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AS REGRAS NÃO ESCRITAS

No documento Toni Bentley a Entrega (páginas 86-93)

Não somos domésticos. Ficamos dentro do desejo, do quarto — e fora da cozinha, da lavanderia, do escritório e de qualquer outro aposento que possa ameaçar trazer aquilo à realidade. Em algumas poucas ocasiões, quando famintos depois do sexo, fizemos o jantar — bem, na verdade ele fez, mas depois comemos na banheira com velas, uma grande tigela de metal flutuando cheia de carne tenra e malpassada entre nós. Ambos na parte funda, claro. Nunca fomos a um cinema e não planejamos ir, jamais. Por que iríamos? Nós somos o filme: o filme pornô que não pode existir — visualmente impressionante, espontaneamente inventivo, genitalmente gráfico e visceral‐mente cauterizador de almas. Nada é previsível com o Homem‐A. Sexo, dar o cu, essa é a única constante. Nós nunca deixamos de trepar.

Nós não somos monogâmicos. Nunca fomos e nunca seremos. Nenhum de nós jamais pediu isso e nenhum de nós jamais ofereceu isso. Oferecer seria a única forma de isso acontecer — nenhum de nós se intrometeria na livre escolha do outro. Livre escolha é o centro do que é excitante entre nós. O assunto foi discutido apenas para estabelecer o que deve ser mutuamente compreendido. "Não pergunte, não conte" é a política básica. Ele diz: "Eu não preciso saber." Ele presta atenção ao que é, não ao que não é.

Nunca tendo feito isso antes, pensei muito sobre o assunto. Se alguém faz sexo com outro alguém que não o Amado, o que acontece? Essa pessoa se arrisca a diminuir o afeto pelo Amado? Isso contamina o amor? Ou meramente confirma o amor de todas as maneiras, o contraste iluminando a beleza do Amado novamente, de outra maneira, de outro ângulo? E esse presente para o outro — a liberdade de permitir outras experiências — apenas eleva o amor. Amor sem correntes é que é amor.

A experiência de ser verdadeiramente livre, sem recriminação, sem julgamento, de escolher a qualquer hora, em qualquer dia, este ou aquele,

apenas reforça o amor do Amado, reforça a escolha do Amado como Amado. Não ser monogâmico e exercitar essa opção assegura o grande amor — sendo sempre testado, ele é confirmado, reforçado, transformado, redefinido.

Se um homem pode possuir uma mulher sexualmente — realmente possuir — ele não vai precisar controlar suas idéias, suas opiniões, suas roupas, seus amigos, nem mesmo seus outros amantes. Em minha experiência de muitos amantes, apenas ele verdadeiramente me possuiu, e assim me libertou. Ele come meu cu durante horas, com um pau dois centímetros e meio maior do que o necessário para o trabalho: isso é possuir. Depois de uma rodada como essa, ele não precisa se infiltrar em minha vida, minha psique, meu tempo ou meu guarda‐roupa, porque ele se infiltrou no âmago de meu ser — o resto é apenas decoração periférica. Dominação — total e completa dominação de meu ser —, é aí que encontro a liberdade.

!

Presumi desde o início de nosso caso que ele provavelmente estava comendo alguma outra mulher aqui e ali ou em outro lugar. E ele sabia que eu sabia. Não era a ruiva pré‐rafaelita, mas uma morena bonita e tranqüila que também malhava na academia. Fiquei até com uma certa raiva do poder que presumi que ele tinha sobre ela. Eu sabia dela, mas ela não sabia de mim e isso funcionava muito bem. Eu até tinha minhas próprias fantasias com ela. Eu mesma poderia seduzi‐la, dizer a ela para chupar minha boceta enquanto ele olhava. Esbarrei nela às vezes na academia e éramos sempre amigáveis; ela parecia ser uma mulher legal, tímida.

Ele e eu tínhamos até conversado sobre a idéia de uma trepada a três com ela — nós sempre nos lembrávamos carinhosamente da magia dos tempos da ruiva e imaginávamos se aquilo poderia ser reproduzido com mais alguém.

Mas ele disse que não tinha certeza se eu gostaria do corpo dela. A proporção é importante para mim no que diz respeito a beleza, e embora ela fosse magra, não tinha peitos e tinha uma bunda grande. Bom o suficiente para ele, obvia‐mente, mas talvez não para mim. Uma avaliação curiosa, mas provavelmente correta.

Com o passar do tempo, entretanto, essa mulher tornou‐se cada vez mais abstrata. O Homem‐A estava me comendo tantas vezes e tão bem que ela era facilmente deixada de lado, muitas vezes esquecida. Que ele seja livre para comer quem quiser e mesmo assim me ligue repetidamente, venha até mim e me coma parece uma prova diária de amor e desejo maior do que seria um compromisso de monogamia — especialmente se tiver sido feito apenas para prevenir que as inseguranças aflorem à superfície.

Será que o amor dele é tão profundo quanto o meu? Não ligo se for tão superficial quanto o meu é profundo, desde que ele e seu desejo duro feito pedra apareçam na minha porta dos fundos muitas vezes por semana. A sodomia dá a partida numa gratidão de grande escopo. Suspeito que até ele ter estilhaçado o painel de controle do meu ser — minha acuidade mental e meu poder físico — eu nunca tinha realmente amado antes.

Como você sabe que é amor, amor verdadeiro?

Quando você encontra aquele com quem você não tem medo de morrer. Aquele que manda embora a constante mordida do medo da morte, que nos dá ar para respirar.

Sem medo de morrer, esse é o sentimento que ele gera quando come meu cu. Penetração de boceta não vai tão fundo em minha psique; não quebra a barreira; não faz parar o medo.

O que veio primeiro, o amor ou a sodomia? O amor cresce do desejo. Isso eu sei. Além do mais, não acredito no amor. Já o ouvi ser declarado muitas vezes. Mas acredito totalmente no desejo.

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Depois, eu digo: "Talvez não seja nem o sexo. É algo mais. Além do sexo." Tive um orgasmo clitoriano normal tipo batalhando‐até‐o‐fim? Não. Cheguei sequer a pensar nisso? Não. Apenas uma tola iria se prender ao que conhece enquanto está sendo apresentada a um

território livre além do orgasmo. Território de harmonia, de profunda harmonia com outro ser humano. Família. Ele é minha família.

K‐Y

"Como está a sua tarde?", é o começo.

Ele tem um compromisso às seis, vai passar às três. Agora são duas. Falta uma hora. A cortesã toma o comando. Abro a água da banheira, muito quente, e deixo‐a encher.

Confiro o estoque de camisinhas e reponho, sempre tendo muitas, pelo menos cinco, quanto mais, melhor, numa sensação de fartura e muitas possibilidades, como pipoca. Confiro os tubos de gel K‐Y, espremendo o conteúdo para a abertura e lavando‐os depois na torneira, porque estão pegajosos da última vez. O calor cresce enquanto lavo esses tubos. Uso uma escova de cerdas duras para limpar bem embaixo do sulco na embalagem onde o polegar dele aperta para abrir. A sujeira sempre fica acumulada ali; é assim que sei que o tubo foi usado. Adoro lavar esses tubos com calma.

No início, comprei aqueles pequenos e finos tubos de viagem, bons para uma ou duas sessões, pequenos, discretos, passíveis de serem negados. Quando conheci, no início, o êxtase do ato, achei que poderia ser apenas uma ocorrência muito rara, um tipo de presente especial de aniversário. Considerei que não seria saudável para meu cuzinho ser invadido com tanta freqüência. Achei que a bem‐aventurança não era gratuita, não era planejada e definitivamente não era algo que poderia me acontecer com muita constância. Tais considerações me levaram a comprar aqueles tubinhos de viagem. Mas eles eram fininhos e iam embora rápido, e a negação tornou‐se um esforço. Dar o cu era parte de nosso repertório regular. Da vez seguinte que ele abriu a gaveta, tirou um tubo branco e azul gigantesco, de tamanho fálico, e quando viu aquilo caiu da cama de tanto rir. Foi um movimento arriscado para mim. Presunçoso. Prático.

Depois de muitos meses usando um tubo grande após outro, coloquei dois tubos grandes na gaveta ao mesmo tempo. Foi assim que ele desenvolveu o ritual de espalhar os tubos enquanto eu chupava seu pau. Um homem bonito, com uma ereção feroz, atirando grandes tubos plásticos azuis e brancos pelo quarto (em qualquer lugar que fiquemos ele pode comer meu cu, bem ali, bem naquela hora, sem esforço): era uma imagem de esperança, a mais próxima de uma garantia que conheci com um homem. O anel de ouro em meu dedo anular esquerdo garantia muito menos. Logo havia cinco tubos na gaveta de uma vez só, cada um num diferente estágio, sendo o mais vazio o melhor.

Ainda não consegui descobrir quantas fodas de cu podem ser dadas por tubo de 120m1. Provavelmente umas 11. A US$ 4,19 o tubo, isso dá cerca de 38

cents por trepada... acrescente a isso o preço de uma camisinha (36 por US$ 14,99), a 42 cents, e a melhor coisa do mundo custa menos de um dólar. Depois descobri os tubos com desconto na Cotsco, dois por US$ 4, e comprei seis. Isso faz a coisa baixar para 60 cents por trepada. (Conselho para quem dá o cu: use óculos escuros para comprar K‐Y e não se vire na fila do caixa: estão todos olhando para sua bunda, sem acreditar.)

Vou fazer um estoque de K‐Y. O Lexus dos lubrificantes. Fico muito agradecida pela enfiada suave.

Assisti uma analista de talk show de televisão fazendo perguntas a um homem travestido para saber se ele era gay ou não. Brincando com rápidas associações de palavras, ela diz "Futebol", ele diz "cerveja", ela diz ... ele diz... ela diz "KY", ele diz "Kentucky". Ela anuncia triunfante que ele é heterossexual. E eu acrescentaria que certamente não é um heterossexual sodomita.

Dos lubrificantes líquidos, o Astroglide é rei. Mas estejam avisados: se misturarem Astroglide com K‐Y durante uma simples e vigorosa trepada de cu, vai formar uma grande quantidade de espuma. Espuma por toda parte.

O que querem dizer o K e Y. De acordo com a Johnson & Johnson, que fabrica o gel desde 1910 — seus atendentes foram muito amigáveis ao telefone —, não querem dizer nada, são apenas letras arbitrárias designadas pelos cientistas pesquisadores originais. Mas elas acabaram significando muita coisa.

No documento Toni Bentley a Entrega (páginas 86-93)