• Nenhum resultado encontrado

AS REFORMAS DO ENSINO TÉCNICO E ARTÍSTICO NA 1ª METADE DO SÉCULO

A REFORMA DE 1918

Foi neste quadro político, económico e social que emergiram as reformas educativas como respostas em cada tempo ou época, com mais ou menos celeridade, às altera- ções havidas na sociedade portuguesa. Foram e serão sempre apresentadas, as reformas no ensino, como veículos de mudança e de ruptura dentro de um contexto maior de transformação e de ruptura de um regime com o outro que o antecedeu. As reformas educativas de 1918, 1931 e 1948, todas elas diferentes, porque produtos de épocas dissemelhantes, bem marc adas politicamente - a de 1918 com a I Grande Guerra, a de 1931 com a ascensão da ditadura e impleme ntação do Estado Novo e a de 1948 com o pós guerra - e intimamente ligadas às opções de desenvolvimento económico que foram sendo tomadas.

Perante estes panoramas políticos, económicos e sociais, o comportamento no te rreno das reformas de ensino, particularmente de ensino técnico, teria que ser diverso como foi, quer na abordagem ao estado do ensino como nas transformações propostas e efectivamente operadas.

A reforma de 1918, protagonizada pelo Dr. João Alberto Pereira de Azevedo Neves foi a reforma das boas intenções democráticas, da igualdade, da liberdade e da fraterni- dade. Uma reforma muito coerente com o pensamento republicano e bem estrut urada nos conceitos como na sua aplicabilidade. Azevedo Neves soube ―ler‖ as necessidades do país e construiu uma reforma do Ensino Técnico virada para resolver o atraso cons- tante, metódico e regular desta área do ensino. A revolução republicana estava ainda bem viva e, apesar da I Grande Guerra e das dificuldades económicas, que foram mui- tas, conseguiu-se porém que ela prevalecesse. Foi uma reforma generosa, franca e liberal que careceu de um maior apoio financeiro, que não teve, e cujos resultados se diluíram na voragem das lutas políticas, das capelinhas, das invejas e de incompetên- cias várias que desvirtuaram as ideias nobres que presidiram à sua feitura.

Esta reforma, instituída pelo Decreto nº 5029 de 5 de Dezembro de 1918, que deu ao ensino técnico uma bem estruturada organização, um código e um estatuto da educ a- ção técnica que não era comum em Portugal nos princ ípios do século XX, cotejando com outras que a precederam, sobressai, para além dos bons intentos e propósitos democráticos, a igualdade de género nas oportunidades, nos direitos e deveres do ensino. Quanto às ideias de qual deve ser o papel da escola, o preâmbulo do Decreto é bastante esclarecedor

:

― (…) O valor de um povo, o seguro caminhar na senda do progresso, a harmonia de intuitos capazes de conduzir à finalidade histórica da raça, tem uma só origem, e em só um fundamento imutável através dos tempos: o ensino. É na escola que está a força o direito e o futuro de um povo (…)‖.52

Quanto à função da escola e da sua ligação com a sociedade, Azevedo Neves não pode ser mais explícito e inovador: "(…) O que eu muito desejava conquistar com a reforma era uma comunhão de interesses entre a escola e o meio, entre a escola e as associa- ções de classe respectiva(…)"53. E acrescenta de uma forma digna e corajosa mas

também, porque não escrevê-lo, utópica:

" (…) Na escola, a democracia será perfeita; o Estado protegerá o aluno pobre, mas sempre premiando o trabalho e distinguindo o melhor aplicado (…)‖.54

Ao se estudar qualquer reforma deparamo-nos com duas situações muito típicas, uma, a das reformas se sucederem entre elas sem as anteriores tere m sequer tempo de vingarem para, em seguida serem reformadas antes mesmo de se mudarem os diri- gentes que as propuseram. Outra situação é a falta de aplicação das notáveis ideias que sempre comportam, e, dos extraordinários, inovadores e progressistas diplomas

que as compõem.

Esta reforma não obedece a tais premissas, foge completamente à regra e felizme nte foi aplicada não pelo tempo necessário há mudança que o país precisava , mas sufi- ciente para se aquilatar da sua importância. Esta reforma tem ainda uma particulari- dade que outras não tiveram, que foi o do ensino técnico ficar integrado na Secretaria de Estado do Comércio – mais tarde Ministério do Comércio e Comunicações. Tal medida, foi muito defendida na altura com argumentos poderosos como o do fina n- ciamento ao ensino industrial e comercial ser maior e bem melhor aproveit ado, se estiver num "ministério" de ideias e práticas mais ligadas às necessidades e realidades da vida e não estar, como anteriormente, diluído no Ministério da Instrução Pública onde só se irá teorizar. Em suma este tipo de ensino, deveria, no pensamento do seu mentor, ser prático e capaz de "levantar as forças industriais e comerciais da nossa terra", sereficaz, democrático e formador de jovens para a vida:

" (…) É preciso educar e instruir a classe operária e a isso visa esta organização, que foi elaborada sob o ponto de vista mais democrática e tem por fim criar bons operários mode rnos (…)".55

52 Dec reto nº 5029 de 5 de Dezembro de 1918 , p.23 .

53 I dem, p.23 .

54 I dem, p.24 . 55 I dem,p.25 .

Foi pois para responder ―na prática‖ ao que tão diligentemente enumerara no preâm- bulo do decreto, que o legislador fixa de uma forma clara, coerente, simples e exequí- vel os princípios gerais/estruturais e particulares de todo o desenvolvimento do ensino técnico industrial, comercial e artístico, nas suas mais diversificadas vertentes (alunos, professores, funcionários, tipos de instalações, formação de professores, financiamen- to dos diversos cursos…).

Quanto à estrutura, o Ensino Técnico apresentava-se dividido em duas grandes áreas:

O Ensino Industrial, que era ministrado nas Escolas de Artes e Ofícios - Escolas Indus-

triais - Escolas Preparatórias e Escolas de Arte Aplicada - que compõem o ensino bás i- co os Institutos Industriais - o ensino médio e o Instituto Superior Técnico que com- preendia o ensino superior. Quanto ao Ensino Comercial ele era ministrado nas Aulas Comerciais, Escolas Comerciais, Institutos Comerciais e Instituto Superior de Comé r- cio; sobre o qual não desenvolveremos quaisquer considerandos visto estar fora do âmbito deste trabalho.

As Escolas de Artes e Ofícios eram destinadas a ministrar o ensino elementar sob uma forma prática e acessível, aos indiv íduos que se consagram às profissões artísticas e industriais. São cursos de aprendizagem e de aperfeiçoamento. Podem ser criadas a pedido de um fabricante ou fabricantes, associações locais de turismo, associações industriais de patrões ou de operários no entanto os custos destas escolas eram suportados pelas entidades promotoras, ficando sujeitas à fiscalização do Estado. As Escolas de Artes e Ofícios criadas e os respectivos cursos foram: Tecelagem – Braga, Lamego, Guimarães, Covilhã, Gouveia, Alhandra, Lisboa e Porto, Fabrico de mantas – Terroso; Chapelaria e Passamanaria – Braga; Ourives – Gondomar e Porto; Tapeçaria – Arraiolos e Évora; Rendas e Bordados – Peniche, Vila do Conde, Setúbal, Niza, Figueira da Foz, Funchal, Angra do Heroísmo, Ponta Delgada, Ribeira Gra nde e Horta;

Montador de Electricista – Porto e Coimbra; Canteiros – Pêro Pinheiro, Batalha e

Estremoz; Vidreiro – Marinha Grande; Cerâmica – Coimbra, Porto, Vila Nova de Gaia, Miranda do Corvo, Caldas da Rainha, Ílhavo, Sacavém e Estremoz; Embutidores e

Artefactos de verga – Funchal – Madeira; Serralharia – Angra do Heroísmo, Ponta Del-

gada e Horta, Indústria do couro – Alcanena e Guimarães; Fabrico do papel – Tomar;

Doçaria – Aveiro, Viseu, Évora, Santarém, Beja, Setúbal, Elvas e Faro; Mobiliário –

Porto, Braga e Évora.

Podiam ser admitidos a estes cursos, mesmo indivíduos ana lfabetos e estas escolas não podiam ser frequentadas por mais de 15 alunos por classe. Quanto ao horário de funcionamento era distribuído nos dois turnos: diurno e nocturno e nalgumas discipli- nas (que não especifica) poderiam vir a ser dominicais, conforme as condições locais da profissão.

De realçar, que passadas mais de noventa anos, as localidades referidas, bem assim como os respectivos cursos, desenvolveram com êxito assinalável pequenas e médias indústrias, quase todas relacionadas com os cursos acima descritos, o que prova o conhecimento profundo que Azevedo Neves possuía das necessidades nacionais:

―(…) O ensino profissional pode e deve compreender a feição artística, na especialidade oficinal designada para cada escola, de modo que mais se coadune com o interesse das indústrias locais, ou que mais se ju l- gue conveniente estabelecer para criar qualquer ramo de reconhecida utilidade(…)‖.56

As Escolas Industriais destinavam-se à preparação de aprendizes e operários mode r- nos, ou seja, operários com uma educ ação elementar geral e uma educação manual suficiente. De um grau superior às Escolas de Artes e Ofícios, exigia-se para o seu ingresso o ensino primário. Além de ministrarem cursos de Aprendizagem, serviam também para dar cursos de Aperfeiçoamento aos operários que pretendam instruir-se, ou ainda aperfeiçoar-se na sua arte ou ofício. Resumindo: as Escolas Industriais pre- param aprendizes em cursos de aprendizagem e operários em cursos de aperfeiço a- mento, mas de uma forma global e não ―embrutecedora‖ nas aprendizagens:

" (…) Do ensino resulta a profissão. O progresso tem uma unidade social, um factor elementar que é o ope- rário, quer seja o operário de mãos calejadas em trabalhos rudes, quer seja o operário que despende as suas horas em pesquisas científicas (…)". É necessário dar à classe operária o que lhe é devido, mas é indispensável primeiro que tudo, instrui-la convenientemente (…)".57

As Escolas Industriais criteriosamente distribuídas pelo território nacional, coincidindo basicamente, a excepção do Funchal, com as zonas mais industrializadas do país, pas- saram a ser as seguintes: António Augusto de Aguiar – Funchal; Francisco de Holanda – Guimarães; Afonso Domingues – Lisboa; Machado de Castro – Lisboa; Marquês de

Pombal – Lisboa; Fonseca Benevides – Lisboa; Faria de Guimarães – Porto; Infante D. Henrique – Porto e Avelar Brotero – Coimbra:

" (…) Para que uma escola seja boa não basta possuir bons professores e mestres, é indispensável que seja dotada de máquinas e utensílios modernos e inteiramente semelhantes aos que se empregam na indústria. É preciso que haja boas oficinas. Este ponto é fundamental (…)".58

O ensino ministrado nos cursos de Aprendizagem das Escolas Industriais, compree n- diam três graus: O primeiro grau – Preliminar (1 ano), destinava-se a estabelecer a ligação entre a escola primária e o grau geral. O segundo grau – Geral (4 anos), somente admitia alunos com 13 ou mais anos e servia para ministrar a educação geral

56 I dem,p.27 . 57 I dem,p.28 .

a todos os operários e aprendizes. Por último, o terceiro grau – Complementar (2 anos) – destinava-se a preparar operários modernos, que tivessem completado com aproveitamento o grau geral. Todos os cursos de Aprend izagem eram ministrados no turno diurno, excepto os de Aperfeiçoamento que podiam ser nocturnos. Iremos encontrar, curiosamente, bastante similitude com esta estrutura organizacional, mais tarde, na Reforma do Ensino Técnico de 1948.

Estes cursos, espinha dorsal desta Reforma, possuíam um conjunto de disciplinas e matérias que obviamente iam ao encontro da filosofia que presidiu à sua criação e que eram: No primeiro grau - Preliminar (1º ano) compreendia as seguintes disciplinas: Língua Pátria; Noções de Arit mética e Geometria; Elementos de Desenho Geral; Tra- balhos Oficinais em madeira, ferro, modelação e pintura; Noções de costura, borda- dos, rendas e cartonagem para o sexo feminino. No segundo grau - Geral (4 anos), compreendia as disc iplinas de Língua Pátria; Arit mética e Geometria ; Princípios de Física e Química e Noções de Tecnologia; Geografia e História; Língua francesa; Dese- nho Geral especializado; Trabalhos Oficinais masculinos e femininos (os Trabalhos Ofi- cinais serão sempre de acordo com a especialização do desenho: ao desenho de cons- trução corresponderá trabalhos oficinais em madeira, ao desenho mecânico corres- ponderá trabalhos oficinais em metal…).

No terceiro grau – Complementar (2 anos), como grau especializado compreendia vários cursos com várias disciplinas dirigidas especificamente às dive rsas profissões escolhidas pelos alunos principalmente aquando da frequência do curso Geral.

Houve ainda lugar a uma particularidade de muito interesse, porque reflectia a preo- cupação de Azevedo Neves com a ligação ao mundo do trabalho, detalhe esse que mais uma vez só se veio a reproduzir na Reforma de 1948 que eram, na Reforma de 1918, as Cartas Patentes: As Escolas Industriais concediam "cartas patentes" (uma espécie de diploma de aptidão profissional), aos alunos habilitados com o curso Co m- plementar, que tivessem completado 18 anos de idade e que provassem haver tido uma prática de pelo menos três anos na indústria e que fossem aprovados num exa- me que compreendia, uma prova prática e outra oral sobre assuntos da profissão, precedidas ambas por uma prova de Desenho.

Quanto às Escolas de Arte Aplicada foram criadas, uma em Lisboa e outra no Porto59 e

tinham como objectivo ministrar o ensino de desenho especializado e o oficinal neces- sário aos artistas das artes industriais. Para o seu ingresso precisavam da aprovação

59 Pelo Decreto-lei n.º 1 .027 de 5 de N ovembro de 1914 foi expos to : ―parec endo c onveniente que a nova Esc ola de Arte

Aplic ada do Porto rec eba o nome de um portuense que haja dado realc e à A rte nacional naquela c idade‖. N o s eguimento des te preâmbulo o minis tro dec reta – que o estabelec imento de ens ino se pass e a c hamar: Escola de Artes Aplicadas Soa- res dos Reis e a c ujo cargo es tá a lecc ionação de quatro c ursos de desenho es pecializado, assim c omo a manutenção das ofic inas de pintura decorativa e de talha. T erá vida c urta e s erá anos mais tarde anexa à já exis tente Escola Indus trial Faria de Guimarães , que passará a denominar-s e Escola I ndus trial Faria de Guimarães (A rte A plic ada).

no curso Geral das Escolas Industriais e q uanto aos planos de ensino, duração dos cursos, assim como as disciplinas para estas escolas, desde a sua criação não foram muito claros nem objectivos. Neste particular sempre enfermaram de algumas defi- ciências, mais por via de sobreposições com os cursos das Escolas Industriais e os de Artes e Ofícios e principalmente devido há pouco clara divisão entre o ensino para um ofício e o do ensino artístico enquanto tal. Esta pendência levará o seu tempo a ser dirimida.

As Escolas Preparatórias (4 anos), só existentes em Lisboa e Porto (Escola Rodrigues

Sampaio, em Lisboa e Escola Preparatória, do Porto), eram exclusivamente destinadas

a ministrar o ensino geral, mas os alunos eram canalizados, não para uma via profis- sionalizante, como nos cursos ministrados nas Escolas Industriais, mas sim para os cursos dos Institutos Industriais e Comerciais (cursos médios).

As habilitações necessárias para o ingresso nestas escolas, eram a aprovação no grau complementar da instrução primária, sem limite de idade e o ensino nelas ministrado compreendiam as seguintes disciplinas: Desenho Geral; Língua Pátria; Arit mética Geometria e Elementos de Álgebra; Língua francesa; Língua inglesa; Princípios de Físi- ca e Química; Elementos de Ciências Naturais; Geografia Geral; Elementos de História Universal; Trabalhos Manuais; Noções de Comércio; Escrituração e Contabilidade Comercial; Estenografia e Dactilografia (somente para o acesso aos Institutos Come r- ciais).

As Escolas de Arte Aplicada instituídas no âmbito desta reforma foram somente duas: uma em Lisboa e outra no Porto - Fonseca Benevides e Faria Guimarães, respectiva- mente, que trinta anos depois se transformariam, passando entretanto por outras denominações e moradas, na Escola de Artes Decorativas António Arroio - Lisboa e Escola de Artes Decorativas de Soares dos Reis - Porto.

Como epílogo, pensamos ter hav ido nesta Reforma de 1918 e do seu mentor Dr. Aze- vedo Neves, uma ideia meritória de formar os jovens com uma preparação mais ade- quada às necessidades de uma nação que se pretendia dinâmica, democrática, indus- trializada e preocupada em fazer ―português‖ com beleza e qualidade e como corolário da apresentação desta Reforma achámos melhor encerrar com as palavras, infeliz- mente tão actuais, do seu autor:

―(…) Tomar o ensino útil é torná-lo prático, é criar técnicos e não parasitas. É fundamental que se com- preenda bem nitidamente que todo o indivíduo sem competência técnica prática (junto de propósito os dois vocábulos) é uma perfeita inutilidade para o caminhar do progresso, para a marcha da civilização e constitui um peso para o Estado. O país carece essencialmente de técnicos e não de diplomados. É pela gente com cérebro, e com cérebro capaz de ser praticamente utilizado, que uma nação demonstra o seu valor. A nossa instrução até hoje tem sido essencialmente destinada a produzir diplomados . Procura-se o diploma e não a competência; procura-se o lugar, a competência virá mais tarde. Os alunos saem das escolas sem nenhuma competência técnica, mas com profundos conhecimentos decorados, fixados por qual quer modo. É preciso

acabar de vez com este lamentável estado de cousas, e muito se tem conseguido recentemente, graças ao desenvolvimento de certos organismos do ensino… um ensino útil e prático é proveitoso para o comércio e para a indústria, que não procuram nunca os diplomados, mas tão-somente os competentes, e constitui uma fonte de riqueza para o Estado; um ensino destinado a fabricar diplomados só é prejudicial. Tais são as bases em que assenta este projecto de decreto (…)‖.60

A REFORMA DE 1931

Em 1930 e 1931, é publicado um conjunto de disposições legais reformadoras do ensino técnico que, de uma forma autoritária, modificou totalmente o sentido, o rumo e a estrutura da Reforma de 1918. Gustavo Cordeiro Ramos tinha chegado ao Minist é- rio da Instrução Pública e com ele a política do Estado Novo:

―(…) A Nação, tem o direito de esperar do Estado uma assistência efectiva à instrução profissional e bem assim os recursos extraordinários que neste momento lhe são indispensáveis. Mas - note-se bem - é preciso que seja a Nação a esperá-lo. Que ela sinta e compreenda a suprema utilidade dessa instrução e nenhum governo saberá recusar-lhes os meios de a valorizar (…)‖.61

Com o advento da ditadura, estando ministro Gustavo Cordeiro Ramos, cria-se a

Direcção Geral do Ensino Técnico, sendo seu titular o Eng. Francisco José Nobre Gue- des, futuro Comissário da Mocidade Portuguesa e um dos, senão o principal ideólogo desta Reforma. Procedendo-se de imediato, de acordo com as linhas programáticas do Estado Novo à politização do ensino, e à centralização dos poderes sob o pretexto de dificuldades financeiras ao desmembramento do edifício escolar vindo da I República.

Os Decretos nos 18420 de 4 de Junho de 1930 e o 20420 de 21 de Outubro de 1931

procuram uniformizar os diversos tipos de escolas, cursos e procedimentos pedagóg i- cos vindos da reforma de 1918 e posteriores alterações, extinguindo e transforma ndo umas e criando outras, com o objectivo de rentabilizar o ensino técnico, ao mesmo tempo que impõe a ideologia "estadonovista" à escola e a todos aqueles que a "hab i- tam", especialmente o corpo docente, demasiado republicano para os gostos da épo- ca.

Com alguns, poucos, elogios à reforma de 1918, lá se vai difundindo que se deve ao Dr. Azevedo Neves o último e importante diploma referente ao ensino técnico, no entanto, os regulamentos a que este antelóquio doutrinário deu origem, deformaram porém muitos dos seus princípios e até nalguns pontos o negaram.

60 O rganização do E ns ino I ndus trial e Comercial. P arte III do Relatório, I n, Dec reto nº 5029 , de 5 de Dezembro de 1918 ,

publicado no Diário do Governo, I série, nº 263 de 5 de Dezembro de 1918 .

Contudo, declara-se que o seu todo actual (o produto do diploma de 1918) não satis- faz, é desarmónico, embaraçado, com defeitos graves comprovados e lacunas que não se justificam. Foi com estas intenções de reorganização, como pretendendo pôr a casa em ordem, que este diploma de 1931 aparece e se apresenta, apontando o caminho, traçando metas, sendo claro nos objectivos.

Quanto ao pensamento de qual deve ser o papel da escola e dos seus intervenientes no novo panorama político do país, este Decreto é muito claro e elucidativo como seria de esperar:

" (…) O ensino técnico profissional, considerado há longos anos como um dos órgãos vitais de todo o povo moderno (…).Dispondo como sabemos de sólidos alicerces, representados por uma tradição de seriedade, de labor consciencioso e de fé… o nosso ensino industrial carece, neste momento, em primeiro lugar, dum certo desafogo financeiro (…). Sabemos já como dentro do campo propriamente pedagógico ele soube cum- prir a tarefa que se lhe impunha [diploma de 1918], a de criar no país um ensino que não existia e de que ele necessita como base. Mas ainda, no mesmo campo, uma nova hora vem de soar para todo o mundo industrial: a hora da tecnologia, cujo estudo alcança hoje uma importância decisiva na formação profissional