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CAPÍTULO 2: A legislação dos agrotóxicos, as políticas públicas, os guias de vigilância

1. As primeiras leis e o Programa Nacional de Defensivos Agrícolas

Existem registros de agentes químicos utilizados no combate a pragas desde os escritos antigos da Grécia e Roma. No entanto, a produção de alimentos ocorria em muito menor escala, assim como a utilização destes produtos. Além disto, as lavouras eram expostas a uma quantidade menor destes agentes (LONDRES, 2011).

Até a década de 1920, o conhecimento do ponto de vista toxicológico ainda era limitado, bem como os seus possíveis danos à saúde, mas pesquisas já eram desenvolvidas com o intuito de conhecer o impacto, na população, dos compostos químicos que pudessem prevenir e matar pragas nas plantações, insetos e outros agentes vetores e transmissores de doenças (OPAS/OMS, 1997). Em 1939, o entomologista Paul Hermann Müller, descobriu DDT e, posteriormente, em 1948, foi agraciado com o prêmio Nobel de Medicina pela sua contribuição no combate à malária (MLA, 2014).

Durante a Primeira Guerra Mundial, o DDT foi usado pelos soldados que o espalhavam na pele para combater os piolhos e prevenir a tifo. O DDT passou a ser utilizado, de modo mais representativo, na agricultura, com grande êxito em decorrência do baixo preço e eficiência (LONDRES, 2011), onde o seu uso realmente se intensificou.

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, muitas políticas foram desenvolvidas mundialmente a fim de criar mercado para os agrotóxicos e para as outras tecnologias

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destinadas a agricultura. A ONU, a FAO, e o Banco Mundial (BM) foram dois agentes que estimularam este processo (LONDRES, 2011).

Dentre as justificativas, destacam-se a necessidade de aumento da produção de alimentos para abastecer a população mundial crescente e combater a fome. Porém, por trás destas ações estavam às indústrias bélicas, as mesmas provedoras da grande maioria das tecnologias do campo atualmente que necessitavam direcionar seus investimentos com o fim das Guerras para novos consumidores (LONDRES, 2011).

Assim, os incentivos governamentais ao uso dos agrotóxicos passaram a fazer parte de uma política mundial para países em desenvolvimento. Segundo a FAO, dos 38 países em desenvolvimento, 26 deles subsidiavam o uso de agrotóxicos (SOARES, 2012).

A América do Sul foi o continente com o maior uso de DDT, além de toxafeno e lindano no mundo (D´AMATO, 2002). No Brasil, em meados de 1945, iniciou-se um processo de intensificação da produção agrícola e, a partir dos créditos rurais, deu-se o aumento do uso dos agrotóxicos de forma mais efetiva (BRASIL, 1965).

O DDT que permaneceu como o inseticida mais usado pelos 30 anos seguintes (OPAS/OMS, 1997). Foi amplamente utilizado na agricultura, bem como nas ações de saúde pública do controle da malária – devido a sua eficácia no combate a formas adultas do mosquito e seu prolongado efeito residual. Entre 1946 e 1970, todos os programas de controle incluíam em seu escopo o seu uso (REY, 1991).

No estado de São Paulo, o uso de agrotóxicos na saúde pública ocorreu principalmente com a categoria dos piretróides no combate à doença de Chagas e o DDT para combate à malária (REY, 1991).

As legislações nacionais para regulamentação, concessão de registros e cuidados com a utilização dos agrotóxicos não foram ágeis o suficiente para acompanhar o crescimento do mercado. Além de se tornarem rapidamente defasadas, eram pouco precisas, permanecendo assim por um longo período, já que a lei que regulamenta este processo até os dias de hoje, foi sancionada em 1989 e regulamentada apenas em 2002.

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Antes disto, seguiam-se as obsoletas especificações presentes no Regulamento de Defesa Sanitária Vegetal de 1934, que será descrito a seguir, onde o termo “agrotóxicos” ainda nem era utilizado.

a. Regulamento de Defesa Sanitária Vegetal

O primeiro ato normativo que regulamentou o uso dos agrotóxicos foi o Decreto nº 24.114, de 12 de abril de 1934, conhecido como Regulamento de Defesa Sanitária Vegetal, criado durante o governo de Getúlio Vargas (BRASIL, 1934). O documento refere-se a “pesticidas e fungicidas” para tratar os agrotóxicos utilizados na agricultura.

Nele, constam os procedimentos para os fabricantes, importadores e exportadores, sobre como se obter o registro e a licença de aplicação na lavoura dentre outras regulamentações como, por exemplo, qual seria o procedimento em caso de pragas, além de criar o Serviço de Defesa Sanitária Vegetal, que passou a ser o órgão responsável por conceder as licenças (BRASIL, 1934).

Para a liberação dos produtos, eram analisadas as “condições de pureza, inocuidade, praticabilidade, eficácia e composição” declaradas. A licença era negada quando algum desacordo com seus fins terapêuticos era identificado. Os registros, segundo o decreto, expiravam após cinco anos, sendo necessário um novo pedido. Ademais, qualquer mudança na formulação também requeria um novo pedido de registro perante ao órgão público responsável (BRASIL, 1934).

O atual MAPA, na época apenas Ministério da Agricultura (MA), era o único órgão responsável pela liberação das substâncias (para o caso de produtos a serem aplicados em ações de saúde pública, como combate a vetores, o MS era consultada também). O Instituto de Química colaborava com as análises dos produtos requisitados e, quando o governo não possuía capacidade de realizá-las, a indústria requisitante responsabilizava-se por providenciá-las (BRASIL, 1934).

A taxa fixa do requerimento era de 100$000 réis (equivalente a cinquenta reais) – valor inferior quando comparado a outros países como nos Estados Unidos. A própria

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legislação refere-se a acordos entre os MAPA e Ministérios da Fazenda (MF) para concessão de benefícios e redução de taxas de importação de inseticidas e fungicidas (BRASIL, 1934).

Com este decreto, ficou a cargo do governo realizar treinamentos e capacitação aos trabalhadores para utilização dos produtos sem haver responsabilidade das empresas produtoras e distribuidoras (BRASIL, 1934).

Considerações sobre cuidados especificamente em relação à saúde dos(as) trabalhadores(as) são citadas no decreto quando abordada a questão da desinfecção de produtos para exportação: “as câmaras para desinfecção e expurgo devem ser dotadas de (...) aparelhamento que permita a perfeita aplicação e distribuição dos inseticidas sem perigo aos trabalhadores” (BRASIL, 1934).

Nenhum comentário aos possíveis danos ao meio ambiente e a saúde humana – além do supracitado (mesmo que indiretamente) - estavam presentes na legislação. Estes, só iriam aparecer anos mais atarde com a lei atual.

Desde a primeira lei, muitas portarias foram adicionadas e, assim como o sistema legislativo, os sistemas de saúde e de vigilância epidemiológica tornaram-se mais complexos e atuantes nas ações e políticas governamentais. Porém, ambos ainda muito distantes dos níveis das discussões internacionais que surgiram nas décadas seguintes.

b. Marcos históricos

Em 194112, aconteceu a I Conferência em Saúde, em 1953 apenas, foi criado o MS e (BRASIL, 1953) e foi iniciado o processo de estruturação do SNVS (BRASIL, 1985a).

A partir da década de 50, novos produtos foram desenvolvidos e passaram a ser utilizados nas lavouras como os organofosforados, carbamatos, ditiocarbamatos e os

12 Criada após a estruturação do Ministério da Saúde como sendo o ambiente de convergência entre o

Ministério e os governos estaduais. O relatório Final da Conferência está disponível em: http://conselho.saude.gov.br/biblioteca/Relatorios/relatorio_1.pdf. Acesso: Ago, 2015.

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organomercuriais. A introdução destes novos produtos refletia o processo de tecnificação do campo decorrente da Revolução Verde (ROSSI, 2002).

Assim, além da criação do mercado internacional para os agrotóxicos, desenrolava- se em paralelo outro processo, o de estruturação do monopólio da tecnologia pelos países hegemônicos economicamente (ROSSI, 2002).

Para que os dois processos acontecessem, o apoio dos governos era e foi fundamental, pois os produtos tecnológicos com alto valor agregado e o investimento elevado em pesquisas encareciam a produção e, para que fossem acessíveis aos(as) agricultores(as), eram necessárias medidas como com incentivos fiscais (ROSSI, 2002).

A dependência externa (tanto internacional como da própria propriedade rural em si) nos modos de produção em latifúndios se instaurou, tanto por estar atrelada ao uso intenso de tecnologia, quanto por necessitar da atuação constante de especialistas. Os custos com a tecnologia dependem também da manutenção dos contratos de produção e das demandas de consumo (ROSSI, 2002).

No mesmo período, começaram a se estruturar Políticas de Incentivo a Ciência e Tecnologia (PCT). Em 1951, foram criados o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior (CAPES). A importância destes fatos se dá principalmente por atrelar os financiamentos de pesquisa às entidades governamentais e, portanto, às políticas públicas vigentes no período e ao modo de gestão do governo (SERAFIM, 2015).

Uma delas foi o ‘vinculacionismo’, termo dado para a tentativa de atrelar, por meio das políticas públicas, as pesquisas científicas e os meios de produção e o setor produtivo, ou seja, as pesquisas serem movimentadas de acordo com as demandas das empresas estatais e federais (SERAFIM, 2015).

O próximo marco histórico importante para o estudo dos agrotóxicos ocorreu em setembro de 1962, com a publicação do livro Silent Spring (Primavera Silenciosa) da bióloga Rachel Carson (2010).

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O efeito de seu trabalho refletiu em diversos países levando o debate à cerca do uso dos agrotóxicos a nível internacional e a criação de legislações mais criteriosas e desenvolvimento de novas pesquisas a fim de conhecer o real efeito destas substâncias (CARSON, 2010). Os resultados das então publicadas pesquisas foram incorporados de diversas formas pelos países levando a condutas diferenciadas.

Carson (2010) deu visibilidade aos efeitos adversos da utilização dos agrotóxicos, em particular do DDT, como seu acúmulo e biomagnificação ao longo da cadeia alimentar, decorrente da estabilidade do agrotóxico e seus metabólitos.

Sua característica lipossolúvel permite que se aloje no tecido adiposo do homem e de outros animais, potencializando o risco de causar câncer e danos genéticos. Ou seja, além de matar as “pragas” da lavoura, outras espécies como pássaros, peixes, abelhas também são dizimadas (CARSON, 2010).

Como é uma substância de alta estabilidade, sua toxicidade não é reduzida com a chuva, ao contrário, com ela e também com o vento, pode propagar-se para áreas muito distantes do local de aplicação, o que torna o seu uso ainda mais preocupante, pois os riscos não se restringem a área de uso (CARSON, 2010).

Apesar de já terem sido proibidos há anos, ainda são encontrados resíduos dos agrotóxicos organoclorados no meio ambiente e até no leite humano tanto em amostras analisadas no Brasil como em outros países (MENCK et al., 2015).

Deve-se reiterar que os efeitos nocivos não são mérito apenas desta categoria de agrotóxicos, uma vez que muitos outros têm ainda maior potencial biocida (LONDRES, 2011).

Mesmo assim, os governos que sucederam, incluíram em suas políticas de desenvolvimento nacional linhas de crédito para a compra de agrotóxicos. Durante a Ditatura Militar, a pesquisa para o desenvolvimento econômico passou a ganhar importância com a criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), que direcionava recursos do Tesouro Nacional para este fim (SERAFIM, 2015).

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Neste mesmo período, entre as décadas de 60 e 70, que os impactos da Revolução Verde chegaram de forma mais incisiva na América Latina. Autores como Serafim (2015) falam sobre o panorama mundial que estimulava o uso dos pacotes tecnológicos relacionando o desenvolvimento dos países e a sua capacidade de competir no mercado internacional a estes.

Organizações como a FAO, com estratégias relacionadas ao combate à fome em parceria com o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) e BM influenciaram as políticas para reforçar a adesão aos pacotes tecnológicos (SERAFIM, 2015).

Como o uso de tecnologias no campo é diferente da indústria, por se tratar de um ambiente aberto e com grande interferência do meio – sazonalidade, temperatura, espécies, adaptação, culturas, dentre outros – estudos locais/ nacionais se fizeram necessários. Além disto, a necessidade de investimento era elevada e a maioria dos países não era capaz de arcar com os custos (SERAFIM, 2015).

Assim, redes de cooperação internacional passaram a se formar atuando principalmente com a pesquisa agrícola, institutos e centros internacionais e com os créditos agrícolas de subsídio voltados aos países em desenvolvimento (SERAFIM, 2015). Um dos resultados foi o programa tratado a seguir.

c. Programa Nacional de Defensivos Agrícolas

A principal ação responsável pela massificação do uso dos agrotóxicos no Brasil ocorreu no âmbito do Sistema Nacional de Crédito Rural que vinculou à concessão dos créditos agrícolas a obrigatoriedade da compra de “insumos químicos” em 1965, com isto, de 10 a 15% do valor deveria ser obrigatoriamente destinado à compra dos agrotóxicos (BRASIL, 1965).

A desobediência da regra trazia o risco de perda do financiamento. Como medida de monitoramento, a propriedade poderia ser fiscalizada e a constatação do não uso dos agrotóxicos, também poderia refletir na suspensão do crédito (BRASIL, 1965).

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Em meio a crises econômicas mundiais, principalmente a crise energética pelo aumento do preço do petróleo nos anos que sucederam, o Brasil crescia de forma acelerada e, para manter este padrão entre os anos de governo de 1975 a 1979, foi desenvolvido o II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND II) (BRASIL, 1975b).

Como proposta para o desenvolvimento econômico e inserção do Brasil no mercado internacional, foi escolhido o modelo – que se mantinha desde o período colonial – de exportação de produtos agropecuários, minérios e manufaturados como já dito anteriormente. Para tanto, uma das ações do Estado foi firmar o compromisso da garantia da oferta de “defensivos agrícolas” (agrotóxicos) e fertilizantes e suas matérias primas a preços acessíveis visando à redução da dependência do mercado internacional, além de permanecer com os preços competitivos (BRASIL, 1975b).

Entretanto, vale ressaltar que o ocorrido foi exatamente o oposto, com a proposta de facilitar o acesso aos agrotóxicos, dentre outras tecnologias, o governo cedeu às pressões do monopólio das multinacionais, permanecendo até hoje dependente de produtos e tecnologias importadas (ABRASCO, 2015).

No PND II estão descritas as metas e propostas de políticas que tinham por objetivo expandir as áreas de ocupação brasileira, sendo as principais ações direcionadas às regiões da Amazônia e do Pantanal. Com vistas a promover o desenvolvimento produtivo, com atividades agrícolas e metalúrgicas, este processo levou a expansão da fronteira agrícola para a região do Centro-Oeste e Amazônica (BRASIL, 1975b).

Os resultados se refletem hoje no acelerado processo de desmatamento, na perda de biodiversidade, no desrespeito à soberania da população destas duas regiões, na concentração de terras e renda e na expulsão dos pequenos produtores que não conseguirem competir com os grandes latifúndios (ABRASCO, 2015).

E, ironicamente, as justificativas para estas ações governamentais e das empresas são as mesmas “desenvolvimento econômico e combate à fome”, sendo esta segunda reforçada com a promessa de direcionamento da produção excedente para a população necessitada, o que na verdade, não acontece (LONDRES, 2011).

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Outro aspecto relevante é que a política de subsídio aos agrotóxicos tornou a agricultura nacional dependente desta contribuição. Ao longo dos anos a quantidade, especificidade e a tecnificação da agricultura, além dos monopólios de patentes de produtos, processos e sementes, encareceu os custos da produção até chegar ao patamar de hoje, quando que 30% dos custos do agronegócio é gasto com agrotóxicos (ABRASCO, 2015).

O trecho a seguir, retirado do PND II ilustra contexto político-econômico mundial pós-Revolução Verde e os interesses dos agentes governamentais da época:

“O extraordinário dinamismo do setor não agrícola da economia, em anos recentes, criou condições para tornar viável a modernização agrícola progressiva nas áreas já ocupadas. Tal ocorreu principalmente do ponto de vista da demanda e em especial se considerarmos as oportunidades que a perspectivas mundiais de carência de alimentos estão abrindo” (BRASIL 1975b; P. 27). O trecho traduz como o mercado da fome e o paradigma malthusiano da oferta de alimentos versus crescimento populacional foram utilizados como justificativa para o desenvolvimento da agricultura e pecuária, levando a sua transformação – inclusive na nomenclatura, para agronegócio nos dias de hoje – e permitiram que essas duas áreas fossem transformadas em produtoras de mercadorias para exportação em escala industrial e não mais de alimentos com ênfase principal na soberania alimentar nacional.

Para isto, a compra dos “insumos modernos”, como citado no plano, a preços competitivos foi um dos métodos adotados nesta política (BRASIL, 1975b). Não por outro motivo, o PND II incluía em seu escopo o Programa Nacional de Defensivos Agrícolas (PNDA), projeto que dava incentivos monetários para a criação de empresas nacionais e a instalação no país de multinacionais produtoras de agrotóxicos.

Com este plano, muitas multinacionais instalaram-se principalmente nas Regiões Sul e Sudeste no final da década de 70. Entre os anos 70 e 80, foi implementado o programa para incentivo à produção local que resultou em um salto tecnológico com a síntese de diversas moléculas - com forte atuação da Embrapa, e com isto, 80% do volume demandado de agrotóxicos passou a ser produzido nacionalmente (LONDRES, 2011).

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Apesar de demonstrar que os objetivos do plano foram cumpridos na época, o fato da produção ser nacional não significa que a tecnologia fosse, em sua maioria, de desenvolvimento nacional, o que implica em perpetuação do valor elevado dos produtos.

O valor da produção nacional entre os anos 1964 e 1974 aumentou em torno de 1.120% (passou de US$ 2,3 milhões para US$ 28,1 milhões), com taxa média de crescimento anual de 18,6%. O consumo estimado de inseticidas, fungicidas e herbicidas no mesmo período apresentou crescimento médio anual da ordem de 20% (ROSSI, 2002). Até 1984, o Brasil já era o terceiro maior consumidor mundial de agrotóxicos (LONDRES, 2011).

Isto ocorreu porque os pacotes tecnológicos tinham por base o seguinte tripé: pesquisa, extensão e o credito rural. A pesquisa é a geradora da tecnologia, e por interesse das indústrias internacionais, fica concentrada nelas (LONDRES, 2011).

A extensão rural, setor que o governo brasileiro deu grande ênfase, foi a via de propagação do conhecimento e das técnicas para os produtores. E, por fim, o crédito rural, financia a compra e manutenção dos produtos, como foi o papel do Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR) (LONDRES, 2011).

Ao longo deste processo de intensificação da agricultura no país e aumento da demanda internacional, se viu a necessidade de investir na pesquisa nas ciências agrárias para desenvolver a agricultura adaptada ao Brasil e formar mão de obra especializada capaz de lidar com as tecnologias implementadas no campo. Além disto, outro fator determinante foi o objetivo de internacionalização da economia brasileira proposto pela Ditadura Militar (LONDRES, 2011).

Neste momento, a agricultura tomou uma dimensão no país de setor principal de representação do Brasil nas divisões internacionais de trabalho, ou seja, cresceu mais do que os outros setores, sofrendo grande influência das agências internacionais (SERAFIM, 2015).

Assim, dentro deste contexto de subordinação dos países em desenvolvimento aos países considerados desenvolvidos, apoiado por ações públicas, como a Portaria Interministerial n° 280 (BRASIL, 1970), que tinha por objetivo reformular as políticas e ensino agrícolas para abarcar o pacote tecnológico, financiada pelo governo norte americano.

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d. EMBRAPA

A fim de gerar conhecimentos técnicos à agricultura nacional, a EMBRAPA foi criada em 1972 vinculada ao MAPA (BRASIL, 1972). Tal empresa tem como objetivo:

“Promover, estimular, coordenar e executar atividades de pesquisa, visando à produção de conhecimentos e tecnologia para o desenvolvimento agrícola do país além de fornecer apoio técnico e administrativo a órgãos do Poder Executivo, com atribuições de formulação, orientação e coordenação das políticas de ciência e tecnologia no setor agrícola” (BRASIL, 1972).

Uma de suas principais atuações foi desenvolvida em parceria com Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMBRATER), segmento da empresa que tem como principal objetivo de “modernizar” o agricultor e a agricultura. Em 20 anos, a extensão rural passou de 10% para 77,7% a sua atuação nacional (EMBRAPA, 2015). Obviamente, como a extensão esteve vinculada ao crédito rural, todos os agricultores que não aderiram aos pacotes tecnológicos foram excluídos da política.

A empresa conta com apoio de instituições de pesquisa nacionais e internacionais, como universidades e empresas, e com sua atuação dependente do Estado, principalmente através de convênios para pedidos de financiamento (EMBRAPA, 2015).

Atingiu tamanha dimensão que, atualmente, emprega quase 10 mil funcionários e atua em praticamente todas as áreas relacionadas à agricultura e pecuária. Suas principais linhas de pesquisa e investimento são nas áreas de desenvolvimento de inseticidas, alimentos transgênicos, biocombustíveis, bioinseticidas, biossegurança (EMBRAPA, 2015).

As principais empresas internacionais parceiras destas mesmas pesquisas têm suas sedes nos países que mais importam as commodities produzidas no Brasil (China, Alemanha e Estados Unidos) (EMBRAPA, 2015).

Não é por acaso que os mesmos países que são os maiores consumidores dos produtos brasileiros e maiores investidores como financiadores de pesquisas são também a sede das empresas fornecedoras das sementes e dos agrotóxicos mais consumidos para a produção dos transgênicos no Brasil (soja, milho). Tratam-se de transnacionais como a Basf, a Bayer e a Monsanto, segundo relatado no site da própria empresa (EMBRAPA, 2015).

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Ou seja, esta relação resulta no perfil econômico e agrário que vivenciamos no país que se porta como um importador de tecnologia de alto valor agregado (tecnologia de agrotóxicos e sementes transgênicas) e exportador destas commodities alimentares que possuem baixo valor agregado. Segundo o site da empresa,

“No início da década de 1970, a inclusão dos fertilizantes na agricultura brasileira viabilizou a exploração agrícola contínua numa

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