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2 CAMINHO METODOLÓGICO

2.1 OS PRESSUPOSTOS DA HERMENÊUTICA

2.1.3 As categorias da hermenêutica

As categorias para a interpretação hermenêutica do discurso, construídas por Ricoeur (2013), serão apresentadas abaixo mais detalhadamente. Nesta tese foram utilizadas para interpretar a teoria da complexidade.

2.1.3.1 A efetuação da linguagem como discurso

Algo acontece quando alguém fala ou escreve, e isso é necessário considerar por se tratar de uma distinção que tem uma origem temporal que se manifesta no presente. O discurso é sempre sobre alguma coisa que promove um evento sobre aquilo que fez surgir, pois é dessa forma que todas as mensagens são trocadas. O caráter do evento do discurso é um dos dois pares do discurso, e a outra parte é a da significação que enriquece a noção de distanciamento. Se tenta compreender, não é o evento, mas a significação visto que é na linguística do discurso que o evento e o sentido se articulam. O ato de discurso possui três níveis que o constituem: 1) o ato de dizer ou ato locucionário proposicional; 2) aquilo que se faz ao dizer ou ato ilocucionário; 3) aquilo que faz pelo fato de falar ou ato perlocucionário.

2.1.3.2 O discurso como obra

A obra é uma sequência longa que se forma pela composição do gênero literário, do estilo individual que revela a natureza e a composição da obra. São as categorias da produção e do trabalho que organizam a linguagem para captar a relação da situação e o projeto no processo de reestruturação. É o momento de discernir sobre o discurso na obra em que o autor se revela do lugar de onde atua para o leitor que está num outro lugar de escuta e deve absorver como se estabelece essa relação.

2.1.3.3 A relação entre fala e escrita

É o resultado da relação que se estabelece entre o texto escrito e a leitura como uma fala, produzindo uma autonomia na interpretação com significação que não reduz, mas como observação do horizonte intencional do autor. O significado do texto

toma rumos variados e diferentes, pois o texto pode ser reconstituído e gerar uma nova situação ou um novo diálogo.

2.1.3.4 O mundo do texto

É a compreensão ou a captação de uma expressão objetiva escrita que é acessível pela estrutura da obra escrita, como uma referência ao mundo dado pelo autor e levada até as mais extremas condições referenciadas. No mundo do texto, as experiências relatadas anunciam a maneira como o autor está diretamente relacionado com o enunciado, ou seja, como ele se percebe nessa relação com o seu modo de ser no mundo.

2.1.3.5 Compreender-se diante da obra

Trata-se do que o texto oferece como mediador das reflexões no leitor para que ele se compreenda diante das provocações oferecidas numa subjetividade de caráter fundamental instituído pela obra. Essa é uma observação que revela ao leitor aquilo que chamou sua atenção pelas várias razões da leitura, pois é de onde se combinam as experiências relatadas no texto como consolidação das observações anteriores. É como uma apropriação do texto para o momento de vida do locutor ou escritor e do leitor, como uma revelação, descoberta de si ou da coisa do texto, mediado pela disponibilidade de colocar a subjetividade em suspenso como uma isca e dessa experiência resgatar o que couber em suas referências.

Essas categorias servem também para preparar o leitor para o deslocamento do texto em direção ao tempo do mundo para o qual ele se abre em diálogo. Ao se relacionar com o fenômeno do tempo, Ricoeur (2013, p. 323) cita que sua inspiração também surgiu ao ler a seguinte passagem no livro Confissões de Santo Agostinho:

só de maneira imprópria se fala de passado, presente e futuro: agora está claro e evidente para mim que o futuro e o passado não existem, e que não é exato falar de três tempos – passado, presente e futuro. Seria talvez mais justo dizer que os tempos são três, isto é, o presente dos fatos passados, o presente dos fatos presentes, o presente dos fatos futuros. E estes três tempos estão na mente e não os vejo em outro lugar. O presente do passado é a memória. O presente do presente é a visão. O presente do futuro é a espera.

Parece que, de modo geral, em qualquer época da História, as pessoas utilizam os mitos e símbolos para tentar compreender a existência pela linguagem numa experiência afetiva, por isso é preciso encontrar critérios que permitam captar os operantes desse processo no limite da consciência. Segundo Ricoeur (2013), esse processo ocorre em três níveis, a saber: a) o aspecto cósmico das hierofanias ou aparências do sagrado; b) o nível onírico dos sonhos; c) e o nível poético da imaginação. Primeiro se faz a leitura dos símbolos no mundo, depois se posiciona dentro de cada um e, finalmente, o símbolo é compreendido por meio da imaginação poética. Os símbolos estão ligados à própria vida e dela dependem, e os mitos são a maneira como as pessoas usam a linguagem para falar sobre símbolos.

O pensamento de Ricoeur sobre a hermenêutica começou com o símbolo, de acordo com Pellauer (2007), mas ficou inacabado na filosofia da vontade e depois iniciou um encontro com a psicanálise de Freud. Não queria pular etapas de uma filosofia baseada na interpretação criativa dos símbolos e mitos e compreende por que a consciência não é origem, mas tarefa da hermenêutica para ajudar na compreensão do símbolo para que se torne o fundamento da compreensão de si.

As categorias da hermenêutica, segundo Ricoeur, serviram de base para a interpretação da teoria da complexidade, mas foi necessário para esta pesquisa construir as categorias dessa teoria que servem na interpretação da história de vida de professores universitários.