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A definição de alguns termos se faz necessária para a compreensão da problemática tratada nesse trabalho, sendo assim determinados conceitos serão explanados a fim de se demarcar conceitualmente cada um desses termos. Por processo de incubação entendemos a relação humana e institucional entre um grupo de sujeitos autônomos e a organização responsável pela incubação (ITCPs), desenvolvendo assim um projeto de construção de uma nova organização (cooperativa).

O processo de incubação apresenta desafios peculiares à realidade organizacional, Cançado, Carvalho e Pereira (2011) afirmam que a gestão desenvolvida nesse processo busca promover a autossustentabilidade dessas organizações. Torna-se então um instrumento educativo/pedagógico desenvolvedor de diversos tipos de conhecimentos, dentre eles a gestão. Então, o ambiente das incubadoras, como qualquer enclave da vida humana associada está sujeito às mais diversas tensões. Nesse estudo, elegemos dois tipos de tensões, tratadas em diversas pesquisas, para guiar-nos.

Em um primeiro momento, o processo de incubação é entendido como um processo pedagógico/educativo. Sendo assim, as ITCPs são entendidas enquanto um tipo de tecnologia social que agrega professores, pesquisadores, técnicos e acadêmicos além dos participantes do processo de incubação (os cooperativistas). Culti (2009) afirma que as incubadoras têm como objetivo organizar e fomentar certos tipos de assessorias aos empreendimentos econômicos solidários/cooperativistas. Essa assessoria, enquanto processo educativo, faz parte de uma díade entre construção e reconstrução dos conhecimentos.

O processo de incubação tem como formandos (cooperativistas) uma classe historicamente submissa, explorada e marginalizada pelo sistema (CULTI, 2009). Notamos assim que há uma diversidade de grupos no processo de incubação, os formadores e os cooperativistas, que apresentam diferentes histórias de vidas. Ou seja, enquanto os cooperativistas são caracterizados pela falta de escolaridade e pelo histórico de submissão e marginalização. Os formadores apresentam uma estreita relação com a universidade, ou seja, com a educação formalizada, pertencendo a outro grupo econômico e cultural.

Dessa forma, a tensão epistêmica se caracteriza com a relação entre os diferentes grupos inerentes ao processo de incubação sendo eles os formadores e os cooperativistas. Ao pensarmos nesses dois grupos podemos enxergar diversos posicionamentos nos mais diversos aspectos sociais. Por exemplo, cultura, conhecimento, linguística, classe social, dentre as mais variadas características são elementos que diferenciam o grupo dos formadores do dos cooperativistas. Surgindo assim uma tensão, que se mantém e é fomentada pela disputa de sentidos que há entre os dois grupos. Disputa essa, que se dá pela dissonância de sentidos presentes a partir da construção de representações sociais no cotidiano. Notamos então uma disputa de poder por aquelas representações sociais que fazem mais sentido aos grupos.

Outro ponto que trabalharemos nesse estudo é constituído pela relação entre as racionalidades instrumental e substantiva. Cançado, Carvalho e Pereira (2011) afirmam que em um ambiente de incubação, a hegemonia da racionalidade instrumental é fonte de tensão entre a dimensão ética e valorativa dos sujeitos e a racionalidade que impera nas organizações atuantes com a lógica do mercado. Dessa forma, as organizações solidárias/cooperativistas se constituem ideologicamente em um conjunto de valores que muitas vezes se contrasta com a inter- relação que desenvolvem com o mercado. Portanto há um paradoxo organizacional, ou seja, as cooperativas devem produzir e se relacionar com o mercado até o momento em que este não as faça perderem o sentido substantivo. Esse paradoxo resulta na tensão entre as racionalidades instrumental e substantiva, fenômeno esse que influencia preponderantemente as relações sociais desenvolvidas no processo de incubação. Guerreiro Ramos (1989) corroborando o exposto afirma,

[...] Há, portanto, uma tensão contínua entre os sistemas organizacionais planejados e os atualizadores, e afirmar que o indivíduo deveria esforçar-se para eliminar essa tensão, chegando assim a uma condição de equilíbrio orgânico com a empresa (exemplo de política cognitiva que uma psicologia motivacional defende, em bases supostamente científicas), corresponde a recomendar a deformação da pessoa humana. Somente um ser deformado pode encontrar em sistemas planejados o meio adequado à própria atualização. (GUERREIRO RAMOS, 1989, p. 99)

Apesar de alguns estudos abordarem as problemáticas envolvidas no processo de incubação. Boeira et al (2012) afirmam que as reflexões teóricas e epistemológicas, encontradas na base Scielo, sobre o cooperativismo apresentam, em sua maioria, uma superficialidade. Essa característica pouco crítica é ainda mais clara em estudos de bases econômico/administrativa, construindo assim uma visão economicista, gerencialista e financeira das cooperativas. Dessa forma, esse conjunto de contribuições enfatiza os aspectos fatuais, pontuais e descritivos, não há, portanto, contextualização e teorização condizentes com a complexidade das temáticas desenvolvidas.

A fim de ultrapassarmos essa característica dos estudos administrativos no que tange a economia e solidária. Propomos uma abordagem crítica baseada em tensões presentes no processo de incubação. A figura a seguir procura sintetizar a influência que entendemos que as tensões causam no ensino da gestão durante o processo de incubação.

Figura 2– Problema de Pesquisa

Fonte: Elaborado pelo autor

Representações Sociais do Processo de Incubação

Tensão

Epistêmica

Gestão

Tensão entre

Racionalidades

Após apresentarmos um breve histórico sobre o cooperativismo e incubadoras, considerando as relações desenvolvidas no processo de incubação, chegamos ao nosso problema de pesquisa que se resume com a seguinte questão: compreender a gestão a partir das representações sociais desenvolvidas no processo de incubação de uma ITCP, considerando, como pressupostos, a existência de tensões epistêmicas e entre racionalidades instrumental e substantiva?

Para conseguirmos responder esse questionamento, propomos os objetivos geral e específicos a seguir.

1.3 OBJETIVOS