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Coleta de dados

Inicialmente foram realizadas entrevistas informais6 com extrativistas encontrados ad libitum7 com o intuito de se conhecer aspectos mais gerais da comunidade nativa, dos ecossistemas locais e das práticas de utilização nele desenvolvidas. Após esta etapa, foram gravadas entrevistas semi-estruturadas (figura 2) com extrativistas que desenvolvem as diversas modalidades de pesca, mariscagem e extrativismo vegetal. A pesquisa privilegiou, a princípio, a abordagem de questões históricas e de percepção de impacto ambiental.

Figura 2 - Realização de entrevista semi-estruturada

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Entrevistas informais são aquelas em que o pesquisador escreve registros de uma conversa casual (ALEXIADES, 1996).

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Posteriormente foram realizadas 21 entrevistas semiestruturadas abordando assuntos relacionados à biologia e ecologia dos recursos (etnotaxonomia, etnofenologia, ecozoneamento, hidrodinâmica, territorialidade...), crenças locais, estratégias de captura, utilização e conservação. Particularmente no que se refere ao estudo da compreensão dos ciclos naturais pelos nativos (etnofenologia – NABHAN, 2010), foram agregados indicadores vernáculos (grassroots indicators - MARARIKE, 1996; ORONE, 1996) identificados pelos extrativistas para relacionar eventos fenológicos distintos. Através das entrevistas, foi investigado se os nativos percebem mudanças nos ciclos etnofenológicos e se atribuem alguma causa a estes fenômenos.

A percepção local sobre as mudanças ocorridas no ambiente foi estudada através da história oral. Para tanto foram realizadas entrevistas semi- estruturadas empregando o gênero “história oral temática”, que segundo Freitas (2006), permite a comparação entre diversas informações, apontando convergências, divergências e evidências de uma memória coletiva. Todas as entrevistas semi-estruturadas foram gravadas e transcritas de forma verbatim, respeitando o linguajar nativo. Dentre os entrevistados, privilegiou-se contactar aqueles indivíduos considerados “especialistas nativos(as)”, pessoas auto- reconhecidas e reconhecidas pela própria comunidade como culturalmente competentes no exercício de determinada atividade (MARQUES, 1995). A ampliação amostral foi possibilitada pela inclusão de novos indivíduos, sucessivamente indicados a partir dos anteriormente contatados.

Todas as entrevistas foram precedidas pela identificação do entrevistador, explanação sobre os objetivos do trabalho e apresentação de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, conforme indicações do Comitê de Ética em Pesquisa (autorização em apêndice 1). O projeto de tese foi avaliado e autorizado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN)8 por

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No ano de 2011, a solicitação de autorização de acesso ao conhecimento tradicional associado à biodiversidade em pesquisas que não envolvam o acesso direto ao componente genético e nem a intenção de gerar produtos e patentes, deixou de ser uma atribuição do Conselho do Patrimônio Genético (CGEN) e

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tratar de conhecimento tradicional associado à biodiversidade (processo 02000.000446/2012-10 DPI/IPHAN/MinC – D.O.U. 18/07/2012 – apêndice 2). Por tratar-se de uma pesquisa em unidade de conservação federal o projeto também foi submetido a avaliação pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade e aprovado sob o número 27644-3(apêndice 3). Por se tratar de uma unidade de conservação de uso sustentável, o projeto foi submetido ainda à apreciação do Conselho Deliberativo da Resex Baía do Iguape, tendo sido apresentado e discutido em reunião.

A coleta de dados também ocorreu através de observações diretas (figura 3), quando os informantes foram acompanhados em suas atividades extrativas rotineiras, ocasião em que também foram realizadas as entrevistas de campo (ALEXIADES, 1996). Complementarmente, foi utilizada a técnica de percursos guiados em campo, onde os próprios extrativistas serviram de guias em áreas de extrativismo ou atividades que desenvolvem (GRENIER, 1998). Durante essas incursões, foram feitos registros fotográficos (conforme permissão do sujeito da pesquisa) das atividades cotidianas de extrativistas nos sítios de pesca e coleta, nas ruas ou em suas residências. Nessas ocasiões, foram evitadas interferências no trabalho desses profissionais para que o registro das imagens seja fidedigno e para não atrapalhar o rendimento de suas atividades.

passou a ser analisado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), desta forma, o projeto desta tese que aguardava parecer do CGEN, foi transferido para apreciação do IPHAN.

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Figura 3- Observação direta do extrativismo da piaçava

Um esquema do processo de coleta de dados é representado na figura 4.

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Análise de dados

Optou-se por analisar as atividades extrativistas sob abordagem da Etnoecologia Abrangente (MARQUES, 1995, 2001). A escolha de compreender as relações entre extrativistas e o restante do ambiente a partir desta óptica se justifica principalmente pela natureza eminentemente qualitativa da proposta e pelas categorias empregadas que facilitam a análise.

A partir das entrevistas foram identificados memes que, enquanto ferramenta de análise qualitativa, serviram como instrumento para verificar a consistência das informações obtidas. Também através das entrevistas, buscou- se no presente estudo comparar os conhecimentos locais com a literatura científica (cognição comparada) e os comportamentos foram observados de acordo com as implicações ambientais decorrentes. Inferências relacionadas à etnoconservação (PITT, 1987) foram abordadas de forma mais pragmática, utilizando a perspectiva adotada por Smith e Wishnie (2000) para avaliar conservação em sociedades de pequena escala9, segundo os quais existe conservação quando há prevenção ou mitigação de: depleção de recurso, extirpação de espécies e degradação de hábitat.

Reunindo informações a respeito dos conhecimentos, crenças e comportamentos dos extrativistas com relação aos recursos por eles explotados, será elaborado um diagrama baseado no calendário agrícola, climático e festivo elaborado por BARRERA-BASSOLS e ZINK (2003). Nesta ilustração serão mostrados elementos que influenciam na atividade extrativista agregando elementos simbólicos e práticos. Integrando dados obtidos nas entrevistas, observações de atividades extrativistas e percursos guiados foi construído um modelo ilustrando as principais unidades de manejo da paisagem da maneira como são percebidas pelos nativos (MAIMONE-CELORIO et al, 2008).

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Sociedades de pequena escala são caracterizadas essencialmente por possuir algumas centenas a poucos milhares de habitantes e certa autonomia política (SMITH e WISHNIE, 2000).

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Optou-se nesta pesquisa por abordar o extrativismo pesqueiro e vegetal na comunidade da Salamina Putumuju a partir de uma análise de caráter etnográfico, privilegiando assumidamente uma análise qualitativa dos dados. A análise escolhida parte do arcabouço teórico-analítico da etnoecologia abrangente (MARQUES, 1995; 2001) e buscou integrar outros elementos com a intenção de tornar as dimensões espacial e temporal os eixos da análise. Para tanto, agrega- se um entendimento mais amplo de paisagem, assumindo-a de acordo com a perspectiva de Ingold (1993) considerando a vida humana como um processo que envolve a passagem do tempo e nela são construídas as paisagens que a pessoa vive. Além disso, procurou-se associar aspectos trazidos pela etnoecologia da paisagem, que tem assumido a importância dos processos históricos e relações de poder na geração do conhecimento e manejo de recursos naturais (ELLEN, 2009; JOHNSON E HUNN, 2010a).

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