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Assembléia no Estádio Vila Euclides em 1979

Amparada pelo clima popular de organização, a greve do ABC contou com ampla solidariedade nacional. A burguesia responde a isso, lançando uma campanha televisiva em favor do governo Ditatorial-burguês e do patronato afirmando que os trabalhadores do ABC eram privilegiados, que tem os maiores salários do país, etc (ANTUNES, 1992).

Na assembléia geral de terça-feira (27 de março), completados 15 dias de greve, em uma votação apertada, sob insistência de Lula que queria acabar com a greve, a maioria decidiu pela volta ao trabalho e uma “trégua” de 45 dias para que o patronato apresentasse uma nova proposta. Ainda assim, o patronato preparou a retaliação ao operariado havia se organizado para lutar por suas demandas, muitos trabalhadores são demitidos.

A greve geral de 1979 teve importantes avanços organizativos, foi qualitativamente mais intensa e extensa que àquela de 1978, tanto em organização quanto em alcance. Em 1978 ocorreram uma série de paralisações parciais e greves, que ocorreram de forma dispersa e não coesa. Mas em 1979 a greve articulou amplos setores da categoria metalúrgica e uma significativa base de apoio ao operariado do ABC. O movimento além de conquistar parte de suas pautas, avançou também em sua organização e articulação, demonstrando avanço não só quantitativo, mas também qualitativo, pois suas manifestações paralisaram, só no ABC, mais de 150.000 trabalhadores, e ainda

estendeu-se a outras categorias, cidades e estados. Somou-estendeu-se um total de 436 estabelecimentos em greve no País com mais de 3 milhões de trabalhadores paralisados (ANTUNES, 1992, SADER, 1991).

Com as paralisações parciais de 1978 e a greve geral metalúrgica de 1979, a correlação de forças altera-se em favor dos trabalhadores e contra o patronato e o Estado burguês-militarizado. A onda proletária insurgente estava em ascensão. Em abril de 1979 é realizado em São Paulo o Primeiro Congresso da Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo. Porém, ainda neste momento não houve articulação orgânica entre os metalúrgicos de São Paulo em luta e os metalúrgicos do ABC. Estes núcleos de mobilização nacional não se entendiam enquanto vanguarda proletária do país, com possibilidade objetiva de re-determinar o desenvolvimento social e político do Brasil.

O movimento mostrava-se forte o suficiente para determinar mudanças político-salariais no País e influenciar outros movimentos, como a greve desencadeada pela Oposição Sindical em São Paulo que envolveu mais de 300 mil trabalhadores que exigiam a unificação com ABC para vingar a morte de Santo Dias, operário grevista assassinado em um piquete com um tiro nas costas, efetuado pelo policial militar Herculano Leonel a serviço da ditadura militar-burguesa. Outros segmentos sociais também saíram em luta pelos seus direitos, fazendo greve, contrariando portanto a lei anti-greve do governo militar-burguês, como os trabalhadores e professores da USP (Universidade de São Paulo) que deflagraram greve em 1979 (SALLES, E., MATOS, D., 2007). Ainda, outros segmentos decretaram greves, como observa Eduardo Noronha (1991), no trabalho A

explosão da greves na década de 1980

Neste ano, além dos metalúrgicos, que continuaram a liderar o movimento, com 18,3% das greves e 31,1% das jornadas perdidas, novas categorias do setor privado entraram em cena: os trabalhadores da construção (8,1% das greves e 10,5% das jornadas), os motoristas e cobradores (8,9 % e 3,0 %) e algumas outras categorias do setor industrial. Além desses, dois outros segmentos, o dos médicos (7,7 % e 3, 0 %), e dos professores (9,3 % e 35, 4 %), deram inicio a movimentos que ao longo do tempo os transformariam nos principais grupos grevistas dos assalariados de classe média. (p. 105).

Frente à ofensiva do proletariado contra o patronato e o Estado burguês-militarizado, fazia-se urgente impor um fim ao risco de derrubada do regime de exceção, tornou-fazia-se então estratégico derrotar o operariado organizado, e redefinir a autoridade das políticas governamentais e patronais. O projeto passava por buscar, a todo custo, controlar totalmente o tipo de abertura que seria permitida, restringindo e reprimindo as alternativas apresentadas pelos trabalhadores por via direta.

Assim, também em 1979 o operariado foi alvo de intensa repressão patronal e governamental, além dos ataques que o operariado sofreu das Forças Armadas, terminada a greve o patronato inicia uma nova onda de demissões. Frente a este duplo ataque da patronal e do Estado, o

operariado do ABC novamente ficou isolado. Não conseguiu ligar-se organicamente a outros processos de luta operária que acontecia em São Paulo. Somou-se a este isolamento o boicote político levado a cabo pelos partidos stalinistas brasileiros, o PCB, PC do B e MR8. Estes negaram qualquer forma de solidariedade aos levantes dos trabalhadores e trabalhadoras do ABC. Para estes partidos, os enfrentamentos desencadeados a partir do ABC significavam uma afronta o Estado burguês-militar e a toda “burguesia democrática”, com isso para os stalinistas, os levantes atrapalhava a transição da ditadura para democracia burguesa. Conforme aponta Santana (2001) no caso do PCB:

Se em 1978, o tom era de muito mais apoio e percepção de possibilidades, agora já se sentem criticas a determinadas posturas e receio de que as possibilidades fossem de resultados negativos, tanto para os trabalhadores como para a sociedade, na busca por democratização. Essa posição do partido se acirrará em movimentos futuros, na medida em que tinha ligação, também, com a consolidação de um bloco alternativo às posturas do PCB. (p. 193).

Os partidos stalinistas, ao invés de se aliarem com o proletariado em ascenso preferiram manter-se nas fileira dos setores “mais democráticos” do movimento sindical, como forma de enfraquecer a ala representada pelos “autênticos”. Com isso, as organizações stalinistas acabaram por organizar-e com o setor dos “pelegos”. Esta fração reformista era a mais expressiva preocupada em não afrontar o regime.

Diante desse espetacular processo de luta operária em São Paulo, o PCB e o MR-8 - aliados diretos dos pelegos -, e o PCdoB - que se colocava como “opositor” -, todos juntos faziam de tudo contra as greves, pois em sua estratégia de conciliação de classes com a burguesia “opositora” - e a aliança com os pelegos - defendiam a transição pacífica para a “democracia” e consideravam que as greves deveriam se restringir à luta salarial para não “atrapalhar” a “abertura”. O PCB publicou um folheto com o título “Chega de Aventuras”, sem tocar na traição do pelego Joaquinzão e ainda defendendo que a repressão patronal pós-greve era culpa dos que estiveram à frente das lutas. Este era o nefasto papel que cumpria a burocracia stalinista junto com os pelegos, aliando-se à burguesia para trair as greves em nome de garantir a “abertura”. (CEIB, 2008, p. 24-25).

De forma geral, podemos considerar que de fato o operariado do ABC tirou uma série de lições das greves de 1979, esta foi organizada de forma muito mais qualitativa do que as greves e paralisações de 1978. Ainda no plano sindical-organizativo os sindicalistas tentam canalizar também as mobilizações de 1979 em um novo encontro operário, que foi realizado em fevereiro de 1980. Este ficou conhecido como “Encontro de João Monlevade”, cidade de Minas Gerais. Foi sediado no Sindicato dos metalúrgicos. Segundo Rodrigues “Do encontro participaram líderes de pastorais operárias, de atividades comunitárias de base, das oposições sindicais, além de diretores de sindicatos oficiais”. (p. 17).

Ou seja, a dinâmica do movimento operário do ABC apontava que a organização proletária no país teria continuidade. Internacionalmente desencadearam-se outros levantes de trabalhadores contribuindo com o quadro geral de mobilizações. No mesmo período em outros paises também eclodiram ações proletárias radicalizadas, como na Nicarágua em 17 de julho de 1979, quando trabalhadores, camponeses e estudantes, acabavam de derrubar a ditadura de Somoza. Também na Polônia, com a Comuna de Gdanski, os trabalhadores desencadeiam uma grande greve e insurreição política.

Com mobilizações operárias acontecendo dentro e fora do Brasil, diante do risco premente da radicalização do movimento operário brasileiro, que se organizara cada vez mais, o governo foi obrigado a ceder em alguns pontos para neutralizar o risco de ser derrubado pela insurgência proletária. Assim, como forma de desmobilizar os/as operários/as radicalizados, o governo Ditatorial-burguês viu-se obrigado a fazer uma concessão parlamentar eleitoral, em dezembro de 1979 modificou a legislação eleitoral e restabeleceu o pluripartidarismo partidário, com isso o ARENA (partido do governo Ditatorial-burguês) tornou-se Partido Democrático Social (PDS). E o MDB tornou-se PMDB. As lideranças sindicais do ABC, aliados com setores da igreja católica, sindicalistas e intelectuais lançam o “movimento pró-PT”, que objetivava criar o Partido dos Trabalhadores (PT).

Além destes, outros partidos foram criados, como o Partido Democrático Trabalhista - PDT, o Partido Popular - PP e o Partido Trabalhista Brasileiro - PTB. Já os partidos que se reivindicavam comunistas continuaram sendo considerados ilegais. Interessante observar que, mais atrasados do que o regime ditatorial, o PCB, PC do B e MR8 posicionavam-se contra a fundação do PT. Para o estes partidos de matriz stalinistas, os operários deveriam lutar apenas pelo reajuste salarial, como pauta única. Com a ampliação da pauta dos metalúrgicos e a discussão de formarem um novo partido dos trabalhadores, em que a burguesia não poderia participar, estes partidos passam a demonstrar hostilidade também em relação a proposição de atuação partidária oriunda de setores do movimento dos operários do ABC. Entendiam que os operários e sindicalistas não deveriam fundar um novo partido, mas sim, ligar-se ao MDB junto com as frações burguesia que eram entendidas como progressistas, compondo assim a luta pelo restabelecimento da democracia burguesa no país.