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A questão relativa às formas de representação do conhecimento químico não poderia ficar fora de nosso enfoque. Nesse sentido, as três formas de representação da Química: o nível macroscópico, microscópico e o simbólico, foram contextualizadas para os três professores. Após a contextualização sobre esses níveis, questionamos os professores acerca da relevância em fazer a distinção e relação entre os níveis de representação no ensino de Química. Também questionamos em qual dos níveis a Química era comumente ensinada ou se abrigava ambos os níveis de representação. E por fim, questionamos qual seria o nível mais difícil para ensinar e aprender Química no Ensino Médio. Essa categoria está diretamente relacionada ao objetivo específico, que visa identificar como os professores de Química

estabelecem relações entre os níveis de representação macroscópico, microscópico e simbólico nas aulas de Química.

Na opinião dos professores Alfa e Beta, é interessante fazer a relação e a distinção entre os três níveis de representação no ensino de Química. O professor Alfa diz que se trabalha na escola com os três níveis, admite, porém, que o nível microscópico e o simbólico são os níveis mais explorados no ensino de Química. A investigação realizada por Santos e Schnetzler (1996) agrupou também as principais considerações dos professores de Química em relação à importância de o ensino englobar aspectos do nível macroscópico e microscópico concomitantemente, a fim de facilitar a compreensão em relação entre estes níveis. Mas em relação ao nível simbólico nada foi apontado pelos professores, conforme os autores desse estudo. Já o professor Beta afirmou que costuma relacionar o nível macroscópico com o nível microscópico aplicando-os no cotidiano do estudante. Principalmente quando trabalha o conteúdo de estequiometria, faz o estudante pensar quanto é um mol68 de banana ou um mol de arroz, pois os estudantes “[...] têm que entender que um mol é uma quantidade infinitamente grande, mas, em outras circunstâncias, pode ser muito pequena” (PROFESSOR BETA).

Em nosso entendimento, seria valioso os professores explorarem o ensino de Química nos três níveis de representação do conhecimento químico. Porém, conexões entre o nível macroscópico (como o professor Beta relatou), que é o nível em que o estudante posa identificar a Química no contexto em que está inserido, pode ser o primeiro movimento para construir um ensino de qualidade, isto é, que esteja conectado à realidade dos estudantes. Gabel (1993) destaca ser insuficiente fazer relação entre os níveis de representação no ensino de Química, se os fenômenos estudados não forem relacionados e aproximados à vida cotidiana dos estudantes. E nesse aspecto parece que o professor Beta atinge parcialmente os quesitos que são importantes para a formalização da aprendizagem em Química. A narrativa do professor Gama, contudo, apresentou divergências nessa questão. Inicialmente, mencionou que é possível estabelecer a relação entre os níveis de representação e que faz toda a diferença efetuar esta distinção:

[...] é possível estabelecer a relação entre estas três formas de representação. Quando o estudante aprende é porque ele fez uma interação entre o nível empírico (macroscópico), que ele traz de casa, com o nível microscópico e simbólico, quando essa associação for feita, com certeza o estudante está aprendendo (PROFESSOR GAMA).

68 Para identificar o número de partículas em uma amostra, foi criada a grandeza denominada quantidade de

Contudo, no transcorrer da narrativa, Gama se contradiz: “[...] talvez essa diferenciação não represente um ganho para os 35 estudantes de uma sala de aula, mas aquele estudante que assumir uma carreira dentro da área das Ciências Naturais vai precisar conhecer este mundo”, do contrário, esse estudante chegará defasado à Universidade.

Quando os professores foram questionados sobre qual dos três níveis seria o mais difícil para o ensino e para a aprendizagem, a resposta foi unânime: o nível microscópico. Na opinião do professor Alfa, o nível microscópico é a forma de representação mais difícil para o estudante aprender, porque “esse é o nível que eles têm que imaginar e interpretar”. Em continuidade, Alfa diz: “[...] a gente teria que ter alguma coisa que pudesse simular o ensino nos três níveis”. Essa narrativa apenas confirma nossa hipótese inicial, isto é, de que o professor Alfa não considera os recursos digitais, tais como programas computacionais, a internet, o YouTube69, bem como de aulas experimentais; espaços ou oportunidades essas, que seria possível o ensino de Química transitar entre essas formas de representação.

Já o professor Gama, com o intuito de promover uma melhor compreensão do nível microscópico por meio de recursos concretos, emprega um material didático chamado “kit de construção de moléculas” (modelo varetas e bolinhas). Contudo, tem por hábito alertar seus estudantes para não saírem do Ensino Médio achando que o átomo “[...] é uma bolinha e que tem corpo”. Embora o alerta, ressalta que os estudantes saem da oitava série com essa concepção inadequada sobre o átomo.

As concepções dos professores a respeito das formas de representação do conhecimento químico parecem convergir com a literatura; o nível que concentra a maior dificuldade, tanto para o ensino quanto para a aprendizagem, é o nível microscópico, por essa representação ser invisível e abstrata (WU; SHAH, 2004; GIORDAN; GÓIS, 2005; POZO; CRESPO, 2009). Convergem também com a literatura quanto à relevância para o ensino valorizar a transição entre os três níveis de representação do conhecimento químico. Vale destacar apenas a divergência do professor Gama, que, no seu discurso, ora demonstra otimismo na relação e diferenciação dos níveis de representação, ora salienta que a distinção entre os três níveis talvez não implique um ganho para turmas com 35 estudantes.

Poderíamos ter aprofundado tal divergência para atenuar essa questão. No entanto, considerando a dificuldade em agendar novas entrevistas com os professores, a referida questão fica aberta. A origem dessa divergência pode ser a própria situação de exposição à qual o professor é submetido, pois talvez não seja uma prática comum os professores de

69 O YouTube é uma plataforma que qualquer usuário do ciberespaço pode compartilhar vídeos em formato

Ensino Médio serem convidados a participar de entrevistas que resultarão em posteriores estudos. A respeito da exposição, importa destacar que os professores Beta e Gama inicialmente ficaram um tanto desconfortáveis com a entrevista, mas, logo em seguida, a partir de um maior entendimento dos objetivos da pesquisa, passaram a demonstrar bastante empenho em colaborar.