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AS PRINCIPAIS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO PROCESSO DE

4 ANÁLISE DOS DADOS

4.1 AS PRINCIPAIS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO PROCESSO DE

O processo de incubação desperta as mais diversas representações sociais nos sujeitos, esse fato pode ser constatado a partir da forma multifacetada com que os indivíduos discursam sobre o assunto. Para uma parte dos entrevistados o processo representa uma possibilidade de organização das atividades desenvolvidas no empreendimento solidário. E é muito importante porque antes da incubação a gente não tinha organização nenhuma, a gente não organizava o financeiro, não tinha conta, porque tinha aquele pensamento assim: vai abrir uma conta porque é complicado, porque os outros vão pensar que eu vou pegar, a visão era assim. Depois foi que a conta é conjunta, é retirado o extrato todo mês e fica lá. Então a gente aprendeu tudo isso na incubação. Porque a gente não fazia isso (E1, cooperativista).

No excerto acima o entrevistado retrata a importância organizativa que o processo de incubação trouxe, há toda uma formalização que mesmo no contexto em que predomina a informalidade, torna-se importante para a sustentabilidade do empreendimento. Essa formalização não era realizada até então devido à aversão ao registro. As pessoas desenvolvem crenças segundo algumas atividades das organizações, como é o caso da abertura de conta bancária no exemplo acima.

A forma organizativa do processo de incubação é retratada em mais um relato, “Ah sim, sim, a gente aprende tudo isso, como trabalhar o dinheiro, como fazer para não ter gastos muito além, e para não perder. Tudo isso agente aprende.” (E2, cooperativista). Tendo como base a espiral de contextualização proposto por Arruda (2005) na análise das representações sociais, existem temáticas que auxiliam no processo de compreensão: cultura, contexto imediato, imaginário social, história/história das ideias. Central nessa análise é o objeto de estudo, sendo no nosso caso o processo de incubação, esse que é permeado pela cultura que o molda perante os costumes e as tradições construídas com as histórias de vida apresentadas pelos sujeitos. A cultura empreendedora dos cooperativistas é fundamentada na informalidade e consequentemente na falta de quaisquer tipos de registros sobre setores como produção, financeiro entre outros. Certo receio paira sobre os sujeitos, que ligam o controle e os registros às medidas fiscais, dessa forma a ausência dos mesmos garantiria a informalidade de forma geral, já que, na maioria das vezes, não recolhem impostos. A falta de escolaridade também é preponderante na ausência de instrumentos de controle, juntamente com a falta de domínio técnico em computadores, o que auxiliaria na criação de instrumentos peculiares às necessidades organizacionais. O contexto de marginalização imposto pelo sistema produtivo taylorista é um fator que intensifica, ainda mais, a ausência de controle por parte dos cooperativistas, pois com a cisão entre o trabalho intelectual e físico não se instituiu uma preocupação com os aspectos de gerência, controle e planejamento do negócio. Os sujeitos, hoje cooperativistas, sempre contribuíram com o aspecto físico na produção, raramente com o intelectual, deixando a cargo dos “mais capacitados” essa função. O processo de incubação então se torna fonte organizativa, à medida que os cooperativistas o veem com a possibilidade de organizar e formalizar o empreendimento, atendendo assim aos preceitos da economia solidária e às perspectivas legais de uma cooperativa. A ideia de que é necessário um tipo de assessoria para orientar a formalização dos processos organizacionais é a essência do processo de incubação visto pelo lado dos cooperativistas. A incubadora e o processo de incubação são vistos como uma forma de organizar o grupo, já que apresentam uma forte ligação com a universidade, desenvolvendo assim a função de ponte entre a realidade dos sujeitos e o conhecimento fundamentado nas bases da universidade.

O processo de incubação é visto pelo grupo dos formadores como uma formação tanto para os cooperativistas como para eles próprios. O

processo requer, portanto o ideal de formação contínua, como a fala a seguir retrata.

Eu acho que perceber as necessidades do grupo, tentar contribuir, mas saber dos nossos limites. Também trazer o que eu vejo como nosso trabalho como incubadora, é a questão do trabalho, então por mais que tenham outras questões que precisam ser tratadas também, porque se forem deixadas de lado o grupo não se consolida e não vai para frente. Acho que não pode perder de vista que o que une tudo isso é o trabalho. O que viabiliza tudo isso é o trabalho. Então eu vejo que no fim esse processo de incubação vai muito além de acordo com o grupo, com as necessidades do grupo. É claro que eu acho que se precisa de conhecimento, de metodologia e de conhecimento de experiências e práticas, mas para ter um repertório e saber o que utilizar, o que é necessário para aquele grupo mesmo, na verdade, de todas as pessoas envolvidas, não só dos grupos como dos formadores, que acaba variando em função disso. (E3, formadora)

Percebemos com o trecho acima que o processo de incubação é visto como um trabalho contínuo. Esse trabalho contínuo não é visto como uma via de mão única, pelo contrário, ele é uma prática de formação tanto para os formadores como para os cooperativistas.

O caráter formador do processo de incubação é retratado mais uma vez no trecho a seguir.

É uma formação! Só que é uma formação mais demorada e com uma visão, [...] Porque a incubação é você ver um período, você está em permanente diagnóstico, em permanente formulação e permanente reformulação. Então é um contínuo no qual você se transforma, se modifica, se percebe de outras facetas. Eu acho que é liberador de ambas as partes, exige planejamento, estudo, então você ao estudar você se aprofunda naquilo que você está fazendo. (E4, formadora)

Nesse relato temos como central a questão da formação, no entanto em uma perspectiva mais individual. O sujeito retrata o processo de incubação tendo como essencial a sua própria transformação durante o processo. A formação proporcionada pelo processo de incubação aos cooperativistas e aos formadores é central no que tange a transformação necessária aos sujeitos para se adaptarem aos valores envolvidos em um empreendimento econômico solidário/cooperativista.

A formação mais uma vez aparece no excerto “Primeiro você tem que formar o grupo, então na verdade a incubação já começou aí, a incubação é primeiro formar um grupo, consolidar o grupo, e dar uma formação.” (E5, formador).

O contato com um novo paradigma produtivo é também retratado como essencial ao processo de incubação: “Na verdade, vou resumir, apresenta um mundo novo para eles em todos os sentidos, eles nunca trabalharam nisso, nunca decidiram coletivamente, eles estavam acostumados que vem alguém para mandar.” (E5, formador).

Por último o processo de incubação é visto como algo além da produção fundamentada pelos princípios da economia solidária, é algo maior do que isso,

Tem tudo! Na verdade aqui mistura tudo! Mistura uma terapia, que a gente não entende como terapia, e não é uma proposta de terapia, mas sem querer uma produção em conjunto, um convívio em conjunto. É terapêutico também, é emancipatório sim! Então é um conjunto de coisas que faz parte da própria proposta de economia solidária, que não é só a produção em si. (E5, formador)

O sujeito acima fundamenta seu discurso em dois temas, emancipação e formação. O processo de incubação é construído a partir da formação do sujeito, ou seja, da construção de conhecimento junto aos cooperativistas. Essa função é ainda mais intensificada com a vinculação entre incubadora e universidade. Pois, a universidade, enquanto instituição histórica construtora dos mais diversos conhecimentos é vinculada, fundamentalmente, à construção de saberes. Emancipação, outro tema retratado fortemente, se dá com a apresentação de novas formas de trabalho e organização aos sujeitos. Há, portanto, um contexto de apresentação e inserção a um novo paradigma, trazendo assim outras lentes para se visualizar a sociedade e as desigualdades da mesma.

A figura a seguir tem como objetivo apresentar as principais representações sociais construídas pelos dois grupos entrevistados. Figura 10 - As representações sociais do processo de incubação

Fonte: Elaborado pelo autor

Como podemos perceber há uma essência nas representações apresentadas pelos dois grupos a respeito do processo de incubação. A ideia de formação desenvolvida pelos formadores apresenta uma ligação com a assessoria construída pelos cooperativistas. Os cooperativistas buscam certo tipo de assessoria para suas ações, podendo assim respaldar suas escolhas gerenciais. Essas escolhas são fruto de como a formação desenvolvida pelos formadores se encaixa nas necessidades cotidianas do empreendimento econômico solidário/cooperativista. Portanto, a assessoria requerida pelos cooperativistas encontra sua outra ponta na formação desenvolvida pelos formadores, que devem lapidar os conhecimentos desenvolvidos na universidade tendo como balizas as problemáticas cotidianas dos cooperativistas.

Dessa forma, os formadores assumem uma visão do processo de incubação balizada na formação e emancipação, apresentando assim diversas concepções a respeito desses temas. Já os cooperativistas se fundamentam na assessoria que o processo de incubação pode

Processo

de

Incubação

Formadores:

Formação;

Emancipação.

Cooperativistas:

Assessoria.

proporcionar, visualizando o processo de incubação enquanto forma de organizar o empreendimento econômico solidário/cooperativista. A seguir trataremos da tensão epistêmica encontrada no processo de incubação.