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As unidades de conservação brasileiras e os mosaicos: princípios de sua governança

seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração ao qual se aplicam garantias adequadas de

proteção”. As unidades de conservação integrantes do SNUC dividem-se em dois grupos,

segundo distintas categorias de manejo. As unidades de uso sustentável somam 56% do total de unidades de conservação federais. As unidades de conservação de proteção integral, por outro lado, correspondem a 44% do total.27

Quadro 8. Tipos de unidade de conservação segundo o SNUC I - Unidades de Proteção Integral II - Unidades de Uso Sustentável

Estação Ecológica Reserva Biológica Parque Nacional Parque Estadual Monumento Natural Refúgio de Vida Silvestre

Área de Proteção Ambiental

Área de Proteção Ambiental Estadual Área de Relevante Interesse Ecológico Floresta Nacional

Floresta Estadual Reserva Extrativista Reserva de Fauna

Reserva de Desenvolvimento Sustentável Reserva Particular do Patrimônio Natural

No Brasil, conforme afirma Medeiros (2006), apesar de o SNUC ter equacionado o problema de ordenar o conjunto de unidades de conservação existentes, definindo critérios mais objetivos para a criação e gestão de algumas tipologias e categorias que antes se encontravam dispersas, e apesar de ter aberto espaço para que novas categorias fossem criadas ou incorporadas a partir de experiências originais desenvolvidas no país (como as Resex e RDS),

27 Por motivo de espaço, para a caracterização de cada uma das categorias de UC reconhecidas pelo SNUC remetemos o leitor para a lei nº 9.985/2000 (MMA, 2007).

deixou de fora outras tipologias que continuaram a existir, isto é, as chamadas “Áreas Protegidas”: as Áreas de Proteção Permanente (APPs), as Reservas Legais (RLs), as Terras

Indígenas (TIs) e as Áreas de Reconhecimento Internacional (ARIs). Isso dificulta a integração e a articulação dessas categorias com as ações previstas para as demais UCs, gerando conflitos decorrentes da sobreposição de territórios, por exemplo, entre as UCs, as TIs e os territórios quilombolas reconhecidos pela Constituição de 1988. As decorrências dessas ambiguidades são conhecidas, sendo a principal delas a sobreposição de territórios gerando conflitos fundiários, sociais e ambientais que impedem a compatibilização da

“presença da biodiversidade, a valorização da sociodiversidade e o desenvolvimento sustentável no contexto regional” (MMA, 2007, art. 26, p. 22-23).

O SNUC, lei nº 9.985/2000 que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (MMA, 2007), previu a gestão territorial e ambiental por mosaico “de forma integrada e participativa, considerando-se os seus distintos objetivos de conservação, de forma a compatibilizar a presença da biodiversidade, a valorização da sociodiversidade e o desenvolvimento sustentável no contexto regional” quando da existência de um conjunto de unidades de conservação de categorias diferentes ou não, próximas, justapostas ou sobrepostas e outras áreas protegidas, públicas ou privadas.

No site do ICMBio, encontramos a seguinte descrição da definição e dos objetivos dos mosaicos:

O mosaico é a gestão integrada e participativa de um conjunto de unidades de conservação que estejam próximas, sobrepostas ou justapostas. Este instrumento de gestão integrada tem a finalidade de ampliar as ações de conservação para além dos limites das UCs, compatibilizando a presença da biodiversidade, a valorização da sociodiversidade e o desenvolvimento sustentável no contexto regional (art. 26; SNUC). O mosaico é reconhecido por meio de ato do Ministério do Meio Ambiente, que institui um conselho consultivo para promover a integração entre as unidades de conservação que o compõem. A Portaria nº 482, de 14 de dezembro de 2010, institui os procedimentos necessários para o reconhecimento dos mosaicos. Existem atualmente 14 mosaicos reconhecidos oficialmente e inúmeras iniciativas envolvendo UCs federais (...) Para apoiar e acompanhar o reconhecimento e a implementação destes dois instrumentos de gestão integrada entre unidades de conservação, o Instituto Chico Mendes conta com uma coordenação específica, vinculada à Coordenação Geral de Criação, Planejamento e Avaliação de Unidades de Conservação (CGCAP/DIMAN).28

De acordo com o decreto nº 4.340/2002, que regulamenta o SNUC (MMA, 2007), esse modelo de gestão integrada tem como objetivo compatibilizar, integrar e otimizar as

28 Informações disponíveis no site do ICMBio, em http://www.icmbio.gov.br/portal/o-que-fazemos/mosaicos-e- corredores-ecologicos.html. Acesso em 23 nov 2014.

atividades desenvolvidas em cada unidade de conservação, tendo em vista, especialmente, os usos na fronteira entre as UCs, o acesso às UCs, a fiscalização, o monitoramento e a avaliação dos Planos de Manejo, a pesquisa científica e a alocação de recursos advindos da compensação referente ao licenciamento ambiental de empreendimentos com significativo impacto ambiental, assim como estreitar o relacionamento com a população residente na área do Mosaico. O SNUC também prevê um Conselho Consultivo para o Mosaico de UCs (ou de Áreas Protegidas), como se refere a ele a lei de regulamentação do SNUC.29 O decreto nº 4.340/2002, em seu capítulo V, afirma que as UCs poderão ter Conselhos Consultivos ou Deliberativos segundo a sua categoria (MMA, 2007).

Como apontam Caroline Delelis e colaboradores (2010), os conselhos gestores que surgem com a Constituição de 1988 são

um espaço de “concertação” e decisão democrática, criando uma cultura cidadã e de

responsabilidade (...) Nesses espaços, as demandas devem ser legítimas por princípio, prevendo-se canais de confronto e pactuação democrática entre atores e projetos sociais, de modo a se construir caminhos viáveis com inclusão social (p. 64).

O Conselho de uma UC é um espaço de participação da sociedade, que pode tanto

“simplesmente” procurar influir na tomada de decisões para auxiliar o chefe da unidade no

tratamento dos conflitos envolvendo a UC (Conselho Consultivo, no caso de da categoria de proteção integral e algumas de uso sustentável), como definir os principais usos a que se presta a unidade de uso sustentável (Conselho Deliberativo de Reservas de Desenvolvimento Sustentável - RDS e Reservas Extrativistas - Resex). O depoimento de Lucila P. Vianna e colaboradores (2011), a propósito do processo de gestão da APA Marinha do Litoral Norte em São Paulo é bastante elucidativo dessa preocupação:

O maior desafio do CG [Conselho Gestor] é construir um fórum participativo e democrático, onde se estabeleça alternativas de convivência nas quais os interesses particulares de cada setor tenham como contraponto os interesses comuns e coletivos. (...) Estes processos foram

29 Mais uma ambiguidade existente no SNUC, essa dupla caracterização dos mosaicos vem causando problemas de interpretação que se refletem na gestão da governança. Afinal, trata-se de Mosaicos de Unidades de Conservação, com ênfase no planejamento e na gestão territorial a partir das UCs? Ou são Mosaicos de Áreas Protegidas, e, como tais, devem incluir em sua composição, além das UCs, as reservas indígenas, as terras quilombolas e outros territórios de povos tradicionais (ainda que não completamente reconhecidos pela legislação), e demais áreas de proteção permanente? O que dizer das Reservas Legais? Como veremos adiante, nos dois mosaicos que estudamos foram feitos arranjos locais no regimento interno. Tentou-se acomodar disputas de poder pré-existentes entre diferentes coalizões de defesa e garantir a sua representação paritária no Conselho Consultivo (pró-biodiversidade ou pró-sociodiversidade, no caso do Mosaico Bocaina), e também buscar uma alternativa ao modelo presidencialista desenhado originalmente no MMA (com a constituição de uma diretoria colegiada ao invés de uma Presidência e uma Vice-presidência assessoradas por uma Secretaria Executiva), que além de ser considerado extremamente centralizador e contradizer o princípio de gestão compartilhada do território, acaba por sobrecarregar tanto o presidente como o(a) secretário(a) executiva.

conduzidos promovendo o empoderamento e a incorporação dos atores envolvidos diretamente com o ambiente marinho no processo de gestão do mesmo, possibilitando o acesso à informação e à expressão de cada um, de forma igualitária e democrática. O processo participativo tem sido inclusivo, respeitando o tempo de entendimento e reflexão de cada setor, bem como se adaptando às necessidades de participação dos setores menos organizados, como os pescadores.

Porém, em nenhum momento a legislação competente indica o tamanho deste conselho. Isso pode vir a se tornar um problema para a governança quando o número de componentes é muito grande, dada a dificuldade de conseguir alcançar quóruns e gerar consensos.30 Conforme aponta Maciel (2007: 120): “O que se vê é que há um excesso de reuniões das quais participam basicamente as mesmas pessoas. Isso implica, geralmente, em gasto desnecessário de tempo e recursos. Um sistema eficiente de gestão dos mosaicos deve levar

isso em consideração”.

Além disso, há problemas que são próprios do funcionamento dos Conselhos, segundo um estudo que se propôs a avaliá-los contando com a participação e depoimento de alguns conselheiros empossados (MMA, 2004). Entre as dificuldades mencionadas está a sua composição (designação dos conselheiros pelo gestor da UC, com risco de personalização da representação) e a elaboração do Regimento Interno (que por vezes define nominalmente as entidades que dele podem participar, dificultando a ampliação da participação da população local), o mau funcionamento ou inexistência de uma Secretaria Executiva (com o correspondente acúmulo de funções para a gerência da UC), a falta de recursos previstos no orçamento para o funcionamento dos Conselhos e deficiências orçamentárias em geral (o que

por vezes dificulta operacionalmente a realização das reuniões: “falta de transporte ou ajuda

de custo aos membros menos favorecidos economicamente e/ou residentes em locais mais

afastados ou isolados”), e as prerrogativas do chefe da unidade de conservação previstas em

lei (presidente do Conselho), as quais tendem a garantir uma centralização do poder de decisão (e veto) nas figuras estatais.

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Numa consulta sobre o tamanho de conselhos diretor, administrativos e consultivos, realizada por comparação com os dados disponíveis em sites de ONGs e empresas, além de conselhos consultivos de UCs, Enrico Bernard, pesquisador e professor da UFPE, observou: “Para as UCs, o número de assentos variou entre 12 e 33, com média de 26,6 assentos por conselho. Para o grupo não UC [ONGs e empresas], variou entre 5 e 23, com média de 11,3 assentos por conselho. Ou seja, em média, os conselhos consultivos das UCs brasileiras tem mais que o dobro de assentos que os conselhos similares de entidades de outros ramos”. E constata o que ele chama de “incoerência”: “(...) algumas das entidades ambientalistas que estão diretamente envolvidas com os processos de suporte à criação e implementação de UCs no Brasil têm conselhos bastante enxutos, mas parecem não transmitir esta lição para as UCs que apoiam e que estão criando os seus próprios conselhos. Isso, ao meu ver, é um mau conselho” (Cf. Bernard, 2009).

O Conselho Consultivo é uma instância voltada para o debate das questões locais pungentes e também de auxílio na condução e solução dos problemas e conflitos identificados que estão a cargo do chefe da unidade de conservação. No entanto, o Conselho pode vir a ser considerado por este último como uma ameaça à sua autoridade, o que pode de fato levá-lo a uma postura de encastelamento e a sabotar o seu funcionamento adequado (não divulgando com a devida antecipação as convocatórias; selecionando a pauta de discussão dos temas sem consulta aos demais conselheiros; discussão de assuntos técnicos sem o devido suporte de material impresso, tais como cartilhas, textos de apoio, mapas etc.; ou mesmo não se esforçando por proporcionar uma capacitação constante dos conselheiros).

Alguns atores/autores envolvidos que participam direta ou indiretamente das experiências de implementação de UCs no Brasil identificam que a disposição para a ação coletiva e para a cooperação intra e interinstitucional tem também outras raízes além daquelas definidas nos marcos legais. Há motivações diretamente derivadas dos desafios apresentados aos gestores no cotidiano do seu trabalho (Tambellini, 2007a), ou motivadas e estimuladas pelo apoio dado por instâncias superiores, tais como o Departamento de Áreas Protegidas (DAP-MMA) para o estabelecimento de mosaicos de UCs (especialmente o edital do FNMA de 2005)31 e a existência de uma legislação básica para a implementação (tal como SNUC, de 2000 e o Decreto 4.340, de 2002) (Chada et al., 2010).

Com apoio de várias referências nacionais no assunto (Diegues, 2001; Brito, 2000), Manuela Tambellini (2007a) traça um bom histórico da criação de mosaicos de UCs no Brasil e dos principais problemas envolvidos na sua implementação e gestão. A autora chama a atenção para a importância do Núcleo Regional de Unidades de Conservação (NURUC, concebido em 1996 e institucionalizado no ano seguinte como uma instância regional do sistema de unidades de conservação federais, com sede no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, em Teresópolis), uma “experiência bem-sucedida de cooperação entre UCs, e um exemplo e inspiração para as atuais tentativas de gestão integrada, assim como os primórdios do que hoje se concebe como gestão por mosaicos” (2007: 39). Da constatação de que várias UCs ultrapassam os limites estaduais e que compartilham vários problemas rurais e urbanos

(ataques por “incêndio, ladrões de madeira, de lenha, de palmito, caçadores, pescadores,

31 Esse edital, apresentado no bojo do programa de cooperação franco-brasileira (Delelis et al., 2010), foi responsável pelo apoio à criação de vários mosaicos, tais como o Sertão Veredas-Peruaçu, Baixo Rio Negro e Extremo Sul da Bahia, entre outros. Ver Campos (2013) para uma análise específica desse edital, e Saraiva (2008) para o caso do Mosaico Sertão Veredas-Peruaçu.

grileiros, sem-terra e até bandidos”), os chefes das UCs que compunham o NURUC, ao invés de

“mandar papel passear” em Brasília, ou despachar todos os assuntos com os seus

superintendentes estaduais, cuja única especialização para o posto era a notória competência de seus padrinhos políticos, abriram canais inéditos de entendimento com o Ministério Público Federal, com ONGs ambientalistas, com o Judiciário, o Corpo dos Bombeiros, os Batalhões Florestais, e os centros universitários de pesquisa. A partir desse diálogo e cooperação passaram a multar melhor e com mais eficácia as agressões ao meio ambiente. Os parques se reequiparam. Ligadas por rádio e transportadas por veículos 4X4 suas equipes de combate ao fogo passaram a chegar mais cedo aos focos de incêndios e outros resultados (Depoimento de participantes do NURUC a um jornalista apud Tambellini, 2007: 41).

O discurso recorrente sobre a situação atual das UCs brasileiras – sejam elas federais, estaduais ou municipais – é que o Brasil tem outras prioridades e não pode destinar via orçamento a soma considerável de recursos que a política de conservação da sociobiodiversidade requer. Uma pesquisa sobre a efetividade de gestão das UCs federais realizada pelo WWF e Ibama (WWF & Ibama, 2007) denunciava a situação até a subdivisão do Ibama em 2006, quando se criou o ICMBio, órgão atualmente responsável “apenas” pela gestão das UCs federais. Das 246 unidades analisadas (85% do total), 125 (51%) apresentaram baixa efetividade, 89 média, e apenas 32 tinham alto desempenho (apud Vianna, 2008, p. 295). Esperava-se que a partir de então houvesse uma maior profissionalização, com incremento na qualidade da gestão. De fato, nova rodada de aplicação do método RAPPAM em 2010 (e publicada em 2011) demonstra um relativo ganho em termos e efetividade na gestão das UCs federais desde então, conforme demonstra a figura abaixo.

Gráfico 5. Barras comparativas de efetividade de gestão de UCs federais

Então chamadas de “reservas de papel”,32 fruto da política ambiental brasileira, ou seja, criadas por lei (e, diga-se, passíveis de terem seus limites também alterados por lei) mas implementadas a duras penas, as UCs brasileiras são sempre dependentes de verbas de compensação ambiental. As experiências mais recentes, como os mosaicos, são basicamente implementados graças a acordos de cooperação, com o devido aporte de tecnologia e recursos internacionais, notadamente do governo alemão, do francês, e, mais recentemente, também do japonês.33 É bom destacar que o mercado internacional de créditos de carbono é um grande incentivo a esses aportes financeiros para áreas protegidas nos países em desenvolvimento.

Hoje aposta-se também no modelo de governança via concessões, as chamadas parcerias público-privadas (ou PPPs), que possibilitem criar uma infraestrutura mínima para viabilizar o uso público. Com um olhar gerencial(ista), sobretudo para os parques nacionais, acredita-se que estes possam vir a se tornar sustentáveis com o estímulo à visitação, a cobrança de ingressos e oferta de serviços de transporte, estacionamento, alimentação, exploração de trilhas, oferta de guias e venda de souvenires, tal como já acontece em Foz do Iguaçu e Fernando de Noronha, por exemplo. Contando com adeptos dentro do órgão federal,34 aparentemente esse modelo tem se fortalecido em âmbito nacional, uma vez que o secretário do Meio Ambiente de São Paulo anunciou em evento recente (na Semana da Mata Atlântica, em 27 de maio de 2013) a assinatura do contrato de concessão de três parques estaduais (Cantareira, Jaraguá e Campos do Jordão) para a iniciativa privada.

Muito recente ainda do ponto de vista das experimentações em curso, apesar de ter se expandido consideravelmente pelo território nacional, do outro lado do espectro da governança encontramos a gestão territorial de ecossistemas críticos, tais como a Mata

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Expressão empregada pelo ex-presidente do ICMBio, em entrevista concedida a mim logo após a sua criação. 33 Destacam-se para a constituição de mosaicos duas iniciativas paralelas: aquela conduzida no bojo da cooperação franco-brasileira (Delelis et al., 2010) e outra conduzida pela RBMA, no bojo do Programa Mosaicos da Mata Atlântica (Dias, 2007), com recursos do Fundo de Parceria para Ecossistemas Críticos (CEPF), uma iniciativa conjunta da Conservação Internacional, do GEF, do governo do Japão, da Fundação MacArthur e do Banco Mundial.

34 Ver depoimento do atual presidente do

ICMBio, Roberto Vizentin, ao programa Cidades e Soluções, da Globo News, em 16 de maio de 2013 (http://g1.globo.com/globo-news/cidades-e-solucoes/platb/2013/05/16/cidades-e- solucoes-parques-nacionais-2/). No Parque Nacional da Serra da Bocaina, o atual gestor também acredita ser o modelo das PPPs a melhor “solução” para o incremento da visitação e do uso público, uma vez que, segundo ele, o modelo tradicional de concessão por atrativos (permissões e terceirizações) é mais engessado e não é rentável e atraente para a iniciativa privada. Segundo o gestor, o parque deveria “ser trabalhado numa escala macro, na sua totalidade”, dividindo-se os objetivos e os custos da conservação entre o governo e a instituição parceira. Cf. Entrevista em 3 partes para o Instituto Semeia, disponível em https://www.youtube.com/watch?v=RwzhW8aWgUY. Acesso em 09 dez 2014.

Atlântica (Galindo-Leal & Câmara, 2005), por meio de mosaicos de áreas protegidas.35 Segundo Clayton Lino e Heloísa Dias:

A proposta original de criação de mosaicos surgiu em 1994 da experiência concreta da busca de gestão integrada de quatro áreas protegidas estaduais (PETAR, Parque Estadual Intervales, Parque Estadual Carlos Botelho e Estação Ecológica Xitués) que forma um grande contínuo de Mata Atlântica, no Vale do Ribeira em São Paulo. Sua inserção na economia regional através do ecoturismo, a busca de resolução de conflitos com moradores do entorno e a necessidade de se promover sua gestão de forma participativa, nos levaram a incluir na proposta conceitual, os princípios de integração entre conservação, cultura, sociedade, desenvolvimento e da gestão colegiada estabelecidos nas funções no sistema de gestão da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica (2012, p. 41).

Como afirmam os principais idealizadores da estratégia da gestão territorial por mosaicos de UCs, os gestores da Reserva da Biosfera, é fundamental que ultrapassemos de vez o estágio em que ainda se encontra a discussão estéril sobre os limites ao desenvolvimento impostos pela conservação dos recursos naturais. O desenvolvimento regional ou local, com distribuição mais igualitária possível dos benefícios decorrentes a todos os que estão envolvidos nessa empreitada, só será alcançado se pensarmos as interações, ações e projetos a

partir das unidades de conservação, e não apesar delas.

A principal vantagem do princípio de adoção da gestão territorial por corredores ecológicos e mosaicos de unidades de conservação e/ou áreas protegidas é o fato de que essas unidades de planejamento são compreendidas como fazendo parte de um contexto cultural, social e econômico. Assim, a luta pela conservação ambiental passa pela prevenção da prática de agressões diretas “através de estratégias criativas de alternativas econômicas sustentáveis e promoção de matriz de paisagens, ao mesmo tempo, produtivas e biologicamente diversificadas” (Timmers, 2010, p. 111).

35 É, portanto, normal que também sejam pouco numerosos os trabalhos acadêmicos sobre os mosaicos. Temos conhecimento de dez dissertações de mestrado (Maciel, 2007; Tambellini, 2007; Saraiva, 2008; Scalco, 2009; Abirached, 2011; Duarte, 2012; Bim, 2012; Silva, 2012; Campos, 2013; Gidsicki, 2013). Alguns mosaicos têm se beneficiado da internet como um instrumento de mobilização e divulgação das ações desenvolvidas (Cf. bocaina.org.br). Surgida em 2008, a Rede Mosaicos é outra importante iniciativa de pessoas envolvidas, ainda que aparentemente mais predominem entusiastas do que atores políticos (Cf. redemosaicos.com.br. Obs.: o portal, uma iniciativa da Cooperação Brasil-França sobre Áreas Protegidas (Delelis et al., 2010), vinha sendo atualizado até meados de 2010, e ficou desativado por alguns anos. Aparentemente voltou à ativa recentemente, trazendo informações sobre atividades desenvolvidas pelas equipes dos diversos mosaicos espalhados pelo Brasil em 2014). Um bom artigo de divulgação dos mosaicos, de autoria de dois especialistas, encontra-se no livro

Conservação da natureza. E eu com isso? (Cf. Lino & Dias, 2012). Recentemente têm surgido também vários

mestrados e teses com estudos de caso de processos de governança em UCs específicas e também naquelas de