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5 AVALIANDO O CICLO DIDÁTICO DO PROGRAMA ESCOLA ATIVA EM JARDIM DO

5.2 APLICAÇÃO DIDÁTICA DA METODOLOGIA

5.2.4 Articulação com a comunidade

Propostas renovadoras de articulação da escola com a comunidade são defendidas por importantes teóricos da área educacional como um meio de superação de práticas errôneas que conduzem os pais a se preocuparem somente com o progresso escolar dos seus filhos, sem envolverem-se afetivamente com outros aspectos da vida, tão importantes quanto visar os resultados numéricos anotados no boletim que geram a aprovação escolar (FERRIÈRE, 1928; FORGIONE, 1949). Segundo os documentos do Programa (BRASIL. MEC, 1999), a

Articulação com a comunidade é, no Escola Ativa, um componente metodológico

que visa à promoção de um estreitamento das relações entre a escola e a comunidade ao seu entorno, envolvendo os estudantes em atividades curriculares relacionadas à sua vida diária e ao seu ambiente natural e social, sendo concebidas como sistematizadoras dos conhecimentos junto à comunidade, devendo ser partícipe do processo educativo (BRASIL. MEC, 2006). Ao sugerir atividades que podem se articular à comunidade, as diretrizes para que o professor desenvolva

[...] estratégias para estimular a comunidade educacional na qual trabalha a participar das atividades da escola. Algumas dessas atividades consistem em familiarizar-se com a metodologia e ajudar a melhorar o espaço físico, as carteiras e mesas usadas na sala de aula e as estantes dos cantinhos de aprendizagem e da biblioteca. Os alunos, por sua vez, podem desempenhar atividades que beneficiem sua comunidade, como recuperar elementos culturais representativos e empreender ações de saúde, saneamento, nutrição, preservação do meio ambiente, etc. (BRASIL. MEC, 1999, p. 134).

Entendemos que é imprescindível que a escola busque estreitar as relações com a comunidade, com o objetivo de obter a cooperação dos pais e dos responsáveis pelos estudantes nas atividades escolares e relacionar as atividades político-pedagógicas ao cotidiano da criança, projetando-a em direção à família e à comunidade, visando transformá-la. Porém, como está determinado, responsabilizar a comunidade pela melhoria do espaço físico escolar, das carteiras, das mesas e de outras mobílias e/ou materiais necessários à implementação do Programa Escola Ativa, induz à desresponsabilização de obrigações que são específicas das esferas públicas educacionais vinculadas ao Estado, como o MEC, e as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação.

Entendemos que é imprescindível que a escola busque estreitar as relações com a comunidade, com o objetivo de obter a cooperação dos pais e dos responsáveis pelos estudantes nas atividades escolares e relacionar as atividades político-pedagógicas ao cotidiano da criança, projetando-a em direção à família e à comunidade, visando a transformação de todos: da escola, da criança e da própria comunidade em que todos estão inseridos.

Em Jardim do Seridó, as atividades do Programa que visam à articulação com a comunidade se concentram nos aspectos pedagógicos, sobretudo nas reuniões com os pais, algumas confraternizações e, em duas escolas, identificamos a realização de projetos mobilizadores sobre temáticas de interesse público. A professora Figueira esclareceu que nos quatro primeiros anos conseguia articular melhor o trabalho da escola com a comunidade. Atualmente, essa articulação concentra-se nas reuniões bimestrais nas festividades, como Dia das Mães, Dia dos Pais, São João, etc. A professora Mandacaru do Sertão enfatizou que a articulação se dá também no dia-a-dia, pois todos se conhecem na comunidade e quando é necessário ela vai pessoalmente até as casas dos estudantes para conversar com os seus pais. A professora Pau-Darco destaca a importância de projetos temáticos:

Eu tenho uns alunos que gostam muito de teatro, e eu criei um teatro, lá na escola produzido pelos alunos. A cada final de bimestre os alunos apresentavam para a comunidade as peças teatrais que eles tinham produzido. Teve também o projeto que explorou o problema do lixo, que a gente trabalhava nas casas, visitando e esclarecendo sobre os cuidados para não pegar doenças (PAU-DARCO, 2009, p. 31)

A professora destacou também que essa experiência sobre os cuidados que se deve ter com o lixo levou algumas pessoas da comunidade a reciclarem e venderem o lixo, gerando renda e conscientização da necessidade de preservação do meio-ambiente. A professora Juazeiro ressaltou que além das atividades já mencionadas, em sua comunidade a escola é aberta às reuniões das associações comunitárias, como a dos pescadores. Embora esta seja uma prática comum nas comunidades rurais, bem como aquelas de cunho estritamente pedagógicas, as entrevistadas75 afirmaram que as atividades desenvolvidas por meio do Programa

Escola Ativa ampliaram a articulação com a comunidade, principalmente porque

75 Não detalhamos o conteúdo das respostas das supervisoras sobre esse indicador porque as

além das reuniões e das festividades, outros mecanismos foram desenvolvidos, como o Croqui e a Monografia da Comunidade, os quais descreveremos a seguir:

A. CROQUI DA COMUNIDADE

É um tipo de mapa simples da comunidade na qual a escola se situa. Neste croqui se detalham os limites, as rotas, os caminhos, alguns riachos, rios e/ou nascentes, a localização das casas, incluindo as dos alunos, prédios públicos, igrejas, etc. Além disso, podem ser mostrados também alguns pontos críticos de risco, como zonas de erosão, áreas contaminadas e desmatadas, entre outros aspectos. “O mapa deve ser elaborado com a participação de todos: pais, alunos e professores. Deve-se fazer uma reunião com eles e propor-lhes que façam o croqui em conjunto, para ser colocado num local visível na escola” (BRASIL. MEC, 1999, p. 142). Em todas as escolas que visitamos, observamos que os croquis estavam afixados no Cantinho de Geografia. Alguns estudantes nos explicaram a função e o processo de sua construção, em cada comunidade.

Figura 7: Croqui de uma das comunidades atendidas pelo Programa Escola Ativa.

B. MONOGRAFIA DA COMUNIDADE

É um instrumento que permite aos professores e estudantes conhecer, compilar, recuperar, preservar e valorizar aspectos da cultura da comunidade. Segundo as diretrizes do Escola Ativa, trata-se de uma construção que estimula a pesquisa, a escrita e a análise da realidade local, associada aos aspectos globais. Na sua montagem, podem ser contemplados os aspectos geográficos, culturais, ocupacionais, da vida doméstica, organizacionais, entre outros que fazem parte da comunidade. A respeito de sua construção,

[...] o professor pode motivar os pais e a comunidade de modo geral a colher informações sobre diferentes temas e a colaborar com relatos orais e, se possível, documentos, como fotografias, textos, gravações, etc. que ajudem a descrever aspectos de cada tema. Se isso não for possível, basta o relato oral, que deve ser bem organizado, verdadeiro e completo (BRASIL. MEC, 1999, p. 150).

Constatamos como relevante do ponto de vista político-pedagógico, o fato de todas as escolas em Jardim do Seridó possuírem a sua Monografia, abordando os aspectos acima mencionados. Inclusive, cada um desses documentos apresenta uma discussão introdutória sobre a história do nome do lugar onde está situada a escola, trazendo ainda particularidades históricas de pessoas que vivem ou viveram nessas comunidades. Segundo as entrevistadas, o processo de construção das monografias foi motivador, pois, além dos estudos na sala de aula, envolveu também conversas com moradores mais antigos da comunidade, com contadores de histórias, pesquisas junto à EMATER, aos professores de História e de Geografia que trabalham no município, entre outras iniciativas. Os documentos retratam ainda os costumes, os valores e a cultura local e, inquestionavelmente, contribuem para o fortalecimento da identidade cultural, histórica e educacional dos sujeitos, contribuindo para a preservação da sua memória. Percebemos assim, que a construção da Monografia da Comunidade como um componente metodológico do Programa Escola Ativa, a exemplo do Governo Estudantil e do Croqui, consegue cumprir os seus objetivos, em Jardim do Seridó.

C. FICHA FAMILIAR

Além dos instrumentos apresentados anteriormente, a Ficha Familiar também faz parte da variável articulação com a comunidade e é um instrumento que, segundo as diretrizes do Programa (BRASIL. MEC, 1999), possibilita coletar e registrar informações sobre as famílias que fazem parte da comunidade escolar. Deve conter dados da família, data, nome, gênero, idade, grau de parentesco, participação na produção, escolaridade, habilidades artísticas, esportes favoritos, entre outras informações. “Sua análise permite que conheçamos as necessidades da comunidade em diferentes áreas, como em educação, saúde, recreação e moradia” (BRASIL. MEC, 1999, p. 142). Essas fichas devem ser arquivadas na escola, mas em local de fácil acesso e manuseio para os professores, estudantes, pais e membros da comunidade. Em Jardim do Seridó, as fichas familiares são devidamente preenchidas, porém, segundo as entrevistadas, o seu uso para consultas não se realiza com a frequência que o Programa orienta, pois não há tempo suficiente para se debruçar sobre esse trabalho, visto o acúmulo de atividades no trabalho docente, até mesmo em função da complexidade da metodologia do Programa Escola Ativa.

D. CALENDÁRIO AGRÍCOLA

Essa perspectiva metodológica consiste na exploração de atividades do ciclo agrícola associadas aos conteúdos do currículo das escolas, devendo os profissionais que atuam com a metodologia envolver os estudantes e membros da comunidade escolar em atividades que orientem sobre período de plantio e colheita, entre outros aspectos dessa natureza. Desse modo,

[...] o calendário agrícola permite que o professor planeje o retorno de meninos e meninas que, por sua situação econômica, precisam ausentar-se temporariamente da escola para colaborar na colheita. Assim, elimina-se um dos problemas mais graves que exclui do sistema educacional muitas crianças de grupos sociais de renda mais baixa, como os trabalhadores rurais (BRASIL. MEC, 1999, p. 153).

Conforme orientam as premissas do Programa, o calendário agrícola pode contribuir para que o calendário letivo seja planejado de acordo com a época do

plantio e da colheita em cada região. Porém, essa iniciativa exigiria uma flexibilização do calendário escolar, inclusive, prevista no parágrafo segundo da LDB – Lei n. 9.394/96 – porém, na prática isso não ocorre em Jardim do Seridó, pois não há uma orientação formal por parte da Secretaria Estadual de Educação para se atender a essa particularidade da Lei ou às específicas do Programa Escola Ativa. Assim, o calendário letivo das escolas rurais em Jardim do Seridó cumpre o mesmo cronograma das escolas urbanas. O Calendário Agrícola é um dos instrumentos de articulação da escola com a comunidade, logo, nas Monografias das Comunidades é possível identificar algumas informações sobre os tipos predominantes de lavouras, técnicas de manejo, entre outros aspectos associados ao trabalho local. Embora as diretrizes do Escola Ativa (BRASIL. MEC, 2005a) apresentem esse indicador como um dos instrumentos de inovação metodológica junto às turmas multisseriadas, percebemos que a prática de atividades dessa natureza não se constituem como uma novidade, pois naquele município já era possível observá-las nas atividades curriculares da escola rural Jardim Seridoense, na década de 1940, conforme mostra Azevedo (2006a).