• Nenhum resultado encontrado

FUNDO PÚBLICO E ASSISTÊNCIA SOCIAL EM TEMPOS DE CRISE NA PARAÍBA

3.4 A P eculiaridade do Financiamento da Assistência Social na “terra dos coronéis ‖

3.4.1. As macro-determinações do sistema do capital e o cenário paraibano

parte da população98 - torna-se cada vez mais recrutada para atender aos ―que

dela necessitam‖, conforme preconiza seu marco legal. Como referencia uma estudiosa do fenômeno da expansão da assistência social nos últimos tempos:

[...] na impossibilidade de garantir o direito ao trabalho, seja pelas condições que ele assume temporariamente, seja pelo nível de desemprego, ou, pelas orientações macroeconômicas vigentes, o Estado capitalista amplia o campo de ação da assistência social [...] além dos pobres miseráveis e inaptos para produzir também desempregados passam a compor a sua clientela (MOTA, 2006, p.8).

Esse quadro, portanto, reserva mais que nunca um novo lugar de fetiche para a política de assistência social no interior da seguridade social, à medida que passa a assumir uma ―condição de política estruturadora e não como mediadora de acesso a outras políticas e a outros direitos, como é o caso do trabalho‖ (MOTA, p.132, 2007).

Nesse sentido, cabe reiterar pelo que vimos desenvolvendo ao longo desse trabalho, que a Assistência Social, seja nos moldes ―lato sensu‖, seja ―estrito sensu‖, assim como as demais políticas, não possui ―cacife‖ para resolver, tampouco erradicar os ―males sociais‖ engendrados no sistema do capital, pois,

faça chuva ou faça sol, elas atuam nos efeitos das contradições capitalistas

(NETTO, 2005). O crescimento da cifra de recursos destinados à assistência social, que, quando comparadas ao pagamento da dívida, não chegam a representar um grande conflito no interior do orçamento federal, é uma expressão da perda de forças do sistema do capital em garantir um mínimo de condições de sobrevivência pelas vias do trabalho assalariado.

3.4 A Peculiaridade do Financiamento da Assistência Social na “terra dos coronéis

3.4.1. As macro-determinações do sistema do capital e o cenário paraibano

98

Em 1998, segundo dados do Conselho Nacional de Saúde (APUD BERINHG, 2003), 39 milhões de brasileiros estavam acobertados por planos privados de saúde. Em 2007, esses números se elevam para 49 milhões de brasileiros.

Se a nossa intenção nesse espaço fosse apresentar o estado da Paraíba para algum grupo de personificações do capital interessado na montagem dos mais variados tipos de negócios, a exemplo da indústria turística, certamente, iniciaríamos ressaltando que o estado abriga algumas das mais belas praias do nordeste, localiza-se no extremo oriental das Américas – com uma capital onde ―o sol nasce primeiro‖ – possui uma das capitais mais ―verdes‖ do Brasil, um admirável pôr-do-sol, ao som do famoso ―bolero de Ravel‖, além da facilidade de subvenções do governo as personificações do capital e um povo ―ordeiro‖ pronto para apreciar os ―benefícios‖ do turismo. Vista por esse ângulo a Paraíba seria, de fato, um verdadeiro paraíso tropical!

No entanto, como esse não é o rumo da nossa ―prosa‖, basta assinalar que ―esse pedaço de paraíso tropical‖ abriga o segundo pior índice de desigualdade de renda do país, possui uma das maiores taxas de trabalho infantil do Nordeste, um expressivo número de paraibanos vivendo em situação de indigência, altas taxas de desemprego, famílias desabrigadas por cederem espaço para construção de barragens e açudes, na terra onde a ―indústria da seca‖ tem o seu espaço garantido, além de elevadas taxas de homicídios juvenis99, como detalharemos no

decorrer deste item.

Como no modo de produção capitalista nenhum espaço socioterritorial, nenhuma possibilidade de vida social escapa à lógica infernal do impulso expansionista do capital e suas determinações quanto à degradação das condições materiais da reprodução da força de trabalho, logo, com o estado da Paraíba não seria diferente, posto que este não se encontra ―ilhado‖ no seio desse modelo sociometabólico de produção, embora guarde suas particularidades sócio- históricas.

Alguns desses traços particulares tornam-se evidentes quando analisados seus principais aspectos socioeconômicos. O peso industrial da economia paraibana dá-se vinculado à produção de bens de consumo de corte bastante tradicional e voltado para o beneficiamento de matérias-primas agrícolas e

99

Segundo dados do ―Mapa da Violência dos Municípios Brasileiros 2008‖, estudo elaborado pela Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana (RITLA), Instituto Sangari, Ministério da Saúde e Ministério da Justiça, a Paraíba é, proporcionalmente, o 4° Estado do Nordeste e o 7° do país onde mais morrem jovens, de 15 a 24 anos, por homicídio. O índice de vitimização juvenil é de 85%, taxa semelhante a países que vivem em guerra. Disponível em < http://www.ritla.net> Acesso em 03/06/2008.

minerais. Os principais ramos industriais estão concentrados no setor têxtil, com destaque para as fibras vegetais, a exemplo do algodão colorido e do sisal, indústria alimentícia, com a ênfase para produção do açúcar e suco de frutas e a chamada ―indústria da transformação‖ de minerais não metálicos, dos quais são emblemáticas a produção de cimento e calçados.

Esses são, basicamente, os principais ramos produtivos dos quais emanam as mercadorias paraibanas para serem consumidas internamente e escoadas mundo afora; em torno dos quais empresários e Estado arquitetam formas para tornar a Paraíba competitiva no mercado, a exemplo de subsídios fiscais, redução de ICMS, investimentos em infra-estrutura (construção e manutenção da malha rodoviária, e, modernização do sistema portuário). Além da construção de açudes e barragens, que sob o engodo de beneficiar o ―pequeno produtor‖ rural e bolsões da população sertaneja, que perecem durante os períodos de estiagem, acabam alimentando a ―indústria da seca‖.

Nesse sentido, pode-se afirmar que há dois conglomerados industriais no estado – João Pessoa e Campina Grande – onde está concentrada quase metade da população, ou seja, 1.351 milhões de habitantes. O primeiro localiza-se no espaço litorâneo, formado pela capital e cidades circunvizinhas, como Cabedelo, Conde, Bayeux, Santa Rita e Lucena, e se destacam na indústria alimentícia, construção civil, têxtil e de cimento. O segundo encontra-se localizado no município de Campina Grande - ―capital do forró‖ – conhecida nacionalmente por seus festejos juninos e por seu destaque na produção algodoeira, em meados do século XX, que rendeu a cidade o segundo lugar mundial na produção do ―ouro branco‖. Essa, por sua vez, abriga dois pólos irradiadores de conhecimento – Universidade Estadual da Paraíba e Universidade Federal de Campina Grande – dos quais o último vem ganhando destaque em pesquisas tecnológicas, como a produção e exportação de

software, e aguçando o apetite lucrativo de empresas multinacionais, a exemplo da

Nokia e sua oferta de linhas de financiamento para a exploração desse ramo.

Além disso, cabe assinalar que a cidade contém um dos maiores pólos calçadista do estado, com destaque para as empresas do Grupo São Paulo Alpargatas, responsável pela fabricação das sandálias Havaianas e por empregar grande parte da mão-obra campinense. No entanto, face ao cenário de crise mundial intensificado no Brasil em fins de 2008, a empresa vem realizando demissões que,

nas palavras do atual presidente da FIEP, Francisco Gadelha, conformam ―ajustes necessários‖ face às intempéries do mercado. No entanto, assim que o período turbulento cessar, a empresa voltará a contratar mais força de trabalho. Para esse representante das personificações do capital, tudo se resume a: ―tranqüilidade para enfrentar as adversidades‖ desse modelo sociometabólico de produção 100.

Outro ponto a enfatizar refere-se à confecção das famosas redes de São Bento. Esta cidade, que se encontra localizada no alto sertão do estado e conta com um número populacional de aproximadamente 30 mil habitantes e um PIB de R$ 78.397 mil, se destaca como uma das maiores produtoras nacionais de redes de dormir e apresenta-se como uma das maiores geradoras de ICMS no estado. As toneladas de redes que são, anualmente, produzidas e exportadas para todo país e alguns recantos da América do Sul, África e Europa, succionam a maior parte da força de trabalho dos são benitenses, a qual se processa em condições de superexploração, tanto no interior de pequenas fábricas quanto no próprio espaço doméstico, com envolvimento de toda a família, inclusive da mão-de-obra infantil. A cidade é banhada pelo principal rio do estado – Rio Piranhas – e este funciona como elemento indispensável para o processo de feitura das redes, uma vez que o tingimento dos fios exige água em abundância. A circulação dessas redes é capitaneada pelos assim chamados ―redeiros‖ e donos de caminhões que transportam ambas as mercadorias, força de trabalho e redes, para serem vendidas pelo Brasil. Também aqui se evidencia o uso do trabalho infantil. Ressaltamos que, fora o registro do trabalho infantil em alguns meios estatísticos, bem como dados populacionais, PIB e peso do ICMS, tais observações acerca desse recanto do estado são de natureza empírica, e pesquisas acerca dessas relações do processo de feitura das redes dariam valiosas contribuições, sobretudo, quanto à configuração de mais um espaço de exploração da força de trabalho no estado.

Outro ponto curioso a destacar sobre a referida cidade é que, mesmo contando com a instalação de pequenas fábricas de redes, observa-se que esse cenário não se evidencia nas finanças municipais. Conforme dados do Tribunal de Contas do Estado, a receita orçamentária do município não recebe nenhum recurso advindo da instalação e funcionamento dessas fábricas. Situação que pode indicar ―dois‖ caminhos: ou esses donos de fábricas são isentos de uma fatia de impostos

ou, de fato, boa parte do processo de trabalho acontece no interior das residências dos são benitenses.

Pelo breve traçado socioeconômico paraibano, sobretudo, no que tange a sua ―frágil‖ base industrial, tem-se que os principais produtos voltados para a exportação são: sisal, tapetes, álcool etílico, tecido, calçados, couros, sucos de frutas, atum, inhames, açúcar cristal, confecções (redes), software, abacaxi 101. Das unidades

produtivas responsáveis pelo maior peso (66,8%) de exportações, destacam-se as Alpargatas (45%), com a fabricação de sandálias de borrachas, acima referidas; a Companhia de Tecidos Norte de Minas (COTEMINAS - (9,3%), com a produção de tecidos atoalhados; a empresa Gramane Industrial e Agrícola (5,9%) – GIASA S/A, com o destaque para produção do álcool etílico e açúcar; a Companhia Sisal do Brasil – COSIBRA – (3,5%) como referência na confecção de tapetes e a Pedreiras do Brasil S/A (3,1%). Por outro lado, a Paraíba importa, dentre outras mercadorias, aquelas identificadas como ―bens de capital‖ ou bens de produção, a exemplo das colheitadeiras de algodão, máquinas para costura, teares para tecido sem lançadeira a jato, lâminas de ferro, dentre outros (FIEP, 2006).

Seria essa estreita base econômica, na visão de alguns apologetas do sistema, que alimentaria as taxas de desemprego na Paraíba nos últimos anos. Ou seja, seu ―pequeno parque produtivo‖ não possibilitaria oportunidades de emprego para todos.