva.

O controle do arquivamento do inquérito civil pelo Conselho Superior do Ministério Público é uma medida de grande relevância, tendo em vista a importância dos direitos metaindividuais tutelados e a possibilidade real de ocorrência de equívoco do órgão ministerial ao arquivá-lo.

Não obstante, o Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, ao tratar do referido instituto, retira a obrigatoriedade deste controle, tornando-o facultativo, ao estabelecer no § 5º do artigo 23, que se o órgão do Ministério Público entender conveniente,poderá encaminhar os autos do inquérito civil arquivado ou das peças informativas ao Conselho Superior do Ministério Público, para homologação e cria a possibilidade de avocação pelo referido órgão superior do Ministério Público, de autos de inquéritos civis arquivados, com o fim de uniformizar a atuação ministerial (parágrafo 6º do artigo 23).