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As primeiras ações: o início da atuação dos órgãos estaduais de preservação na

4. PROGRAMAS DE REABILITAÇÃO DE ÁREAS URBANAS CENTRAIS NO

4.3 As primeiras ações: o início da atuação dos órgãos estaduais de preservação na

Em meados dos anos 1980 ocorre uma mudança significativa no campo da proteção do patrimônio urbano, com a aplicação dos conceitos da conservação integrada, ou seja, uma estratégia de geração de investimentos e sustentabilidade econômica para realização de projetos urbanísticos, ações socioambientais e culturais, aliando a cooperação público-privada e a efetiva participação da comunidade. Para Leonardo Castriota (2007, p. 22) é nesse momento que surge, também, o conceito de “reabilitação urbana”, termo utilizado para definir as ações em áreas históricas formuladas a partir do conhecimento da realidade dos locais, assim “as políticas de patrimônio não se limitam mais a apenas formular estratégias de controle para as áreas a serem conservadas, mas passam a traçar estratégias amplas para o seu desenvolvimento, que partem exatamente de seu caráter de áreas conservadas”.

A inserção da participação popular no processo de intervenção passa a ser vista como imprescindível para que se possa esperar algum sucesso. Assim, como demonstrou o PPO, o foco do discurso preservacionista desloca-se do turismo para a comunidade, pelo menos no discurso, tendência que começou a ser observada no final do PCH, quando as ações passam a contemplar os problemas urbanos e sociais das cidades históricas, e a população recebe uma maior atenção institucional (SANT’ANNA, 1995, p. 190).

Embora o final dos anos 1980 e início dos anos 1990 tenha se configurado, no Brasil, como um período com poucos investimentos no campo da preservação do patrimônio cultural, é nesse momento que tem início a implementação de projetos de recuperação de centros históricos em diversas cidades brasileiras, a exemplo de João Pessoa, Salvador, Recife, Rio de Janeiro, São Paulo e São Luís62 dentre outras, por iniciativa dos governos estaduais e/ou municipais, o que demonstra um reflexo da atuação do PCH no fortalecimento de uma rede de órgãos locais de preservação, e na disseminação da ideia de especulação do turismo cultural para melhoria econômica das cidades.

62Projeto de Revitalização do Centro Histórico de João Pessoa (1987), Programa de Recuperação do Centro Histórico de Salvador (1991), Plano de Revitalização do Bairro do Recife (1989), Projeto Corredor Cultural no Rio de Janeiro (1985), Operação Urbana Anhangabaú em São Paulo (1991) e Programa de Preservação e Revitalização do Centro Histórico de São Luís (1989).

Segundo Gottschall e Santana (2007) foi na década de 1980 que se iniciaram no Brasil as discussões sobre a relação entre cultura, sociedade e espaço urbano, a partir daí, “de atividade espontânea que buscava o original como parte do cotidiano, assim definindo lugares nas cidades, a cultura passou a ser valorizada como mercadoria simbólica, capaz de agregar valor e difundir costumes e práticas” (GOTTSCHALL e SANTANA, 2007, p. 2). Com o crescimento das cidades, a modernização dos espaços e o surgimento de novas centralidades, ao mesmo tempo em que os centros históricos sofriam um constante esvaziamento e perda de vitalidade econômica, se tornavam espaços singulares, agregando realidades de outras épocas, cuja diversidade poderia ser exibida e explorada.

O termo sustentabilidade, que já figurava como premissa em projetos anteriores, adquire, na década de 1990, o status de palavra de ordem das ações de reabilitação. Estas deveriam garantir a salvaguarda do patrimônio e da área objeto de intervenção a longo prazo, tanto do ponto de vista social, gerando de melhorias para a população e diversidade de usos, quanto do ponto de vista econômico, gerando subsídios para sua manutenção, objetivos que se relacionam diretamente com as determinações da Recomendação de Nairóbi, de 1976.

A proteção e o restauro deverão ser acompanhados de atividades de animação social e cultural. Para isso, será essencial manter as funções existentes que se mostrem adequadas, nomeadamente o comércio e o artesanato, e criar outras novas que, para serem viáveis a longo prazo, deverão ser compatíveis com o contexto econômico e social da cidade, da região ou do país em que se inserem. O custo das operações de salvaguarda não deve avaliar-se apenas em função do valor cultural das construções mas também do seu valor de mercado decorrente do uso que delas se possa fazer. Os problemas sociais da salvaguarda não podem ser corretamente analisados sem ter em conta estas duas escalas de valor. Os usos a dar às edificações terão de adaptar-se às necessidades sociais, culturais e económicas dos habitantes, sem desvirtuar o caráter específico do conjunto histórico. Uma política de animação cultural deverá converter os conjuntos históricos em polos de atividades culturais e conferir-lhes um papel essencial no desenvolvimento cultural das comunidades circundantes (UNESCO, 1976, p. 7).

Sempre ficou claro que, assim como os pedidos de tombamento, o foco dos projetos recaia sobre a possibilidade de exploração turística das áreas antigas, sobretudo nas cidades do Nordeste. Com a criação, em 1994, do Programa Integrado de Desenvolvimento do Turismo no Nordeste (PRODETUR/NE)63, esse objetivo ganha um

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O PRODETUR/NE foi uma ação conjunta dos Ministérios dos Esportes e do Turismo recebia investimentos públicos e privados, a partir da integração do BID e do Banco do Nordeste (BNB), seu órgão executor (PAIVA, 2010, p. 2).

novo folego. Descrito por Paiva (2010, p. 198) como “um megaprojeto de investimentos adequado a um ambiente competitivo, [...] baseado em uma abordagem de autossustentabilidade e num moderno gerenciamento que supõe planejamento participativo e estratégico”, o programa se propunha a melhorar a qualidade de vida da população através do turismo, gerando condições para expansão dessa atividade.

O PRODETUR/NE64 se tornou um dos principais financiadores de ações em centros históricos do Nordeste, privilegiando não só a recuperação do patrimônio tombado, mas principalmente a inserção e melhoria da infraestrutura e da mobilidade urbana, além da instalação de equipamentos de apoio turístico e realização de ações visando o aquecimento econômico das cidades (PAIVA, 2010, p. 205). Durante a década de 1990 diversas ações de restauro e recuperação de edificações históricas foram efetivadas, assim como a recuperação de áreas públicas e implementação de ações visando o crescimento turístico, porém poucas foram as ações que mantiveram um foco social, que buscasse a retomada do uso habitacional, ou a manutenção da população moradora, o que agravou, em alguns casos, o estado de degradação e abandono de algumas áreas centrais.

A maioria dos centros históricos que se encontravam em estado de abandono e degradação nesse período, apresentavam áreas de ocupação irregular por moradores de menor renda, seja em casarões abandonados ou em conjuntos precários nos vazios urbanos. Um tratamento comum dado a essa população no início dos projetos foi a expulsão de suas casas, sem consideração quanto ao tempo de ocupação ou as relações econômicas e culturais dos moradores com o lugar, tendo em vista a necessidade de se melhorar a imagem da cidade. Em alguns casos prevendo a relocação das famílias para novas moradias, comumente localizadas nas bordas urbanas da cidade, longe da área a ser revitalizada, em outros apenas o pagamento de indenizações irrisórias, que não supriam o custo de uma nova moradia, fazendo com que os moradores realizassem uma nova ocupação irregular em outro ponto da cidade, ou retornassem para a área histórica.

Os projetos realizados pelos estados e municípios, com apoio do PRODETUR, apresentaram erros e acertos que serviram de base para a formulação das novas políticas

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A primeira fase atuou até 1999, quando teve início o PRODETUR/NE II que se amplia sua área de atuação, agregando os estado de MG e ES, e várias fontes de financiamento, gestão e execução, como o BID, o BNB, o BNDES, a Embratur, o Ministério do Turismo, a Infraero, a CTI/NE, os estados e municípios, por meio das secretarias de turismo, e as unidades executoras (PAIVA, 2010, p. 206). Em 2008 o programa se tornou nacional.

desenvolvidas posteriormente, e, embora o fator social ainda não fosse a finalidade principal dos projetos de reabilitação dos centros históricos, após uma série de equívocos, surgiu um entendimento de que para se alcançar a sustentabilidade social e econômica desejada é preciso atender as necessidade de todos os atores envolvidos no processo, garantindo que haja uma diversidade econômica e social nessas áreas.

4.4 O Programa de Preservação do Patrimônio Histórico Urbano (Monumenta) e