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As Lógicas de produção do espaço urbano em Presidente Prudente

Mapa 15 – IQA das Áreas Verdes Públicas de Presidente Prudente (SP)

3. RELAÇÃO SOCIEDADE-NATUREZA E A PRODUÇÃO CAPITALISTA DO

3.2 As Lógicas de produção do espaço urbano em Presidente Prudente

Em Presidente Prudente, desde o início de sua expansão territorial foram notadas algumas práticas que desencadearam processos de diferenciação de áreas e a consequente segregação socioespacial. Por segregação (urbana, residencial, social, espacial, socioambiental, dentre outros adjetivos) é compreendido o processo inerente à produção do espaço em sociedade, que resulta de arranjos espaciais nos quais as distintas classes passam a residir, cada vez mais, concentradas em áreas específicas e/ou conjuntos de bairros dentro da cidade. A prática é valorizada pelos agentes produtores do espaço, principalmente, os privados, e facilitada por algumas ações do poder público em escala local. Por exemplo, quando são disponibilizadas benfeitorias e conveniências no momento da apropriação do solo para o seu loteamento (VILLAÇA, 1998).

Na cidade, a expansão da malha urbana ocorreu inicialmente no sentido leste-oeste, devido a dois fatores preponderantes. O primeiro deles decorreu das características do relevo, pois a compartimentação geomorfológica favoreceu a ocupação das áreas centrais, localizadas

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sobre o espigão divisor de águas e, por outro lado, desfavoreceu as áreas periféricas onde as rupturas de declive são mais marcantes (AMORIM, 1993).

O segundo fator foi devido à colonização realizada pelo Coronel Manoel Goulart, que diferentemente daquela realizada pelo Coronel José Soares Marcondes (Vila Marcondes) no setor leste, não teve finalidade empresarial, resultando na venda de lotes com preços mais acessíveis a oeste. A Vila Goulart pela sua localização privilegiada, junto à estação ferroviária inaugurada na cidade em 1919, acabou por assumir e se tornar o principal centro municipal. Assim, o crescimento territorial sempre ocorreu de forma mais dinâmica no sentido leste- oeste, como ampliação da Vila Goulart (SPOSITO, 1983; HONDA, 2011).

No ano 1921, a criação legal do município como centro político e administrativo regional proporcionou a reconfiguração da sua produção agrícola, que baseada no café (prevalecente até a década de 1930) foi incrementada pela produção do algodão e pela pecuária de corte. Isto fez com que a cidade assumisse papel de base comercial, de prestação de serviços e de beneficiamento da produção agrícola para a região da Alta Sorocabana, no extremo oeste do estado de São Paulo (HONDA, 2011).

A expansão da cidade verificada entre as décadas de 1920 e 1950 caracterizou-se pela carência de planejamento urbano e de regularização legal, o que conferiu informalidade à organização fundiária do território municipal. Na década de 1940, o crescimento foi bastante influenciado pela instalação das filiais de importantes empresas, como a S/A IRF Matarazzo e Anderson Clayton e Co. S/A (SPOSITO, 1983; HONDA, 2011).

Por outro lado, entre 1950 e 1960 a expansão territorial foi pouco significativa, visto o crescimento registrado na década anterior. Contudo, a realidade muda novamente no contexto da década de 1970, quando a expansão incorpora outros eixos urbanos e rompe a “barreira” da Rodovia Raposo Tavares. A partir disto, surgem novos loteamentos em áreas descontínuas à malha urbana, caracterizadas pela ausência de equipamentos e serviços públicos, em áreas de risco e de fragilidades ambientais (SPOSITO, 1983).

Na figura 2 demonstra-se como se deu a expansão da malha urbana na cidade, privilegiando o sentido leste-oeste e, posteriormente, a sudoeste. Já na figura 3, visualiza-se como a mesma se encontra nos dias de hoje.

49 Figura 2 – Expansão e evolução da malha urbana de Presidente Prudente – 1923 a 2004.

50 Figura 3 – Malha urbana de Presidente Prudente – Outubro de 2015

2015

Fonte do Banco de Dados: USGS (2015). Composição Colorida/LANDSAT-8/R(B4) G(B3) B(B2). Elaborado pela autora.

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Analisando o processo de expansão territorial, Hora (1997) considerou que o mesmo sofreu as influências das políticas públicas federais, sobretudo, no período pós-ditadura (década de 1960). Nesta época, o governo se destacou nacionalmente nos planos de ordenamento territorial urbano, repercutindo na escala da cidade, pois os recursos disponibilizados pelo Estado foram utilizados na política de reurbanização e apropriação de algumas áreas, notadamente os fundos de vale. Os principais programas citados por Hora (1997) em seus estudos sobre Presidente Prudente foram Comunidade Urbana para Recuperação Acelerada (CURA) e o Fundo de Desenvolvimento Urbano (FDU).

Para Marisco (2003) é justamente na década de 1970 que a produção do espaço urbano na cidade passa a obedecer, mais nitidamente, as lógicas de segregação social decorrentes da associação entre os agentes públicos e privados responsáveis em produzir e consumir o espaço.

Nas análises de Sposito (1983) sobre o crescimento verificado, a autora observou influências significativas do capital privado na dinâmica urbana da cidade, especificamente do mercado imobiliário.

Sobre esta relação, tanto Sposito (1983) quanto Melazzo (1993) consideraram que os novos loteamentos surgidos neste período (1970 -1980), não tiveram a finalidade de atender a uma demanda específica, pois a malha urbana cresceu territorialmente em proporções bem maiores ao da população. Soma-se a isto o fato de que mesmo com a expansão, não foram diminuídos os problemas habitacionais, pelo contrário, o poder público local teve que intervir propondo políticas de habitação, pois faltava moradia para a população de baixa renda que para exercer seu direito à cidade, aumentava progressivamente as áreas favelizadas.

Sobre a intervenção das políticas públicas praticadas pelo governo municipal, já em meados da década de 1990, pode-se dizer que a mesma configurou-se como uma política de afastamento espacial dos grupos socialmente excluídos, porque deslocou muitas famílias habitantes das favelas e de áreas periféricas para loteamentos também periféricos e carentes de infraestrutura, serviços e equipamentos públicos (MELAZZO, 1993).

Exemplificando, durante os anos 1987 e 1988 foram propostos pelas Companhias de Habitação (COHAB) dois empreendimentos de habitação social, o Jardim Mediterrâneo e o Jardim Itapura, ambos implantados em extrema descontinuidade à malha urbana, um no setor oeste e o outro no setor leste, respectivamente (FERNANDES, 1998).

Tal conjuntura revela a intencionalidade das políticas de produção do espaço, ou seja, a de promover o distanciamento dos já segregados socialmente seja das áreas centrais quanto

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nos novos setores urbanos em desenvolvimento. Isto permite afirmar que na escala local as práticas de diferenciação e de segregação social e ambiental foram articuladamente impostas pelo poder público e pelo capital privado (MELAZZO, 1993; SPOSITO, 1983).

As consequências deste espaço produzido são percebidas nas diversas paisagens intraurbanas, que mostram as descontinuidades e desigualdades, os espaços segmentados do lazer, do consumir e, prioritariamente, do habitar, pois os loteamentos de alto padrão é uma realidade, assim como os de baixo padrão construtivo. Nos setores sul e sudeste, onde predominam os de alto padrão são comumente observadas melhorias em infraestruturas urbanas. Por outro lado, ao norte e nordeste onde predominam os de interesse popular, quase sempre as áreas apresentam-se desprovidos dos meios de consumo coletivos, como infraestruturas, serviços e equipamentos de qualidade (SPOSITO, 1991; 2007).

Além dos fatores supracitados, tem-se a questão da mobilidade urbana que é facilitada para alguns loteamentos em detrimento de outros. Dois casos podem ser citados. O primeiro deles diz respeito à implantação do Conjunto Habitacional Ana Jacinta (1992) para além da Rodovia Raposo Tavares, a 7 km das áreas centrais. Durante muito tempo, o loteamento apresentou inúmeras carências, forçando seus moradores a se deslocarem constantemente ao centro, a fim de terem suas necessidades atendidas (PEREIRA, 2002). Atualmente, independentemente da sua localização espacial, o bairro participa das dinâmicas urbanas, sendo considerado o mais populoso da cidade e apresentando subcentros comerciais e de serviços de importância significativa.

O segundo caso refere-se ao processo de revitalização urbana das áreas onde hoje se encontra o Parque do Povo, uma das principais AVPs da cidade. Em 1980, no entorno da área verde foi implantado um dos primeiros loteamentos fechados de alto padrão construtivo (Jardim João Paulo II), que teve sua instalação beneficiada pela canalização do Córrego do Veado, obra finalizada em 2007. Além da canalização, o poder público investiu em infraestruturas, equipamentos e serviços, atribuindo novos valores e funcionalidades a essa área urbana. A intervenção do governo municipal gerou uma seletividade a partir da condição social, pois além dos residenciais, as áreas loteadas só puderam ser adquiridas pelas parcelas sociais com poder aquisitivo elevado, em função do preço do solo, aumentado após essa conjuntura (SPOSITO, 1983).

A história de Presidente Prudente não nega que a produção do seu espaço urbano tem reproduzido as lógicas capitalistas, que priorizam os interesses das classes sociais dominantes baseadas no discurso das necessidades coletivas. O modo como se deu a expansão da malha

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urbana na cidade promoveu a diferenciação de áreas, paralelamente à execução de políticas públicas que repercutiram em segregação socioespacial. Esses arranjos podem ser vistos na diversidade de paisagens intraurbanas, que explicitam as diferenças do tratamento dado aos setores habitados pelas parcelas sociais com alto poder aquisitivo, daqueles periféricos, habitado geralmente pela população de baixa renda.

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4. A NATUREZA NA CIDADE: AS ÁREAS VERDES COMO UMA