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2. O MERCADO DE GÁS NATURAL NO BRASIL

2.1 Panorama geral do mercado de gás natural no Brasil

2.1.3 As propostas de aprimoramento regulatório do mercado de gás natural

No ano de 2016, a iniciativa do “Gás para Crescer”, coordenada pelo MME marcou a retomada das discussões sobre a necessidade de se ampliar a participação do gás natural na matriz energética do Brasil. Para tanto, em 14 de dezembro daquele ano, por meio da Resolução CNPE nª 10, houve a instituição do Comitê Técnico para o Desenvolvimento da Indústria do Gás Natural (CT- GN), dividido em oito subcomitês temáticos, que após diversas discussões, inclusive com a sociedade, apresentaram propostas para o aprimoramento do mercado de gás natural (MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA, 2016).

Deste trabalho, resultou o texto de Substitutivo ao Projeto de Lei nº 6.407, de 2013, protocolado em 21/11/2017 pelo relator, deputado Marcus Vicente (PP-ES), cuja redação acabou sendo modificada em dezembro de 2017. O texto final do projeto foi encaminhado somente em abril de 2018 à Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados e aguarda votação. Cabe observar que, entre os principais assuntos descritos no substitutivo, estão:

a regulação do preço do gás no upstream; a criação de um mercado secundário de gás; a redução a zero da alíquota do PIS/COFINS sobre gás; a criação do Operador do Sistema Nacional de Transporte de Gás Natural (ONGÁS); e a definição do papel do Executivo federal na política nacional de gás, além de alterar a Lei de Gás abrindo as redes de gasodutos a terceiros e pondo fim à verticalização (COSTA, H. K. M; TOMÉ, F. M. C, & SILVA, I. M. M, 2019, p. 27).

No ano de 2019, houve a retomada das discussões sobre o desenvolvimento do mercado de gás natural e o lançamento do projeto intitulado “Novo Mercado de Gás”, adicionando às premissas

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anteriormente estudadas novas considerações entendidas como necessárias ao fomento da indústria. Neste contexto, para que seja estabelecido um mercado de gás dinâmico e competitivo, foi criado um comitê coordenado pelo MME, em conjunto com ANP, a EPE e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), em que foram avaliados os principais desafios vislumbrados.

Na opinião de Adriano Pires (2019, p. 8),

o projeto do governo (MME – Ministério de Minas e Energia / ME – Ministério da Economia) para a abertura do mercado de gás natural - Novo Mercado de Gás consiste em uma série de ações que tem o objetivo proclamado de quebrar monopólios, da Petrobras na produção e comercialização do combustível, e na distribuição do gás canalizado dentro dos estados (como se fosse possível dar fim ao monopólio natural das distribuidoras), e com isso reduzir drasticamente os preços do gás natural para o consumidor final.

Hirdan Costa (2009, p. 148) menciona que

o mercado de gás natural brasileiro apresenta características marcantes relacionadas, principalmente, à forte presença e ao poder de mercado da Petrobrás, que é a principal financiadora de projetos em infraestrutura de transporte [herança institucional].

Nos termos da Resolução do CNPE 16/2019, objetiva-se a adoção das medidas que permitam o acesso negociado às infraestruturas essenciais, com o estabelecimento de regras de acesso com diretrizes da ANP, além da possibilidade de arbitramento em situações de conflito; a redução da concentração na oferta pelo agente dominante, com a adoção de programa com limites progressivos à participação da Petrobras no mercado; a desverticalização das atividades, por meio da venda de ativos de transporte pelo agente dominante; a liberação da capacidade; a maior transparência nos contratos de compra e venda, com a divulgação do teor de tais documentos e o aperfeiçoamento da regulação estadual, por meio de incentivos aos Estados para a adoção de boas práticas regulatórias, com a separação entre comercialização e distribuição.

Cabe observar que, nos artigos 2º e 3º da Resolução do CNPE 16/2019, é descrita a forma por meio da qual a transição para o mercado concorrencial de gás natural deve ser realizada. Percebe- se o enfoque no aumento da eficiência na operação e a competitividade entre os players do mercado, especialmente na transparência das negociações, e “a precificação adequada no fornecimento de gás natural por segmento de usuários” (VI, art. 2º)

Necessário transcrever o art. 4º da Resolução do CNPE 16/2019, que pormenoriza questões essenciais à transição de modelo, considerando a oferta de gás natural e o sistema de entradas e saídas:

Art. 4º A transição para um mercado concorrencial de gás natural observará: I - Oferta de capacidade disponível de transporte;

II - Critério de autonomia e independência dos transportadores (com a implementação do modelo de desverticalização do transporte);

III - organização do sistema de transporte por meio dos códigos comuns de rede; IV - Elaboração de códigos comuns de acesso a dutos de escoamento, unidades de processamento de gás natural e terminais de GNL;

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comercialização e publicação de contratos de transporte padronizados; e VI - Implantação de programas de liberação de gás natural para redução de concentração do mercado.

§ 1º Os incisos I a V serão implementados conforme regulação da Agência Nacional do Petróleo, Gás natural e Biocombustíveis - ANP.

§ 2º O inciso VI será implementado sob a supervisão da ANP, em conjunto com a autoridade de defesa da concorrência.

Da mesma forma, no art. 5º, da Resolução do CNPE 16/2019, são descritas recomendações aos Estados e ao Distrito Federal para que seja possível viabilizar o desenvolvimento do mercado de gás natural:

Art. 5º Recomendar que o Ministério de Minas e Energia e o Ministério da Economia incentivem os Estados e o Distrito Federal a adotarem as seguintes medidas:

I - Reformas e medidas estruturantes na prestação de serviço de gás canalizado, incluído eventual aditivo aos contratos de concessão, de forma a refletir boas práticas regulatórias, recomendadas pela ANP, que incluem:

a) princípios regulatórios para os Consumidores Livres, Autoprodutores e Autoimportadores; b) transparência do teor dos contratos de compra e venda de gás natural para atendimento do mercado cativo;

c) aquisição de gás natural pelas distribuidoras estaduais de forma transparente e que permita ampla participação de todos os ofertantes;

d) transparência na metodologia de cálculo tarifário e na definição dos componentes da tarifa; e) adoção de metodologia tarifária que dê os corretos incentivos econômicos aos investimentos e à operação eficiente das redes;

f) efetiva separação entre as atividades de comercialização e de prestação de serviços de rede; e

g) estrutura tarifária proporcional a utilização dos serviços de distribuição, por segmento de usuários;

II - Criação ou manutenção de agência reguladora autônoma, com requisitos mínimos de governança, transparência e rito decisório;

III - privatização da concessionária estadual de serviço local de gás canalizado; e

IV - Adesão a ajustes tributários necessários à abertura do mercado de gás natural discutidas no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ, a exemplo do Ajuste do Sistema Nacional Integrado de Informações Econômico-Fiscais - SINIEF nº 03/18, de 3 de abril de 2018.

§ 1º Na privatização de que trata o inciso III, incentiva-se que os Estados e Distrito Federal avaliem a oportunidade e conveniência de definição de novo contrato de concessão, que considere as diretrizes que trata o inciso I.

§ 2º Recomendar ao Ministério de Minas e Energia, ao Ministério da Economia, à ANP e à Empresa de Pesquisa Energética - EPE que se articulem para promover o apoio de treinamento e capacitação das agências reguladoras estaduais nas matérias de que trata os incisos I e II.

Segundo a projeção da EPE, descrita no Documento de Apoio ao Plano Nacional de Energia - PNE 2050, “no horizonte até 2050, a trajetória do preço do gás natural no Brasil oscilará em função de alguns fatores como (i) o aumento da competitividade com combustíveis substitutos; (ii) a competição entre agentes; (iii) a monetização do gás natural associado; e (iv) o balanço entre demanda e oferta (EMPRESA DE PESQUISA ENERGÉTICA, 2018).

Como detalha Solange David (2019, p.87),

quase dez anos da Lei do Gás (Lei nº 11.909, de 4 de março de 2009), somente em 2019 foram adotadas duas resoluções pelo Conselho Nacional de Política Energética – CNPE, com

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a finalidade de promover a concorrência no mercado de gás natural no Brasil e estabelecer diretrizes, princípios e aperfeiçoamentos de políticas energéticas voltadas à promoção da livre concorrência e à abertura do mercado.

Vale enaltecer que se trata de um processo de transição em que há a necessidade da integração entre os diversos integrantes do mercado. Para tanto, indispensável que tanto o respeito aos contratos já firmados quanto a governança das instituições sejam priorizados. Conforme estabelece o art. 8º da Resolução do CNPE 16/2019,

o Ministério de Minas e Energia, em articulação com o Ministério da Economia, a ANP, a EPE e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE, monitore a implementação das ações necessárias à abertura do mercado de gás, devendo propor medidas adicionais e complementares ao CNPE, caso necessário.

Por conseguinte, no dia 23 de outubro de 2019, foi aprovado o parecer ao Projeto de Lei nº 6.407, de 2013 pela Comissão de Minas e Energia, que dispõe sobre medidas para fomentar a indústria de gás natural, especialmente relacionadas à metodologia de precificação do gás natural, à redução de alíquotas de contribuição para o PIS/Pasep e Cofins incidentes sobre a importação do hidrocarboneto. O projeto também altera a Lei nº 11.909/2009 e descreve a figura do Operador do sistema Nacional de Transporte de Gás natural (Ongás), pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, responsável pela coordenação e pelo controle da operação da movimentação de transporte de gás natural4.

2.2 O ambiente de contratação livre de gás natural no Estado de São Paulo