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Como pode ser visto, segundo Afonso (1998, p. 77), as discussões que envolvem o tema educação e globalização ou como ele passa a chamar de reformas políticas educacionais, rondam a década de 1990 e permeiam os espaços educativos apresentando, uma gama de possibilidades de “usos e acepções”. Assim sendo, é importante refletir sobre essa terminologia e talvez seja por isso que no início do capítulo II da tese de doutoramento de Almerindo Afonso, ele dedica-se a fazer uma revisão sobre o conceito, funções e limites das reformas educativas. Assim, Afonso (1998, p. 79) afirma que para falar de reforma educacional, faz-se necessário “[...] considerar uma variedade de

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iniciativas que visam alterações no alcance e na natureza da educação pré-escolar e escolar, passando por mudanças nos conteúdos e currículos e nas formas de seleção, orientação e creditação”, ou seja, profundas mudanças que precisam de uma maturação para poderem ser implantadas de forma eficiente e eficaz. Por outro lado, há outra corrente, mais pragmática, conforme alerta Jonas Soltis em Reform or reformation (1990), que diz que “[...] reformas são projectos mais circunscritos que têm em vista renovar, melhorar ou redirecionar as instituições educativas sem preocupação de promover mudanças radicais” (p. 411).

O tema é bastante polêmico, com várias possibilidades de compreensão das ações e das relações entre os sujeitos envolvidos, como demonstram os autores acima e, por isso, faz-se necessário um olhar weberiano para poder traçar rotas bem definidas em busca do aumento do desempenho escolar para as gerações futuras tendo em vista as ações tomadas e as relações sociais que podem ser formadas. É nesse contexto que Weber (1995, p. 400) define ação e relação social quando diz que “A ‘ação social’, portanto, é uma ação na qual o sentido sugerido pelo sujeito ou sujeitos refere-se ao comportamento de outros e se orienta nela no que diz respeito ao seu desenvolvimento”. Assim, essa é uma das suas premissas fundamentais, pois para ele a ação social parte de um indivíduo em relação a outro indivíduo e essa ação tem um objetivo e este objetivo está relacionado ao comportamento do outro indivíduo. Um exemplo disso é quando ajudamos um idoso a atravessar uma rua. Ao fazer isso, esperamos que o idoso agradeça, apesar de não ter como afirmar com certeza que se terá esse resultado. Portanto, uma sociedade composta de vários indivíduos é impossível determinar qual o comportamento exato dela e, por isso, é considerado por Weber um feixe inesgotável de possibilidades. Apesar dessa definição, Weber vai além e cria o conceito de relação social. O que ele afirma é que em alguns contextos, um grupo de indivíduos que estão se relacionando tem suas ações aceitas reciprocamente apenas dentro desse grupo. Nesse caso não se tem uma ação social, que trata-se de um indivíduo para outro, mas sim uma relação social. Um exemplo disso é uma partida de futebol, dentro daquele contexto entende-se uma pessoa fazer uma “falta” sobre a outra, fora desse contexto não. Assim, pode-se dizer então que uma relação social é composta também de ações sociais, podendo ser individuais ou coletivas e, assim, como a educação e a globalização, elas também precisam dessa reflexão para serem compreendidas.

No cenário internacional, as mudanças a partir da década de 1990 foram significativas e percebe-se isso quando Antunes (2005, p. 128) afirma que no final desse período “[...] verificaram-se

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os primeiros, e em alguns casos decisivos, passos do que podemos considerar uma nova fase do processo de europeização das políticas educativas e de formação [...]”. Essa autora considera, ainda, algumas iniciativas significativas que contribuíram para marcar a consolidação desse momento de mudanças educacionais: uma delas foi um programa que foi idealizado em 1999/2000 e ficou conhecido como Educação & Formação - 2010. O processo de Bruges/Copenhaga (2001/2002) e Bolonha (1999) também devem ser citados pois possuem algumas similaridades que podem quando analisados, e levando-se em consideração suas particularidades, proporcionar o surgimento de caminhos que apontem para o mesmo norte.

Essa questão que se impõe sobre as políticas educativas, diz respeito à regulação no qual esse processo vem passando. Para Barroso (2005, p. 727), é importante não confundir regulação com regulamentação, esta é muito mais “[...] centrada na definição e controlo a priori dos procedimentos e relativamente indiferente às questões da qualidade e eficácia dos resultados” quando comparada a regulação que apresenta-se muito mais adaptável quando define os processos, mas torna-se mais rígida quando avalia a eficiência e a eficácia dos resultados.

Como pode ser visto, as regulações nas quais a educação passou nos últimos anos, em especial após a década de 1990, foram alterações cujas raízes são tão profundas quanto de uma grande árvore frutífera que para se nutrir, desenvolver-se e apresentar bons frutos precisa se fixar em uma terra fértil e que seja bem cuidada, ao longo dos anos, pelos seus gestores. Metaforizando, ainda, à uma grande árvore, é preciso um olhar reflexivo para a educação por parte dos governantes e porque não, da própria população, que tem o verdadeiro poder nas mãos e que se nutre dessa grande árvore constantemente. Seriam os processos de Bruges/Copenhaga e de Bolonha na Europa, e a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) no Brasil em 1996, uma tentativa de aragem da terra? O que os gestores podem fazer para fertilizar o solo e fazer com que essa árvore prospere e gere frutos de alta qualidade? São essas questões que podem nos ajudar a encontrar respostas que melhorem as políticas educacionais atuais e, assim, possam contribuir também com a melhoria educacional dos povos.

O processo de Bruges/Copenhaga criado em novembro de 2002, trata-se de uma cooperação entre os países da Europa para reforçar o desempenho, a qualidade e o interesse da população europeia pelo Ensino e Formação Profissional (EFP), sendo motivados por instrumentos de Aprendizagem ao Longo da Vida (ALV) e revistos de dois em dois anos.

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O processo de Copenhaga prevê: uma dimensão política destinada ao estabelecimento de objectivos europeus comuns e reforma dos sistemas nacionais de EFP; o desenvolvimento de instrumentos e quadros europeus comuns que aumentem a transparência e a qualidade das competências e qualificações e facilitem a mobilidade; a cooperação para promover a aprendizagem mútua a nível europeu e envolver todas as partes interessadas competentes a nível nacional (DECLARAÇÃO DE COPENHAGA, 2002).

Assim sendo, de acordo com as prioridades e objetivos definidos nas metas que iriam até 2010, merecem destaque “Reforçar a dimensão europeia do EFP; aumentar a informação orientação e aconselhamento, bem como a transparência, do EFP; criar ferramentas para o reconhecimento mútuo e a validação de competências e qualificações e melhorar a garantia de qualidade do EFP” (DECLARAÇÃO DE COPENHAGA, 2002). Assim, nos anos seguintes6 foram discutidos e incrementados

outros pontos de relevância para a implementação das metas estabelecidas, nos quais destaco os seguintes:

Aumentar o investimento público/privado em EFP; promover o desenvolvimento contínuo de competências em matéria de EFP de professores e formadores; desenvolver sistemas de EFP para satisfazer as necessidades das pessoas e dos grupos desfavorecidos; uma abordagem sistemática ao reforço da aprendizagem e cooperação mútuas, nomeadamente, com a utilização de dados e indicadores consistentes e comparáveis; adaptar-se às evoluções do mercado de trabalho e compreender os sectores e as qualificações emergentes; assegurar acções de formação adaptadas às necessidades de uma sociedade envelhecida (DECLARAÇÃO DE COPENHAGA, 2002).

Por fim, de acordo com as metas para 2011-20, os pontos mais relevantes dizem respeito ao “[...] reforço da qualidade, da eficiência, da atractividade e da pertinência do EFP; tornar realidade a aprendizagem ao longo da vida e a mobilidade; desenvolvimento da criatividade, da inovação e do empreendedorismo; a promoção da igualdade, da coesão social e da cidadania activa” (DECLARAÇÃO DE COPENHAGA, 2002).

Depreende-se, a partir desse processo, o quão relevante é a educação profissional para a comunidade europeia, bem como os temas que eles consideram importante para o desenvolvimento de uma sociedade mais justa e igualitária. Preocupação semelhante, porém em se tratando do Ensino Superior, pode ser visto no Processo de Bolonha de 1999, que iniciou com 30 países e hoje abrange 477. A declaração tem como objetivo criar um Ensino Superior unificado em toda a Europa como forma

6 Faço referência ao que foi acertado, em 2004 em Maastricht, 2006 em Helsínquia, 2008 em Bordéus e 2010 em Bruges, no qual foi fixado acordo para

o período 2011-20.

7 Albânia, Alemanha, Andorra, antiga República jugoslava da Macedónia, Arménia, Áustria, Azerbaijão, Bélgica, Bósnia e Herzegovina, Bulgária,

Cazaquistão, Chipre, Croácia, Dinamarca, Eslováquia, Eslovénia, Espanha, Estónia, Federação da Rússia, Finlândia, França, Geórgia, Grécia, Hungria, Irlanda, Islândia, Itália, Letónia, Listenstaine, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Moldávia, Montenegro, Noruega, Países Baixos, Polónia, Portugal, Reino Unido, República Checa, Roménia, Santa Sé, Sérvia, Suécia, Suíça, Turquia e Ucrânia.

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de facilitar o reconhecimento de diplomas entre os países participantes, possibilitar que pesquisadores, professores e estudantes circulem mais facilmente, além de assegurar excelente qualidade da docência com a possibilidade de intercambio e troca de experiência entre os professores. Assim sendo, de acordo com seis eixos de atuação, conforme mostrado abaixo, o acordo vem promovendo uma verdadeira reformulação educacional no Ensino Superior em quase toda a Europa e destacando esses países como grandes potências educacionais mundiais. Abaixo consta alguns dos objetivos do acordo de Bolonha:

Criação de um sistema de graus académicos facilmente reconhecíveis e comparáveis, que inclui a criação de um suplemento de diploma partilhado a fim de aumentar a transparência; Criação de um sistema essencialmente baseado em dois ciclos: um primeiro ciclo útil para o mercado do trabalho, de uma duração mínima de 3 anos, e um segundo ciclo (mestrado) dependente da conclusão do primeiro ciclo; Criação de um sistema de acumulação e de transferência de créditos curriculares do tipo ECTS utilizado no âmbito dos intercâmbios Erasmus; Promoção da mobilidade dos estudantes, dos professores e dos investigadores através da supressão de todos os obstáculos à liberdade de circulação; Cooperação em matéria de garantia da qualidade; Incorporação da dimensão europeia no Ensino Superior, aumentando o número de módulos, os cursos e as vertentes cujo conteúdo, cuja orientação ou cuja organização apresente uma dimensão europeia (DECLARAÇÃO DE BOLONHA, 1999).

Dessa forma, assim como aconteceu em Bruges, ao fim do primeiro decênio do acordo de Copenhaga, houve no caso do processo de Bolonha, na cidade em Bucareste, em 2012, o acordo para os próximos 10 anos, ou seja, de 2010-20 em que foi estabelecido mais um conjunto de prioridades, dentre as quais algumas que coincidem com as metas de Bruges e que, seguindo os objetivos dos Programas Educação e Formação 2010 e Europa 2020, deverão ser implementados até lá. São eles:

Dimensão social: acesso e conclusão equitativos; aprendizagem ao longo da vida; empregabilidade; aprendizagem centrada no estudante e missão de ensino do Ensino Superior; educação, investigação e inovação; abertura internacional; mobilidade; recolha de dados; ferramentas de transparência multidimensionais; financiamento (DECLARAÇÃO DE BOLONHA, 1999).

Talvez agora esteja mais claro do porquê comparar os processos acima com a aragem da terra de uma grande árvore frutífera. As metas e acordos pensados em 1999 e 2002 talvez estejam começando a gerar os primeiros frutos agora, aproximadamente 15 anos depois, o que nos leva a depreender que, em se tratando de reformas educacionais, é preciso uma espera a médio prazo para ter o retorno do investimento feito.

Barroso (2005, p. 728-731) corrobora com essa ideia ao dizer que “De um modo geral, a regulação é vista como uma função essencial para a manutenção do equilíbrio de qualquer sistema

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(físico ou social) e está associada aos processos de retroacção (positiva ou negativa)”. Por meio dos órgãos de regulação, o sistema identifica o que está em desordem, analisa, trata essas informações e ordena aos seus órgãos de execução novos comandos para restabilizar o sistema. De acordo com o autor, ao levar em consideração o sistema educativo como um sistema social complexo, pode-se perceber que as diversas possibilidades de “fontes, finalidades e modalidades” para que se possa executar a regulação desse sistema vai depender dos diversos atores, suas posições, seus interesses e suas estratégias para se alcançar os seus objetivos, ou seja, as suas ações e relações. Oliveira, D., também dá sua contribuição quando fala da variável gestão quando diz que

A gama de estudos e pesquisas nesse campo, no que se refere à gestão – a tensão entre descentralização e centralização; autonomia financeira e administrativa e sistemas nacionais de avaliação; a autonomia pedagógica requerida das escolas e as prescrições curriculares, entre outros – pode ser considerada correlata à problemática da regulação educacional (OLIVEIRA, D., 2005, p. 764).

Segundo Afonso (2001a, p. 16-18), essas regulações, até então, representavam o poder que o Estado granjeou ao longo dos anos junto à sociedade, apesar desse poder estar ligado as relações de dominação das classes mais favorecidas e ser “[...] igualmente sujeita às demandas das classes dominadas e de outros actores colectivos e movimentos sociais [...]” que pode existir em uma nação. Essa visão apresenta um estado unido e fortemente integrado, possuindo uma identidade com a língua e uma cultura que demonstra sua dominação de acordo com suas tradições e história que trilhou ao longo dos anos. É nesse contexto que surge a nomenclatura de Estado-nação, demonstrando ser uma organização que apresenta-se com um mesmo território, etnia, governo e identidade, o que ele chama de “isomorfismo”.