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A partir da análise das entrevistas, foi possível definir as seguintes categorias observadas a partir da cultura organizacional e que impactam a iniciativa de BPM:

comunicação, inovação, mudança, política, gestão de pessoas, melhoria contínua, orientação ao cliente, colaboração, gestão organizacional. Também foram identificadas

uma série de ações, com algumas delas já em execução, para desenvolver aspectos culturais, atuando como facilitadores na implantação da iniciativa de BPM dentro da organização. Neste caso, podemos exemplificar a própria iniciativa de BPM, que também atua como indutor da mudança de cultura organizacional, exercendo um papel de facilitador, num processo cíclico da influência mútua.

Durante a análise dos dados foi realizada uma classificação das categorias, considerando como critério na definição das categorias o grau de influência dos fatores observados na cultura organizacional na iniciativa de BPM. A partir disso, elaboramos uma lista das categorias consideradas como fatores da cultura organizacional com maior impacto na iniciativa de BPM, seja individualmente ou por atuarem em conjunto por complementação.

Das categorias identificadas apenas orientação ao cliente foi descartada para uma análise crítica mais detalhada, embora seja considerada na literatura como um dos valores culturais fundamentais para a evolução de uma iniciativa de BPM bem-sucedida em uma organização. Porém, apesar de termos incluído questões relacionadas à orientação ao cliente no protocolo das entrevistas, as evidências não foram ricas e relevantes para serem incluídas como uma categoria nos resultados da pesquisa.

5.1.1! Comunicação

A categoria “Comunicação” diz respeito à transmissão de informação relevante, ou seja, o compartilhamento da informação, dentro e para fora da organização. É por meio da comunicação também que ocorre o envolvimento das pessoas, troca de informações, criação de sinergia, consolidação da confiança e coleta de soluções.

Observamos na organização que a comunicação, tanto interna (entre setores) quanto externa (com outros órgãos e sociedade) diretamente relacionadas à atividade finalística, é identificada como um dos pontos fracos da organização. Essa constatação está diretamente associada à existência de canais de comunicação falhos, e, consequentemente à necessidade de modernizar e profissionalizar a comunicação da instituição, criando outros canais ou aperfeiçoando os já existentes.

Além disso, também contribuem para essa fragilidade na comunicação externa, a própria área de atuação da instituição, que é de difícil compreensão pela população em geral. O resultado disso, é que muitas vezes, a sociedade, que é o principal cliente da organização, não tem ciência do trabalho realizado pela organização. Os canais de comunicação existentes, como publicação de coluna informativa em jornais de grande circulação ou portal institucional, não são suficientes para comunicar à população de maneira efetiva o que a organização faz, qual o seu papel e importância para a sociedade.

A deficiência na comunicação externa foi também identificada no diagnóstico estratégico como uma das principais fraquezas da organização. Este diagnóstico foi realizado como uma das etapas para elaboração do Plano Estratégico (2013-2018), utilizando como instrumento a ferramenta de Análise SWOT.

Diante da crescente necessidade das organizações públicas atuarem de forma ágil e transparente, a comunicação da organização com o público externo é reconhecida pelos entrevistados como lenta e ineficiente. Essa questão pode ser evidenciada no seguinte trecho de entrevista:

“... A comunicação com o público externo melhorou muito, mas acho que temos que mudar radicalmente. As pessoas querem respostas mais rápidas, querem ter transparência total. Acho que isso ainda está muito lento...” (P003).

A comunicação interna também é considerada deficiente. É necessária uma ação de reestruturação da área da organização responsável pela comunicação, com aumento de quadro de pessoal e melhoria da eficiência dos serviços prestados aos clientes internos na divulgação das informações. Esse ponto foi ressaltado no seguinte trecho:

“...tem que contratar, aumentar o quadro. Então hoje a gente pede uma publicação, passa 3 dias para entrar no ar. Não pode.” (P005).

Observamos também a inexistência de uma estratégia de comunicação interna, tendo como consequência a dificuldade em compartilhar informações entre os setores da organização, seja pela falta de agilidade, pela fragilidade dos canais existentes ou pelo próprio desconhecimento do fato gerador da notícia pela área de comunicação. Além disso, verificamos a dificuldade em comunicar ações e diretrizes da organização em eventos e reuniões, dado o alto índice de abstenção ou a falta de efetividade na cobrança aos encaminhamentos das ações deliberadas durante estas reuniões.

Em relação ao impacto da comunicação falha na iniciativa de BPM, é fundamental utilizar mecanismos que modifiquem a visão das pessoas e o seu o entendimento sobre o que é de fato a gestão por processos. A comunicação é um grande instrumento para conscientizar as pessoas do poder de transformação que a gestão por processos pode proporcionar à organização. Sem uma comunicação eficiente, dificilmente será possível a compreensão das pessoas sobre o real significado de BPM e como isso pode ajudá-las no seu dia-a-dia de trabalho e à organização a se tornar mais ágil e eficiente, refletindo na imagem que a sociedade tem da instituição. Também foi constatado que esse mecanismo de comunicação precisa de maior atenção, uma vez que tem sido falho até o momento.

“Se a gente conseguir vender e mostrar que a gente vai ser mais eficiente com isso. Se as pessoas acreditarem nisso, eu acho que elas vão ajudar. Elas precisam acreditar que aquilo ali vai trazer resultado, que aquilo vai ser mais ágil. Tem alguns departamentos que absorvem melhor as mudanças. Se elas

verem que a gente está facilitando a informação para a sociedade... O sonho do servidor é que as pessoas acreditem que o que a gente faz é importante” (P001).

5.1.2! Mudança

A categoria “Mudança” refere-se à forma como a organização reage às mudanças, se há incentivo à quebra de paradigmas, bem como flexibilidade na adaptação da sua cultura organizacional.

Observamos como valor cultural uma forte resistência à mudança, representado por um sentimento de desconfiança dos funcionários ao novo, especialmente quando são tirados da sua zona de conforto. Podemos perceber isto no seguinte trecho na entrevista:

“Para tudo que estamos implantando aqui existe uma resistência: por que mudar? Isso vai me dar mais trabalho... Além disso, vou ter que fazer mais isso” (P001).

No caso específico da implantação da iniciativa de BPM, por ser um agente de transformação organizacional, constata-se uma preocupação com a resistência às mudanças, enraizada na cultura da instituição.

“O excesso de formalismo e a resistência à mudança podem impactar a iniciativa de BPM...” (P008).

Outro fato gerador da resistência às mudanças dentro da organização é o choque de gerações. Como se existissem duas instituições, conflitantes, em uma única instituição formal. Os funcionários mais recentes entraram, em sua maioria, com desejo de mudança, de colaborar para o desenvolvimento de uma gestão mais moderna. Já os mais antigos, que talvez um dia tenham tido os mesmos anseios, mostram-se mais reativos, sempre procurando defeitos nas propostas de mudança.

“Para fazer uma mudança aqui é complicado. Entraram muito jovens, com 18 ou 20 anos. As pessoas são contaminadas. Você entra aqui com vontade de fazer acontecer, então antigamente as pessoas tinham iniciativas individuais, e nos primeiros obstáculos se decepcionavam e se acomodavam...” (P006).

“Foram apresentadas como melhoria do processo várias mudanças de automação de procedimentos... Com isso, houve uma reação imediata de resistência das pessoas dessa áreas, devido à possível perda de poder identificada pelas pessoas desse setor.” (Diário do Pesquisador – 19/12/2014).

Em relação à flexibilidade, constatamos que as iniciativas que impactem características muito arraigadas na cultura organizacional, não serão facilmente assimiladas ou poderão até sofrer boicote. Mesmo que essas ações propostas representem uma possível melhoria na efetividade dos resultados gerados pela instituição.

A organização até que incentiva as mudanças, refletindo sobre o que é possível aperfeiçoar. Porém, verificamos uma dificuldade em implantar essas mudanças, sendo necessário um trabalho de convencimento dos vários atores envolvidos. As pessoas envolvidas nas mudanças, de maneira geral, contribuem relatando um histórico de insucessos de iniciativas anteriores, sempre com uma visão negativa dos fatos, prevendo antecipadamente que os fracassos tornem a se repetir.

Entretanto, apesar da resistência às mudanças ser uma característica intrínseca à cultura organizacional da instituição analisada, esta resistência pode ser minimizada pelo poder político que incentiva e apoia a mudança. Ou seja, existe a necessidade de patrocínio da alta gestão com o objetivo de influenciar e facilitar as ações de mudança.

“... Se não houver o patrocínio do presidente ou da gestão para uma mudança substancial, ela não ocorre” (P009).

5.1.3! Inovação

A categoria “Inovação” diz respeito à forma como a organização é receptiva a ideias pioneiras para a melhoria do desempenho dos seus processos de negócio, bem como se estimula e recompensa seus colaboradores a pensar “fora da caixa” com o objetivo de criar soluções inovadoras.

Apesar de existir um prêmio formalmente instituído para incentivar e recompensar as ideias inovadoras dentro da organização, na prática, identificamos que existem iniciativas pontuais à inovação, geralmente incentivadas por gerentes de forma isolada. Devido a alguns fatores como falhas na divulgação, o prêmio de inovação não

está institucionalizado, tendo pouca representatividade e importância entre os colaboradores.

“Há incentivo sim. Mas sempre partindo de uma iniciativa individual, pontual. Existe o incentivo às teses de mestrado, que é uma política de incentivo da organização para as pessoas fazerem pós-graduação strictu sensu, com a condição que tragam alguma ideia inovadora para ser aplicada na organização” (P006).

A organização tem como característica cultural muito forte o formalismo e o conservadorismo, que representam uma barreira a qualquer iniciativa de inovação. Entretanto, observamos que existe a consciência da importância e necessidade de fomentar a inovação de forma institucional, através do incentivo a ações que estimulem a inovação. Essa questão pode ser ressaltada pelos trechos de entrevista a seguir:

“Sem dúvida, isso [o prêmio de inovação] é um instrumento, uma política de incentivo. Mas, ao mesmo tempo, isso é uma característica da instituição, que mostra-se muito conservadora diante de uma inovação. Então é interessante, porque de um lado incentiva a inovação, mas do outro ela tem essa natureza mais conservadora” (P002).

“Acho que qualquer organização, por mais inovadora que ela seja, e a nossa não está nesse rol das mais inovadoras, por ser um órgão público, tem o aspecto formal... Mas também não está no rol das mais conservadoras. Existe um certo grau de abertura à inovação com algumas iniciativas pontuais, mas eu tenho visto nos últimos anos, a organização dar passos largos em relação à inovação... Em especial, as últimas gestões sempre incentivaram muito a inovação” (P008).

Além do conservadorismo, representado por um modelo de gestão obsoleto, uma outra barreira ao incentivo da inovação dentro da organização é a associação de ações de inovação ao alto risco de insucesso, com base em histórico anterior de projetos desse tipo na instituição. Essa visão de inovação como um risco está relacionada à característica da cultura organizacional de forte resistência à mudança. E mudança é inerente a qualquer

iniciativa de inovação. Com isso, é gerado um receio entre os colaboradores de se envolverem nesses tipos de ação e, de alguma forma, serem estigmatizados na instituição por participarem de projetos fracassados.

“... se fala muito de alguns projetos passados, ideias passadas, que por algum motivo não deram certo... A impressão que eu tenho é que parece que as pessoas que estavam envolvidas com essas ideias que não atingiram devidamente seus objetivos, parece que elas ficam meio estigmatizadas dentro do tribunal. Isso pode trazer um fator muito negativo, deixar as pessoas com medo de assumirem um risco da inovação. Inovação traz risco... Pode não ter dado certo por diversos fatores. Isso é uma coisa que a organização tem que tomar cuidado para não inibir as pessoas” (P002).

5.1.4! Política

A categoria “Política” refere-se ao modo como a organização absorve a influência externa e interna entre setores, seu grau de intensidade e o impacto no ambiente e na gestão organizacional e, consequentemente, nos serviços prestados pela organização.

Observamos a existência eventual de influência política externa na execução do trabalho da organização. Isso se reflete em desmotivação dos funcionários e na construção de uma imagem negativa perante a sociedade, conforme apresentado nos trechos de entrevistas a seguir:

“A decisão às vezes tem um enfoque mais político, menos tecnicista, isso acaba prejudicando a imagem. Precisa melhorar... É uma pressão muito forte política” (P003).

“Eu acho que a gente deveria ser mais independente. É um órgão independente pela lei, mas a gente deveria ser mais independente mesmo. Tem essa preocupação com alinhamento muito forte. A gente tem muito cuidado com o que vai fazer... E até na parte técnica, as pessoas ficam desmotivadas com o viés político da casa. E aí, quando você não acredita que o trabalho vai dar resultado, você trabalha menos” (P001).

“Há um sentimento, mas muitas vezes esse sentimento se traduz em frustração diante das dificuldades que a pessoa encontra para realizar o trabalho. A questão da influência política na execução do trabalho” (P006). Em relação à influência política interna, muitas vezes a visão sistêmica é relevada a segundo plano. Algumas pessoas com objetivo de projetar sua imagem junto a quem detém o poder político, através de conhecimento conseguem patrocínio da alta administração para priorizar iniciativas que não trarão qualquer benefício para a instituição.

“Os aspectos políticos internos influenciam em às vezes você ter que se preocupar como seu trabalho vai aparecer. Mesmo que você ache que é mais importante fazer o trabalho A, mas o trabalho B vai dar mais visibilidade. Então, você às vezes tem que priorizar o trabalho B, que não é tão relevante, porque o presidente está olhando, o conselho está olhando, mesmo que A seja mais importante” (P001).

Também constatamos a indicação política e com vários privilégios associados para preenchimento de alguns cargos, apesar da transformação organizacional em crescente evolução para que a distribuição desses cargos ocorra com base no mérito.

“Ocorre que muitas vezes isso bate de frente com posturas da alta administração, ..., ou até mesmo de alguns funcionários, posturas antiquadas de valorizar o nepotismo. Ninguém, na verdade, se assume como defensor do nepotismo, pelo contrário. Eles são contra o nepotismo, mas praticam o contrário do que pregam, nem que seja nepotismo cruzado. Muitas das posturas modernas de construir uma organização melhor, parceira da sociedade, com valores modernos de otimização de resultados para a sociedade, eles esbarram nessa cultura que existe aqui, há muito tempo instaurada de privilégios” (P006).

“A gente ainda tem muito essa questão do apadrinhamento. Eu acho que é uma instituição que já reconhece bastante a questão do mérito. Mas ainda tem um lado muito forte de paternalismo: é filho de não sei quem, é amigo de

não sei quem, é protegido de não sei quem... O tribunal está avançando, cada vez mais se reconhece o mérito. Desde que estou aqui no tribunal tenho visto isso mudar” (P002).

A baixa rotatividade nos cargos de gestão também é um dos aspectos culturais que atuam como barreira à implantação de uma iniciativa de BPM, uma vez que estimula a resistência às mudanças e acomodação dos funcionários. Porém, esta também é uma característica cultural que já tem sofrido uma mudança nas últimas, visando a implantação de uma gestão orientada a resultados.

“Existiam pessoas que criavam raízes no cargo. A gestão anterior revolucionou, mexeu e tirou todo mundo. Havia pessoas que manipulavam as situações para manter o status quo” (P006).

“A gestão passada deu uma chacoalhada. Havia muitas pessoas há muitos anos no mesmo cargo, há 10 anos. Quando a penúltima gestão assumiu, foi muito corajosa, já com tudo acordado com o presidente atual, para dar uma continuidade.... Em todo lugar, na mudança de gestão todos os cargos são exonerados. Aqui era normal você continuar. Quando alguém tirava uma pessoa do cargo, quem saía achava que era pessoal. Isso foi muito bom, um choque de gestão...” (P005).

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