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4 1 1 Assentamentos Chaquenho

No documento subsistência e cultura material (páginas 120-124)

Os dados sobre os assentamentos Guaicurú no Chaco são escassos, principalmente nos primeiros séculos da colonização hispânica, séculos XVI e XVII.

Cabeza de Vaca (1969, p. 35) relatou pela primeira vez o caráter temporário dos acampamentos Guaicurú: “... nunca están quedados de dos días arriba en un lugar; luego levantan sus casas, que son de esteras, y se van una legua o dos desviados de donde han tenido asiento, porque la caza, como es por ellos hostigada, huye y se va, y vanla siguiendo y matando”.

O capuchinho Espinosa (1948, p. 634) observou no início do século XVII a pouca estabilidade do grupo, registrando que se utilizavam de canoas durante as inundações para se locomover:

Demas de ser tan haragana, no tienen poblazion, mas de vnas esteras, que las mudan quando quieren a outra parte y aunque es tierra raza sin montaña, ni arboleda, donde viuen, son dificiles de conquistar, porque llouiendo se aniega toda la tierra, por ser muy llana, y sin corrientes, de suerte que toda está hecha vna mar, y andan por ella muchas leguas en Canoas, y en dexando de llover se seca luego, la qual está llena de ganado.

Techo (1897, t. III, p. 140), jesuíta do século XVII, destaca outro aspecto da instabilidade: “(...) conocía por larga experiencia cuán enemigos son los indios de tener domicilio estable, á causa de la afición que tienen á las guerras intestinas, de tal manera, que todos los años solían trasladarse á outro sitio”.

O cronista Muriel (1918, p. 229) indica o esgotamento dos recursos locais como causa dos deslocamentos constantes Guaicurú: “como sufren de falta de mantenimiento, cada año mudan de lugar, llevando a hombro todos los enseres domésticos y la misma casa, que es portátil, también”.

O jesuíta Lozano (1941, p. 67) é quem dá a idéia dos locais preferenciais para os assentamentos em tempos de seca no Chaco: “bien que quedan en partes, pantanos de dos y tres leguas, y en ellos algunos esteros donde se esconden estos Guaycurús (...)”.

Da mesma forma, Alvear (1970, p. 680-81) refere que: “Sin embargo se conservan algunas lagunas a largos trechos, y a ellas, como a seguro asilo, se acogen los guaycurúes, y pasan la vida sin más alimento que algún pescado, raíces de totora y el agua hedionda de aquellos lodazales.”

O jesuíta Labrador (1910, t. I, p. 144-45), ao localizar em meados do século XVIII algumas tribos Mbayá-Guaicurú na margem ocidental do rio Paraguai, entre os 18º e os 21º de latitude sul, menciona a existência nessa área de mais lagoas do que rios. Identificou e localizou dezoito lagoas que os Guaicurú buscavam em suas jornadas, pois ...

Abundan en ellas los peces y Caimanes, horribles en sus aspectos y formidables por sus colmillos. En tiempo de las crescientes del río Paraguay, y de las lluvias no puede este camino traginarse á causa de cerrar la senda las aguas y lodazales.

Em meados do século XIX, Castelnau (1949, p. 245) registrou que:

Os Guaicurus são ótimos cavaleiros, acostumados à vida errante no grão- Chaco e refratários à fixação em qualquer morada permanente. Na vastidão do deserto estão eles em contínua movimentação, um minuto bastando para montarem nos cavalos as mulheres e crianças, juntamente com as esteiras, os couros e os próprios cães, e partir logo todo o bando a galope. Não vivem senão do saque e dos assaltos que praticam, cometendo não raro espantosos morticínios.

Esta informação registrada por Castelnau (1949) refere-se, provavelmente, a uma das duas tribos eqüestres Mbayá (Cadiguegodis ou Guetiadegodis) que tinham nessa época assentamentos na margem chaquenha do rio Paraguai, na região do Alto Paraguai.

Em Métraux (1963, p. 355) encontra-se reproduzida uma ilustração (fig. 15) de um acampamento Mbayá em Albuquerque feita por Castelnau. Este acampamento poderia estar relacionado à seguinte passagem descrita pelo autor (1949, p. 234) em sua obra: “quando chegamos a Albuquerque, achava-se aí de passagem uma outra tribo da mesma nação de que estamos tratando, a dos Cadiueus, muito mais selvagem do que a precedente. Tinha ela vindo pouco antes do grão-Chaco, fugindo à perseguição dos Inimás, tribo contra a qual haviam praticado alguns actos de hostilidade”.

Castelnau (op. cit., p. 244) registrou ainda um aldeamento da tribo dos Uaitiadeu42, próximo a Albuquerque, no qual as 25 casas estavam dispostas em semicírculo.

Figura 15: Acampamento Mbayá em Albuquerque (Fonte: Castelnau, 1852 apud

Métraux, 1963, p. 355).

Conclui-se, a partir da análise das informações pertinentes aos séculos XVI, XVII, XVIII e XIX, que os Mbayá-Guaicurú possuíam assentamentos pouco estáveis no Chaco, em função das condições ambientais da região, onde há a alternância de períodos de seca e de chuvas torrenciais e do tipo subsistencial característico: caçador-pescador-coletor. Os Mbayá-Guaicurú eram grupos nômades que realizavam deslocamentos constantes no Chaco em busca de locais propícios para seu sustento. Em períodos de seca, o grupo procurava áreas próximas a lagoas, pântanos e charcos para seus assentamentos, pois ali obtinha água e alimentos para sua subsistência. Primeiro, eram grupos pedestres que utilizavam esporadicamente a canoa como meio de locomoção, mas com a adoção do

cavalo obtiveram grande mobilidade, o que lhes permitiu percorrer maiores distâncias e se mover mais rápido. A pouca estabilidade dos assentamentos chaquenhos nos séculos XVIII e XIX pode relacionar-se também a outros fatores, como a grande mobilidade eqüestre e a economia botineira, em conseqüência da reorganização de uma sociedade eqüestre e guerreira, com ataques e assaltos a outros grupos indígenas, espanhóis e portugueses.

No documento subsistência e cultura material (páginas 120-124)