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As Organizações Não-Governamentais (ONGS)

3 A QUESTÃO DOS REFUGIADOS NO PLANO DAS RELAÇÕES

3.2 Os atores na questão dos refugiados e dos direitos humanos

3.2.3 As Organizações Não-Governamentais (ONGS)

As Organizações Não-Governamentais, como se sabe, têm assumido um papel cada vez mais importante na pauta das discussões acerca dos direitos humanos. Por outro lado, o Estatuto do ACNUR prevê que este órgão deve procurar soluções para os problemas dos refugiados em colaboração com os governos, com as organizações intergovernamentais e com as organizações privadas. Sua capacidade para estabelecer acordos, mencionada no item anterior, se estende aos órgãos não-governamentais embora estes não sejam sujeitos do Direito Internacional.158

Essas organizações são definidas por Ricardo Seitenfus (2005, p. 340) como “associações de direito privado cujas atividades são voltadas para questões de interesse público. Elas promovem valores e interesses morais, éticos, religiosos, ideológicos ou culturais, cuja defesa organiza-se, num primeiro momento, em âmbito nacional”.159 Seu lugar

como atores nas relações internacionais é amplamente reconhecido.160 Neste caso, como

lembra Seitenfus (2005, p. 341) elas ultrapassaram as fronteiras nacionais e atuam de forma transnacional.161

As ONGs têm desempenhado papel de fundamental importância na ação do ACNUR. “Confrontado em seu terreno de atuação com o ativismo das ONGAT”, este órgão “constitui, provavelmente, a OI que mais lança mão desta cooperação” (SEITENFUS, 2005, p. 343).162 Efetivamente, como dispõem de maiores recursos, elas podem levar socorros mais rapidamente nos casos de urgência. Entre elas podem ser citados os organismos Médicos Sem

158 Ver Jubilut (2007, p. 158).

159 Seitenfus (2007, p. 340) apresenta, também, a definição dada pelo Conselho Econômico e Social (ECOSOC)

da ONU, em parecer de 27 de fevereiro de 1950: “[...] qualquer organização internacional que não é criada por via de acordo internacional”. Por acordo internacional, entende-se “aquele decorrente do direito internacional público, ou seja, concluído pelo Estado”.

160 São as Organizações Não-Governamentais de Alcance Transnacional (ONGAT), conforme Seitenfus (2005,

p. 337-351).

161 Seitenfus (2005, p. 341) apresenta os elementos caracterizadores das ONGATS, quatro no total: “a) o

princípio associativo, pois trata-se da reunião de um grupo de pessoas privadas que defendem um ideal ou uma convicção procurando alcançar um objetivo comum não-lucrativo e demonstrando uma atividade perene; b) independência com relação ao poder público, nacional ou internacional, criando um espaço autônomo com relação aos Estados e às OI, sem excluir formas de cooperação; c) a comunidade formada pela ONGAT comunga princípios e valores comuns, com seus membros participando de maneira voluntária; d) embora vinculadas à uma sede central ou matriz, suas atividades possuem um alcance transnacional” (destaques do autor).

162 O ACNUR mantém um projeto, intitulado PARINAC (Partenariat in Action), do qual participam,

Fronteiras – MSF),163 Médicos do Mundo, Ação contra a Fome, ou “Save the Children

Fund”.164Podem ser acrescentadas a esta lista a Anistia Internacional165e a Americas Watch

que agem na defesa dos direitos humanos fundamentais, ambas citadas por Seitenfus (2005, p. 349).

Algumas ONGS se especializaram em áreas de atuação que não são contempladas pelo mandato do ACNUR. É o caso da organização França Terra de Asilo que ajuda os solicitantes de asilo nos trâmites burocráticos. No Brasil, essa tarefa é realizada pela Cáritas, organização sem fins lucrativos ligada à Igreja Católica. Essa associação foi criada em 1950, atua em mais de cento e cinqüenta países em todos os continentes e tem destacada atuação em vários projetos sociais em todo o mundo.

A colaboração entre o ACNUR e algumas ONGS pode tornar-se complicada já que aquele é um órgão oficial dotado de um mandato preciso e estas últimas são organismos privados cujos objetivos e engajamentos podem variar. O ACNUR possui uma estrutura burocrática pesada para as intervenções de urgência e como é beneficiado por financiamentos governamentais não goza da mesma independência da maioria das ONGS. Neste contexto, a parceria com uma ONG lhe é salutar. Por outro lado, houve casos em que o Alto Comissariado denunciou as intervenções que considerou precipitadas das ONGS e as conseqüências nefastas que tais precipitações podem acarretar para a missão na qual aquele órgão está envolvido (LA DOCUMENTATION FRANÇAISE). Nesse sentido, Seitenfus (2005, p. 348) destaca que a intervenção das ONGAT nos assuntos internos dos Estados Nacionais necessita da manifesta concordância destes e que “as relações entre os interventores e o país objeto de intervenção não são isentas de tensões”.166 Ademais, outras críticas têm

vindo à tona, tais como a transformação da atividade das ONGs em “charity business”, onde o negócio passa à frente da caridade, ou a colisão entre certas organizações e os poderes locais

163 Recebeu o Prêmio Nansen em 1993 por sua ação em favor dos refugiados. Essa organização atua na África,

no Próximo Oriente e no Oriente Médio, na Ásia, na Europa e nas Américas (na Guatemala, na Colômbia e no Haiti). Para maiores detalhes ver sítio do MSF: http://www.msf.fr/actions/nosactions.

164 Denunciou em 2002 violências sexuais cometidas por empregados do ACNUR ou das ONGs contra mulheres

em campos de refugiados na África. Informação obtida no site www.ladocumentationfrancaise.fr/dossiers/refugies/cicr.shtml. Acesso em 07 dez. 2007.

165 Recebeu o Prêmio Nobel da Paz em 1977.

166 O autor ressalta “a diferença fundamental entre a posição dos órgãos das Nações Unidas, como o Alto

Comissariado para os Refugiados ou ainda o Comitê Internacional da Cruz Vermelha em contraponto às intervenções humanitárias das ONGAT. Os primeiros sustentam sua ação através de prévio consentimento dos Estados” e os segundos “devem se submeter às diretrizes do Estado detentor da soberania” (SEITENFUS, 2005, p. 348).

(notadamente as forças armadas locais), que são, com freqüência, diretamente responsáveis pelas crises humanitárias. (LA DOCUMENTATION FRANÇAISE).

De outra ponta, os Estados tendem a uma utilização maior das ONGAT nas áreas humanitaristas, ambientalistas e de direitos humanos, terrenos em que uma intervenção direta de um Estado sobre outro, além de ser legalmente impossível, é desgastante do ponto de vista político (SEITENFUS, 2005, p. 341).

Uma vez expostas a problemática com suas características principais no primeiro capitulo e sua situação no âmbito das Relações Internacionais no segundo, passa-se, no terceiro capítulo, ao exame de um caso específico, o dos refugiados colombianos.

4 UMA REFLEXÃO SOBRE O CASO COLOMBIANO