CAPÍTULO 3: A IMPLEMENTAÇÃO CURRICULAR DA HISTÓRIA E CULTURA AFRO-
3.2 As ações da Secretaria de Educação de Pernambuco
Considerando que o campo empírico da pesquisa foi principalmente o Estado de Pernambuco, é importante explicitar as responsabilidades atribuídas aos sistemas de ensino estadual pelo Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Etnicorraciais e para o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Entre as ações que foram prescritas para o Sistema de Ensino Estadual, destacamos:
a) Apoiar as escolas para implementação das Leis 10.639/2003 e 11.645/2008, através de ações colaborativas com os Fóruns de Educação para a Diversidade Etnicorracial, conselhos escolares, equipes pedagógicas e sociedade civil;
[...]
c) Promover formação para os quadros funcionais do sistema educacional [...], mobilizando de forma colaborativa atores como os Fóruns de Educação, Instituições de Ensino Superior, NEABs, SECAD/MEC, sociedade civil, movimento negro, entre outros que possuam conhecimento da temática;
d) Produzir e distribuir regionalmente materiais didáticos e paradidáticos que atendam e valorizem as especificidades [...] da população e do ambiente ao ensino e à aprendizagem das Relações Etnicorraciais;
[...]
f) Realizar consulta às escolas sobre a implementação das Leis 10.639/2003 e 11.645/2008 e construir relatórios e avaliações do levantamento realizado;
g) Desenvolver cultura de auto-avaliação das escolas e na gestão dos sistemas de ensino por meio de guias orientadores, com base
em indicadores socioeconômicos, etnicorraciais e de gênero produzidos pelo INEP;
h) Instituir nas secretarias estaduais de educação equipes técnicas para os assuntos relacionados à diversidade, incluindo a educação das relações etnicorraciais, dotadas de condições institucionais e recursos orçamentários para o atendimento das recomendações propostas neste Plano; [...]
Embora haja essa divisão de responsabilidades entre os sistemas de ensino e um constante convite à comunidade escolar para o combate à discriminação etnicorracial no âmbito da educação, as iniciativas para a materialização dessa política ainda se encontram em um nível embrionário. A efetivação da educação para as relações etnicorraciais está sujeita à mobilização da sociedade civil com o propósito declarado de que o direito à diversidade etnicorracial seja garantido nas escolas, nos currículos, nos projetos político-pedagógicos, na formação de professores e nas políticas educacionais como um todo (GOMES, 2009).
Dito isto, é pertinente mencionar que houve conquistas no âmbito estadual no sentido anteriormente tracejado. Segundo Nota Técnica (Anexo H) encaminhada ao MPPE, algumas ações foram realizadas a partir de 2007 com vistas a cumprir as orientações do governo federal e diretrizes do MEC, em atendimento às reivindicações pelo tratamento das temáticas afro-indígenas no campo educacional, conforme Quadro 3:
QUADRO 3
Gerência de Políticas Educacionais de Educação Infantil e Ensino Fundamental (GEIF)
Participação de 40 professores formadores no Seminário Regional em Alagoas;
Encontro com a participação dos Gestores das 17 Regionais – Lei nº 10.639/2003;
Seminário Quilombola – Discussão dos eixos temáticos que norteiam o estudo da Histó- ria da África;
Formação continuada do professor formador para inclusão da temática nas turmas de EJA;
Formação Continuada para professores de EJA nas 17 Regionais sobre a história da Cultura Afro-Brasileira;
instrumento para realização do Censo Quilombola com 150 participantes, incluindo pro- fessores e lideranças quilombolas;
2009: Formação continuada de professores municipais – Lei nº 10.639/2003 com 300 participantes nos municípios de Panelas e Bom Conselho;
2009: Participação da SEE, através da GEIF, e de dois Técnicos da Gerência, Titu- lar/Suplente, para compor representação do Fórum de Educação das Relações Etnicor- raciais de Pernambuco, com participação de uma Técnica no Curso de Educação das Relações Etnicorraciais para Implementação da Lei n° 10.639/2003, promovido pela CEPIR/PE-UNICAP, em novembro de 2009;
2010: Formação continuada de professores municipais – Lei nº 10.639/2003, com 300 participantes no município de Flores;
2010: Fundamentação das diretrizes curriculares para a educação das relações etnicor- raciais nas Orientações Teórico-Metodológicas (OTMs); Base Curricular Comum (BCC) no Ensino Fundamental (séries finais) e Educação de Jovens e Adultos (EJA);
2010: Formação continuada dos professores do Ensino Fundamental (séries finais), Educação Infantil, Educação de Jovens e Adultos (EJA) e Educação Quilombola, já pro- gramado no PTA (Plano de Trabalho Anual).
Gerência de Políticas Educacionais do Ensino Médio (GPEM)
2009: Desenvolvimento da revisão e implantação de currículo em escolas de Ensino Médio/Normal Médio, estudos sobre a História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena, su- gerindo os conteúdos elencados nas referidas leis.
Gerência de Direitos Humanos e Cidadania (GEDH)
2008: Formação continuada de professores, técnicos e educadores de apoio, contando com palestras, mesas-redondas e oficinas que tematizaram a questão etnicorracial e a Lei n° 10.639/2003;
2009: Formação de atualização em educação escolar indígena para 360 professores das GREs do agreste e sertão pernambucano;
2010: Seminário Itinerante da Educação Escolar Indígena para 1.700 professores de todo o Estado.
Podemos observar no Quadro 3 que, majoritariamente, as ações realizadas pela SEDUC ocorreram na esfera da divulgação da Lei n° 10.639/2003, mesmo em momentos posteriores à promulgação da Lei n° 11.645/2008. A compreensão aqui é de que, embora seja necessária certa proporção de arrojo ao implementar ações
dessa natureza, haja vista a presença marcante dos preconceitos ainda muito presentes no imaginário coletivo, há duas questões subjacentes nessa postura: os interesses dos vínculos políticos19 e a possibilidade de esquivar-se, enquanto for possível, de mais uma grande responsabilidade. Ocorre que esquivar-se significa, nesse sentido, manter-se alheio de uma obrigação para com a sociedade e que, por sua vez, contrapõe-se ao próprio sentido de atuação de um órgão político- administrativo voltado para a educação. Isto corrobora com o que foi discutido no capítulo anterior do presente trabalho, sobre a separação binária das Leis, e que, no observar deste estudo, tem servido apenas para enfraquecer o movimento em defesa da promoção de igualdade étnica e racial na sociedade brasileira.
Percebemos também que o foco das ações foi a formação continuada, embora pouco se especifique no documento as formas como essas formações aconteceram. Contudo, o fato de as ações terem focado os professores, em sua maior parte, demonstra que houve um reconhecimento sobre a importância desses agentes nas mudanças educacionais. Entrementes, não foram identificadas ações no sentido de incentivar a realização de projetos sobre a temática afro-indígena, ou mesmo ações que oferecessem subsídios ao trabalho dos docentes, como o provimento de materiais didáticos específicos para a compreensão e tratamento dessas questões.
Todavia, as ações que despertaram mais atenção na pesquisa não foram divulgadas pela SEDUC. Essas consistiram na inclusão de duas disciplinas na grade curricular da rede estadual e foram instituídas com o intuito de abordar os assuntos determinados pela Lei n° 11.645/2008, como será visto a seguir.
3.3 Os componentes curriculares Direitos Humanos e Cidadania (DHC) e