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As ocupações na 2ª Guerra Mundial

CAPÍTULO I – As raízes do presente

4. As ocupações na 2ª Guerra Mundial

“As Guerras de 1914-1915 e 1939-1945, ambas exclusivamente europeias pela origem e mundiais pelos efeitos”,23 acentuava Adriano Moreira…

Durante a 2ª Guerra Mundial, Portugal afirma-se neutral, no entanto, não foi por esse facto que, Timor deixa de sofrer os efeitos do conflito.

A 17 de Dezembro de 1941, deu-se o desembarque em Dili de forças holandesas e australianas, com o argumento de impedirem o avanço das forças nipónicas em direcção à Austrália – os japoneses já tinham mesmo ocupado algumas posições estratégicas na Ásia (Singapura, Malásia e Java). Acentua-se a divisão entre a ilha, com a parte portuguesa de Timor na órbita dos australianos e a parcela de Timor pertencente aos holandeses mais favorável aos japoneses, esta divisão foi testemunhada por um cineasta de guerra australiano, Damien Parer que numa reportagem sobre as zonas de combate e os alinhamentos diz:

“As relações das nossas forças com os nativos tocam os dois extremos. Por um lado, há

os nativos que são usados pelos Japoneses, armados, em muitos casos, com

espingardas e encorajados a dar caça aos nossos homens e a intimidar aqueles que são

favoráveis aos australianos. Por outro lado, dificilmente conseguiríamos viver sem o

auxilio e a amizade dos nativos das montanhas, que são leais à Administração

portuguesa e que criaram fortes laços com os australianos…os japoneses dão muita

atenção à questão dos nativos, tentando, por todos os meios, voltá-los contra os

australianos e contra a ainda constitucional Administração portuguesa”

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22 Citado por: MENDES, Nuno Canas; A “ Multidimensionalidade” da Construção Identitária em Timor –

Leste, Instituto Superior de Ciências Sociais e Politicas, pag. 168, Lisboa 2005.

23 MOREIRA, Adriano; Estudos da Conjuntura Internacional, D. Quixote, Lisboa 1999, pag.250.

24 Citado por: MENDES, Nuno Canas; A “ Multidimensionalidade” da Construção Identitária em Timor –

Contra esta invasão, Portugal limitou-se a lavrar protestos, sem quaisquer efeitos práticos sentidos no terreno, e na vida das pessoas que ali viviam.

“A administração portuguesa não contrariou, no terreno esta primeira invasão embora o

governo de Lisboa tivesse lavrado os mais veementes protestos, manifestos em

Exposição de S. Exª o Sr. Presidente do Conselho Acerca dos Sucessos de Timor (19.

12. 1942)”.

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A 19 de Fevereiro de 1942 deu-se a entrada das forças japonesas, mais uma vez o Presidente do Conselho apresenta um protesto perante a Assembleia Nacional. Mas, também este protesto não se revestiu de qualquer efeito prático. A administração ficou vazia de poderes e o território transformou-se num palco de lutas entre as facções presentes. A destruição, especialmente de Dili, a capital, foi total, há autores que apontam para números entre os 60 e os 80 000 de mortes, ou seja, 15 a 20% da população do território.

Marcello Caetano escreve na altura:

“Os japoneses em Timor vexavam e afligiam os portugueses a pretexto de os impedir de

comunicar com os australianos mas deixavam flutuar a bandeira portuguesa, iam

cumprimentar o Governador no dia 5 de Outubro e não se atreviam a um ataque frontal à

nossa soberania. O método adoptado era outro: matar os portugueses à fome e fazer

varrer os últimos restos de Portugal pela insurreição dos nativos, aos quais pregavam o

advento da Grande Ásia – erguida pelos asiáticos e para os asiáticos”

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Com estas palavras, como refere Nuno Canas Mendes, “Caetano omite os timorenses que resistiram, dando apenas a medida da actuação dos japoneses na sua reacção á invasão preventiva de Timor pelas tropas australianas e holandesas, que haviam dado o primeiro passo na quebra do respeito pela neutralidade portuguesa” 27

Apesar de, o presidente do governo de Portugal, Marcelo Caetano omitir os timorenses, e a resistência por eles demonstrada contra os invasores, perante a comunidade internacional o governo português serve-se da resistência, que os

25Citado por MENDES, Nuno Canas; A “ Multidimensionalidade” da Construção Identitária em Timor –

Leste, Instituto Superior de Ciências Sociais e Politicas, pag. 146, Lisboa 2005

26 Citado por: MENDES, Nuno Canas; A “ Multidimensionalidade” da Construção Identitária em Timor –

Leste, Instituto Superior de Ciências Sociais e Politicas, pag. 145, Lisboa 2005

timorenses utilizaram perante os invasores, para demonstrar como estes lhe eram fiéis.

Durante a Guerra, os timorenses sentiram-se entregues a si próprios. A neutralidade dos portugueses não impediu que o seu território fosse palco de lutas sangrentas, pagando o povo timorense com a própria vida, essa dita neutralidade (os europeus que viviam em Timor foram colocados num campo de concentração em Liquiçá, onde muitos morreram à fome). Os “vizinhos” australianos, com o pretexto de expulsar os japoneses, quando a guerra terminou, bombardearam intensamente a cidade de Dili, deixando-a reduzida a escombros, por outro lado os holandeses, da outra metade da ilha, eram em grande parte, aliados do invasor, acentuando-se assim a divisão entre as das duas metades da ilha, como já foi referido, o que viria a repetir-se, cerca de trinta anos mais tarde, aquando da invasão pela Indonésia.

Após a Guerra terminar, como se pode verificar através do excerto do telegrama nº 416, datado de 16 de Setembro de 1945, enviado pelo então Governador de Timor, Ferreira de Carvalho, ao Ministro das Colónias, em Timor, a administração portuguesa, foi reposta sem qualquer oposição por parte, dos timorenses:

“No momento em que vemos terminada a situação dificílima e angustiosa que acabámos

de atravessar, sempre firmes no posto de sacrifício que nos coube, e que só em 5 do

corrente acabou pela comunicação de terem cessado as hostilidades e se estar já

fazendo a evacuação de Timor pelas forças japonesas e hoje, de facto, pelo

restabelecimento da comunicação com a Mãe Pátria, todos os portugueses que estão

em Timor, quer europeus, quer indígenas, saúdam comovidamente V. Ex.ª, afirmando

apenas que o seu bem arreigado patriotismo lhes permitiu atravessar este longo período,

no meio de todos os sacrifícios, físicos e morais, sem desfalecimento e contentes por

verem a bandeira de Portugal cobrindo a terra portuguesa de Timor (…) A Dili têm

acorrido muitos chefes indígenas para saudar o Governo, logo que souberam da noticia

de ter acabado a guerra, mostrando todos a sua alegria por verem restabelecida a plena

autoridade portuguesa e garantindo a sua lealdade e terem compreendido bem os

motivos da situação que acabámos de atravessar”.

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Nesta altura não existia em Timor qualquer elite escolarizada e politizada que questionasse a presença portuguesa (antes da 2ª Guerra Mundial apenas

28 NEVES, Mário V.; Dez Anos de Politica Externa (1936 -1947) A Nação Portuguesa E A Segunda Guerra

Mundial; Ministério dos Negócios Estrangeiros, Imprensa Nacional Casa da Moeda, Lisboa -1980, Vol. XI, pag. 485.

existiam em Timor 24 escolas do sexo masculino com 1377 alunos, e 9 escolas do sexo feminino com 421 alunas). Mas, há autores que têm apontado a 2ª Guerra Mundial e a resistência organizada dos timorenses, como o primeiro momento histórico de coesão, de consciência da sua diferenciação e do seu destino histórico. Mattoso refere mesmo que a 2ª Guerra Mundial despertou no povo timorense “uma espécie de consciência pré-nacional”.29

Em 1945, a Indonésia, aproveitando a derrota do Japão, proclama a independência, declarando-se herdeira do Império Holandês das Índias Orientais, não reclamando a parte de Timor que estava sob administração portuguesa. Apesar de Timor ocupar uma posição geográfica periférica e de o seu povo ser maioritariamente analfabeto, portanto pouco permeável à difusão da ideologia anti-colonialista então reinante no extremo oriente, Portugal demonstrou à recém- criada nação Indonésia, a sua preocupação quanto à situação deste território. O Presidente da Indonésia, Sukarno, comprometeu-se, perante Portugal, a respeitar a soberania portuguesa na metade da ilha até então sob administração portuguesa.