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3 O IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS

3.2 ASPECTOS RELEVANTES DA REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA

3.2.1 Aspecto Material

O aspecto material da regra-matriz de incidência tributária é o que confere a verdadeira consistência à hipótese de incidência do tributo. Segundo ensina Paulo de Barros Carvalho, o aspecto material sempre apresentará um verbo pessoal e de

predicação incompleta e seu complemento56. O verbo pessoal indica o

comportamento humano que será regulado pelo direito, e do seu complemento se infere o consequente que concluirá a materialidade do tributo.

Ao disciplinar o ISS, a Constituição não indicou o completo elemento material

do imposto57, limitando-se a tratar do fato que expressa riqueza sobre o qual incide,

qual seja, serviços. A legislação complementar, porém, deu conta de definir como

fato gerador do ISS a prestação de serviços58.

Da mesma maneira, a CF também não definiu expressamente o conceito de “serviços” para efeitos tributários, delegando ao intérprete tal responsabilidade. Neste sentido, Aires Barreto destaca que não há liberdade ilimitada para o intérprete, ao contrário, ele deve abalizar-se por todo o contexto constitucional e

princípios fundamentais para alcançar sua definição59.

Sergio Pinto Martins60 leciona que há duas correntes sobre o conceito de

serviço para fins do ISS: a econômica, que explica o “serviço” como conceito

proveniente da economia, e a jurídica, que extrai o conceito do Direito Civil.

A corrente econômica defende que a nomenclatura do tributo apontaria seu objeto econômico, o serviço, que na classificação econômica reflete a ideia de bem

econômico imaterial, suscetível de apreciação econômica61. Bernardo Ribeiro de

Moraes aduz que o ISS é um imposto sobre circulação62, assim, defende Sergio

56 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 18. ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 267-270.

57 MANGIERI, Francisco R.; MELO, Omar A.L. ISS: sobre o leasing e cartões de crédito e débito. 2. ed., rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2018, p. 147

58 MARTINS, Sergio Pinto. Manual do ISS. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 104

59 BARRETO, Aires Fernandino. ISS na Constituição e na lei. 2. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Dialética, 2005, p. 27.

60 MARTINS, Sergio Pinto. Manual do ISS. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 54 61 Ibidem, p. 69

62 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do ISS. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1984b, p. 78.

Pinto Martins que o serviço refletiria a ideia de bem econômico imaterial, suscetível

de apreciação econômica, que se encontra na etapa de circulação63.

Noutro sentido está parte da doutrina, que concorda com o conceito de serviço nos moldes do direito civil, como sendo uma obrigação de fazer. Regina Helena Costa define o serviço como “a prestação de utilidade de qualquer natureza a terceiro, efetuada em caráter oneroso, sob regime de direito privado e que não

configura relação de emprego”64. Carrazza acresce que o serviço exige a existência

de um esforço humano que lhe dá origem65, e Ives Gandra pontua que somente o

serviço-fim é tributável pelo ISS, de modo que mesmo que se enquadre no conceito

de serviços, uma atividade meio não será objeto de tributação66.

Quando chamado a se manifestar sobre a incidência do ISS sobre as atividades de planos de saúde, o STF teve a oportunidade de enfrentar o tema, o

que ocorreu na decisão proferida nos autos do RE651.703/PR, apreciado pelo Min.

Luiz Fux nos seguintes termos:

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ISSQN. ART. 156, III, CRFB/88. CONCEITO CONSTITUCIONAL DE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA. ARTIGOS 109 E 110 DO CTN. AS OPERADORAS DE PLANOS PRIVADOS DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE (PLANO DE SAÚDE E SEGURO- SAÚDE) REALIZAM PRESTAÇÃO DE SERVIÇO SUJEITA AO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA-ISSQN, PREVISTO NO ART. 156, III, DA CRFB/88

(...) 13. Os tributos sobre o consumo, ou tributos sobre o valor

agregado, de que são exemplos o ISSQN e o ICMS, assimilam considerações econômicas, porquanto baseados em conceitos elaborados pelo próprio Direito Tributário ou em conceitos tecnológicos, caracterizados por grande fluidez e mutação quanto à sua natureza jurídica. (...) 18. O artigo 156, III, da CRFB/88, ao referir-se a serviços de qualquer natureza não os adstringiu às típicas obrigações de fazer, já que raciocínio adverso conduziria à afirmação de que haveria serviço apenas nas prestações de fazer, nos termos do que define o Direito Privado, o que contrasta com a maior amplitude semântica do termo adotado pela constituição, a qual inevitavelmente leva à ampliação da competência tributária na incidência do ISSQN. 19. A regra do art. 146, III, “a”, combinado com o art. 146, I, CRFB/88, remete à lei complementar a função de definir o conceito “de serviços de qualquer natureza”, o que é efetuado pela LC nº 116/2003. 20. A classificação (obrigação de dar e obrigação de fazer)

escapa à ratio que o legislador constitucional pretendeu alcançar, ao

63 MARTINS, Sergio Pinto. Manual do ISS. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 62

64 COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário: Constituição e Código Tributário Nacional. 5. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 417.

65 CARRAZZA, Roque Antônio. A tributação na Constituição, o princípio da autonomia municipal e o

imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS). Questões Conexas. In: SANTI, Eurico Marcos

Diniz de (Coord.). Curso de direito tributário e finanças públicas. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 791. 66 MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Imposto sobre serviços de qualquer natureza. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 963.

elencar os serviços no texto constitucional tributáveis pelos impostos67. [grifos nossos]

Desta forma, infere-se que o atual posicionamento do STF demonstra seu alinhamento com o conceito de serviço defendido pela corrente econômica. Tal posicionamento se explica pela evolução tecnológica que acometeu o setor de serviços e trouxe à baila novos signos representativos de riquezas que não se

adequavam a diretriz “obrigação de fazer”68.

Entretanto, só podem ser tributados pelo ISS aqueles serviços que constarem da lista anexa à Lei Complementar. Existem diferentes posicionamentos acerca da natureza desta lista; porém, não nos deteremos em discutir esta questão, por não ser objeto deste trabalho.

Partindo-se da premissa da taxatividade da lista, observa-se que houve uma ampliação significativa neste rol pois, quando da sua regulamentação pelo DL 406/68, foram elencados apenas 29 itens que foram gradativamente modificados por Leis Complementares, até ser alcançado o atual patamar posto pela LC 116/2003 que elencou 40 itens com inúmeros subitens que fazem referência a 170 serviços no total.

A amplitude da lista faz com que, nas grandes cidades brasileiras, o ISS venha se apresentando como a principal receita própria, visto que a concentração dos serviços e o desempenho das maiores atividades econômicas ocorrem nestes

locais69. Entretanto, o mesmo não se observa para os menores municípios pois, em

que pese a ampla gama de serviços sujeitos à tributação, tais localidades não são

economicamente tão dinâmicas, o que diminui a sua base tributária70. Temos, pois, a

67 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 651703. Relator: Min. Luiz Fux,

Tribunal Pleno, julgado em 29/09/2016. Disponível em:

<http://stf.jus.br/portal/jurisprudencia/visualizarEmenta.asp?s1=000324537&base=baseAcordaos>. Acesso em: 20 nov. 2018.

68 MASUKO, Ana Clarissa. Conceitos econômico e jurídico de “serviços” e impacto na tributação. Blog

Economia de Serviços, 19/04/2018. Disponível em <

https://economiadeservicos.com/2018/04/19/conceitos-economico-e-juridico-de-servico-e-impactos- para-a-tributacao/>. Acesso em 01/10/2018.

69 FREITAS, José Valter Gonçalves de. Um estudo sobre a importância para os municípios brasileiros

quanto a cobrança do ISSQN. Monografia (Especialização em Gestão Pública Municipal) – Universidade Estadual da Paraíba, João Pessoa, 2012. Disponível em: <http://dspace.bc.uepb.edu.br/jspui/bitstream/123456789/13160/1/PDF%20-

%20Jos%C3%A9%20Valter%20Gon%C3%A7alves%20de%20Freitas.pdf>. Acesso em: 10 nov. 2018.

70 ABRUCIO, Fernando Luiz; COUTO, Cláudio Gonçalves. A redefinição do papel do estado no

primeira premissa estabelecida para entendermos a concentração da receita obtida pelo tributo.

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