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Autonomia Municipal e o local de recolhimento do ISS: Uma análise do Serviço de Administração de Cartões

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Academic year: 2021

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FACULDADE DE DIREITO

PROGRAMA DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

LORENNA BORGES PASSOS

AUTONOMIA MUNICIPAL E O LOCAL DE RECOLHIMENTO DO ISS:

UMA ANÁLISE DO SERVIÇO DE ADMINISTRAÇÃO DE CARTÕES

Salvador

2018

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AUTONOMIA MUNICIPAL E O LOCAL DE RECOLHIMENTO DO ISS:

UMA ANÁLISE DO SERVIÇO DE ADMINISTRAÇÃO DE CARTÕES

Trabalho de conclusão de curso de graduação em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, apresentado como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Dr. Harrison Ferreira Leite

Salvador

2018

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AUTONOMIA MUNICIPAL E O LOCAL DE RECOLHIMENTO DO ISS:

UMA ANÁLISE DO SERVIÇO DE ADMINISTRAÇÃO DE CARTÕES

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Direito à Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia.

Aprovada em ____ de ___________ de 2018.

BANCA EXAMINADORA

Harrison Ferreira Leite – Orientador ______________________________________ Doutor em Direito Tributário pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Universidade Federal da Bahia

Daniela Lima de Andrade Borges – Examinadora ___________________________ Mestre em Direito Tributário pela Universidade Federal de Minas Gerais

Universidade Federal da Bahia

Thiago Anton Alban – Examinador ________________________________________ Mestre em Direito Público pela Universidade Federal da Bahia

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De todos os caminhos percorridos durante a graduação, este, sem dúvidas, foi o mais difícil e árduo. A Deus, que me concedeu a força necessária pra seguir, toda a minha gratidão.

Aos meus pais, agradeço pelo amor incondicional e por terem tantas vezes ouvido minhas angústias, acalmado o meu coração e me darem a certeza de que sempre terei lugar seguro para pousar. A tia Évila, agradeço por disponibilizar seu tempo e conhecimento para me auxiliar na reta final. E a toda a minha família por me ajudar a chegar até o fim dessa jornada, me cobrindo com orações e amor.

A todos os meus amigos, em especial a Fernanda Mônaco, Adila Andrade, Juliana Araújo e Carolina Portugal, por demonstrarem a essência da palavra companheirismo durante esta nada fácil jornada que passamos juntas.

Ao professor Harrison Leite, por ajudar a conduzir este estudo, e aos professores Daniela Borges e Thiago Alban, por gentilmente terem aceito o convite para avaliar o presente trabalho e abrilhantá-lo com seus conhecimentos.

A Faculdade de Direito da UFBA, por me ensinar tanto sobre o Direito, sobre a vida e sobre mim mesma.

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“Saudade da justiça imparcial, exata, precisa. Que estava ao lado da direita, da esquerda, centro ou fundos. Porque o que faz a justiça é o “ser justo”. Tão simples e tão banal. Tão puro. Saudade da justiça pura, imaculada. Aquela que não olha a quem nem o rabo de ninguém. A que não olha o bolso também. Que tanto faz quem dá mais, pode mais, fala mais. Saudade da justiça capaz” Ruy Barbosa

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RESUMO

Esta pesquisa almeja analisar o potencial do Imposto Sobre Serviços como forma de assegurar maior autonomia aos municípios, com enfoque nas normas que determinam o local do seu recolhimento. A justificativa do tema se dá em razão da edição da Lei Complementar 157/2016 que alterou o local do recolhimento de alguns serviços de grande potencial arrecadatório, mas teve sua eficácia suspensa em razão de concessão de medida cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5835, de modo que se aguarda um posicionamento definitivo do STF sobre a questão. Num momento inicial, revisam-se noções sobre o modelo federativo de estado, vê-se o sistema de discriminação de rendas posto pela Constituição e trata-se da autonomia municipal, destacando-trata-se a importância do ISS para o alcance desse fim. Em seguida, revisa-se alguns pontos relativos ao imposto como previsão constitucional, aspectos relevantes da regra matriz de incidência e as principais alterações legislativas relacionadas ao seu aspecto espacial, dentre elas, a alteração posta pela Lei Complementar 157/2016. Posteriormente, faz-se uma análise do serviço de administração de cartões, ressaltando a relevância econômica do serviço e a dinâmica da sua execução. Indicam-se dados que revelam o potencial arrecadatório do setor e como ele tem sido distribuído entre os municípios, mostrando a concentração da receita do imposto no referido serviço. Em seguida, analisa-se a validade da opção feita pelo legislador na escolha de novo local de recolhimento, veiculada pela Lei Complementar 157/2016, assim como faz-se comentários acerca da decisão monocrática que suspendeu a eficácia do novo diploma legal. Neste sentido, conclui-se que o potencial arrecadatório do Imposto Sobre Serviço contribuiria positivamente para o fortalecimento da autonomia dos municípios, entretanto, para tal fim, demonstra-se necessária a medida promovida pela Lei Complementar 157/2016.

Palavras-Chave: Imposto Sobre Serviços. Local de Recolhimento. Lei Complementar 157/2016. Administração de Cartões. Autonomia Municipal.

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Place: An analysis of the Cards Administration Service. 74 fls. Monograph (Graduation) – Law School, Federal University of Bahia, Salvador, 2018.

ABSTRACT

This research aims to analyze the potential of the Services Tax as a way of ensuring greater autonomy to municipalities, with focus on the rules that determine the place in which it is collected. This approach is justified by reason of the edition of the Complementary Law 157/2016, which modified the collection place of some services with great revenue potential, but whose efficacy was suspended by reason of the concession of a precautionary measure in the Direct Act of Unconstitutionality nº 5835, in relation to which a definitive position of the Federal Supreme Court is still to be formed. Initially, in this work, the notions related to the federative model of state are revised, the income discrimination system set by the Constitution is examined, and the municipality’s autonomy is analyzed highlighting the importance of the Services Tax for this goal to be reached. Next, some aspects of that tax are revised, such as its constitutional provision, relevant aspects of the incidence matrix rule and the main legal modifications set by the Complementary Law 157/2016. After that, it is made an analysis of the cards administration service, highlighting the economic relevance of that service and the dynamics of its execution. It is shown data which reveal the tax collection potential of that sector and how it has been distributed among municipalities, indicating the tax revenue concentration of that service. Next, the validity of the option made by the legislator concerning the choice of new collection places in the Complementary Law 157/2016 is analyzed, and some commentary is given on the monocratic decision which suspended the efficacy of the new legal precepts. In this sense, it is concluded that the collection potential of the Services Tax could contribute in a positive way to the strengthening of municipalities’ autonomy. Nevertheless, in order to reach that end, the measure promoted by the Complementary Law proves to be necessary.

Keywords: Services Tax. Collection Place. Complementary Law 157/2016. Cards Administration. Municipal Autonomy.

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LISTA DE SIGLAS

ABECS – Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias

ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade CF – Constituição Federal

CMN – Confederação Nacional dos Municípios CTN – Código Tributário Nacional

DL – Decreto-Lei

ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços ISS – Imposto Sobre Serviços

LC – Lei Complementar

PLC – Projeto de Lei Complementar POS – Point Of Sale

STF – Supremo Tribunal Federal STJ – Superior Tribunal de Justiça

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Evolução do Mercado de Cartões de Crédito e Débito ... 44 Figura 2 – Funcionamento do Mercado de Cartões ... 51

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LISTA DE TABELAS

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 12

2 NOÇÕES INICIAIS ... 14

2.1 BREVES NOTAS SOBRE O FEDERALISMO ... 14

2.1.1 A Repartição das Competências Tributárias ... 16

2.1.2 A Repartição das Receitas Tributárias ... 20

2.2 A AUTONOMIA MUNICIPAL ... 21

3 O IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS ... 28

3.1 PREVISÃO CONSTITUCIONAL ... 28

3.2 ASPECTOS RELEVANTES DA REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA .... 29

3.2.1 Aspecto Material ... 30

3.2.2 Aspecto Temporal ... 33

3.2.3 Aspecto Espacial ... 34

3.3 PRINCIPAIS ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS ATINENTES AO LOCAL DE INCIDÊNCIA DO ISS ... 36

3.3.1 Decreto-Lei nº 406/1968 ... 36

3.3.2 Lei Complementar 116/2003 ... 38

3.3.3 Lei Complementar 157/2016 ... 39

4 A ADMINISTRAÇÃO DE CARTÕES DE CRÉDITO E DÉBITO ... 43

4.1 RELEVÂNCIA ECONÔMICA ... 43

4.2 AGENTES ENVOLVIDOS NO MERCADO DE CARTÕES ... 45

4.3 O SERVIÇO DE ADMINISTRAÇÃO DE CARTÕES ... 48

4.3.1 Onde o serviço é prestado? ... 49

4.3.2 Onde o ISS tem sido recolhido? ... 52

5 A LEGÍTIMA OPÇÃO DO LEGISLADOR NA LC 157/2016 E O DESACERTO DA CONCESSÃO DA CAUTELAR NA ADI Nº 5835 ... 56

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 65

(12)

1 INTRODUÇÃO

O município é o mundo minimizado: é nele em que a vida acontece, em que o dia-a-dia se revela, em que as necessidades dos cidadãos são externadas e as demandas cobram rápidas respostas. Ocupando a especial posição de ente autônomo na estrutura federativa do país, ao município incumbe importantes responsabilidades no que tange bem-estar da sua população e a sua própria gestão, que exigem deste ente certo grau de autonomia financeira para custear essas despesas.

A distribuição de competências tributárias foi um dos meios que a Constituição outorgou aos municípios para alavancar as suas receitas. Dentre os seus tributos próprios, o Imposto Sobre Serviços se apresenta como importante fonte de arrecadação direta. Entretanto, a complexidade do setor de serviços sempre gerou dúvidas quanto a determinação do local onde deveria ser recolhido o tributo, questionamentos que se maximizam considerando a modernização que atinge o setor.

O tema central da pesquisa deste trabalho se reveste de especial relevância na atualidade devido às recentes alterações na regulamentação do ISS, promovidas pela Lei Complementar 157/2016. Uma das modificações trazidas pela lei consiste na mudança do local do recolhimento do ISS em serviços de grande potencial arrecadatório, que deixariam de ser pagos ao município do estabelecimento prestador e passariam a ser feitos no município em que o tomador está domiciliado. Dentre os serviços modificados está a administração de cartões, que apresenta arrecadação bilionária e possui tomadores em todo o país, levantando questionamentos acerca dos critérios utilizados para definir o local do seu recolhimento.

As alterações feitas pela Lei Complementar 157/2016 no local do recolhimento somente passaram a produzir efeitos em janeiro do presente ano, entretanto, encontram-se atualmente com a sua eficácia suspensa em razão da concessão de cautelar dada monocraticamente nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5835.

(13)

Este trabalho de conclusão de curso apresenta uma estrutura dividida em seis capítulos, sendo a introdução, quatro capítulos de desenvolvimento e a conclusão.

Iniciaremos o estudo analisando o modelo de estado federativo, os mecanismos de discriminação de rendas postos pela CF e a amplitude da autonomia dos municípios na federação. Também serão apresentados dados que revelam o atual panorama da autonomia municipal no país e a relevância que o ISS tem alcançado como principal receita.

Em seguida, faremos um breve estudo acerca do Imposto Sobre Serviços, sua previsão constitucional e alguns critérios da sua regra matriz de incidência, evidenciando o importante papel do legislador complementar na edição do regramento do imposto. Serão vistas, também, as legislações que alteraram o local do recolhimento do imposto, destacando-se a alteração feita pela LC 157/2016 e os motivos que lhe originaram.

Posteriormente, a análise será voltada ao serviço de administração de cartões, verificando-se a relevância econômica deste, os agentes envolvidos, a dinâmica da prestação e em quais locais ocorrem as suas etapas mais importantes. Analisa-se ainda o impacto da aplicação da regra geral de recolhimento do ISS neste serviço específico, demonstrando a concentração de receita que dela decorre.

No quinto capítulo, faz-se uma análise da opção do legislador na LC 157/2016, confrontando-a com alguns dos argumentos aventados na ADI nº 5835. Ademais, analisa-se de maneira breve a decisão monocrática que concedeu a cautelar, concluindo pelo seu desacerto. Por fim, traçam-se considerações finais sobre o tema.

A despeito de toda a importância que têm para os municípios a presente questão, notamos que a doutrina permaneceu silente sobre o tema. Neste sentido, o presente estudo não busca esgotar o assunto, mas se apresenta como uma pequena tentativa de contribuir para a discussão de questão que ainda será decidida pelo STF.

(14)

2 NOÇÕES INICIAIS

2.1 BREVES NOTAS SOBRE O FEDERALISMO

O primeiro artigo da Constituição Federal de 1988 prevê o estado Brasileiro como uma federação. Bem diferente do que vige atualmente, a primeira forma de estado adotada pelo Brasil pós-independência foi o estado unitário, consagrado pela Constituição Imperial de 1824. O estado unitário tinha como característica perfil centralizador, tanto em virtude dos interesses econômicos e políticos dos

portugueses, quanto pela associação com a forma de governo monárquica1.

Ainda durante o período monárquico desenvolveu-se uma tendência descentralizadora de estado, especialmente em decorrência do Ato Adicional de 12 de agosto de 1834, que conferiu às províncias maior grau de autonomia, permitindo que cada uma delas estabelecesse uma Assembleia Legislativa Provincial. Entretanto, tal medida não foi suficiente para sobrepujar a centralização que

prevaleceu durante todo o período Imperial2.

A forma federativa de estado somente fora adotada na primeira Constituição da República, em 1891, cujo modelo de federalismo tinha traços distintos dos modelos internacionais da época, muito em decorrência do reflexo da sua experiência anterior como estado unitário e centralizador. Neste sentido, ensina Ingo

Sarlet3 que o primeiro período republicano não adotou modelo estático de

federalismo, notadamente devido aos diversos momentos de instabilidade política vivenciados, com destaque para a Ditadura Militar que vigorou entre 1964-1985. Apesar destes acontecimentos, o ideal federalista se manteve vivo e a Constituição de 1988 o confirmou, entretanto, num novo formato.

A principal inovação trazida pela CF de 1988 foi a elevação dos municípios à categoria de ente autônomo da federação, quando logo em seu primeiro artigo foi

1 SARLET, Ingo Wolfgang. Da Organização do Estado e da Repartição de Competências. In: ______; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. [E-pub]

2 Ibidem. 3 Ibidem.

(15)

colocado ao lado dos estados, prevendo a união indissolúvel entre eles4. Desde

então, a estrutura da nossa federação passou a ser especialmente caracterizada por um modelo tríplice de organização interna, que não estabelece hierarquia entre seus

entes e lhes dá poderes oriundos diretamente da Constituição Federal (CF)5.

Mas, o que é a federação? Conceitualmente, a federação é “uma associação, uma união institucional de estados, que dá lugar a um novo estado (o Estado

Federal), diverso dos que dele participam (os estados-membros)”6.

Apesar dos estados federalistas apresentarem diferenças entre si, é possível apontar alguns elementos considerados essenciais a eles: sempre serão compostos por, pelo menos, a União e seus estados-membros, ao passo que só o estado federal, em seu conjunto, é dotado de soberania, enquanto seus demais componentes possuem autonomia nos estritos limites dispensados pela Constituição. Porém, seus entes participam da formação da vontade federal e são dotados de capacidades de auto-organização, autolegislação, autogoverno e

autoadministração. Tais capacidades garantem a sua efetiva autonomia7.

O estado brasileiro também tem seus objetivos fundamentais traçados pela CF e, dentre eles, está a garantia do desenvolvimento nacional e a erradicação da

pobreza, marginalização e redução das desigualdades sociais e regionais8. Para o

alcance destas finalidades, todos os membros da federação devem envidar seus esforços conjuntamente. Neste sentido, uma das principais características do federalismo para o alcance deste fim é a existência do federalismo fiscal que, segundo Luiz Marques de Andrade Filho pode ser entendido como:

Um processo de divisão e de transferências intergovernamentais e inter-regionais de receitas tributárias e de competências administrativas, que

4 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político.

5 ATALIBA, Geraldo. Normas Gerais de Direito Financeiro e tributário e autonomia dos Estados e

Municípios. Revista de Direito Público, São Paulo, ano 2, n. 10, p. 45-80, out./dez. 1969, p. 59.

6 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 117.

7 SARLET, Ingo Wolfgang. Da Organização do Estado e da Repartição de Competências. In: ______; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018 [E-pub].

8 Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

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objetivam uma maior eficiência do setor público e também a diminuição das desigualdades regionais, ao propiciar, através da descentralização fiscal e administrativa, uma maior efetividade do Estado na prestação de serviços à população9.

Deste modo, entende-se o federalismo fiscal como mecanismo que engloba a discriminação de rendas baseada na fonte, por meio da repartição de competências tributárias, e a distribuição do produto arrecadado por meio da repartição das

receitas10, que tem como finalidade garantir a eficiência do Estado em suas

instâncias autônomas e assegurar a prestação de serviços à população de maneira mais eficiente em todas as suas esferas.

A seguir, analisaremos brevemente estes dois mecanismos de discriminação de rendas previstos constitucionalmente.

2.1.1 A Repartição das Competências Tributárias

É próprio do estado federativo, que tem como característica a descentralização, que a Constituição faça distribuição de competências entre os seus federados. Dentre as competências partilhadas, a competência tributária tem fundamental relevância pois, a partir do seu exercício, o ente federado obtém recursos de maneira direta para cumprir os desígnios que lhes foram conferidos. Neste sentido, a repartição de competências tem como objetivo mediato preservar a

própria autonomia financeira e orçamentária dos seus entes11.

Conceitualmente, entende-se a competência tributária como sendo a habilitação ou a faculdade potencial que a CF confere aos seus membros federados

para que por meio de lei, tributem12. Tal competência é dotada de características,

das quais Carrazza destaca a privatividade, a indelegabilidade, a incaducabilidade, a

inalterabilidade, a irrenunciabilidade e a facultatividade13.

9 FILHO, Luiz Marques de Andrade. Notas sobre finanças e federalismo no Brasil. Salvador: Empresa Gráfica da Bahia, 2002, p. 50.

10 TÔRRES, Heleno Taveira. Direitos fundamentais e conflitos de competências tributárias no

federalismo fiscal brasileiro: o caso dos municípios. Constituição e efetividade constitucional.

Salvador: Juspodium, 2008, p. 143.

11 BERTI, Flávio de Azambuja. Direito tributário e princípio federativo. São Paulo: Quartier Latim, 2007, p. 186.

12 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 451.

13 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. p. 463

(17)

A competência tributária é privativa porque a Carta Magna outorgou-a exclusivamente ao ente, de modo que somente a ele cabe instituir os referidos tributos. Assim, caso haja a criação de tributo por pessoa política incompetente, este será nulo e não produzirá nenhum efeito.

É indelegável porque não há possibilidade de renúncia ou delegação a terceiros. Frise-se que capacidade e competência tributária são diferentes

institutos14: a ‘capacidade tributária’ é o elemento que permite ao ente figurar como

polo ativo da relação jurídica tributária, passível de delegação. Neste sentido, a competência tributária abrange tanto a capacidade, quanto o poder de instituir o tributo por meio de suas próprias leis ordinárias.

É incaducável porque há uma vitaliciedade do direito de criar o tributo. Deste modo, ainda que nunca tenha criado, o ente político pode a qualquer tempo o instituir por meio de lei, pois o seu direito não se deteriora com o decurso do tempo. É inalterável porque não é permitido ao seu titular alterá-la ou prorrogá-la, mas somente a exercer nos exatos limites que a CF lhe delegou. Por fim, é irrenunciável porque não é permitido ao ente titular renuncia-la, mas, pode livremente escolher pelo seu não exercício quando decide não criar qualquer tributo, sendo facultativo o seu exercício.

Roque Carrazza15 defende que a Constituição Federal foi exaustiva e

minudente ao constituir o sistema de repartição de competências tributárias, forjando-lhe de maneira rígida e com limites bem delineados. De outro modo

entende Ricardo Anderle16, que prefere não reconhecer a perfeição do legislador

constituinte, pontuando que a afirmativa de que a Constituição foi completa representa uma negligência em relação à realidade da aplicação das normas jurídicas, que é essencialmente interpretativa e complexa.

14 Como bem diferencia Paulo de Barros Carvalho, uma coisa é poder legislar e outra diversa é reunir credenciais para integrar a relação jurídica como sujeito ativo. (CARVALHO, Paulo de Barros. Curso

de direito tributário. 18. ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007.)

15 CARRAZZA, Roque Antônio. A tributação na Constituição, o princípio da autonomia municipal e o

imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS). Questões Conexas. In: SANTI, Eurico Marcos

Diniz de (Coord.). Curso de direito tributário e finanças públicas. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 783. 16 ANDERLE, Ricardo. O papel da lei complementar na solução de conflitos de competência. IBET, São Paulo, 2017. Disponível em: <https://www.ibet.com.br/o-papel-da-lei-complementar-na-solucao-de-conflitos-de-competencia-por-ricardo-anderle/>. Acesso em: 10 out. 2018.

(18)

Nesta seara, entendemos correto o posicionamento de Anderle, visto que a própria Constituição atribuiu relevantes funções à lei complementar em matéria tributária, como se depreende do que se lê no art. 146 da CF:

Art. 146. Cabe à lei complementar:

I - Dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

II - Regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;

III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:

a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes; (...)17.

Sergio Pinto Martins pontua que, de modo geral, todas as leis são

complementares, pois se prestam a complementar as disposições contidas na CF18.

No entanto, a CF optou por lhe atribuir de maneira expressa algumas matérias, sobre as quais tem exclusividade para legislar. Pois bem: se em matéria tributária o legislador constituinte atribuiu a ela incumbência para dispor sobre conflitos de competência, parece correto afirmar que nem mesmo ele acreditava na sua perfeição.

Assim, o destaque da lei complementar em âmbito tributário se denota da sua competência para dispor sobre aspectos de extrema importância, visto que os entes políticos, apesar de dotados de competência para tributar, estão inseridos num sistema federativo e devem prezar pela sua integridade. Acerca do tema, são valiosas as lições de Aliomar Baleeiro:

Se, em vários estados unitários como a França ou a Espanha, razões técnico-jurídicas, à vista da crescente participação da administração pública na dinâmica econômica de nossos dias, recolhendo as transformações e mudanças impostas na demanda social, impuseram a elaboração de normas gerais que disciplinassem as finanças públicas e que se colocassem em grau de hierarquia superior às leis ordinárias, tanto mais se fez sentir, nos Estados de forma federal como no nosso, a necessidade de um instrumental jurídico coerente, que dirimisse conflitos de competência entre pessoas estatais tributantes, que facilitassem a reforma de estruturas e instituições conducentes à produção eficiente e à justa distribuição de renda nacional19.

A lei complementar funciona, portanto, como um método aclaratório das disposições da Constituição para que o sistema de competências do estado

17 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 02 out. 2018. 18 MARTINS, Sergio Pinto. Manual do ISS. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 91.

19 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. Atualizado por Misabel Abreu Machado Derzi. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 104.

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federativo seja mantido em plena harmonia. Roque Carrazza20 leciona que a edição

da lei complementar é o prosseguimento do fenômeno tributário e a ela é dado o papel de reforçar as linhas que separam as faixas de competência dos entes políticos. Assim o legislador ordinário encontraria o seu campo tributário melhor iluminado.

Muito se discute acerca da possibilidade de lei complementar de normas gerais restringir a competência tributária dos entes federados. Ora, não faria sentido instaurar o modelo de estado federativo, assegurando competência tributária e autonomia aos entes se, a todo momento, fosse possível invadir a competência alheia. Sem a lei complementar veiculando normas gerais, decerto que haveriam maiores e constantes conflitos entre União, Estados e Municípios.

Realmente, a garantia da preservação do pacto federativo não resta afrontada com a autorização da União de editar leis complementares – que assumem caráter de leis nacionais – mas, ao contrário, essas leis são antes instrumentos que asseguram aquele princípio. A norma geral deve ser editada no interesse da nação, e não em prol de um ente político.21

Deste modo, a função de instituir normas gerais visa estabelecer uma padronização das normas que serão editadas pelos entes federativos, definindo aspectos importantes da regra matriz de incidência dos impostos. Ressalte-se que tal função não é ilimitada, pois normas gerais não são capazes de substituir a competência legislativa para tributar. Assim, lei complementar não cria tributo e não pode versar sobre normas gerais de modo a alterar substancialmente os ditames

constitucionais já postos acerca da competência tributária22.

Ademais, as normas gerais veiculadas pela lei complementar são eficazes em todo o território nacional e tem como seus destinatários os legisladores das três

ordens de governo da federação23. Cabe às mesmas o papel de elucidar os

dispositivos constitucionais a fim de manter a ordem e a harmonia do modelo federativo de estado.

20 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributario. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 627.

21 ANDERLE, Ricardo. O papel da lei complementar na solução de conflitos de competência. IBET, São Paulo, 2017. Disponível em: <https://www.ibet.com.br/o-papel-da-lei-complementar-na-solucao-de-conflitos-de-competencia-por-ricardo-anderle/>. Acesso em: 10 out. 2018.

22 BARRETO, Aires F. ISS na Constituição e na lei. 2. ed., rev., ampl. e atual. São Paulo: Dialética, 2005, p. 106.

23 COELHO, Sacha Calmon Navarro. A lei complementar como agente normativo ordenador do

sistema tributário e da repartição das competências tributárias. Revista da Faculdade de Direito da

Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, n. 37, 2000, p. 328. Disponível em: <https://www.direito.ufmg.br/revista/index.php/revista/article/view/1150>. Acesso em: 28 out. 2018.

(20)

2.1.2 A Repartição das Receitas Tributárias

Além da repartição de competências tributárias, a Constituição Federal importou-se também em prever mecanismos de participação dos entes nos produtos de arrecadação de outros entes, como mais uma forma de garantir aos seus federados condição financeira para cumprir os fins que a CF lhes determinou. Neste sentido, há uma seção inteira na Constituição dedicada a tratar da repartição de receitas tributárias.

Ao tratar deste assunto, Kiyoshi Harada24 refere que existem três

modalidades de participação nas receitas tributárias previstas pela CF: a participação direta, como na previsão de que o produto do IRRF sobre os rendimentos pagos pelos estados e municípios a eles pertencem; a participação no produto de impostos de receita partilhada, como no caso do ICMS que apesar de ser tributo de competência estadual, nunca será integralmente aproveitado pelo estado em razão da determinação constitucional expressa de que 25% da sua arrecadação pertence aos municípios; e a participação em Fundos de Participação, compostos por um determinado percentual de arrecadação de impostos da União.

Apesar de a repartição de receitas ser um mecanismo viável a favorecer a diretriz financeira dos entes da federação, Kiyoshi Harada pontua que a melhor forma de assegurar a autonomia político-administrativa destes entes é com o

alcance da autonomia financeira por meio dos tributos próprios25.

Feitas estas considerações, é fundamental para o desenvolvimento deste trabalho compreender o lugar que os municípios ocupam na federação e a sua atuação como ente autônomo, análise que será feita no próximo item deste capítulo, à luz do princípio da autonomia municipal.

24 HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário. 27. ed., rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2018, p. 90. 25 Ibidem, p. 88

(21)

2.2 A AUTONOMIA MUNICIPAL

A autonomia municipal é princípio que reafirma as diretrizes de estado republicano e federativo. De importância tal, que Aires F. Barreto a considera como

“magna diretriz” e importante pilar dos sistemas constitucional e subtributário26.

O referido autor define a autonomia municipal como sendo “a faculdade

conferida pela Constituição à pessoa política município para editar – nos limites por

ela traçados – suas próprias normas legislativas, dispor sobre seu governo e

organizar-se administrativamente”27. No mesmo sentido está Roque Carrazza ao

afirmar que ela é “a faculdade que a pessoa política município tem de, dentro do

círculo de competência pré-traçado pela Constituição, organizar, sem interferências,

seu governo e estabelecer, sponte própria, suas normas jurídicas”28.

A previsão constitucional deste princípio depreende-se da interpretação dos

artigos 29 e 30 da CF29, nos quais o legislador constituinte deixou bem delineado os

seus liames: no art. 29 tratou da autonomia política, dando-lhe direito a eleger os seus representantes; no art. 30 inciso I, da autonomia administrativa, dando-lhe competência para legislar sobre assuntos de interesse local; e no art. 30 inciso III, ao

26 BARRETO, Aires Fernandino. ISS na Constituição e na lei. 2. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Dialética, 2005, p. 9

27 Ibidem, p. 9.

28 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 154

29Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos [...].

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental;

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

(22)

dar-lhe poderes para instituir tributos de sua competência, consagrou a sua autonomia financeira.

José Afonso da Silva defende ponto de vista segundo o qual a autonomia municipal pode ser desdobrada em quatro capacidades:

a) Capacidade de auto-organização, mediante a elaboração da lei orgânica própria;

b) Capacidade de autogoverno, eletividade do Prefeito e dos Vereadores às respectivas Câmaras Municipais;

c) Capacidade normativa própria, ou capacidade de autolegislação, mediante a competência de elaboração de leis municipais sobre áreas que são reservadas à sua competência exclusiva ou suplementar;

d) Capacidade de autoadministração (administração própria, para manter e restar os serviços de interesse local). 30

Para este trabalho, a autonomia financeira do município ganha especial relevo, pois, como já mencionado, alcançá-la é requisito determinante para que qualquer ente exerça a plena autonomia que lhe fora dispensada pela Constituição.

Historicamente, a autonomia financeira já vinha mostrando suas formas em

Constituições anteriores31. Na Constituição de 1946, além de possuírem

competência para eleger prefeito e vereadores e coordenar sua administração local, também foi conferido aos municípios o poder de administrar as suas próprias rendas. A Constituição de 1967 manteve a autonomia e inaugurou o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) como meio de impulsionar suas finanças para

alcance dos objetivos constitucionais32.

Na CF 1988, a elevação do status do município ao de ente autônomo pôs termo à discussão acerca da existência da autonomia municipal, pois esta foi minuciosamente regulada. Em matéria tributária, coube aos municípios três impostos

privativos – impostos sobre propriedade predial e territorial urbana (IPTU), imposto

sobre transmissão “inter vivos” a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis

(ITIV) e imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS) –, taxas e contribuições de melhoria, além das contribuições previdenciárias para custeio da previdência pública e a contribuição para custeio da iluminação pública. Deste modo, o município pode tanto instituir quanto cobrar os impostos que a Constituição lhe delegou. E este

30 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 1998, pp. 623-624.

31 MARTINS, Sergio Pinto. Manual do ISS. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 99.

32 SANTI, Eurico Marcos Diniz de (Coord.). Curso de direito tributário e finanças públicas. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 774.

(23)

direito, que lhe foi dado, é a reafirmação da autonomia municipal, de modo que

nenhum governo (estadual ou federal) pode interferir no seu exercício33.

Nesta direção, Francisco Humberto Vignoli34 pontua que, com o pacto

federativo e a distribuição de competências, a questão municipal ganhou destaque, especialmente devido a dois fatores: os municípios começaram a se beneficiar da expansão da arrecadação própria e, com a aderência ao estado federativo, também passaram a ocupar a posição de “efetivos membros da federação”, beneficiando-se de todos os aspectos políticos inerentes a este posicionamento.

Foi assim que nos anos 80 originou-se processo intenso e acelerado de

criação de municípios35, motivado primordialmente pela possibilidade concreta do

aumento de seus recursos financeiros.

No entanto, para além dos benefícios a autonomia municipal também exigiu dos municípios o maior dispêndio de recursos para custear a máquina pública, como os gastos com pessoal, além de atribuir a eles maiores responsabilidades, como a manutenção de serviços essenciais à população, a exemplo dos serviços públicos de interesse local, além de programas de educação infantil e fundamental e serviços de atendimento à saúde, estes devendo ser mantidos com a cooperação técnica dos estados e da União.

Ocorre que o desenfreado processo de criação de municípios não levou em consideração a pluralidade de realidades socioeconômicas do País. Esta falta de atenção resultou em muitos desses entes que sequer conseguiram adquirir infraestrutura suficiente para a arrecadação e fiscalização dos seus próprios tributos, como chama oportunamente a atenção Rui Affonso:

Grande parte dos desafios enfrentados hoje pelos estados e municípios decorre da forma descoordenada pela qual se efetivou a descentralização no Brasil, o que acentuou os problemas estruturais de uma federação constituída por gigantescas desigualdades socioeconômicas, inter e intra-regionalmente36.

33 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 170.

34 VIGNOLI, Francisco Humberto. A questão municipal: avanços e retrocessos. In: SANTI, Eurico Marcos Diniz de (Coord.). Curso de direito tributário e finanças públicas. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 805.

35 SANTI, Eurico Marcos Diniz de (Coord.). Curso de direito tributário e finanças públicas. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 775.

36 AFFONSO, Rui. Os municípios e os desafios da federação no Brasil. Revista São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 10, n. 3, 1996. Disponível em:

(24)

Em decorrência destas desigualdades previamente existentes foi que a repartição de competências tributárias acabou não atendendo às expectativas de se tornar o meio pelo qual os municípios de médio e pequeno porte alcançariam a sua independência financeira, como se desejava. A este respeito, Hugo de Brito Machado pontua que:

A técnica de atribuição de competência é de grande importância porque tem a virtude de descentralizar o poder político, mas tem o inconveniente de não se prestar como instrumento para a minimização das desigualdades econômicas entre os Estados e entre os Municípios. Ao Estado pobre, em cujo território não é produzida, nem circula, riqueza significativa, de nada valeriam todos os tributos do sistema. Por isto é que se faz necessária também a distribuição de receitas tributárias.37

Neste trecho, o autor refere-se às diferenças que existem entre as finanças dos estados pobres e grandes municípios. Porém, o mesmo problema se constata de modo agravado no âmbito municipal, posto que os municípios possuem idêntica parcela de competência para tributar, no entanto, a base econômica tributável não é igual, sequer semelhante entre eles. Assim, pelo fato de a repartição de competências não ter sido suficiente para dar aos municípios condições de manter suas despesas, foi que a repartição de receitas se sobrepôs a ela como fonte de recursos municipais.

Entretanto, uma outra questão se instaura pois, se para os municípios a repartição de receitas tem sido necessária e indispensável para alcançar seus fins, por outro lado, o mecanismo contribuiu para o que Luiz Marques Filho denomina de “crise fiscal do Estado” que, apesar de originada por outros fundamentos, agravou-se a partir de 1988 com o aumento dos encargos previdenciários e o grande volume de transferências constitucionais, gerando restrição orçamentária do governo federal38.

Do que discutimos fica claro que a problemática da autonomia financeira dos municípios atinge patamares maiores do ponto de vista do equilíbrio fiscal do Estado. Para Luiz Marques Filho, a questão do equilíbrio fiscal

37 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 38. ed., rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2017, p. 29.

38 FILHO, Luiz Marques de Andrade. Notas sobre finanças e federalismo no Brasil. Salvador: Empresa Gráfica da Bahia, 2002, p. 80.

(25)

(...) deve ser compreendida considerando-se a ordem federativa do Estado brasileiro, dada a existência de competências tributárias e administrativas exclusivas, denotando a ocorrência de autonomia dos entes federativos39.

Por conseguinte, se as competências tributárias fossem exitosas e eficazes na arrecadação municipal a ponto de diminuir a dependência dos repasses constitucionais, certamente estaríamos mais próximos de atingir a estabilização fiscal do Estado.

Todavia, o equilíbrio fiscal está longe de ser a nossa realidade. No ano de

2014 o Portal Meu Município – projeto desenvolvido pela Fundação Brava e pelo

INSPER (Instituto de Ensino e Pesquisa - SP) – realizou pesquisa comparativa do

valor obtido com a arrecadação dos tributos versus os repasses constitucionais em 5.067 municípios. Destes, apenas 19 arrecadavam com tributos próprios mais do

que a quantia recebida por meio de repasses da União e dos Estados40. O município

de São Paulo, um dentre os 19, teve a sua arrecadação impulsionada pelo ISS.

Dados do IBGE sobre as finanças públicas municipais no ano de 2017 também revelam a difícil realidade da arrecadação dos municípios brasileiros. Enquanto município de São Paulo arrecadou quase 13 bilhões de reais

(R$12.928.050.000,00) apenas com o ISS41, o município de Salvador arrecadou

apenas 912 milhões de reais com o imposto durante o mesmo período (R$912.460.000,00). O valor ainda é alto se comparado com o arrecadado de ITIV

(R$147.240.000,00) e também supera a arrecadação do IPTU (R$

556.342.000,00)42.

A situação torna-se ainda mais grave nos pequenos municípios. Em Itaberaba, município de médio porte baiano com população média de 60 mil habitantes, apenas o valor de despesas correntes chegou a 133 milhões de reais em 2017. No mesmo município, a receita do ISS correspondeu a mais de 6 milhões de reais (R$6.062.000,00), valor que, apesar de não ser vultoso, supera com larga margem o arrecadado com ITIV e IPTU que, somados, correspondem a ínfimos

39 FILHO, Luiz Marques de Andrade. Notas sobre finanças e federalismo no Brasil. Salvador: Empresa Gráfica da Bahia, 2002, p. 84.

40 PORTAL MEU MUNICÍPIO. Apenas 19 municípios brasileiros conseguem gerar receitar maiores

que transferências. Disponível em:

<https://meumunicipio.org.br/noticia/55-Apenas-19-municipios-brasileiros-conseguiram-gerar-receitas-maiores-que-transferencias>. Acesso em: 30 out. 2018. 41 IBGE. Finanças Públicas: São Paulo. Disponível em: <https://cidades.ibge.gov.br/brasil/sp/sao-paulo/pesquisa/21/28134?localidade1=292740&localidade2=291470>. Acesso em: 11 nov. 2018. 42 Ibidem.

(26)

R$1.870.000,00 (um milhão oitocentos e setenta mil reais). O que dá fôlego ao município é, de fato, as transferências intergovernamentais feitas pela União e pelo

Estado, que, somadas, chegam ao montante de R$74.800.000,00 (setenta e quatro

milhões e oitocentos mil reais)43.

Dos dados obtidos deste município do interior baiano, infere-se que as receitas de IPTU e ITIV têm alcançado pouca ou quase nenhuma expressividade frente às necessidades municipais, de modo que o ISS se tornou o imposto com o maior volume de arrecadação. Leciona João Gabriel Laprovitera Rocha que os valores provenientes do ISS tem respondido pela maior parte da receita corrente líquida da maioria das cidades brasileiras, e que a tendência é a acentuação da relevância desse imposto, visto que o setor de serviços é o que mais cresce, impulsionando a economia local, ao passo que os municípios vem se atentando para

aperfeiçoar seus mecanismos de cobrança44. No entanto, o seu potencial

arrecadatório poderia trazer melhores resultados aos pequenos municípios se fosse melhor distribuído.

Dados do impostômetro45 indicam que em 2017 foram arrecadados, a título de

ISS, mais de 55 bilhões de reais. Entretanto, a Confederação Nacional dos Municípios estima que 63% da receita do ISS concentra-se em apenas 35 municípios, e, cerca de 100 responderiam por 78% do ISS de todo o País. Num panorama nacional, mais de 2.600 municípios, juntos, respondem por apenas 1% da arrecadação do tributo, enquanto apenas 2 municípios ficariam com mais de 33,83% de todo o ISS arrecadado. Tal concentração resulta em mais de 1.800 municípios

em que o ISS não representa nem 1% da receita corrente46.

Portanto, é forçoso concluir que a autonomia municipal resta prejudicada no Brasil, visto que a realidade que temos instaurada é a de dependência econômica dos municípios em relação aos outros entes – estados e União – já que é por meio da repartição de receitas que os municípios conseguem custear suas despesas

43 IBGE. Finanças Públicas: Itaberaba. Disponível em:

<https://cidades.ibge.gov.br/brasil/ba/itaberaba/pesquisa/21/28134>. Acesso em: 11 nov. 2018. 44 ROCHA, João Gabriel Laprovitera. O Imposto Sobre Serviços de qualquer natureza e os conflitos

de competência tributária. Dissertação (Mestrado em Direito) - Universidade Federal do Ceará,

Fortaleza, 2012. Disponível em: <http://www.repositorio.ufc.br/handle/riufc/12609>. Acesso em: 10 nov. 2018

45 IMPOSTÔMETRO. Arrecadação por tributos de 01/01/2017 a 31/12/2017. Disponível em: <https://impostometro.com.br/>. Acesso em: 15 nov. 2018.

46 CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE MUNICÍPIOS. ISS 2017. Disponível em: <https://www.cnm.org.br/index.php/institucional/iss_2017>. Acesso em: 11 nov. 2018.

(27)

básicas. Entretanto, estes repasses não são suficientes para cobrir todas as atividades desenvolvidas pelo município, o que resulta na má qualidade ou falta de serviços essenciais à população local.

Noutro viés, o Imposto Sobre Serviços revela-se como possível instrumento de minimização das mazelas financeiras dos municípios, figurando como o imposto de maior importância arrecadatória dentre os de competência municipal. Porém, a sua arrecadação fica concentrada em pouquíssimos locais, e é por isto que se torna necessário explorar mecanismos que sejam aptos a promover sua melhor distribuição.

(28)

3 O IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS

No capítulo anterior, vimos que o ISS tem demonstrado grande potencial arrecadatório, porém, o produto do seu recolhimento se mantém concentrado em poucos locais. Neste capítulo, nos dedicaremos a estudar aspectos básicos do ISS que nos levarão a entender tal panorama.

3.1 PREVISÃO CONSTITUCIONAL

A tributação de serviços no Brasil é anterior ao surgimento do ISS, pois desde

a Constituição de 1934 já existiam impostos destinados a tributá-los47.No entanto, o

ISS como fato gerador individualizado48 somente adentrou no sistema tributário do

País com o advento da reforma tributária promovida pela Emenda Constitucional n.

18 de 1º de dezembro de 196549.

A Constituição Federal de 1988, ao manter o imposto, o disciplinou da seguinte maneira:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (...)

III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.

(...)

§ 3º Em relação ao imposto previsto no inciso III do caput deste artigo, cabe à lei complementar:

I - fixar as suas alíquotas máximas e mínimas;

II - excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior;

III - regular a forma e as condições como isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados50.

A disciplina constitucional deste tributo outorga a competência para sua instituição aos municípios e entrega à lei complementar a responsabilidade de

47 Em nota de atualização à obra de Aliomar Baleeiro, Misabel Abreu Machado Derzi destaca o Imposto de indústrias e profissões, que fora colocado na competência dos Estados pela Constituição de 1891, e realocado para os municípios na Constituição de 1946, com o propósito de fortalece-los financeiramente. (BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. Atualizado por Misabel Abreu Machado Derzi. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 733.)

48 MARTINS, Sergio Pinto. Manual do ISS. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 42.

49 Art. 15. Compete aos Municípios o impôsto sôbre serviços de qualquer natureza, não compreendidos na competência tributária da União e dos Estados. Parágrafo único. Lei complementar estabelecerá critérios para distinguir as atividades a que se refere êste artigo das previstas no art. 12. (BRASIL. Emenda Constitucional nº 18, de 1º de dezembro de 1965. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc_anterior1988/emc18-65.htm>. Acesso em: 10 nov. 2018.)

50 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 01 nov. 2018.

(29)

disciplinar aspectos de importante relevância. Primeiro, porque cabe a lei complementar definir os serviços tributáveis, os quais vêm sendo listados desde a égide do Decreto-Lei 406/68, que foi reconhecido como lei complementar pela

doutrina e jurisprudência51. Ademais, porque a ela cabe também dispor sobre

aspectos que evitem a guerra fiscal entre municípios, como a fixação das alíquotas máximas e mínimas e a regulação da concessão de benefícios. Assim, as disposições complementares conferem ao ISS o que Regina Helena Costa intitula de

“certa homogeneidade normativa”52, e servem a evitar que os municípios legislem

sobre ele de maneira conflitante.

Vistas estas primeiras noções, analisaremos de maneira breve alguns aspectos relacionados à regra matriz de incidência do ISS e os seus liames constitucionais.

3.2 ASPECTOS RELEVANTES DA REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA

O CTN53 consagra a relação estabelecida entre um particular e o estado como

uma obrigação. Tal obrigação só nasce com a ocorrência de um fato gerador que,

na disciplina do art. 114 do CTN54, é a situação definida em lei como necessária e

suficiente à ocorrência da obrigação tributária principal. Esta obrigação principal é a

que gera o dever de “dar” por parte do particular em benefício do Estado55.

O estudo do fato gerador tributário é vinculado a aspectos que configuram o antecedente normativo da regra matriz, quais sejam: os aspectos material, temporal e espacial. Isto posto, passaremos a analisar como tais critérios foram determinados para o Imposto Sobre Serviços.

51 FREITAS, José Valter Gonçalves de. Um estudo sobre a importância para os municípios brasileiros

quanto a cobrança do ISSQN. Monografia (Especialização em Gestão Pública Municipal) – Universidade Estadual da Paraíba, João Pessoa, 2012. Disponível em:

<http://dspace.bc.uepb.edu.br/jspui/bitstream/123456789/13160/1/PDF%20-%20Jos%C3%A9%20Valter%20Gon%C3%A7alves%20de%20Freitas.pdf>. Acesso em: 10 nov. 2018 52 COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário: Constituição e Código Tributário Nacional. 5. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 417.

53 Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.

§ 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente.

54 Art. 114. Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.

(30)

3.2.1 Aspecto Material

O aspecto material da regra-matriz de incidência tributária é o que confere a verdadeira consistência à hipótese de incidência do tributo. Segundo ensina Paulo de Barros Carvalho, o aspecto material sempre apresentará um verbo pessoal e de

predicação incompleta e seu complemento56. O verbo pessoal indica o

comportamento humano que será regulado pelo direito, e do seu complemento se infere o consequente que concluirá a materialidade do tributo.

Ao disciplinar o ISS, a Constituição não indicou o completo elemento material

do imposto57, limitando-se a tratar do fato que expressa riqueza sobre o qual incide,

qual seja, serviços. A legislação complementar, porém, deu conta de definir como

fato gerador do ISS a prestação de serviços58.

Da mesma maneira, a CF também não definiu expressamente o conceito de “serviços” para efeitos tributários, delegando ao intérprete tal responsabilidade. Neste sentido, Aires Barreto destaca que não há liberdade ilimitada para o intérprete, ao contrário, ele deve abalizar-se por todo o contexto constitucional e

princípios fundamentais para alcançar sua definição59.

Sergio Pinto Martins60 leciona que há duas correntes sobre o conceito de

serviço para fins do ISS: a econômica, que explica o “serviço” como conceito

proveniente da economia, e a jurídica, que extrai o conceito do Direito Civil.

A corrente econômica defende que a nomenclatura do tributo apontaria seu objeto econômico, o serviço, que na classificação econômica reflete a ideia de bem

econômico imaterial, suscetível de apreciação econômica61. Bernardo Ribeiro de

Moraes aduz que o ISS é um imposto sobre circulação62, assim, defende Sergio

56 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 18. ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 267-270.

57 MANGIERI, Francisco R.; MELO, Omar A.L. ISS: sobre o leasing e cartões de crédito e débito. 2. ed., rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2018, p. 147

58 MARTINS, Sergio Pinto. Manual do ISS. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 104

59 BARRETO, Aires Fernandino. ISS na Constituição e na lei. 2. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Dialética, 2005, p. 27.

60 MARTINS, Sergio Pinto. Manual do ISS. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 54 61 Ibidem, p. 69

62 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do ISS. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1984b, p. 78.

(31)

Pinto Martins que o serviço refletiria a ideia de bem econômico imaterial, suscetível

de apreciação econômica, que se encontra na etapa de circulação63.

Noutro sentido está parte da doutrina, que concorda com o conceito de serviço nos moldes do direito civil, como sendo uma obrigação de fazer. Regina Helena Costa define o serviço como “a prestação de utilidade de qualquer natureza a terceiro, efetuada em caráter oneroso, sob regime de direito privado e que não

configura relação de emprego”64. Carrazza acresce que o serviço exige a existência

de um esforço humano que lhe dá origem65, e Ives Gandra pontua que somente o

serviço-fim é tributável pelo ISS, de modo que mesmo que se enquadre no conceito

de serviços, uma atividade meio não será objeto de tributação66.

Quando chamado a se manifestar sobre a incidência do ISS sobre as atividades de planos de saúde, o STF teve a oportunidade de enfrentar o tema, o

que ocorreu na decisão proferida nos autos do RE651.703/PR, apreciado pelo Min.

Luiz Fux nos seguintes termos:

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ISSQN. ART. 156, III, CRFB/88. CONCEITO CONSTITUCIONAL DE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA. ARTIGOS 109 E 110 DO CTN. AS OPERADORAS DE PLANOS PRIVADOS DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE (PLANO DE SAÚDE E SEGURO-SAÚDE) REALIZAM PRESTAÇÃO DE SERVIÇO SUJEITA AO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA-ISSQN, PREVISTO NO ART. 156, III, DA CRFB/88

(...) 13. Os tributos sobre o consumo, ou tributos sobre o valor

agregado, de que são exemplos o ISSQN e o ICMS, assimilam considerações econômicas, porquanto baseados em conceitos elaborados pelo próprio Direito Tributário ou em conceitos tecnológicos, caracterizados por grande fluidez e mutação quanto à sua natureza jurídica. (...) 18. O artigo 156, III, da CRFB/88, ao referir-se a serviços de qualquer natureza não os adstringiu às típicas obrigações de fazer, já que raciocínio adverso conduziria à afirmação de que haveria serviço apenas nas prestações de fazer, nos termos do que define o Direito Privado, o que contrasta com a maior amplitude semântica do termo adotado pela constituição, a qual inevitavelmente leva à ampliação da competência tributária na incidência do ISSQN. 19. A regra do art. 146, III, “a”, combinado com o art. 146, I, CRFB/88, remete à lei complementar a função de definir o conceito “de serviços de qualquer natureza”, o que é efetuado pela LC nº 116/2003. 20. A classificação (obrigação de dar e obrigação de fazer)

escapa à ratio que o legislador constitucional pretendeu alcançar, ao

63 MARTINS, Sergio Pinto. Manual do ISS. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 62

64 COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário: Constituição e Código Tributário Nacional. 5. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 417.

65 CARRAZZA, Roque Antônio. A tributação na Constituição, o princípio da autonomia municipal e o

imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS). Questões Conexas. In: SANTI, Eurico Marcos

Diniz de (Coord.). Curso de direito tributário e finanças públicas. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 791. 66 MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Imposto sobre serviços de qualquer natureza. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 963.

(32)

elencar os serviços no texto constitucional tributáveis pelos impostos67. [grifos nossos]

Desta forma, infere-se que o atual posicionamento do STF demonstra seu alinhamento com o conceito de serviço defendido pela corrente econômica. Tal posicionamento se explica pela evolução tecnológica que acometeu o setor de serviços e trouxe à baila novos signos representativos de riquezas que não se

adequavam a diretriz “obrigação de fazer”68.

Entretanto, só podem ser tributados pelo ISS aqueles serviços que constarem da lista anexa à Lei Complementar. Existem diferentes posicionamentos acerca da natureza desta lista; porém, não nos deteremos em discutir esta questão, por não ser objeto deste trabalho.

Partindo-se da premissa da taxatividade da lista, observa-se que houve uma ampliação significativa neste rol pois, quando da sua regulamentação pelo DL 406/68, foram elencados apenas 29 itens que foram gradativamente modificados por Leis Complementares, até ser alcançado o atual patamar posto pela LC 116/2003 que elencou 40 itens com inúmeros subitens que fazem referência a 170 serviços no total.

A amplitude da lista faz com que, nas grandes cidades brasileiras, o ISS venha se apresentando como a principal receita própria, visto que a concentração dos serviços e o desempenho das maiores atividades econômicas ocorrem nestes

locais69. Entretanto, o mesmo não se observa para os menores municípios pois, em

que pese a ampla gama de serviços sujeitos à tributação, tais localidades não são

economicamente tão dinâmicas, o que diminui a sua base tributária70. Temos, pois, a

67 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 651703. Relator: Min. Luiz Fux,

Tribunal Pleno, julgado em 29/09/2016. Disponível em:

<http://stf.jus.br/portal/jurisprudencia/visualizarEmenta.asp?s1=000324537&base=baseAcordaos>. Acesso em: 20 nov. 2018.

68 MASUKO, Ana Clarissa. Conceitos econômico e jurídico de “serviços” e impacto na tributação. Blog

Economia de Serviços, 19/04/2018. Disponível em <

https://economiadeservicos.com/2018/04/19/conceitos-economico-e-juridico-de-servico-e-impactos-para-a-tributacao/>. Acesso em 01/10/2018.

69 FREITAS, José Valter Gonçalves de. Um estudo sobre a importância para os municípios brasileiros

quanto a cobrança do ISSQN. Monografia (Especialização em Gestão Pública Municipal) – Universidade Estadual da Paraíba, João Pessoa, 2012. Disponível em:

<http://dspace.bc.uepb.edu.br/jspui/bitstream/123456789/13160/1/PDF%20-%20Jos%C3%A9%20Valter%20Gon%C3%A7alves%20de%20Freitas.pdf>. Acesso em: 10 nov. 2018.

70 ABRUCIO, Fernando Luiz; COUTO, Cláudio Gonçalves. A redefinição do papel do estado no

(33)

primeira premissa estabelecida para entendermos a concentração da receita obtida pelo tributo.

3.2.2 Aspecto Temporal

O aspecto temporal, segundo Geraldo Ataliba, é a propriedade da hipótese de incidência que designa o momento em que se deve reputar como consumado um

fato imponível71.

Em geral, a lei instituidora do tributo não indica precisamente a ocorrência do fato, deixando implícito o momento da sua ocorrência. Em alguns casos específicos, porém, a lei faz a determinação deste momento, a exemplo do que ocorre com o IPTU, cujo fato gerador reputa-se ocorrido, em geral, no dia 1º de janeiro de cada

ano72. Não obstante, em face da diversidade dos serviços que são objeto de

tributação pelo ISS é que o momento da ocorrência do fato deve ser individualmente

considerado73.

A doutrina defende que o aspecto temporal do imposto se forma no momento

em que a prestação de serviços for aperfeiçoada74, assim não há consumação do

fato gerador no momento em que se contrata, nem mesmo quando ocorre o pagamento do valor acertado, mas, apenas no momento em que se constata a

efetiva prestação do serviço75.

Deste modo, conclui-se que o aspecto temporal do ISS somente estará perfectibilizado quando o serviço for efetivamente prestado, não havendo que se falar em obrigação de pagar imposto em momento anterior à prestação do serviço.

<http://cedec.org.br/files_pdf/AredefinicaodopapeldoEstadonoambitolocal.pdf>. Acesso em: 22 nov. 2018.

71 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 94. 72 BOTELHO, Ianá Nogueira Queiroz. Possibilidade do uso da presunção e da ficção jurídica como

regra para fixação da competência tributária para cobrança do ISS – Constitucionalidade dos artigos

3º e 4º da LC 116/2003. Revista Percurso, Curitiba, v. 2, n. 17, p. 55 - 87, 2015. Disponível em: <http://revista.unicuritiba.edu.br/index.php/percurso/article/view/1138>. Acesso em: 28 out. 2018. 73 DA CUNHA, Arlindo Felipe. Regra-Matriz do ISSQN - Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza. Revista IMES – Direito, São Caetano do Sul, ano VIII, n. 13, jul./dez. 2007. Disponível em: <http://seer.uscs.edu.br/index.php/revista_direito/article/view/830/693>. Acesso em: 20 nov. 2018 74 COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário: Constituição e Código Tributário Nacional. 5. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2015, p.421.

75 MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Curso de Direito Tributário. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 969.

Referências

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