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As turmas observadas: perfil dos alunos e das docentes

5. UM EVENTO DE LETRAMENTO EM DUAS CLASSES DO REAJA

5.3 A INTERAÇÃO EM DUAS CLASSES DO REAJA

5.3.2 As turmas observadas: perfil dos alunos e das docentes

As duas turmas têm em comum vários aspectos: são formadas, em sua maioria, por adultos, seguidos de pessoas jovens e idosas. O perfil sócio-cultural condiz com aquele comumente traçado para esse público: migrantes de zonas rurais ou cidades menores, com passagem curta e não-sistemática pela escola na infância e/ou adolescência, que trabalham em ocupações urbanas não-qualificadas e que buscaram a escola para aprender a ler e a escrever e cursar algumas séries do ensino fundamental (OLIVEIRA, 2001; SANTOS,J., 2003; SOARES, 2001)31.

Ambas as turmas também apresentaram um índice de evasão considerável, mas nada que destoe do que se verifica normalmente no Programa. A Turma 1 contava com 45 alunos matriculados no início do ano e 28 freqüentes no segundo semestre, segundo estimativa da professora. Contudo o número máximo de alunos que freqüentaram as aulas no período observado foi de 15, incluindo um discente que chegou ao Módulo II, avançado do Módulo I, naquelas semanas. Na Turma 2, o número de matrículas, conforme relata a professora, passou dos 40, porém a turma contava, no fim do ano, com 17 alunos freqüentes, dos quais 15 compareceram no período em que a pesquisadora esteve com a classe.

Como foi comentado na seção anterior (p.88), a evasão é um problema conhecido da coordenação do REAJA e parece não ter uma solução fácil devido às razões que motivam a saída do jovem e adulto da sala de aula. Parece também que não há um movimento claro da parte da Secretaria de Educação, ou das direções escolares, tampouco das professoras, no sentido de se tentar reverter ou minimizar tal quadro com qualquer tipo de intervenção. A evasão escolar foi comentada pelas professoras e pela coordenadora do REAJA em tom de preocupada resignação,

como se estivesse evidente a seriedade e natureza do problema, assim como a impossibilidade prática de se fazer algo sobre o assunto. Há que se discutir, entretanto, em instâncias apropriadas, o papel da escola na efetivação de um discurso político-pedagógico que trabalhe em prol da manutenção do aluno em classe de EJA e que não reforce o sistema de re-exclusão daqueles que já foram, um dia, excluídos da escola. A evasão não pode ser considerada apenas mais um problema da escola, mas uma questão a ser seriamente discutida no espaço escolar e fora dele, visto que muitos dos motivos que tiram o aluno da sala dizem respeito não apenas às suas condições sócio-econômicas, mas também à organização escolar e ao modo como ela trata o aluno jovem e adulto.

As turmas são caracterizadas por suas professoras de maneira semelhantes: as duas docentes afirmam gostar dos alunos com quem trabalham e expressam satisfação quanto ao seu desenvolvimento acadêmico, destacando o fato de esses alunos terem conseguido prosseguir nos estudos até o fim do ano. Elas também fazem referências à participação dos alunos nas discussões e às inúmeras diferenças em se trabalhar com adultos e com crianças ou adolescentes, especialmente no que concerne ao rendimento das aulas, à indisciplina – problema inexistente entre os adultos –, e às relações interpessoais. Ambas reforçam que as relações são muito mais respeitosas entre alunos jovens e adultos do que com os outros e atribuem isso ao fato de os adultos serem mais conscientes da necessidade de estudar e terem a posição social do professor em alta conta.

A professora da Turma 1 é aluna formanda do curso de Pedagogia da UESB32, atuando na área da educação há quinze anos, e com jovens e adultos há sete. Nas conversas informais travadas no período de observação de campo, ela

afirmou que gosta de trabalhar com as turmas do REAJA, mas que pretende dar aula para crianças assim que terminar seu curso e puder trabalhar no turno da manhã, quando atualmente ela estuda.

A Turma 2 é conduzida por uma professora que também já trabalha com educação há alguns anos; esta classe, contudo, é sua primeira experiência com educação de jovens e adultos, da qual ela diz estar gostando bastante, apesar das dificuldades encontradas. A regente é estudante do curso de Letras da UESB, cursando o 5º semestre letivo, e já tem em sua formação outros cursos superiores (Bacharel em Teologia e Bacharel em Psicanálise, conforme informações da mesma). Ela descreve a sua turma como muito animada, disposta a fazer coisas novas, a aprender, atenta, polêmica. Sobre sua relação com a turma, afirma que mantém um clima positivo em classe, que as aulas são divertidas, que ela faz "de tudo" para tornar as aulas mais agradáveis para seus alunos e que desenvolveu com eles um relacionamento tão bom que ela gostaria de continuar com a mesma turma, se fosse possível, no ano seguinte.

Questionada sobre os problemas de trabalhar com uma turma de jovens e adultos, ela disse que a principal dificuldade é a evasão escolar, fruto da necessidade que os alunos têm de conciliar emprego e estudo. Lembre-se que a turma que começou com mais de quarenta alunos matriculados conta, no fim do ano, com 17 alunos freqüentes.

Para falar dos pontos negativos das turmas, as suas regentes levantaram unânimes a dificuldade que muitos alunos têm em dar continuidade aos estudos por causa dos problemas de ordem sócio-econômica que os afastam da sala de aula. A professora da Turma 2 exemplificou o problema com alguns casos de alunos que precisaram desistir da escola porque conseguiram um emprego novo ou porque

precisaram mudar seus horários de trabalho. Ao longo dos períodos passados nos dois colégios, outras situações foram citadas pelas professoras, algumas relacionadas a questões pessoais e não necessariamente relacionadas com o trabalho, como a de uma senhora com mais de 70 anos que, em dias de chuva, não conseguia chegar à escola; a de um senhor que trabalha fora da cidade e que quase nunca chega a tempo de ir à escola (ele só compareceu uma vez no período acompanhado na Turma 1); a de uma faxineira da Turma 2 que saía tarde do trabalho e, muito cansada, nem sempre conseguia ir para a aula; a de uma senhora da Turma 1 que precisou viajar para acompanhar a filha que acabara de ter um bebê, entre outros casos.