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Colocavam o recém-nascido naquele curvo receptivo e davam-lhe giro contrário simples como passe mágico Volta a janela ao natural de seu

1.2 AS SANTAS CASAS DE MISERICÓRDIA E AS RODAS DOS EXPOSTOS

Com o propósito de compreender a relevância das Casas de Misericórdia estabelecidas em quase todo o Brasil e que desempenharam um papel importante na história de assistência às crianças abandonadas, uma vez que as Rodas dos Expostos estavam ligadas a elas, faz-se mister elucidar sua origem.

Os hospitais no Ocidente tiveram em sua gênese a Igreja, especificamente as ordens monásticas, como o local de sua fundação. Nesses lugares, ofereciam-se diversos tipos de assistência, desde enfermagem até abrigo aos peregrinos e também às crianças abandonadas.

No Oriente Cristão, foram concebidas obras especializadas de acordo com sua natureza, isto é: para os doentes, existiram os nosocômios; para as crianças pobres e abandonadas, os brefotrófios; e para os órfãos, os orfanotrófios (MARCÍLIO, 2006).

A assistência aos expostos tem sua primeira instituição com a Irmandade do Santo Espírito fundada por frei Guy, em Montpellier, no sul da França, no ano de 1204. Em Roma, no ano de 1203, o papa Inocêncio III ficou estupefato devido ao grande número de bebês que

eram arremessados no rio Tibre e apanhados por pescadores, levando-o a chamar o Frei Guy para dirigir o Hospital de Santo Espírito in Saxia, ao lado do Vaticano, com a finalidade de receber os expostos. Assim, no ano seguinte, no muro lateral dessa instituição foi instalada uma “Roda”, com um pequeno colchão para que os bebês fossem expostos nesse local, mesmo durante o dia. Conforme Marcílio (2006, p.51) “esta foi, seguramente, a primeira Roda de Expostos da cristandade, que serviu de modelo para as que surgiram posteriormente”.

As maneiras que o Hospital do Santo Espírito encontrou para saciar a fome dos bebês foram basicamente duas: primeiramente se recorreu às amas-de-leite e depois ao leite de cabra. As crianças eram entregues às amas-de-leite que os levavam para suas casas. Ao completarem um ano e meio, elas retornavam para o hospital e lá permaneciam até atingirem os 8 ou 10 anos de idade, quando então eram encaminhadas aos mestres-artesãos com a finalidade de lhes ensinarem diversos ofícios, dependendo da aptidão individual.

Vale ressaltar que nesse período os hospitais não atendiam exclusivamente aos expostos, mas também à população, o que significava que os doentes eram tratados juntamente com os recém-nascidos, às vezes até mesmo dividindo o mesmo quarto, ficando sujeitos a contraírem diversos tipos de doenças.

A Itália foi o núcleo irradiador dos hospitais que tinham a Roda dos Expostos como mecanismo para assegurar a moral católica, sendo sempre possível que o depositário permanecesse no anonimato. Na cidade de Mirandola, no norte da Itália, assim como em Florença, havia a Confraria da Misericórdia, instituição que praticava a caridade e que também recolhia os expostos. As Rodas dos Expostos perduraram por sete séculos em quase toda a Europa: Itália, França, Alemanha, Polônia, Hungria, Dinamarca, Inglaterra, Portugal e Espanha, normalmente associadas às Casas de Misericórdia.

A Casa de Misericórdia20 teve início em 15 de agosto de 1498 na cidade de Lisboa e, a partir de então, começaram a pulular por todo o reino de Portugal e pelas terras d’além mar sob seu domínio. Na sua gênese, um documento detalhado foi lavrado estipulando minuciosamente o compromisso dessa instituição para com a prática de obras de caridade. Para tanto, foi criada a Irmandade Nossa Senhora Madre de Deus Virgem Maria da Misericórdia que seguia impreterivelmente os regulamentos estabelecidos.

20 Segundo Carneiro (1986), D. Leonor foi a verdadeira instituidora das Casas de Misericórdia e não Frei Miguel

de Conteiras. Os religiosos predizem que a Rainha foi uma mera protetora da iniciativa, no entanto, em 1575, os Trinitários mandam pintar a bandeira da Misericórdia com o retrato de Conteiras com as letras FMI (Frei Miguel Instituidor) devido a nesse período o trono estar regido por Felipe II.

As Casas de Misericórdia de Portugal foram mais efetivas na assistência da caridade do que as congêneres italianas:

[...] O horizonte das ambições beneficentes das nossas Confrarias é até, a bem dizer, ilimitado, visto que elas foram criadas expressamente para cumprir, não uma ou outra, mas todas as Catorze Obras de Misericórdia do Catecismo, as quais virtualmente compreendem toda a assistência moral e material de prevenção e de remédio que se possa prestar à humanidade. [...] não só eram elas que enterravam por caridade os mortos miseráveis, olhavam pelos doentes e os recolhiam aos hospitais, mas eram também as Misericórdias que mantinham, e administravam elas mesmo, hospitais, recolhimentos, asilos, que exerciam em larguíssima e maravilhosa escala a assistência, em inúmeras de suas modalidades – a doença, à orfandade, à velhice, à miséria -, assistência que o Estado só muito modernamente começou a exercer uma parte (BASTO, 1934 apud CARNEIRO, 1986, p.59, v.1, grifo no original).

A organização da Misericórdia em Lisboa estava diretamente ligada à formação da Irmandade da Misericórdia, composta pelo Provedor, Mordomo de Presos, Escrivão, Recebedor de Esmolas, Mordomo da Botica e pelos que servem por salário (CARNEIRO, 1986). O principal objetivo da Irmandade da Misericórdia era a prática de obras de caridade, como estabelecia o compromisso da instituição, divididas em quatro vertentes, segundo Carneiro (1986), a saber:

1. Tratar os enfermos: curá-los; acompanhar e enterrar os mortos; 2. Patrocinar os presos: libertar os cativos, acudir aos presos;

3. Socorrer os necessitados: cobrir os nus, dar de comer aos famintos, dar de beber a quem tem sede, dar pousada aos peregrinos;

4. Amparar os órfãos: educar os enjeitados.

Verifica-se assim que o escopo da atuação da assistência caritativa lisboeta abarcava a maioria das necessidades que a população buscava suprir assim como as privações a que ficava exposta. No entanto, a Irmandade da Misericórdia também se preocupava com a educação das crianças órfãs, mesmo que de maneira ainda incipiente e mais voltada para uma profissionalização. Essa era uma medida importante principalmente num período em que o acesso à educação era restrito à população infantil.

Na história da fundação da Casa da Misericórdia de Portugal foram seus protagonistas: o Rei D. João II, sua consorte a Rainha D. Leonor e o Frei Miguel de Contreiras21 (como seu executor do plano da Monarquia). Essa Casa foi de fato um dos maiores legados deixados por

21 Frei Miguel de Contreiras nasceu em Segóvia, em 29 de setembro de 1431, de família nobre. Ainda moço,

ingressou na vida monástica, professando na Ordem da Santíssima Trindade. Viveu na Espanha até os 50 anos de idade e, por razões ignoradas, transferiu-se para o convento da mesma ordem na cidade de Lisboa (CARNEIRO, 1986, p. 50, v.1.).

eles no que concerne ao socorro de parte da população de um reino ainda sem tantos recursos financeiros (CARNEIRO, 1986).

Para arcar com os custos de tamanha magnitude e para que a vultosa obra não padecesse por falta de verba, outra decisão importante foi tomada: os nobres seriam membros integrantes da Casa de Misericórdia e em troca a Coroa lhes concederiam alguns privilégios. Dessa forma, por meio da união entre a Igreja, a Coroa e a nobreza, as Santas Casas de Misericórdia conseguiram atingir seus desígnios.

A criação da Casa de Misericórdia de Portugal está associada à fundação do Hospital de Todos os Santos, que tiverem seus primeiros alicerces lançados em 1492, e à D. João II, D. Leonor e ao Frei Contreiras, como vimos anteriormente. A fundação do Hospital de Todos os Santos, idealizado pelo Rei D. João II, fazia parte de uma nova reforma da assistência portuguesa, ou seja, previa alguns pontos cruciais, tais como:

1. Concentrar todos os 43 hospitais de Lisboa em um único estabelecimento; 2. O Estado assumiria a partir dessa reforma a responsabilidade da assistência,

retirando assim do domínio da nobreza esse setor (CARNEIRO, 1986). Em 1495, D. João II faleceu, deixando em seu testamento o desejo de terminar a obra do Hospital de Todos os Santos, o qual foi realizado pela sua viúva, tendo sido inaugurado em 1501.

O trabalho de caridade do Frei Contreiras teve início em Lisboa, em 1498. Por ter ficado impressionado com o alto grau de miséria que reinava naquela cidade, solicitou à Câmara Municipal que concedesse uma casa abandonada (antes utilizada para as audiências do Cível), com o propósito de estabelecer um hospital para abrigar indigentes, pobres, doentes, estrangeiros (que não conseguiam acolhida), viúvas e órfãs (PINTO, 1828). O intuito era combater as epidemias que assolavam o Reino, além de ser uma estratégia política embasada no enfraquecimento da aristocracia, num local onde até então ela havia exercido grande influência (CARNEIRO, 1986).

Essa obra foi de tão grande envergadura que o rei D. Manuel foi pessoalmente até o nosocômio averiguar os trabalhos que estavam sendo dispensados aos necessitados:

[...] o phisico-mor ia ao hospital para medicar por ordem da Rainha e tanto bastava que outros o fossem por “cortezania: fidalgos e plebeus iam ao encontro de Frei Miguel de Contreiras, quando mais não fosse para serem agradáveis ao Poder, que nessa ocasião se concentrava nas mãos de sua real confessada (FERREIRA, 1898

O Hospital de Todos os Santos tinha como escopo agregar todos os pequenos hospitais de Lisboa. Para isso, foram construídas três seções: a de São Vicente, destinada aos homens de febre; a de São Cosme, aos feridos; e a de Santa Clara, às mulheres feridas ou com febres. Destaca-se que essa instituição considerou a dicotomia dos enfermos: incuráveis e infecciosos, tratando-os em aposentos separados, localizados abaixo das enfermarias; a albergaria dava acolhida aos peregrinos e aos pobres.

Em relação aos expostos, a Misericórdia, em sua conduta caritativa, não se eximiu da obrigatoriedade de assisti-los, mesmo sem tê-los incluído em seus estatutos. Assim, em 1637, foi criada a Casa dos Expostos da Santa Casa de Misericórdia de Lisboa, regulamentada em 1716 pelo Compromisso da Mesa dos Enjeitados, ficando estipulada “a eleição dos irmãos da Mesa, do provedor, escrivão, tesoureiro, dos bens, das rendas da Casa dos Expostos e das crianças sob sua guarda” (MARCÍLIO, 2006, p.98).

Cada um dos “irmãos”, como eram chamados, que ocupasse algum dos respectivos cargos acima descritos deveria ter habilidades específicas para assumir as responsabilidades advindas de suas funções, por exemplo, a administração geral ficava a cargo do provedor que devia ser:

[...] sempre um homem fidalgo, de autoridade, prudência, virtude, reputação, idade de maneira que os outros Irmãos o possam reconhecer por cabeça, e o obedeçam com mais facilidade, ainda que por todas as sobreditas partes o mereça, não poderá ser eleito de menos idade de quarenta anos (CARNEIRO, 1986, p.74, v.1).

A Casa dos Expostos contava ainda com dois mordomos, um nobre e um oficial mecânico, responsáveis pela gestão econômica, e ainda com outros funcionários encarregados da criação, educação e assistência médica aos expostos. Havia também as amas que se dividiam em três categorias:

1. Rodeira: mulheres que conduziam todas as crianças da Casa e cuidavam da porta de entrada da instituição;

2. Amas-secas: moças que permaneciam internadas na Casa da Roda e cuidavam das crianças maiores que já haviam sido desmamadas quando elas retornavam à Instituição;

3. Amas-de-leite: permaneciam na Casa amamentando os bebês desde que chegavam até o momento em que fossem encaminhados às amas de fora (MARCÍLIO, 2006).

O mecanismo da Roda no qual os bebês eram expostos funcionava praticamente da mesma maneira em todas as Casas de Misericórdia: era um dispositivo de madeira de forma cilíndrica, com uma divisória ao meio e podia ser fixado no muro ou na janela da instituição; na parte externa havia um tabuleiro inferior que servia para acomodar o bebê. O expositor22 girava a roda e puxava um cordão em cuja ponta havia uma sineta para avisar a rodeira que uma criancinha acabara de ser abandonada. A pessoa podia sair do local sem ser identificada.

A figura abaixo (Figura 2) é a Roda da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo que se encontra no Museu da Santa Casa de Misericórdia.

Figura 2: A Roda dos Expostos da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.

Fonte: ARRUDA, 2009, p.13.

Essa peça, juntamente com demais objetos, como bilhetes das pessoas que depositavam os bebês na Roda, fotografias que registravam o cotidiano dos expostos estão em exposição no Museu da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Observamos que no lado esquerdo há uma alça, que servia de apoio tanto para a pessoa que deixava a criança na Roda quanto a rodeira para girar o cilindro assim que a criança era depositada. Em São Paulo, a parte que continha a abertura ficava voltada para a Rua Dona Veridiana, e após o bebê ter sido depositado, a roda era girada, passando a abertura para o interior da Santa Casa. Na parte inferior da mesa sob a qual a Roda está apoiada, é possível observar os Livros de Matrículas dos enjeitados. Neles eram registrados todos os bebês que eram depositados na Roda, contendo

a data de entrada, a existência ou não de um bilhete acompanhando-os, roupas, ou até mesmo eventuais marcas de nascença que a criança possuía.

A figura abaixo (Figura 3) trata-se de um desenho de 1846, do viajante Thomas Ewbank, um dos muitos viajantes que produziram seus relatos acerca da sociedade da América Portuguesa.

Figura 3: Abandono de exposto na Roda na Rua Santa Tereza, Rio de Janeiro.

Autor: Thomas Ewbank. Fonte: VENÂNCIO, 2010, capa.

Ao analisarmos a imagem, é necessário termos em mente alguns critérios para guiarmos nossa incursão, por exemplo: o viajante nunca está só em sua viagem, ele traz consigo uma bagagem de informações preconcebidas que serão utilizadas para tentar compreender a nova cultura que está visitando. Sabe-se que durante o período em que Ewbank permaneceu no Brasil ele passeava pelos diversos ambientes da cidade do Rio de Janeiro com o propósito de descrever os hábitos dos moradores em detalhes. No entanto, devemos recordar que o momento do abandono da criança na Roda dos Expostos era feito geralmente quando não havia ninguém por perto, o que nos leva a questionar o quanto essa pintura pode retratar o momento in loco do abandono. A imagem demonstra o momento em que a mulher que pode ou não ser a mãe da criança está deixando-a na Roda. A sua face é uma mistura de angustia, medo, tristeza. Pelas

vestes representadas na imagem pressupõe-se que se trata de uma pessoa de poucas posses econômicas, talvez seja esse o motivo pelo qual a opção do abandono tenha sido a única forma para dar uma sobrevida à criança.

No Brasil, havia treze sedes das Santas Casas de Misericórdia, fundadas em diferentes momentos históricos, a saber, (CARNEIRO, 1986):

 Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Santos: fundada em 1543, por Braz Cubas – considerada o primeiro hospital do Brasil;

 Irmandade da Santa Casa de Misericórdia da Bahia: fundada em 1549, pelo governador geral Tomé de Souza;

 Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Olinda: fundada em 1560, por João Paes Barreto. Em 1631, com a invasão holandesa, ela foi destruída por um incêndio e sua reconstrução teve início em 1637, sendo finalizada em 1654 para atuar com obras de caridade. Em 1831, a Irmandade foi extinta, sendo incorporada à Santa Casa do Recife;

 Irmandade da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro: fundada em 1567, na Urca com apenas seis cabanas; posteriormente foi transferida para o morro do Castelo por Mem de Sá. Não houve recursos financeiros para a construção de uma casa hospitalar, mas os irmãos da Confraria ergueram a Capela de São Sebastião, local de celebração dos cultos. Após 15 anos, em 1582, foi fundado o Hospital da Confraria da Misericórdia pelo padre José de Anchieta, num galpão de pau a pique, para acudir aos marinheiros doentes da armada de Diogo Flores Baldes;

 Conferência da Misericórdia do Espírito Santo no Estado do Espírito Santo: fundada em 1551. Em1606, irrompeu o Hospital da Misericórdia na Vila de Vitória;

 Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo: fundada em 1599, juntamente com o Hospital da Santa Casa de Misericórdia, fundado em 1603;

 Irmandade da Santa Casa de Misericórdia da Paraíba: suas obras tiveram início em 1602 e foram finalizadas em 1618; sua fundação é atribuída a Duarte Gomes da Silveira. Consta que nessa instituição foram acolhidos os doentes pobres e os meninos expostos;

 Irmandade da Santa Casa de Belém: fundada em 1619. No preâmbulo de suas tarefas acudia aos doentes pobres, defendia os acusados perante juízes e

tribunais, prestava socorro aos necessitados e amparava as órfãs. Em 1787, foram finalizadas as obras do Hospital de Caridade do Largo da Sé, mas o mesmo se tornou demasiadamente pequeno para atender à demanda da população, sendo necessário construir um novo hospital, o que ocorreu em 1890. Sabe-se, no entanto, que em 1807 o Hospital da Caridade passou a pertencer à Santa Casa de Misericórdia do Pará, sendo por ela gerenciado;

 Irmandade da Santa Casa de Misericórdia do Maranhão: fundada em 1657, juntamente com o Hospital de São Luís do Maranhão, pelo padre Antonio Vieira;

 Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Campos, no Rio de Janeiro: fundada em 1791, tendo sua gênese na Irmandade de Nossa Senhora Mãe dos Homens; em 1792, passou a ser denominada Santa Casa de Misericórdia por meio de um edital da rainha D. Maria I;

 Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Resende, no Rio de Janeiro: foi instituída em 1835, pelo padre Manoel dos Anjos Barros de Carvalho;

 Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Manaus: foi fundada em 1853, numa casa alugada. A epidemia de varíola, em 1869, e a de febre amarela, em 1872, ressaltaram a necessidade de se ter uma sede própria para o hospital. As obras foram possíveis com a subvenção da província do Amazonas e pelos donativos recebidos da população em geral, inclusive da elite, sendo iniciadas em 1872 e finalizadas em 1876;

 Irmandade da Santa Casa de Misericórdia do Recife: fundada em 1858, em substituição à extinta Santa Casa de Olinda, fundada por Francisco de Souza Rego. Conta sua história que a iniciativa de Rego se deu em 1802, com a implantação de um hospital para os pobres da Ribeira em dois endereços na vila do Recife. Somente depois de mais de cinquenta anos é que foi fundada a Santa Casa do Recife.

A breve cronologia acima mencionada nos permite constatar que as fundações das Santas Casas de Misericórdia no Brasil tiveram início ainda no período colonial, sendo instituídas nas principais capitanias do Brasil. “Em muitos casos a fundação de uma Misericórdia era simultânea à fundação da cidade, ou a seguia de pouco como aconteceu com a Santa Casa de Olinda” (RUSSELL-WOOD, 1981, p.31), tendo em seu escopo as 14 obras de

caridade, tanto espirituais quanto corporais, instituídas em seu regimento por Frei Miguel de Contreiras.

Na presente pesquisa optamos dar maior ênfase às Santas Casas de Misericórdia de Salvador, Rio de Janeiro e Recife – no período colonial, e sobretudo à de São Paulo, no Império, por possuírem a Roda dos Expostos.

A Roda dos Expostos de Salvador foi fundada em 1726 para apaziguar o “abandono selvagem” cometido na cidade e para atenuar a situação financeira da Câmara Municipal. O anonimato, ao dispor o exposto na roda, era um fator primordial nesse processo. O mecanismo que fazia com que a roda funcionasse era semelhante em quase todas as regiões onde a mesma estava localizada; o que poderia divergir de uma localidade para outra era o local onde ela era fixa, ora no muro da instituição, ora numa janela.

Em 1857, as Irmãs de Caridade de São Vicente de Paula assumiram a administração da Casa da Roda de Salvador, assim como de um recolhimento para moças pobres. Sua função era estabelecer entre os expostos uma educação severa e disciplinar, por meio do ensino religioso e do trabalho (RODRIGUES, 2010).

O sistema de acolhimento dos expostos perdurou em Salvador até 1934, quando foi alterada a maneira pela qual a criança era aceita na instituição. O anonimato havia deixado de ser uma premissa. Com a instalação do ‘escritório aberto’, os familiares ou acompanhantes