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BARRAGENS 373 ANEXO F – CORTES LONGITUDINAIS DAS BARRAGENS

3. SEGURANÇA DE BARRAGEM DE GRAVIDADE

3.1. Aspectos gerais

As barragens, compreendendo o barramento, as estruturas associadas e o reservató- rio, são obras necessárias para uma adequada gestão dos recursos hídricos e contenção de rejei- tos de mineração ou de resíduos industriais. Sua construção e operação podem, no entanto, envolver danos potenciais para as populações e os bens materiais e ambientais existentes no entorno.

A segurança de barragens é um aspecto fundamental para todas as entidades envol- vidas, como as autoridades legais e os empreendedores, bem como os agentes que lhes dão apoio técnico nas atividades, relativas à concepção, ao projeto, à construção, ao comissiona- mento, à operação e, por fim, ao descomissionamento (desativação), as quais devem ser pro- porcionais ao tipo, dimensão e risco envolvido.

Para garantir as necessárias condições de segurança das barragens ao longo da sua vida útil, devem ser adotadas medidas de prevenção e controle dessas condições. Essas medi- das, se devidamente implementadas, asseguram uma probabilidade de ocorrência de acidente reduzida ou praticamente nula, mas devem, apesar disso, ser complementadas com medidas de defesa civil para minorar as consequências de uma possível ocorrência de acidente, especial- mente em casos em que se associam danos potenciais mais altos.

As condições de segurança das barragens devem ser periodicamente revisadas, le- vando em consideração eventuais alterações resultantes do envelhecimento e deterioração das estruturas ou de outros fatores, como o aumento da ocupação nos vales a jusante (ANA, 2016). De uma forma geral, como em qualquer outra obra de engenharia, as barragens não são isentas de falhas e a sua segurança absoluta não é totalmente garantida, portanto, acidentes ou até mesmo rupturas podem ocorrer. Destes incidentes pode resultar a liberação descontrolada do volume armazenado, com consequências que podem variar da simples perda deste volume até catástrofes envolvendo perda de vidas humanas e o comprometimento total da região atin- gida. A esta combinação entre a chance ou a probabilidade de ocorrência de falhas e a gravidade de suas consequências que se denomina de risco.

Apesar do estado da arte da engenharia atual permitir que o projeto, construção, manutenção e operação de barragens sejam realizados de forma eficaz e garantir que os níveis de segurança previstos nos diversos regulamentos, para o empreendimento, sejam atingidos,

pode-se afirmar que sempre haverá a possibilidade, mesmo que remota, de que uma determi- nada combinação de fatores adversos ocorra e que o desempenho da estrutura frente a esta seja insatisfatório. A sociedade moderna reconhece a existência de riscos e a impossibilidade de se eliminar todas as ameaças existentes e, diante da necessidade de certos benefícios, acaba por tolerá-los, porém, não mais aceita que estes não recebem o tratamento adequado.

Os constantes processos de tomada de decisão inerentes a qualquer fase de uma obra de engenharia (estudos e projeto, construção, operação, intervenção ou descomissiona- mento), não basta mais apenas a busca pelo entendimento aos critérios normalizados, como valores mínimos de resistência e de fator de segurança etc., mas cabe ao engenheiro considerar outros métodos de avaliação e análise que consigam mensurar as aversões da sociedade, os quais variam da percepção que esta tem de um determinado risco num determinado momento da história. Os motivos que levam a considerá-los é que eles impactam diretamente a atividade das barragens.

A Figura 3.1 mostra exemplos de barragens de gravidade em alvenaria argamas- sada, a saber: a Barragem de Banca Furada, Ilha de S. Nicolau, e a Barragem de Canto Cagara, Ilha de Santo Antão.

Figura 3.1 – Barragem de Banca Furada (à esq.) e Barragem de Canto Cagara (à dir.)

Fonte: Acervo pessoal do Autor.

A Lei, brasileira, nº 12.334, de 20 de setembro de 2010, conhecida como Lei de Segurança de Barragens, estabeleceu a Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB), considerando os aspectos referidos, além de outros, e definiu atribuições e formas de controle necessárias para assegurar as condições de segurança das barragens.

O regulamento de segurança de barragens de Portugal (RSB, 2007), em vigor, aplica-se as designadas grandes barragens, que por sua vez são agrupadas em classes em função da gravidade dos danos potenciais no vale a jusante, associados á eventual ruptura da obra.

O RSB aplica-se: (a) a todas as barragens de altura igual ou superior a 15m, medida desde a cota mais baixa da superfície geral das fundações até à cota do coroamento, ou a barra- gens de altura igual ou superior a 10m cuja albufeira tenha uma capacidade superior a 1 hm3, no presente regulamento designadas por grandes barragens; e (b) ás barragens de altura inferior a 15m que não estejam incluídas na alínea anterior e cuja albufeira tenha uma capacidade su- perior a 100.000 m3.

No entanto, estarão ainda sujeitas as disposições do RSB “…outras barragens que, em resultado da aprovação de projeto ou de estudo de avaliação de segurança, sejam incluídas na classe…”. A classe da barragem é definida em função da ocupação humana, expressa pelo número de residentes, e dos bens e ambientais existentes no vale a jusante, de acordo com o que mostra a Tabela 3.1.

Tabela 3.1 – Classes das barragens em função da ocupação humana e dos bens e ambiente no vale a jusante do barramento

Classe Ocupação humana, bens e ambiente a jusante

I Residentes em números iguais ou superiores a 25 II

Residentes em números inferiores a 25; ou infraestruturas e instalações im- portantes ou bens ambientais de grande valor e dificilmente recuperáveis; ou existência de instalações de produção ou de armazenagem de substân- cias perigosas

III As demais barragens

Fonte: Adaptado de RSB (2007).

A utilização do betão e alvenaria de pedra argamassada ou não como materiais de construção das barragens e de outras obras de engenharia hidráulica e recursos hídricos datam de mais de uma centena de anos, razão pela qual permite a obtenção de um banco de dados confiável sobre o comportamento deste tipo de materiais e obras.

Em termos gerais o projeto das barragens de concreto e de alvenaria é multidisci- plinar, envolvendo diversas áreas: a hidrologia, a hidráulica, a mecânica das rochas (aspetos geológico-geotécnicos), a engenharia de estruturas bem como a engenharia de matérias e outras áreas específicas.

De acordo com Marques Filho (2005), as barragens de concreto adotam cinco tipos de soluções básicas: barragens de concreto a gravidade, a gravidade aliviada, arco-gravidade, em arco e em contrafortes. Nas barragens de concreto a gravidade, grosseiramente, as ações geradas pelo reservatório têm como fator estabilizante o peso próprio da estrutura, utilizando como critério de resistência as envoltórias de Mohr-Coulomb em modelos cujo comportamento

predominante pode ser caracterizado grosseiramente pela seção transversal em balanço. As bar- ragens são estruturas assimétricas e tridimensionais, construídas a partir de materiais complexos com propriedades físicas não uniformes e anisotrópicas. Isto reflete na interação da barragem com a sua base e na resposta aos esforços estruturais.

Em todas estas soluções estão associados volumes expressivos de concreto, gerando preocupações quanto a fissuração gerada pelos fenômenos termogénicos da hidratação do ci- mento, cujos malefícios são potencializados na presença da água do reservatório.

Na evolução do concreto para utilização em estruturas de grande porte, surgiu o conceito de concreto massa, que exige medidas para controlar a geração de calor e a variação de volume decorrente, a fim de minimizar a sua fissuração. Estruturas onde há altas gerações de calor estão suscetíveis a criarem um panorama de tensões devido oscilações volumétricas, com isso fissurações podem ocorrer levando em risco a segurança da barragem assim como sua durabilidade (CBDB, 1989).

As barragens à gravidade têm sua estabilidade garantida principalmente pelos es- forços de gravidade, ou seja, seu peso próprio. Sendo assim o perfil de uma barragem à gravi- dade é essencialmente triangular, para assegurar a estabilidade e a fim de evitar a sobrecarga da barragem ou a sua fundação.

Algumas barragens de gravidade são suavemente curvas no plano por razões esté- ticas ou por necessidades hidráulicas ou econômicas, e sem colocar qualquer desconfiança em sua estabilidade. Com isso, sabendo de sua complexibilidade e multidisciplinaridade, o perfil transversal deverá satisfazer a duas principais condições: as tensões atuantes devem estar dentro de limites pré-estabelecidos e proporcionar estabilidade para o corpo da barragem, suportando o deslizamento na fundação, paralelamente às essas observações deve-se buscar uma seção ótima para garantir a estabilidade e um menor gasto de concreto possível (MARQUES et al., 2011).

Das várias investigações efetuadas concluiu-se que há interação permanente entre projeto e métodos construtivos, devendo ser utilizado com muito cuidado os equipamentos e materiais, assim como o clima também interfere bastante na construção e planejamento. A es- trutura de uma barragem é maciça, sendo assim o peso próprio e a termogênese do concreto são bastante importantes no projeto. Pelos grandes volumes existentes, há uma dificuldade de exe- cução, bem como devem ser tomados cuidados com as reações deletérias.

O controle de qualidade precisa ser muito rigoroso, pois, além de prazos apertados correlacionados com custo altíssimos, deve-se focar na segurança do processo. Tal controle também é fundamental, pois em barragens de concreto os modelos são complexos, as normas

para edificações com difícil aplicação, as análises de segurança são bastante sofisticadas assim como a geologia do local interfere com as formas.

Deste modo, uma extensa campanha de sondagens e investigações geotécnicas é fundamental na fase de projeto. Devem ser executados furos, trincheiras, galerias e investiga- ções geofísicas, de modo a caracterizar o mais amplamente possível o subsolo e as ombreiras. As estruturas devem ser sempre assentadas em rochas com adequadas características mecânicas para suportar a carga vertical e conferir estabilidade contra esforços de cisalhamento e desliza- mento.

As barragens de gravidade são classificadas, em termos estatísticos, levando em conta suas alturas estruturais. Define-se altura estrutural como a diferença, em elevação, entre a crista da barragem (a elevação da pista de rolamento ou do passeio, caso não exista pista) e o ponto mais baixo da fundação, excluindo-se eventuais zonas de falhas. Desse modo, considera- se o seguinte critério, segundo o U.S. Bureau of Reclamation: (i) Barragens baixas: de até 30 m de altura; (ii) Barragens médias: de 30 a 90 m de altura; e (iii) Barragens altas: acima de 90 m de altura.

A escolha da solução de barramento não é nenhum pouco simples, implicando a interatividade de diversas áreas e análise muito criteriosa. A escolha envolve a mitigação dos riscos, capacidade executiva minimização da interferência ambiental, avaliação econômico-fi- nanceira holística, levando em conta o arranjo físico geral e o cronograma de obras com possí- veis antecipações de receita. Todos esses aspectos precisam ser satisfeitos simultaneamente, por isso diversos arranjos são estudos para se chegar à solução ideal.

A integridade estrutural de uma barragem deve ser mantida em toda a gama de cir- cunstâncias ou acontecimentos que podem surgir em serviço. O arranjo é, portanto, determinado através da análise conjunta de todas as condições de carregamento, e portanto, a estabilidade da barragem e fundação deve ser assegurada em todas as circunstâncias.

As barragens de gravidade (em francês, barrages poids, traduzindo o nome do seu princípio de funcionamento), em betão ou alvenaria, são concebidas e calculadas para resistir, apenas pelo seu peso próprio ao impulso da água que retêm, sendo a relação entre a largura da base e a altura definida de forma a verificar esta condição.

A secção transversal de uma barragem de gravidade típica é aproximadamente tri- angular e a largura da base raras vezes inferior a 80% da altura. O traçado em planta é reto (para barragens de alvenaria) ou com uma ligeira curvatura (para barragens em betão). Inicialmente, a secção transversal de uma barragem gravidade em alvenaria, era um trapézio curvilíneo, em

que a curvatura era continua ou aproximada por um poligonal. Posteriormente esta forma evo- luiu para trapézio retilíneo, em que o paramento de montante começou por ser inclinado e mais tarde vertical.

Já com as barragens em concreto armado, surgiram as de gravidade aligeirada de secção vazada. Esta evolução decorreu essencialmente do conhecimento que se foi adquirindo e da consequente confiança em concessões mais arrojadas, bem como da descoberta do cimento Portland. No entanto, também foi motivada por razões de ordem econômica, uma vez que é muito mais simples e, portanto, menos dispendioso construir superficíes retilíneos.

Evoluções recentes das barragens de gravidade são as barragens descarregadoras e as barragens móveis. As barragens descarregadoras são basicamente constituídas por soleiras descarregadoras que podem ou não estar associadas a pilares, os quais, por sua vez, suportam as comportas quando existem.

As barragens descarregadoras dizem-se móveis quando a área total controlada por comportas é uma fração significativa da seção transversal do vale, e, portanto, quando é pe- quena a sobrelevação do nível da água provocada pela barragem durante a passagem de cheias importantes.