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Intoxicação do(a) trabalhador(a) rural por agrotóxicos : (sub)notificação e (in)visibilidade nas políticas públicas

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

Faculdade de Ciências Aplicadas

VANESSA FRACARO MENCK

INTOXICAÇÃO DO(A) TRABALHADOR(A) RURAL POR AGROTÓXICOS: (sub)notificação e (in)visibilidade nas políticas públicas

LIMEIRA

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VANESSA FRACARO MENCK

INTOXICAÇÃO DO(A) TRABALHADOR(A) RURAL POR AGROTÓXICOS: (sub)notificação e (in)visibilidade nas políticas públicas

Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências Aplicadas da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Mestra em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, área de concentração Modernidade e Políticas Públicas.

Orientadora: Profa. Dra. JULICRISTIE MACHADO DE OLIVEIRA Co-orientadora: Profa. Dra. MILENA PAVAM SERAFIM

Limeira

LIMEIRA Fevereiro, 2016

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DO TEXTO DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDO POR VANESSA FRACARO MENCK E ORIENTADO PELA PROFA. DRA. JULICRISTIE MACHADO DE OLIVEIRA.

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VANESSA FRACARO MENCK

INTOXICAÇÃO DO(A) TRABALHADOR(A) RURAL POR AGROTÓXICOS: (sub)notificação e (in)visibilidade nas políticas públicas

Comissão Julgadora:

________________________________________________ Orientadora: Profa. Dra. Julicristie Machado de Oliveira

________________________________________________ Banca Examinadora: Profa. Dra. Larissa Mies Bombardi

________________________________________________ Banca Examinadora: Prof. Dr. Oswaldo Gonçalves Junior

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, Ricardo e Maristela e ao meu irmão Caio, pelo suporte, amor e carinho. Sem vocês, este trabalho não existiria.

A minha orientadora Julicristie pelo companheirismo, dedicação e paciência durante os três anos que trabalhamos juntas. E pelas risadas e estudos nas estradas, agroflorestas, hortas e restaurantes vegetarianos.

A minha co-orientadora Milena Pavan, por sua contribuição que foi essencial para o desenvolvimento deste trabalho.

A professora Larissa Bombardi, pelos incentivos, elogios, críticas, por toda a bibliografia que me possibilitou interpretar os resultados obtidos após a qualificação. E principalmente por ser um exemplo e inspiração.

Ao professor Oswaldo, por me fazer olhar de forma diferente para o trabalho, por todas as suas sugestões e por me ajudar a deixar a sua leitura mais acessível.

Aos professores do ICHSA, principalmente ao Eduardo Marandola, pelo suporte e empenho na criação deste programa. As aulas, debates e orientações tanto dentro como fora de sala de aula foram fundamentais para o meu desenvolvimento como pesquisadora.

Aos companheiros de sala, especialmente para o Tiago De Paula, Tiago Guioti e Rafael Bastos, pelos inúmeros cafés, cervejas, prosas e risadas. E também, por todas as ansiedades, medos, duvidas e inseguranças que compartilhamos e vencemos juntos.

Ao Professor Dennys Cintra, por me mostrar que é possível (e necessário) fazer política dentro da nossa profissão. E por me ajudar a dar os primeiros passos nessa caminhada.

Aos meus amigos: Gabriel Falcini, Aline Ruffi, Andrea Garbin, Gabriela Freire, Lucas Barbosa, Lucas Fagundes, Luis Godoi, Rodolfo Marinho. Sem vocês meus dias não teriam sido tão alegres.

As mulheres da minha vida Raira, Gabriela, Jessica, Carol, Marô, Giulliana e Priscila que me acompanham e torcem por mim desde o jardim de infância.

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RESUMO

O(a) trabalhador(a) rural está exposto(a) de forma ocupacional aos agrotóxicos por ser o(a) manipulador(a) dos produtos e por normalmente residir próximo(a) aos locais de pulverização. Assim, é possível identificar os efeitos nocivos na saúde desta população de forma mais evidente. Os agrotóxicos têm efeitos nocivos a curto, médio e longo prazos na saúde, associando-se a câncer, infertilidade e outras doenças crônicas não transmissíveis. Ao considerar a representatividade no agronegócio na economia brasileira, que emprega o uso massivo destas substâncias, além da contundente ação das indústrias que os produzem mundialmente, o debate ultrapassa as ações em saúde. Envolvem também as intersecções relacionadas à economia, agronomia, educação, reforma agrária, trabalho, dentre outras. O objetivo desta dissertação, portanto, é entender como a questão das intoxicações por agrotóxicos em trabalhadores(as) rurais é reconhecida pelos diferentes atores governamentais, tais como Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), Ministério da Saúde (MS), Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), por meio de suas legislações e políticas públicas, e atores não-governamentais, como os movimentos sociais envolvidos com a discussão da reforma agrária, agricultura familiar e agroecologia. Ademais, há o intuito de entender o fluxo de informação dos registros das intoxicações, ou seja, se estes fomentaram/embasaram as políticas públicas como dados epidemiológicos ou se o aumento na qualidade/quantidade dos registros ocorre pela maior visibilidade pelas próprias políticas públicas entre os anos 2001 e 2015. A partir da análise dos documentos, foi possível identificar que a ênfase principal das ações, relacionadas tanto aos agentes governamentais como aos não governamentais, quanto ao uso dos agrotóxicos permeia as questões dos alimentos contaminados, dos direitos do consumidor e da importância econômica destes produtos, além de sua necessidade para ações de combate a fome. Os(as) trabalhadores(as) rurais aparecem pela primeira vez em documentos de maior visibilidade e em ações de movimentos sociais advindas de pesquisadores ativistas, como no filme “O veneno está na mesa” e, posteriormente, no Dossiê da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO). Nas políticas públicas, há uma discrepância de interesses e visões quanto ao tema, visto que o MAPA tende a defender o uso dos agrotóxicos e negligenciar o(a) trabalhador(a) rural. Já o MS e o MDA tenderam a privilegiar ações a partir de 2011 com atenção a saúde dos(as) trabalhadores(as), com aprimoramento dos sistemas de notificação e com políticas de incentivo a

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saúde e dignidade no campo - Política Nacional de Saúde Integral das Populações do Campo e da Floresta (PNSIPCF). Foi possível observar que as ações advindas dos pesquisadores considerados ativistas se fez importante para o aumento da visibilidade e fomento as ações direcionadas ao(a) trabalhador(a) rural nas políticas públicas.

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ABSTRACT

Rural workers are exposed to pesticides, firstly for handling the products and secondly because usually they live close to spray sites. Thus, it is possible to identify the harmful health effects in this population more clearly. Pesticides have harmful effects in the short, medium and long-term health, associated with cancer, infertility and other non transmissible chronic diseases, which should be enough to lead to actions through public policies to prevent, restrict or prohibit effectively their use. When considering the importance of the agribusiness in the Brazilian economy, which makes a massive use of these substances, in addition to the strong action of the pesticides industries in the world, debates go beyond health actions. They also involve intersections related to economy, agronomy, education, land reform, and work, among others. Therefore, the aim of this study is to understand how the issue of pesticide intoxication in rural workers has been treated by different state instances such as the Ministry of Agriculture, Livestock and Supply (MAPA), Ministry of Health (MS) Ministry of Agrarian Development (MDA) and Ministry of Social Development and Hunger Alleviation (MDS), through its legislation and public policies, and by non-governmental actors such as social movements involved with the discussion of land reform, family farming and agroecology. Moreover, there is an intention to understand the flow of information from the records of intoxication, that is, if they have fomented/ supported public policies such as epidemiological data or if the growth in quality/ quantity of the records is due to the greater visibility into public policies from the years 2001 to 2015. From the analysis of the documents, it has been observed that the main emphasis of the actions related to the use of pesticides, both from government and nongovernmental agents, permeates issues of intoxicated food, consumer rights and economic importance of these products as well as actions to fight hunger. Rural workers first appear in high profile documents of social movements actions arising from activist researchers such as in the documentary "The poison is on the table" and later in the Dossier from the Brazilian Association of Collective Health (ABRASCO). There is discrepancy of interests and opinions in public policy regarding this subject, since MAPA tends to defend the use of pesticides and to neglect the rural worker. From 2011, MS and MDA showed a tendency to privilege actions which benefited workers health, with the improvement of reporting systems and incentive policies to workers health and dignity in the country field. It has been observed that amongst the social players, including social movements, attention has been directed to the

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contaminated food and that the resulting actions from researchers considered activists has become important for increasing the visibility and to promote actions in benefit of rural workers in public policies.

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Intoxicações por agrotóxicos de uso agrícola por sexo registrado no SINITOX...44 Tabela 2: Valores de registro Brasil e Estados Unidos...76

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Competências dos ministérios do CTA...73

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EPÍGRAFE

“É imperioso escrever contra a desigualdade. Denunciar a injustiça e a opressão não é uma preocupação anti-intelectual, ingênua e antiquada. Pelo contrário, trata-se, intelectualmente, de uma tarefa histórica vital, porque a globalização tornou-se sinônimo de intervenção militar, de uma pobreza gerada pelo mercado, e de destruição ecológica. É impossível perceber o que se passa onde quer que seja se não prestar atenção às dinâmicas de poder que, por toda a parte, moldam a desigualdade”.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABA - Associação Brasileira de Agroecologia ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva

AGAPAN - Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (AGAPAN) AGROFIT - Sistema de Agrotóxicos Fitossanitários

ANDEF - Associação Nacional de Defesa Vegetal ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária BHC - Hexaclorocicloexano

BM - Banco Mundial

CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior CCT - Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática CIAT - Centro de Informações e Assistência Toxicológicas

CIT - Centro de Informações Toxicológicas

CNPQ - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico COMSEA - Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional CONSEA - Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional CONTAG - Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura CTA - Comitê Técnico de Assessoramento para Agrotóxicos

CTNBIO - Comissão Técnica Nacional de Biossegurança DDT - Diclorodifeniltricloroetano

DEFRA - Food and Rural Affairs da Inglaterra DF - Distrito Federal

DHAA - Direito Humano a Alimentação Adequada

EMBRAPA - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

EMBRATER - Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural EPI - Equipamento de Proteção Individual

FAO - Food and Agriculture Organization FII - Ficha Individual de Investigação

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14 FIOCRUZ - Fundação Oswaldo Cruz

FNDCT - Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico GTZ - Gellschaft für Technische Zusammenarbeit

GVS - Guia de Vigilância em Saúde

IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais ICMS - Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços

IDEC - Instituto de Defesa do Consumidor

INAN - Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição INAN - Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição INCA - Instituto Nacional de Câncer José de Alencar LMR - Limites máximos de resíduos

MAPA - Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento MAS - Ministério da Assistência Social

MCT - Ministério da Ciência e Tecnologia MDA - Ministério do Desenvolvimento Agrário

MDS - Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome MEAF - Ministério Extraordinário para Assuntos Fundiários MERCOSUL - Mercado Comum do Sul

MESA - Ministério Extraordinário de Segurança Alimentar e Nutricional MF - Ministérios da Fazenda

MIRAD - Ministério da Reforma e do Desenvolvimento Agrário MMA - Ministério do Meio Ambiente

MPA - Movimento dos Pequenos Agricultores MS - Ministério da Saúde

MST - Movimento dos Trabalhadores Sem Terra OGM - Organismos Geneticamente Modificados OMS – Organização Mundial da Saúde

ONG - Organização Não Governamental

ONU - Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura OPAS - Organização Pan-americana de Saúde

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15 PAA - Programa de Aquisição de Alimentos

PAN - Pesticide Action Network

PARA - Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos PAVS - Plano Integrado de Ações de Vigilância em Saúde

PCT - Políticas de Incentivo a Ciência e Tecnologia PIB - Produto Interno Bruto

PLANAPO - Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica PNAN - Política Nacional de Alimentação e Nutrição

PNATER - Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural PNB - Política Nacional de Biossegurança

PNB - Política Nacional de Biossegurança

PND II - Plano Nacional de Defensivos Agrícolas II PNDA - Programa Nacional de Defensivos Agrícolas PNS - Plano Nacional de Saúde

PNSIPCF - Política Nacional de Saúde Integral das Populações do Campo e da Floresta PPA - Plano Plurianual

PROCON - Fundações de Proteção e Defesa do Consumidor

PRONAF - Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar PT - Partido dos Trabalhadores

PUC-RJ - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ)

RENACIT - Rede Nacional de Centros de Informação e Assistência Toxicológica RET - Registro Especial Temporário

SAI - Sistema de Informações sobre Agrotóxicos SAN - Segurança Alimentar e Nutricional SES - Secretarias Estaduais de Saúde

SIAB - Sistema de Informação da Atenção Básica SIH-SUS - Sistema de Informações Hospitalares do SUS SIM - Sistema de Informação Sobre Mortalidade

SINAN - Sistema de Informação e Agravos de Notificação SINDAG - Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola

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16 SINITOX - Sistema Nacional de Informações Tóxico Farmacológicas

SNCR - Sistema Nacional de Crédito Rural SUS - Sistema Único de Saúde

SVNS - Sistema Nacional de Vigilância Sanitária UFMT - Universidade Federal de Mato Grosso UNB - Universidade de Brasília

US-EPA - United States Environmental Protection Agency VIGISUS - Sistema Nacional de Vigilância em Saúde

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SUMÁRIO

Introdução...19

1. Revisão de literatura...19

a. O agronegócio e o sistema alimentar...22

b. Agrotóxicos, saúde e o(a) trabalhador(a) rural...25

c. Alimentos Transgênicos...28

d. Distribuição dos Riscos e fiscalização...29

2. Objetivos...31

3. Caminho Metodológico...32

CAPÍTULO 1 – O contexto das intoxicações por agrotóxicos de uso agrícola: Uma revisão bibliográfica dos estudos...38

1. Os sistemas de notificação...39

2. Revisão Bibliográfica...41

a. Metodologia...42

b. Caracterização dos Estudos...42

c. Síntese dos resultados encontrados...43

i. Origem das Intoxicações...45

ii. Fatores de Risco...46

iii. Registros das Intoxicações...47

d. Principais dificuldades encontradas pelos autores nos estudos...50

e. Sugestões dos autores para melhoria dos dados...53

CAPÍTULO 2: A legislação dos agrotóxicos, as políticas públicas, os guias de vigilância epidemiológica...57

1. As primeiras leis e o Programa Nacional de Defensivos Agrícolas...57

a. Regulamento de Defesa Sanitária Vegetal...59

b. Marcos Históricos...60

c. Programa Nacional de Defensivos Agrícolas...63

d. EMBRAPA...67

e. Início das proibições...69

f. A Lei dos Agrotóxicos...74

i. Devolução de Embalagens...79

ii. Receituário Agronômico...79

iii. Responsabilidade penal e treinamento técnico...81

iv. Publicidade...82

2. Os Guias de Vigilância Epidemiológica e os Sistemas de Notificação...83

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i. Guia de Vigilância Epidemiológica – 4ª Edição...86

3. Criação a ANVISA...88

CAPÍTULO 3 – Política, desenvolvimento e os agrotóxicos...90

1. Agrotóxicos, intoxicações e saúde durante o governo Lula (2003 – 2010)...90

a. Coligação Lula Presidente e as eleições 2002: propostas de governo...90

i. Vida Digna no Campo e Saúde da Família Brasileira...91

b. Projeto Fome Zero...93

i. A criação do projeto...93

ii. A implementação...95

c. Programa de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos...96

d. Primeiro Mandato e Plano Plurianual 2004 a 2007...101

e. Segundo Mandato e Plano Plurianual 2008 a 2011...108

2. Contradições nas políticas públicas: O governo Dilma (2012 – 2015)...111

a. Proposta (2010), governo e Plano Plurianual 2012 -2015...111

3. Os movimentos sociais...117

a. Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e a Favor da Vida ...119

b. Dossiê ABRASCO: Um alerta sobre os impactos dos Agrotóxicos na Saúde...120 c. Posicionamento CONSEA...121 d. Posicionamento INCRA...121 4. Pesquisa ativista...122 5. Conclusões...127 Referências Bibliográficas...131 ANEXOS ANEXO 1: Glossário...144

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INTRODUÇÃO 1. Revisão de Literatura

O processo de ocupação e distribuição de terras no Brasil teve um caráter problemático desde a sua colonização, iniciando com as capitanias hereditárias1 e as sesmarias2. Ambas representavam a doação de grandes áreas de terra com concessão de poder político e administrativo para poucos donos com a principal finalidade de produção de alimentos ou exploração de matérias primas para abastecer o mercado europeu (OLIVEIRA, 2010).

Essa característica se perpetuou no país, favorecendo a concentração de terras e as diferenças entre as classes. Com a sanção da Lei das Terras em 1850, ainda no Império, milhares de escravos recém-libertados foram impossibilitados de ter acesso à terra, deixando-os sujeitos ao que lhes seria oferecido como trabalho (BRASIL, 1980).

Esse processo favoreceu os latifundiários no período contemporâneo de muitas formas, tanto com a concessão de registros de grandes extensões de terra, como através de políticas públicas que deram pouca ou nenhuma atenção aos menores produtores e aos(as) trabalhadores(as) rurais contratados. Assim, ainda hoje existem privilégios aos grandes grileiros, fazendo com que ocorra a perpetuação do processo de desigualdade social em todas as regiões brasileiras (OLIVEIRA, 2010).

As importantes transformações que ocorreram no campo brasileiro, intensificadas após a Revolução Verde3, mudaram profundamente o cenário do trabalho no campo. Estas mudanças levaram a um aumento significativo dos movimentos sociais em busca de melhor qualidade de vida e das condições de trabalho (muitas vezes precárias e prejudiciais à saúde, como veremos adiante) e da luta pela reforma agrária (SHIVA, 2004; MENDONÇA, 2013).

Durante o processo de internacionalização da economia brasileira, a agricultura passou a incorporar traços mais marcantes do capitalismo, culminando no modelo atual de agronegócio. As mudanças advindas dos preceitos da Revolução Verde se firmaram a partir de acordos econômicos

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com os países centrais. Isto é, estes delineavam os pacotes tecnológicos e as medidas governamentais para os países fragilizados com a dívida externa, com ênfase na exportação (MENDONÇA, 2013).

No caso do Brasil, o modelo escolhido foi a exportação de commodities alimentares4 por grande influência de instituições internacionais (OLIVEIRA, 2008). Desta forma, houve uma a rápida expansão da produção agrícola para exportação em detrimento dos alimentos tradicionais voltados ao mercado interno (GUIVANT, 2001).

A rápida expansão da produção de laranja nas décadas de 70 e 80, e, mais recentemente, a da Soja, são alguns dos exemplos que mostram o grande impacto no consumo alimentar da população, pois também são traçadas estratégias que estimulam o consumo no mercado interno destes produtos (OLIVEIRA, 2010).

A agricultura e a indústria se entrelaçaram devido a incorporação de tecnologias, tais como a utilização de maquinários, aceleradores de crescimento e agrotóxicos que levaram a uma drástica redução de mão de obra e da variedade de alimentos produzidos (SERAFIM, 2015; SHIVA, 2004; GUIVANT, 2001).

Por meio de políticas públicas, o governo concedeu privilégios aos grandes produtores para a exportação das commodities alimentares e importação de tecnologia (SHIVA, 2004; GUIVANT, 2001), na maior parte matérias-primas, como soja, milho e algodão (SINDAG, 2012).

Segundo Serafim (2015), a introdução da lógica capitalista na agricultura foi apenas o reflexo da afirmação do capitalismo como modo de produção dominante:

“A partir desse momento, teve início uma trajetória tecnológica orientada fundamentalmente por uma única variável – a produtividade – em detrimento de outras, como a preservação ambiental, a valorização de conhecimentos tradicionais e o controle do trabalhador sobre o processo produtivo. Como uma espécie de “efeito colateral”, essa trajetória, com suas características particulares, viabilizou uma forma particular de organizar a produção agrícola – que culminou no “agronegócio” – ao mesmo tempo em que impôs significativas barreiras ao avanço de outras formas de produzir (SERAFIM, 2015; p. 24) ”.

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Neste modo de produção hegemônico do agronegócio, o alimento é visto como uma mercadoria e não mais como um substrato essencial para o consumo humano (GUIVANT, 2001).

Este modelo foi embasado em parte na teoria Malthusiana (1798), o qual considerava que, com o crescimento populacional, a produção de alimentos não seria suficiente. Porém, quando Malthus descreveu sua teoria, antes da Revolução Industrial, ele não contava com o intenso desenvolvimento tecnológico que levaria a produção de alimentos a níveis muito maiores do que a necessidade mundial de consumo (BARBIERI, 2013).

No entanto, quando o agronegócio foi adotado como modelo de desenvolvimento econômico, a sua produção passou a ser destinada principalmente para a produção de biocombustível e ração animal e não para consumo alimentar (AZEVEDO, 2009).

A tecnologia trazida pelos países industrializados, não inclui apenas máquinas e agrotóxicos, mas também as sementes, o que significa que a produção de alimentos passa a ser ditada pela demanda do mercado internacional, causando grande impacto na cultura alimentar regional e na soberania alimentar nacional (AZEVEDO, 2009).

Na dinâmica do capital, em que não se produz para a necessidade, mas sim para alimentar um sistema que visa sua eterna expansão, a demanda por novas substâncias, novos métodos e novas mercadorias não tem fim (MÉSZÁROS, 1998). Diferente da capacidade de resiliência do meio ambiente e da saúde humana, que é limitada.

Neste modelo, o meio ambiente é intensamente degradado de forma rápida e insustentável – quer seja pela exploração dos recursos, quer seja por gerar pragas cada vez mais resistentes, que demandam um número maior de aplicações, substâncias cada vez mais fortes e a combinação de múltiplos produtos (SHIVA, 2004).

As consequências não se restringem às áreas de produção, pois os impactos e resíduos das substâncias utilizadas no sistema agroalimentar não permanecem apenas nos locais de aplicação (BECK, 2010). Por meio da água (chuva, rios, lençóis freáticos), solo e ar, os agrotóxicos, os metais pesados, e outras substâncias, se espalham pelo mundo globalizado (CHAIM, 2003).

Para compreender a profundidade do problema gerado pelo uso dos agrotóxicos, é necessário entender a transição política, econômica e social que ocorre no período denominado por

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Giddens (1991) de pós-modernidade. Período este que se diferencia da modernidade pela desconfiança nos sistemas peritos, pois o paradigma de controle dos efeitos produzidos pela sociedade no ambiente ultrapassa as barreiras do conhecimento.

Os sistemas peritos são os sistemas de excelência técnica ou competência profissional que se organizam em grandes áreas de conhecimento. Ou seja, aqueles profissionais ou especialistas, como médicos, engenheiros agrônomos e economistas, que são consultados pelas pessoas (GIDDENS, 1991).

Segundo o autor, havia uma fé cega nos peritos, não questionando seus métodos. Com o surgimento dos resultados sobre os impactos ambientais ocasionados pela industrialização, passou-se a questionar o sistema (GIDDENS, 1991).

Portanto, a crença no controle por meio dos métodos científico-tecnológicos é percebida como falha. Ademais, passa a ser notório que os riscos5 e perigos6 das ações humanas transpõem as barreiras locais, tendo alcance mundial (GIDDENS, 1991).

Por conseguinte, surgem uma série de incertezas e desconfianças em relação aos sistemas peritos (GIDDENS, 1991), que, internamente, também estão permeados por divergências de opiniões e conflitos de interesses (GUIVANT, 2001). Como por exemplo, observamos as divergências de opinião que existem entre os ministérios na questão do plantio de alimentos transgênicos. Ademais, as instituições científicas envolvidas nas análises também passam a ser questionadas.

a. O agronegócio e o sistema alimentar

O modelo do agronegócio foi internacionalizado com a globalização o que gerou maior especialização nos monocultivos, além de mudanças na divisão internacional do trabalho, onde “partes do mesmo produto” são produzidas em diversas partes do mundo. Países menos desenvolvidos produzem mercadorias de menor valor agregado e importam produtos de alta

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tecnologia. Os Estados são os principais facilitadores de concessões de financiamentos para o agronegócio e impulsionando-o nos setores do capital financeiro (MENDONÇA, 2013).

As recentes alterações na legislação ambiental aumentaram a permissividade para a exploração dos recursos naturais e ampliaram as fronteiras de cultivo, favorecendo o avanço do agronegócio, em especial em áreas com maior infraestrutura (MENDONÇA, 2013).

O agronegócio representa hoje entre 30% e 40% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, pois inclui toda a cadeia de produção, ou seja, desde o controle da matéria prima, insumos, indústria, circulação de mercadorias, até a especulação do capital financeiro (MENDONÇA, 2013). Os créditos comerciais, públicos e privados, são considerados indispensáveis para o desenvolvimento e avanços tecnológicos do agronegócio, pois proporcionam preços competitivos das commodities direcionadas para a exportação (MENDONÇA, 2013).

No entanto, em diversos momentos, o apoio financeiro prestado pelo Estado superou os lucros gerados pelo agronegócio; ou seja, o governo investiu mais dinheiro do que o próprio lucro gerado pelo setor (MENDONÇA, 2013).

O agronegócio atua, portanto, em desacordo com o meio ambiente gerando problemas políticos, econômicos e sociais no Brasil. Em contrapartida, a agricultura camponesa7 e/ou do(a) agricultor(a) familiar, atua de forma diferente: em escalas menores e locais e com maior simbiose com a natureza (FOLGADO, 2013).

Vinculada a valores tradicionais e regida pela relação homem – terra – família – trabalho, a agricultura camponesa não se atém apenas ao lucro gerado pela produção (WOORTMANN, 1990). Tende a buscar o maior valor agregado aos seus produtos, mesmo em menores quantidades. Em contrapartida, o agronegócio, que regido por conceitos de mais valia, busca formas de produção em quantidade, mesmo que haja a redução do valor agregado e da qualidade do produto (PLOEG, 2008).

Já no caso da agricultura familiar, a família, proprietária dos meios de produção, relaciona-se dentro do ambiente de trabalho, assume os meios de produção (WANDERLEY, 1996), e possui, portanto, particularidades, singularidades e relações sociais e com a terra diferenciadas (CARNEIRO, 1999).

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Ademais, a visão destes em relação aos(às) trabalhadores(as) contratados é diferente, pois a própria família trabalha na terra (WANDERLEY, 1996). A exposição intencional e descriteriosa dos(as) trabalhadores(as) a substâncias e meios de trabalho nocivos não ocorre da mesma forma que nos latifúndios, pois são relações sociais e culturas são diferentes.

Apesar de a agricultura familiar e a agricultura camponesa parecerem muitas vezes obsoletas em seu modelo de produção, os(as) trabalhadores(as) envolvidos e agricultores(as) familiares atuam de forma importante no mercado, pois são responsáveis por 70% dos alimentos produzidos para consumo no Brasil (BRASIL, 2015a).

É considerado trabalhador rural: “toda pessoa física que, em propriedade rural presta serviços de natureza não eventual a um empregador rural, sob a dependência deste e mediante salário” de acordo com a Lei nº 5.889/73 (BRASIL, 1973).

A agricultura familiar conta com apenas 14% do credito oficial destinado ao setor e possui apenas 25% da terra cultivada no país, mesmo assim, emprega quase 80% dos(as) trabalhadores(as) rurais (BRASIL, 2015b).

Portanto, os(as) camponeses(as) são os grandes responsáveis pela garantia da soberania alimentar. Para esta classe, a produção e o lucro são primordialmente para o sustento da família, pois seu território é seu espaço de vida. Por isto, tendem a cuidar melhor do ambiente e se preocupar mais com a qualidade de vida dos(as) trabalhadores(as) (FOLGADO, 2013; BRASIL, 2014). O que não significa que não façam uso de agrotóxicos e outras tecnologias.

As ações realizadas, por meio das políticas públicas, fortaleceram a indústria por priorizarem as suas necessidades neste processo, onde foram concedidos privilégios a grupos sociais específicos que integram as redes de exportação. Consequentemente, os(as) camponeses(as) e trabalhadores(as) rurais ficaram como secundários nas políticas públicas (IAMAMOTO, 2005).

Assim, os camponeses e agricultores familiares foram inseridos em uma situação de competição desleal por conta do tamanho das áreas de produção, capacidade de investimento (tanto nas tecnologias empregadas como em mão de obra especializada) que possuíam os grandes agricultores (IAMAMOTO, 2005).

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Já os(as) trabalhadores(as) rurais passaram a responder a uma nova lógica: menos postos de trabalho, alta taxa de informalidade, além de estarem expostos(as) diariamente aos agrotóxicos e a toda poluição ambiental (IAMAMOTO, 2005).

b. Agrotóxicos, saúde e o(a) trabalhador(a) rural

Ao alterar a relação entre o homem e o campo (regida pelo tempo natural de produção dos alimentos, clima, simbiose entre espécies) com o uso de agrotóxicos, o ambiente torna-se inóspito e as consequências na saúde do(a) trabalhador(a) rural se manifestam de forma aguda (intoxicações) ou crônica (câncer, infertilidade, doenças respiratórias, hepáticas e até a morte) (GIDDENS, 1991).

As intoxicações agudas são mais facilmente diagnosticadas e compõem a maioria dos dados presentes nos sistemas de notificação brasileiros (BOMBARDI, 2013; FARIA; 2007). No entanto, de acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), para cada caso notificado de intoxicação, outros 50 não são inseridos nos sistemas (PERES, 2001 apud OMS, 1995).

Segundo Ribeiro Neto (2002), os 50 produtos com princípios ativos de maior toxicidade mais utilizados no Brasil já foram proibidos em quase todos os países do mundo. Inclusive, muitos destes produtos também são utilizados nas cidades de forma constante e por longo período, ignorando as distâncias de segurança em relação aos locais de pulverização. Dentre eles, está o produto Roundup (mata-mato) cujo princípio ativo é o Glifosato (RIBEIRO NETO, 2002).

Em estudo realizado por Bedor (2009) no Vale do São Francisco, observou-se que 37% dos produtos utilizados pelos agricultores são classificados como extremamente ou altamente tóxicos para o homem, segundo a classificação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). E 42% são considerados muito perigosos para o ambiente, segundo o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (IBAMA).

O(a) trabalhador(a) rural se expõe aos agrotóxicos em todas as etapas de produção: compra, transporte, preparo e manipulação do produto, fase onde a exposição se dá de forma mais crítica e intensa (PIGNATI, 2007).

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O preparo e a aplicação dos agrotóxicos são atividades predominantemente masculinas. As mulheres, apesar de normalmente terem o contato direto com os biocidas, estão expostas a eles de forma indireta principalmente (PREZA, 2012).

Ficam expostas nas atividades domésticas, auxiliando na higienização das roupas e Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), e nas atividades que realizam no campo como capinação manual e plantio e colheita de hortaliças e, apesar de não aplicarem o agrotóxico, trabalham na terra onde ele foi pulverizado (PIGNATI, 2007).

Em regiões como o Nordeste, as atividades agrícolas estão intensamente ligadas a fruticultura, setor onde predomina a mão de obra das mulheres, há grande incidência de agravos como câncer de pulmão, leucemia, doenças hepáticas e câncer de ovário, que podem ter sido ocasionados pela exposição ocupacional destas mulheres aos agrotóxicos (BEDOR, 2009).

O uso dos agrotóxicos também prejudica a saúde das famílias que moram ao lado ou muito próximas às plantações e/ou locais de armazenamento dos alimentos, além de contaminar as plantações vizinhas (PIGNATI, 2007). O mesmo autor, na afirmação abaixo, discorre sobre o uso destes produtos com uma abordagem bem crítica:

“É interessante observar que a aplicação de agrotóxicos é, provavelmente, a única atividade em que a contaminação do ambiente de trabalho é intencional. Entretanto, o mais grave disto é que na agricultura o ambiente de trabalho é o próprio meio ambiente. Portanto, se contaminam o trabalhador, a própria produção e o meio ambiente (PIGNATI, 2007; p. 107-108)”.

As dificuldades de percepção (ou negação) dos riscos da utilização destes produtos, tanto por parte dos(as) agricultores(as) quanto pelos diversos setores governamentais, especialistas e também dos(as) trabalhadores(as) rurais perpetuam sua utilização massiva e inapropriada (PIGINATI, 2007).

A baixa escolaridade e a ausência de assistência técnica também são fatores preocupantes, pois deixam os agricultores ainda mais vulneráveis as intoxicações (PERES, 2004; PREZA, 2012). Além disto, a percepção do risco do uso dos agrotóxicos é afetada por outros fatores socioeconômicos que dificultam o entendimento dos(as) trabalhadores(as) e a assimilação das informações trazidas pelos peritos, neste caso, engenheiros agrônomos (PIGNATI, 2007).

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A forma e aplicação dos produtos também é errônea, seja pela quantidade utilizada ou pela escolha inadequada do produto, como é relatado anualmente pelos relatórios do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA) da ANVISA, desde a sua criação em 2009 (BRASIL, 2009a).

É possível que a percepção de risco dos agrotóxicos seja realmente inapropriada, haja vista que, mesmo reconhecendo o perigo, os agricultores não cumprem as medidas de segurança e de proteção à saúde (PREZA, 2012).

No entanto, mesmo com informações técnicas disponíveis, a comunicação entre profissionais e trabalhadores(as) nem sempre é eficaz por diferenças culturais e econômicas. A não incorporação dos riscos pelo(a) agricultor(a) pode estar relacionada à forma como a informação foi discutida com ele(a) e não a sua capacidade de entendimento (PREZA, 2012; GUIVANT, 2001).

Além disto, a população que trabalha no campo tende a ter atitudes de negação do risco. O que pode ser uma forma de lidar com o medo gerado perante os riscos inerentes gerados a esta atividade (PREZA, 2012).

Quando se considera o sistema econômico, a transformação do homem e de todos os elementos da natureza em custo, matéria prima, subsídios para a produção para venda e geração de lucros de empresas privadas exploradoras, a reflexividade8 é essencial para questionar a origem dos produtos e seus impactos socioambientais, mas sem individualizar a culpa e nem diluí-la na sociedade (GIDDENS, 1991).

Oliveira-Silva (2001) estimou que 360.000 casos de intoxicações são esperados ao ano em trabalhadores(as) rurais no Brasil. A gravidade é ainda maior, quando dados da OMS revelam que 70% das intoxicações que ocorrem são ocupacionais (OPAS, 1997).

O Estado, por ser dependente da arrecadação de recursos por meio dos impostos, tende a ser negligente em suas ações com política permissivas. A influência do lobby destas empresas nos processos decisórios, bem como no financiamento de campanhas políticas, culminou na estruturação da bancada ruralista no Brasil que se manifesta de forma muito forte e favorável em relação ao uso dos agrotóxicos e a produção de alimentos transgênicos, por exemplo.

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c. Alimentos Transgênicos

A entrada dos alimentos transgênicos movimentou ainda mais as discussões sobre os riscos e gerou novas desconfianças para o uso dos agrotóxicos na agricultura. Os alimentos transgênicos são organismos que foram geneticamente modificados (OGM) para serem produzidos combinados com algum agrotóxico (GUIVANT, 2001).

O discurso contrário ao plantio de alimentos transgênicos, trata principalmente de argumentos políticos e econômicos, onde se prega o combate ao imperialismo e ao poder excessivo de transnacionais (GUIVANT, 2001).

A problematização da dificuldade de sobrevivência dos(as) trabalhadores(as) rurais diante da incorporação de tecnologias importadas em sua produção, e a discussão sobre meios de atenuar as questões relacionadas à exclusão social no campo, foram encampadas por alguns movimentos sociais atuantes contra os transgênicos, bem como por partidos políticos como, por exemplo, o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) e o Partido dos Trabalhadores (PT) (GUIVANT, 2001).

Outras Organizações Não Governamentais (ONGs) como o Greenpeace, Fundações de Proteção e Defesa do Consumidor (PROCON), Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC), IBAMA, pesquisadores(as) de universidades e institutos e alguns agentes públicos também compartilham desta opinião, além de afirmarem que os riscos a longo prazo ainda são inestimáveis tanto na saúde como no meio ambiente (GUIVANT, 2001).

Já as empresas interessadas e alguns participantes da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), afirmam que há pouca flexibilidade dos movimentos sociais e que a precaução excessiva atrapalha o progresso da economia e da ciência (GUIVANT, 2001). Entretanto, se as pragas têm se tornado cada vez mais resistentes aos agrotóxicos, o mesmo não acontece com as outras espécies como mamíferos, aves e peixes, abelhas, que se veem ameaçadas de extinção pelo mau uso das tecnologias (GUIVANT, 2001).

Neste embate de forças e tecnologias, raramente é possível visualizar argumentos pautados no(a) trabalhador(a) rural – que são o grupo mais vulnerável aos agrotóxicos, em decorrência da

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intensa manipulação e exposição. E, por isto, é o grupo mais importante para a mensuração dos danos à saúde, por meio das notificações das intoxicações.

d. Distribuição dos Riscos e fiscalização

Segundo Beck (2010), em sua obra Sociedade de Risco, os riscos são distribuídos mundialmente, não respeitando classe, crença ou fronteiras. No entanto, a globalização dos riscos não significa que eles sejam distribuídos de forma igualitária, pois, os riscos ambientais (ecológicos) e sociais (classe social) se sobrepõem.

As classes sociais menos favorecidas tendem a morar em locais mais poluídos e de maior risco ambiental (como enchentes, contaminação química e biológica). Estas classes também possuem menor acesso a serviços como: saneamento básico, saúde, variedade de alimentos. Além disto, possuem renda insuficiente para minimizar os riscos aos quais são expostos (BECK, 2010).

Quando se trata do trabalho rural, acrescenta-se grande informalidade e flexibilização das legislações trabalhistas, falta de regulamentação econômica e a grande interferência das multinacionais nas políticas dos países que estão inseridas, contribuindo para aumento dos riscos sociais (BECK, 2010).

Ao exercerem suas atividades sem estarem devidamente registrados, os(as) trabalhadores(as) perdem os benefícios trabalhistas, o que pode contribuir para o subregistro dos acidentes e das intoxicações por agrotóxicos (BECK, 2010).

Assim como em outras áreas relacionadas ao setor alimentício, a população está exposta a uma diversidade de opiniões de peritos, agências governamentais e empresas favoráveis e contra a produção e consumo de determinados alimentos (GUIVANT, 2001).

Envolve diferentes atores políticos e sociais com interesses distintos, ocasionando problemas éticos e o confrontamento das transnacionais com os agricultores(as) familiares e trabalhadores(as) rurais (GUIVANT, 2001).

É importante reforçar que a não aceitação de um risco determinado cientificamente pelos peritos não significa que a população seja ignorante, mas sim, que as premissas culturais acerca da

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aceitabilidade dos riscos manifestadas nas fórmulas científicas é que estão erradas ou não adaptadas para aquele local (GUIVANT, 2001).

Pode-se citar, como exemplo, o posicionamento das populações da Inglaterra e da França com relação aos alimentos transgênicos que obrigaram seus governos a recuarem na decisão de liberar o plantio e importação destes produtos (GUIVANT, 2001).

Em um país com grande extensão territorial e diversidade étnica e cultural como o Brasil, não se pode esperar que o mesmo discurso seja apropriado a toda população. Assim, as políticas descentralizadas e regionais se tornam importantes para combater o uso excessivo destas substâncias.

A disparidade de classes e de interesses sociais no Brasil se reflete nas ações do Estado, evidenciando-se na pluralidade de interesses quanto aos objetivos e ações das políticas públicas. Dentro do setor público, mais especificamente no agronegócio, desequilíbrios quanto aos gastos, investimentos, privilégios aparecem quando são analisados os ministérios individualmente (SERAFIM, 2015).

Um dos mecanismos de controle dos riscos se refere aos registros das intoxicações por agrotóxicos e de seus agravos na saúde nos sistemas de notificação. Como veremos no primeiro capítulo, os sistemas brasileiros são fragmentados e escassos, gerando dificuldades de interpretação e utilização dos dados.

No caso dos agrotóxicos, na melhor das expectativas, os danos se encontram dentro do previsto. Este é um formato de política que fortalece o modelo hegemônico do agronegócio (SOARES, 2012) e, como outras políticas, privilegia um grupo específico em detrimento de outros (SERAFIM, 2011).

O próprio processo de liberação dos agrotóxicos possui limitações, pois envolve órgãos governamentais em diferentes níveis de poder decisório, orçamento e autonomia, haja vista que a ANVISA é uma agência, o IBAMA, uma autarquia e o MAPA, um órgão de administração direta. E as instâncias supraministeriais que regulam os órgãos possuem baixo poder político para solucionar os conflitos (SERAFIM, 2011).

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Outro setor governamental que participa ativamente dos debates é a CTNBio, integrante do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), que presta apoio técnico ao governo federal na “formulação, atualização e implementação da Política Nacional de Biossegurança (PNB), OGMse seus derivados” (SERAFIM, 2011).

Assim, para compreensão do tema, faz-se necessária uma análise mais aprofundada de como incentivos governamentais se introduziram nas políticas públicas e como as instituições foram estruturadas.

O(a) trabalhador(a) rural, apesar de ser o responsável pela manipulação direta destes produtos, não é quem dita a forma como isso será feito pois suas ações dependem de quem o contratou (ANDEF, 2008; ANDEF, 2014).

Tendo em vista a discussão acima colocada, onde o debate parece permear as questões dos direitos do consumidor e do giro econômico que envolve o mercado global do uso de agrotóxicos e biotecnologias, a pesquisa está centrada no(a) trabalhador(a) rural que muitas vezes permanece invisível tanto nas políticas públicas quanto no discurso traçado pelos movimentos sociais.

2. Objetivos

O objetivo desta dissertação é entender como a questão das intoxicações por agrotóxicos em trabalhadores(as) rurais é reconhecida pelos diferentes atores governamentais, tais como MAPA, MS, MDA e MDS, por meio de suas legislações e políticas públicas.

Como existem também a atuação de diversos movimentos sociais e outras organizações não governamentais muito atuantes, busca-se, também, compreender como acontece a participação destes atores não-governamentais, ou seja, os movimentos sociais envolvidos com a discussão da reforma agrária, agricultura familiar e agroecologia9.

O recorte da análise abarcou o período de 2001 a 2015, quando foi possível observar aumento das políticas que tangenciam a questão, como a Segurança Alimentar e Nutricional

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(SAN)10, Agricultura Familiar e Agroecologia, dentre outros. Com esta análise, busca-se identificar as convergências e divergências de entendimento da questão, bem como as recomendações, a percepção de risco entre eles e os conflitos de interesse.

Ademais, há o intuito de compreender como a notificação compulsória das intoxicações por agrotóxicos foi estabelecida dentro das políticas públicas e qual o fluxo de informação dos registros das intoxicações, ou seja, se estes fomentaram/embasaram as políticas públicas como dados epidemiológicos ou se aumento na qualidade/quantidade dos registros ocorre pela maior visibilidade pelas próprias políticas públicas.

Para auxiliar no aprofundamento do processo de compreensão, a questão principal foi desdobrada em outras que nortearam este trabalho: “1) Qual a diferença de atuação e percepção dos ministérios em relação à utilização dos agrotóxicos?; 2) Porque a notificação compulsória de intoxicação aos agrotóxicos é tão recente?; 3) Qual a real influência das intoxicações do(a) trabalhador(a) rural perante o desenho das políticas públicas?; 4) Qual a distância entre o diagnóstico da intoxicação e a notificação nos sistemas Sistema de Informação e Agravos de Notificação (SINAN) e Sistema Nacional de Informações Tóxico Farmacológicas (SINITOX) e quais os limites das políticas?; 5) Quais os movimentos sociais ou institucionais que contribuíram para a maior visibilidade e atenção ao tema?”.

3. Caminho Metodológico

Para a análise do objeto escolhido, três formas de coleta de dados foram utilizadas para compor o caminho metodológico do estudo: a revisão bibliográfica e a análise documental.

Primeiramente, foi realizada a revisão dos artigos científicos que utilizaram o SINAN e SINITOX como fontes de dados para estudos relacionados a temática dos agrotóxicos. O intuito desta etapa foi compreender o que os pesquisadores encontraram em termos de falhas, dificuldades, experiências regionais bem-sucedidas e quais suas propostas para aprimorar os dois sistemas de notificação.

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Foram analisados, então, os sites dos quatro ministérios selecionados buscando suas políticas, ações principais e formas de atuação em relação ao uso dos agrotóxicos e seu entendimento e percepção do risco do uso dos agrotóxicos de forma geral, mas com atenção mais específica ao(a) trabalhador(a) rural.

Isto foi realizado por meio da leitura da história dos ministérios, de seus objetivos como órgão do governo, das ações e objetivos de suas secretarias, principais documentos, PPA ministeriais, do currículo de seus ministros e algumas políticas públicas que poderiam estar relacionadas.

Com estes dados, traçou-se uma linha do tempo para cada um dos quatro ministérios, onde as políticas, planos e ações relacionadas com o tema da pesquisa de cada um deles foram organizadas cronologicamente de acordo com os períodos de governo. Os dados foram organizados durante a revisão bibliográfica feita a partir dos sites descritos pelos próprios ministérios.

Com este processo, foi possível compreender, em parte, as transformações político-sociais, identificar valores, e os atores sociais que levaram ao estado atual da questão. Conforme outros documentos eram identificados, seus marcos mais importantes foram agregados a linha do tempo.

Segundo Deubel (2006), há quatro elementos que são importantes para a compreensão das políticas públicas: o envolvimento do governo, a percepção do problema, a definição dos objetivos e o processo político.

Apesar deste trabalho não ser uma análise de política pública, mas sim a análise do processo histórico que culminou na geração das políticas, alguns conceitos, assim como os atores que o envolvem, devem ser mencionados para o melhor entendimento dos argumentos colocados, bem como do jogo político tão naturalizado no Brasil.

Assim, ainda segundo Deubel (2006) Uma política pública é construída quando o governo assume a responsabilidade parcial ou total por uma determinada questão, traça um objetivo específico, e busca alterar uma realidade que foi percebida em sua relevância pelo Estado como problemática.

Quanto aos atores sociais que buscamos na revisão bibliográfica e na análise documental, entendemos que são:

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“Instituições, órgãos, governos e indivíduos organizados ou não em grupos que participam do processo de elaboração de uma política pública (processo da política). Sendo, portanto, quem, ao deter o poder suficiente, consegue influenciar, disputar e negociar determinadas questões ou políticas no momento da tomada de decisão do governo” (DEUBEL, 2015, p. 5).

Podem ser então, atores de entidades governamentais ou não governamentais que participam de alguma forma da agenda política (políticos, legisladores, pesquisadores, especialistas, grupos de interesse) e cidadãos expectadores que são beneficiados com as políticas (PINHEIRO, 2015). Na problemática dos agrotóxicos, vemos a participação de diversos atores, porém com diferentes pesos políticos.

Neste trabalho, apesar de os atores sociais estarem todos classificados dentro da mesma categoria, ou seja, apesar de se usar a mesma nomenclatura para citar-se todos os setores governamentais e não governamentais que de alguma forma participam dos processos que envolvem o uso dos agrotóxicos no país e, consequentemente, em seu impacto na saúde dos(as) trabalhadores(as) rurais, este processo se deu apenas para simplificar – e porque os jogos de poder que se estabelecem não são focos desta dissertação.

Compreende-se que os diferentes atores fazem partes de classes sociais distintas e que seus poderes políticos não são os mesmos perante o Estado, especialmente em sua capacidade de atender às demandas e os interesses coletivos.

Assim, os objetivos e interesses que se mostram muito distintos, portanto a análise de documentos dos diversos setores da sociedade – bem como de diferentes períodos históricos - foi importante para compreender a atual situação política.

A identificação de problemas está relacionada com ideias, entendimento, métodos e valores dos atores sociais que se refletem na percepção de risco, tanto coletiva quanto individual, que influencia a inclusão ou não destes problemas na agenda política (PINHEIRO, 2015). Por conseguinte, e em certa medida, a percepção do risco dos diferentes atores irá nortear a elaboração dos planos de governo, propostas políticas para as candidaturas, planos plurianuais e, posteriormente, as políticas ministeriais.

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Por fim, para a análise documental, levantou-se dados de legislação relacionados aos agrotóxicos, não apenas no período de pesquisa, mas sim, desde a sua primeira regulamentação, em 1934, quando ainda não possuíam essa denominação. Além disto, foi realizado um levantamento das políticas públicas relacionadas aos agrotóxicos no que se refere principalmente a saúde do período de 2001 a 2015.

Ademais, foram analisados também os programas de governo dos mandatos do presidente Luís Inácio Lula da Silva e da presidenta Dilma Rousseff, assim como as propostas de Plano Plurianual (PPA) e os respectivos planos aprovados. Por conta da atuação dos governos nas políticas de SAN e de atenção ao(a) trabalhador(a) rural e a ênfase na reforma agrária.

Nos documentos, buscou-se compreender as transformações no discurso, ou seja, se o olhar perante a questão do(a) trabalhador(a) rural nas políticas permaneceu o mesmo, ou se alterou ou se passou a estar presente nas propostas.

Documentos das Conferências de SAN (1ª a 5ª) e cartilhas e documentos de instituições de pesquisa, universidades e movimentos sociais considerados relevantes ao tema, como da ABRASCO, Fundação Oswaldo Cruz (FioCruz), Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e a Favor da Vida e Instituto Nacional de Câncer José de Alencar (INCA) foram incluídos nas análises.

Considerando-se a relevância e o aprofundamento nos últimos anos nas discussões conducentes a SAN e a incorporação da reflexão acerca dos alimentos transgênicos e do uso de agrotóxicos, os relatórios e cartilhas do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (CONSEA) foram incorporados ao arcabouço documental desta dissertação.

As informações foram organizadas na forma de fichamentos, com nome do autor, data, ministério ou organização a qual se referia, trechos importantes na íntegra, palavras-chave e as percepções pessoais e interpretações da autora.

Foram incluídas também a referência bibliográfica de cada texto, separados de acordo com a data que foram lidos. Procurou-se estabelecer um critério sequencial de leitura separando os documentos por tema para haver confusão ou troca de informações. Por exemplo, foram lidos sequencialmente todos os documentos de vigilância epidemiológica de acordo com a data,

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seguindo do mais antigo para o mais recente. E, assim, foi realizado com todos os outros documentos.

Não foi realizada buscas por palavras-chave nos documentos, pois o intuito foi captar a sutileza e as transformações no discurso de cada um deles. Em alguns casos, para avaliar se o documento seria realmente incluído, foi realizada a busca por palavra-chave. Quando este era selecionado, sua leitura completa foi realizada. Documentos que poderiam fazer referência ao tema pesquisado mas que não o mencionavam foram descartados.

Alguns dos termos que foram considerados importantes para nortear as discussões foram: agrotóxico(s) (e seus ‘correspondentes’ em alguns estudos: “pesticida”, “insumo químico”, “agroquímico”), intoxicação, SINAN, SINITOX, contaminação, agricultor(a) familiar, atenção em saúde, agricultura orgânica, agroecológica, (In)Segurança Alimentar e Nutricional, vulnerabilidade e risco.

A dissertação está estruturada nos seguintes capítulos:

O Capítulo 1 discute os resultados da revisão bibliográfica realizada, na qual foram selecionados artigos, teses dissertações de autores que utilizaram o SINAN e o SINITOX como fonte de dados para pesquisas com o(a) trabalhador(a) rural. Para entender o contexto das intoxicações ocasionadas por agrotóxicos de uso agrícola e a visão de diversos autores sobre os sistemas de notificação.

O Capítulo 2 consiste na discussão sistemática conducente às mudanças nas legislações dos agrotóxicos, desde as que se referem diretamente à análise, liberação, utilização, descarte até as leis e decretos de programas específicos que interferiram ao longo da história, para o aumento na sua utilização. Assim, esta análise tem como referência inicial a primeira lei de 1934 e se encerrará com a última lei do ano 2000. Neste processo de compreensão, são consideradas também as políticas públicas e outros marcos históricos importantes.

O Capítulo 3 é composto pelos resultados da análise documental e está subdividido em cinco períodos separados de forma cronológica e com suas delimitações em marcos importantes das políticas públicas e mudanças de governo. O primeiro período refere-se apenas a 2001, ano do lançamento do Projeto Fome Zero pelo Instituto da Cidadania. O segundo período, ano de 2002,

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abarca o Projeto de Governo da Candidatura de Lula para as eleições, composto por inúmeros documentos.

A partir do terceiro período, que começa em 2003 os Planos Plurianuais são os pontos norteadores e são considerados os Governos Lula (de 2003 a 2011). Por fim, são analisados os Planos Plurianuais dos Governos Dilma (de 2011 até o período atual) que, por ainda estar no início do segundo mandato, caracterizará o quinto e último recorte temporal.

Também são citados diversos movimentos sociais e seus posicionamentos e ao final do capítulo, será tratado brevemente sobre a pesquisa ativista, pois foi um dos resultados encontrados no trabalho.

Por fim, as conclusões do trabalho e ao final, encontra-se um glossário, onde estão descritos muitos termos utilizados que não serão explicados ao longo da dissertação, alguns por serem muito corriqueiros em pesquisas que tratam de temas correlatos. Tais termos estão listados em ordem alfabética.

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CAPÍTULO 1: O CONTEXTO DAS INTOXICAÇÕES POR AGROTÓXICOS DE USO AGRÍCOLA: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA DOS ESTUDOS

Neste capítulo, serão discutidos dados referentes às intoxicações por agrotóxicos de uso agrícola presentes nos sistemas de notificação de acordo com os estudos compilados nesta revisão bibliográfica.

Nesta primeira etapa do trabalho, o objetivo principal foi conhecer a qualidade dos dados epidemiológicos que estão disponíveis.

Para isto, foram selecionados trabalhos de autores que utilizaram em suas pesquisas os sistemas de notificação SINAN e SINITOX para duas principais finalidades: a primeira, usando seus dados para justificar seus estudos e a segunda, para efetivamente analisar a eficácia e qualidade dos próprios sistemas.

Este caminho foi escolhido como ponto de partida, porque quando ocorre um evento, de origem ocupacional, seja ele uma doença ou um agravo que pode vir a ocasionar a invalidez de ou a morte de um(a) trabalhador(a), este deve servir de alerta para se fazer maior controle do processo e para buscar alternativas para como realizá-lo. Assim, sempre que houver um agravo neste sentido, o sistema de vigilância epidemiológica deve ser acionado (RUTSTEIN, 1976).

Quando se registra apropriadamente o agravo, é possível avaliar a forma como o sistema de saúde tem lidado com o problema, tanto no tratamento como na prevenção (RUTSTEIN, 1976). A ausência do registro também diz muito de como se trata do problema.

Além disso, os registros, tem também o papel auxiliar no processo de reivindicação de melhor qualidade da assistência médica e proteção da saúde do(a) trabalhador(a) exposto às mesmas condições (RUSTEIN, 1976). E, a partir destes dados, é possível estimar as intoxicações e a gravidade do problema.

Há diversas formas de coleta de dados para a vigilância epidemiológica. Uma delas é utilizar os sistemas de registro para notificar as intoxicações já ocorridas registradas em centros de saúde e hospitais.

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1. Os Sistemas de Notificação

Existem diversos sistemas de registro no Brasil e os principais são o SINAN e o SINITOX. O SINAN surgiu em 1993 com a necessidade de dados fidedignos para embasar as ações de saúde pública após a criação do Sistema Único de Saúde (SUS). O sistema foi criado para comportar as notificações de todos os tipos de agravos, compilando informações que vão desde acidentes de trabalho, violência doméstico além de doenças infecciosas e não infecciosas (FARIA, 2007).

No SINAN, existem duas formas de coleta de dados, a partir da Ficha Individual de Notificação (FIN), quando existe suspeita de um agravo de notificação compulsória, como é o caso das intoxicações por agrotóxicos e a partir da Ficha Individual de Investigação (FII), um roteiro de investigação que auxilia na detecção da fonte da infecção ou mecanismos de transmissão de uma doença (BRASIL, 2007a).

As informações são encaminhadas aos serviços responsáveis pela coleta da informação e/ou para o setor de vigilância epidemiológica das Secretarias Municipais. Estas devem encaminhar quinzenalmente para as Secretarias Estaduais de Saúde (SES) os dados registrados (IBGE, 2010).

A Intoxicação Exógena (por substâncias químicas, incluindo agrotóxicos, gases tóxicos e metais pesados) é o item 29, do Anexo I da Lista Nacional de Notificação Compulsória de doenças (BRASIL, 2014a).

As intoxicações agudas por agrotóxicos se tornaram compulsórias apenas em 2011, pela Portaria nº 104 de 25 de janeiro de 2011 e ocupam a segunda posição dentre as intoxicações exógenas notificadas no SINAN (BRASIL, 2011a).

Já o SINITOX, foi criado na década de 80 pela FioCruz, instituição que o gerencia ainda hoje. O sistema se atenta exclusivamente a intoxicações em geral. O SINITOX é o órgão responsável pela coleta, análise e divulgação dos casos de intoxicação e envenenamentos registrados na Rede Nacional de Centros de Informação e Assistência Toxicológica (RENACIAT) (FIOCRUZ, 2008).

A Rede possui 36 unidades em 19 estados e no Distrito Federal (DF). Seus principais objetivos são: 1.Fornecer informação e materiais educativos sobre o diagnóstico, prognóstico, tratamento e prevenção de intoxicações; 2.Informações sobre a toxicidade das substâncias;

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3.Informações sobre os riscos ocasionam à saúde humana; 4.Desenvolvimento de pesquisa nas áreas de intoxicação e saúde pública e; 5.Busca ativa de casos, principalmente pelo telefone (FIOCRUZ, 2008).

A RENACIT possui também o serviço de Disque-Intoxicação, por onde o profissional de saúde obtém informações sobre tratamentos, e o público em geral pode tirar dúvidas gratuitamente (SINITOX, 2015).

Os registros são feitos pelos Centros de Informações Tóxico-Farmacológicas (CIAT) que estão localizados em quase todos os estados brasileiros. A maior parte deles integra a RENACIT, que são os responsáveis pelo envio dos dados ao SINITOX. A notificação no sistema não é obrigatória e nem o uso do formulário padrão para envio dos dados (FIOCRUZ, 2008).

O sistema propõe publicações anuais dos registros das intoxicações em seu site na internet, que tem suas informações abertas ao público e organizadas de forma simples (FIOCRUZ, 2016). No entanto, o ano de 2012 foi o último cujos resultados foram publicados.

Outro sistema oficial é o Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), que compila os dados sobre mortalidade. O sistema foi criado em 1975, a partir da unificação de mais de quarenta outros modelos de sistema utilizados por cidades brasileiras (BRASIL, 1975a).

Existe também o sistema do Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola (SINDAG), que compila os dados das vendas de agrotóxicos no país (SINDAG, 2012), que poderia ajudar a detectar os principais locais de vendas e uso dos produtos, o mapeamento das áreas de maior uso e, consequentemente, facilitaria o mapeamento das intoxicações e a busca ativa de casos. Porém, a alimentação do sistema nem sempre está atualizada e faltam informações de muitas empresas.

Aqui vamos nos ater nos dois primeiros sistemas, ao SINAN e ao SINITOX. Existem quatro principais diferenças entre os sistemas: a primeira, é que o SINAN, tem estreita ligação com o SUS e suas notificações são obrigatórias nele o que não ocorre no caso do SINITOX (BRASIL, 2007a; FIOCRUZ, 2008).

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A segunda é na forma de coleta e envio de dados: no SINITOX, apesar do detalhamento das fichas propostas pelo SINITOX aos CIAT, seu uso não é obrigatório. O que leva a despadronização nos registros e das informações fornecidas por cada local.

Além disto, os CIAT também não são obrigados a encaminhar suas informações ao SINITOX e, as informações que são enviadas são pré-selecionadas. Ou seja, mesmo que se tenha mais dados, apenas um pequeno conjunto de informações é encaminhado ao sistema do SINITOX.

E por fim, os dados que são enviados e liberados pelo SINITOX, já estão traduzidos em tabelas, diferente do SINAN, que possibilita que qualquer tipo de informação registrada no sistema pode ser cruzada (BRASIL, 2007a; FIOCRUZ, 2008).

Com este panorama, era se se esperar que o SINITOX tivesse menor qualidade nos dados coletados, além do menor número de notificações de intoxicações registradas no sistema, no entanto, quase que contraditoriamente, este é o sistema com maior número de registros de intoxicações por agrotóxicos no país. Sendo, portanto, um importante instrumento auxiliar dos sistemas de vigilância em saúde na prevenção e cuidado desta população (BRASIL, 2007a; FIOCRUZ, 2008).

2. Revisão Bibliográfica

Quando são analisados os sistemas utilizados para a notificação das intoxicações por agrotóxicos, diversos problemas são detectados. O que coloca obstáculos às pesquisas e, por conta disto, a discussão trazida na revisão destaca os principais pontos trazidos pelos autores a respeito dos dois sistemas.

Foram selecionados artigos, teses e dissertações que utilizaram do SINAN e do SINITOX para diferentes finalidades. O objetivo, portanto, foi compreender como os autores que utilizaram os sistemas de notificação para pesquisar as intoxicações por agrotóxicos de uso agrícola utilizam os sistemas, quais suas dificuldades em utilizá-los e quais as suas sugestões para a melhoria da qualidade dos dados.

Referências

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