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Capítulo V – Apresentação e Discussão dos Resultados

5.4 Aspetos negativos do trabalho temporário

Da mesma forma, que existem aspetos positivos, a situação de trabalho temporário transporta consigo um leque de impactos negativos que advêm da utilização de vínculos temporários. Desta forma, é importante compreender quais os aspetos negativos que os trabalhadores temporários identificam ao nível do trabalho, da vida privada/familiar e atividades de tempo livre. Esta categoria refere-se à questão 5 (5.1, 5.2, 5.3), e são apresentados os resultados, respetivamente, nas Tabelas 8, 9 e 10.

Tabela 8. Análise da questão 5.1 - Face à experiência que tem como trabalhador temporário, indique-me, com o máximo detalhe, os aspetos negativos que identifica: Ao nível do trabalho? Categoria Subcategoria Unidade Semântica Unidade Registo Entrevistados Aspetos negativos do trabalho temporário Trabalho

Insegurança 15 E1, E2, E5, E7, E8, E11, E12, E14, E17 E3, E4, E6, E13, E15, E16 Precariedade no trabalho 3 E1, E2, E14

Falta de investimento em formações

1 E14

Falta de perspetivas de evolução profissional

11 E1, E2, E7, E8, E11, E14, E17

E3, E4, E9, E18 Trabalho repetitivo 2 E9, E13

Prolongamento de horários

8 E2, E7, E8, E11, E14

E13, E15, E16 Horários não

estandardizados

1 E13

Menos regalias 8 E7, E11, E14, E17 E10, E15, E16, E18

Salários baixos 6 E12, E14

E4, E6, E10, E16 Deslocação à Agência

para tratar de algum assunto

1 E18

Inferiorização dos

trabalhadores temporários

1 E14

Relativamente aos aspetos negativos ao nível do trabalho, verifica-se na Tabela 8 que a maioria dos participantes menciona o fator da insegurança (15) como o aspeto

mais negativo da experiência como trabalhador temporário, mencionando ser as melhores palavras que caracterizam o trabalho temporário. Seguindo-se a falta de perspetivas de evolução profissional (11), a pressão que existe em ter de aceitar fazer um prolongamento de horários (8), a falta de regalias comparativamente a trabalhadores efetivos (8) e a aferição de salários baixos (6). Foi ainda referido a precariedade no trabalho (3), trabalhos repetitivos, com forte probabilidade de tendinites (2), a existência de horários não estandardizados (turnos rotativos) (1), deslocação à agência para tratar de algum assunto propositadamente assim que necessário (1) e a inferiorização dos trabalhadores temporários por partes dos trabalhadores efetivos (1).

É de salientar que a palavra que mais associavam ao trabalho temporário, é sem dúvida, a insegurança que diariamente sentem pelo contrato de trabalho estabelecido, referindo que a qualquer momento podem receber a carta de despedimento por parte da entidade empregadora. O facto de ficar em situação de desemprego é assustador para a maior parte dos participantes, e por isso, a pressão e ansiedade é dominante, de forma a que o empenho na atividade profissional seja redobrado, tal como mencionado:

E3- "... é viver sempre naquele sobressalto (...) hoje tenho trabalho, amanhã não tenho (...) viver em constante angústia. [...] ... e há lá pessoas com muitos anos que se vê que produzem muito menos que nós e tem muito menos interesse em estar lá que nós. Pela simples razão, na minha opinião, que nós temos que mostrar trabalho, porque somos novos, porque estamos a contrato temporário, e porque temos que fazer merecer o nosso posto de trabalho".

Acrescentando ainda, outros participantes:

E5- "... a parte da insegurança pesa muito, a nível psicológico, afeta muito. Por exemplo, uma pessoa que tenha encargos, como eu tenho, por exemplo... eu pago a

prestação de um carro (...) conheço inúmeras pessoas que estão na mesma situação, ou até com encargos, bem menores que os meus, e não os conseguem cumprir".

É evidente a falta de perspetivas futuras e a pressão exercida em realizar prolongamento de horário pelo receio de ficar sem emprego:

E16- "... no trabalho mesmo, o temporário, quer queiramos quer não, é sempre temporário, nós somos tratados como temporários, estás aqui mas amanhã podes não estar... (...) Uma pessoa não se pode meter em nada de cabeça, não tem segurança nenhuma, ou seja, o futuro, não há futuro! (...) Se nos pedirem 'olha ficas mais uma hora?', temos que aceitar porque senão... estás aqui e estás temporário, é porque precisam, por isso tens que ir...".

No que diz respeito aos aspetos negativos, ao nível do domínio profissional verifica-se que as palavras associadas de imediato, centram-se na incerteza, insegurança e ameaça constante do desemprego, afirmando que é o que mais caracteriza o trabalho temporário, e principalmente quem o experiencia, vive diariamente o receio de perder o emprego a qualquer altura. A utilização de vínculos temporários veio mostrar que existe precariedade no trabalho, nenhuma segurança do emprego, poucas regalias, salários baixos e uma pressão para realizar um possível prolongamento de horários. Este último facto, pode-se justificar pela perceção de insegurança e da incerteza levando a haver uma maior probabilidade de fazer horários prolongados (Smithson, Lewis & Guerreiro, 1998) pelo medo de perder o emprego. A falta de perspetivas de evolução na carreira, é outro grande aspeto evidenciado. Isto, poderá justificar-se, pelo facto de os trabalhadores serem contratados face à necessidade temporária de mão-de-obra, não existindo perspetiva de continuidade com vínculo direto à empresa, levando, por sua vez, a sentimentos de insegurança em relação ao futuro profissional (Booth, et al. 2002; Nollen, 1996).

Tabela 9. Análise da questão 5.2 - Face à experiência que tem como trabalhador temporário , indique-me, com o máximo detalhe, os aspetos negativos que identifica: Ao nível da vida privada/familiar?

Categoria Subcategoria Unidade Semântica

Unidade Registo Entrevistados Aspetos negativos do trabalho temporário Vida privada/familiar Dificuldade em possuir créditos 3 E1, E2 E13

Desgaste físico e emocional 9 E1, E2, E7, E8, E11, E17 E3, E13, E15 Adiamento de etapas do

trajeto de vida

8 E2, E8, E11, E12

E3, E13, E15, E16

Consequências na saúde mental

7 E2, E5, E8 E3, E13, E15, E16

Menos tempo para a família/amigos/si próprio

7 E8, E17 E3, E4, E6, E13, E15 Dificuldade em fazer

planos

3 E5

E15, E16 Menos disposição para as

tarefas de casa

4 E3, E4, E6, E13

Hora de descanso alteradas 3 E3, E13, E15 Pressão para aceitar o

trabalho

1 E9

A leitura da Tabela 9, permite constatar que, face à experiência como trabalhador temporário, o aspeto negativo mais mencionado a nível da vida privada/familiar pelos participantes centra-se no desgaste físico e emocional sentido pela realização dos horários não estandardizados (9) e o adiamento das principais etapas do trajeto de vida (8), como é o caso, do nascimento de filhos, casar ou mesmo sair de

casa dos pais, são as principais etapas verbalizadas como adiadas pela situação de trabalho em que se encontram de momento, impossibilitando por completo a concretização dessas etapas. Da mesma forma, é referido as consequências na saúde mental, como o stress e as depressões (7) causadas pela insegurança e pressão, menos tempo para a família/amigos/si próprio pela realização de horários não estandardizados (7), menos disposição para as tarefas de casa (4), dificuldade em possuir créditos (3) dificuldade em fazer planos futuros (3), horas de descanso alteradas (3) e a pressão exercida para aceitar um determinado trabalho proposto (1) pelo medo de não voltarem a contactar.

Os resultados mostram-nos um cenário construído pela perceção da incerteza e insegurança, constatada anteriormente, e por essa razão o adiamento das principais fases do trajeto de vida, como o nascimento de filhos, casar, ou mesmo, sair de casa dos pais, pois aguardam primeiramente uma estabilidade económica e profissional. Por este motivo, alguns alegam já ter adiado de vez o nascimento, de um segundo filho, por exemplo, e sair de casa dos pais é algo que não está nos planos, pela dificuldade que é conseguir sustentarem-se sozinhos com trabalhos incertos. Podemos constatar isso em alguns relatos, como por exemplo:

E2- "É um adiar, um adiar as situações mesmo... Eu até queria ter um filho, mas é sempre um risco..."

E11- "Se tivesse um ordenado maior, é obvio que podia... podia alastrar mais os meus objetivos, mas sendo um ordenado baixo, não estava a pensar casar, mas não consigo manter uma casa com este ordenado"

E3- "Adio, adio... quer dizer, acho que já adiei de vez. (...) Acho que realmente a instabilidade é demasiada".

Tal como constatado na revisão da literatura, os trabalhadores expostos a uma constante insegurança no trabalho foram considerados mais suscetíveis a doenças (Benach, et al. 2002), e podemos verificar que o stress é experienciado pela maioria das pessoas que se encontram nesta situação de trabalho, como mencionado por alguns participantes:

E8- "Sim aquela instabilidade de não estar seguros, é muito mais stressante..."

E16- "... psicologicamente afeta a pessoa, anda mais stressada, nervosa, triste, porque quer fazer alguma coisa, comprar alguma coisa, e não pode... Não tem uma garantia...".

Ao nível privado e familiar, constata-se que a perceção de insegurança e de incerteza do trabalho temporário, mais uma vez, transporta consigo consequências negativas para o campo pessoal e familiar, como é o caso de um adiamento das principais fases do trajeto de vida (Smithson, Lewis & Guerreiro, 1998), como é o caso do nascimento de filhos, casamento (Cooper & Jones, 1992, citados em Smithson, Lewis & Guerreiro, 1998), ou mesmo sair de casa dos pais. Simultaneamente dificultam a criação de créditos (por ex. de habitação, carro) impossibilitando traçar um plano a médio longo prazo. Paralelamente a este cenário, verificámos que o panorama de insegurança no trabalho, leva a consequências para a saúde mental, como o stress e depressões. Isto deve-se à exposição constante à insegurança gerado pelo trabalho, o que indica que a insegurança no trabalho atua como um fator de stress crónico trazendo perigos para a saúde do trabalhador (Benach, et al. 2002).

Tabela 10. Análise da questão 5.3 - Face à experiência que tem como trabalhador temporário , indique-me, com o máximo detalhe, os aspetos negativos que identifica: Ao nível de atividades de lazer, sociais, etc.?

Categoria Subcategoria Unidade Semântica Unidade Registo Entrevistados Aspetos negativos do trabalho temporário Atividades extratrabalho

Deixar de praticar uma atividade

3 E1

E3, E15 Mais cansaço/stress 14 E1, E7, E8,

E11, E12, E17 E3, E4, E6, E9, E10, E13, E15, E16, E18

Motivo monetário 4 E2,E5, E8,E17

Não identificam 1 E14

Ao observarmos a Tabela 10, verificamos que a existência de mais cansaço/stress influência na realização de atividade de lazer, sociais, etc., sendo mencionado por 14 participantes, como um aspeto mais negativo ao nível das atividades extra trabalho. 4 Participantes mencionaram não investir mais em atividades extratrabalho pela questão monetária e 3 referem terem, obrigatoriamente, deixar de praticar uma atividade devido ao horário laboral, pois era completamente impossível a conciliação, nomeadamente atividades desportivas e voluntariado. Apena 1 participante não identificou aspetos negativos.

Ainda suportado pela perceção da incerteza e insegurança no trabalho, a realização das atividades extratrabalho fica penalizada pela existência de um maior desgaste físico, fruto, muitas vezes, de um prolongamento de horários, pelo stress e ansiedade:

E3- "...posso dizer que se calhar eu saía todos os fins-de-semana, todos os sábados à noite eu ia com a família e amigos, íamos tomar um café, ou isto ou aquilo, agora eu

chego e quero é descansar... é muito stressante, se calhar não fisicamente até... mas o próprio ambiente em si é muito... é stressante, é mesmo... a gente sai mesmo muito stressadas, enervadas... (...)".

Acrescenta ainda:

E3- "... é menos saídas, menos tempo para mim, que eu considerava as minhas idas ao ginásio, era um tempo para mim só... mas o cansaço começa a apoderar-se de nós (...)".

O preditor de insegurança transporta para os vários domínios da vida uma carga negativa. Por conseguinte, evidencia-se nas atividades extratrabalho, uma diminuição da realização das mesmas pelo stress/desgaste físico/ansiedade, impossibilita experienciarem sensações de relaxamento e bem estar, através de atividade de lazer, sociais, etc.