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CAPÍTULO VII OS ACHADOS DA PESQUISA: ACESSIBILIDADE ATÉ QUE PONTO?

Categoria 2: Atendimento Educacional na Classe Hospitalar

Para saber se há acessibilidade no atendimento educacional na Classe Hospitalar, é preciso identificar, primeiramente, como se configura esse atendimento num contexto geral. Dessa forma, questionou-se a coordenadora pedagógica sobre essa organização: “Como o

Setor Educacional se organiza para o atendimento das crianças hospitalizadas?”.

Segundo ela, há uma preocupação não apenas com a saúde, mas com o desenvolvimento intelectual desses alunos. Logo, o envolvimento com esses educandos ocorre por meio de um primeiro contato para verificar se esses têm interesse de continuar sua escolarização em ambiente hospitalar. Se isso se confirmar, há uma dinâmica para promover esse ensino-aprendizagem, sempre respeitando a vontade, as limitações e as possibilidades do aluno.

O Setor Educacional presta uma assistência específica ao paciente, na ideia de compor a saúde como um todo. Contemplando o cuidado da saúde num sentido mais amplo e saindo dessa visão biomédica, onde

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se prescreve apenas o atendimento médico e de enfermeira. Dessa forma, há uma visão mais ampla no sentido de atendimento multiprofissional. [...] Quando a criança interna, o setor aguarda alguns dias para que o familiar seja informado com relação às condições de saúde dos seus filhos, depois que passou aquele momento de estreia, de conhecimento do novo, dessa nova condição de vida dos filhos, eu apresento o Setor e o atendimento educacional para o familiar e para a criança. [...] Então, eu irei indagar o paciente se ele quer continuar estudando, mesmo estando em tratamento de saúde. Se o paciente dá o aceite, eu entro com o processo de encaminhamento desse aluno para a escola. Se ele não dá o aceite para estudar, espero o momento oportuno, espero passar uma semana, duas e retomarei a pergunta inicial. [...] O setor organiza uma documentação que consta a carta para o diretor, professor, atestado médico e a Resolução 230/97, que são entregues aos pais para que os mesmos levem para as escolas. Estabelece-se assim um triângulo, um tripé em benefício da educação do paciente. Nós podemos trabalhar de duas formas: a escola envia o conteúdo curricular pela família para ser implementado o aprendizado e de outra forma, há o banco de atividades do próprio setor que também irá disponibilizar atendimento educacional. (CONSCIÊNCIA)

Consciência expôs, ao longo de sua fala, que o Setor Educacional precisa do apoio dos familiares e da escola para promover um atendimento de qualidade ao educando. Porém, mesmo quando essa troca não ocorre, não tendo um contato efetivo por parte da escola regular, as profissionais da educação se articulam para possibilitar que o aluno continue estudando, sem maiores prejuízos.

Ao pensar que o aluno é também da escola e que essa tem maiores possibilidades de conhecer o educando, devido à aproximação dos professores, explana-se que, quando essa instituição de ensino não corrobora com a Classe Hospitalar, torna-se mais difícil promover uma educação voltada às suas necessidades. Afinal, para promover esse atendimento, as profissionais da Classe precisam conhecer as necessidades, possibilidades e potencialidades do aluno, o que seria mais rápido se tivesse a colaboração da escola de origem.

Salienta-se que o trabalho exposto por Consciência vai ao encontro das atribuições do coordenador pedagógico da Classe Hospitalar e há uma preocupação em atender ao objetivo que aparece no documento “Classe Hospitalar e atendimento pedagógico domiciliar: estratégias e orientações”.

Cumpre às classes hospitalares e ao atendimento pedagógico domiciliar elaborar estratégias e orientações para possibilitar o acompanhamento pedagógico- educacional do processo de desenvolvimento e construção do conhecimento de crianças, jovens e adultos matriculados ou não nos sistemas de ensino regular, no âmbito da educação básica e que encontram-se impossibilitados de frequentar

escola, temporária ou permanentemente e, garantir a manutenção do vínculo com as escolas por meio de um currículo flexibilizado e/ou adaptado, favorecendo seu ingresso, retorno ou adequada integração ao seu grupo escolar correspondente, como parte do direito de atenção integral. (BRASIL, 2002, p. 13).

Visando conhecer o atendimento educacional nesse espaço para os alunos público-alvo da educação especial, uma das perguntas esteve voltada para a existência desse alunado nesse Setor: “Você tem ou já teve, desde que começou a atuar no Setor Educacional, aluno

público-alvo da educação especial? Em caso de resposta afirmativa, esse (s) aluno (s) apresentava transtorno global do desenvolvimento, altas habilidades/superdotação ou alguma deficiência?”.

As bolsistas responderam que, durante o período de atuação, tiveram alunos com deficiência visual, deficiência física, altas habilidades/superdotação, autismo e síndrome de Down. Porém, em relação ao público com autismo e síndrome de Down não foi possível promover um atendimento focado na escolarização, tendo, apenas, uma aproximação pelo viés lúdico.

Completando essas informações, a coordenadora pedagógica informou que, ao longo dos vinte e um anos de existência da Classe Hospitalar, além desses alunos, tiveram pacientes com surdez e deficiência mental (intelectual).

Porém, Oportunidade reforça a ideia de que, no período delimitado pelo presente estudo, foram atendidos dois alunos público-alvo da educação especial: um aluno com baixa visão e outro com altas habilidades/superdotação: O menino que tem superdotação sim, o que

tem baixa visão também. E a menina que tem Down e autismo não porque é bem difícil de chegar nela para fazer alguma coisa, um atendimento educacional. Só foi aquela conversa informal, assim (OPORTUNIDADE).

Segundo Consciência, os alunos com as características descritas tiveram o contato com o ensino-aprendizagem conforme as possiblidades do Setor, não sendo possível interferir nos demais espaços do hospital. Assim, o atendimento educacional oportuniza a acessibilidade de acordo com as condições estruturadas pelas profissionais da educação.

Nós conseguimos no que abrange a questão das dificuldades e limitações pedagógicas, porém nos outros espaços nós não tivemos como mudar o contexto arquitetônico. Comunicação e atitudinal nós conseguimos, porque vem associado ao pedagógico, mas não com o atendimento total. No que tange aos nossos fazeres educacionais contemplamos, fizemos adaptações arquitetônicas para atender o

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paciente dentro do espaço que podemos dominar, mas o espaço que pertence ao hospital, não. (CONSCIÊNCIA)

Ao longo da resposta exposta anteriormente, indagou-se essa profissional se elas estruturam o trabalho a partir das características do aluno público-alvo da educação especial, referenciadas no documento “Legislação brasileira sobre pessoas com deficiência” (BRASIL, 2013): “E quando a criança interna e vocês percebem que ela é público-alvo da educação

especial, vocês procuram saber com os pais qual a deficiência, ou se esse aluno tem altas habilidades/superdotação ou se é autista? Vocês procuram trabalhar a partir da característica desse aluno?”. Consciência, diz que, após conhecer esse aluno, organizam um

atendimento voltado para suas necessidades e interesse.

Sim, pois embora estando num hospital - que não é um lugar convencional da educação - seguimos o mesmo postulado educacional, ou seja, antes de proporcionar o ensino-aprendizagem, sempre faremos uma escuta do aluno. E essa escuta é o registro de toda a realidade dele, de suas condições gerais, das condições intelectuais e as potencialidades de cada aluno. Então, inventariamos o universo do aluno para depois projetar o seu ensino. (CONSCIÊNCIA)

Nessa exposição, contempla-se o respeito para com as individualidades do aluno. Logo, buscam pensar que, devido às limitações de ordem física e motora, principalmente “o aluno com deficiência necessita de uma avaliação que tem por objetivo identificar a necessidade de se introduzir um recurso diferenciado que lhe possibilite participar das atividades” (SARTORETTO; BERSCH, 201, p. 19).

Ou seja, julga-se que, ao investigar o que o aluno apresenta e o que precisa para estar em contato com a aprendizagem, há uma tentativa de oportunizar a acessibilidade educacional para esse educando no espaço hospitalar. Assim, busca-se efetivar o que está delimitado no documento do Ministério da Educação, que fala sobre o trabalho do professor da Classe Hospitalar e o seu preparo para o reconhecimento das singularidades educacionais de cada educando e as devidas adaptações que podem ser realizadas (BRASIL, 2002).

Na tentativa de identificar como esse trabalho é percebido pela mãe do menino com altas habilidades/superdotação, foi elaborado o questionamento: “Seu filho recebe o

Elas vão lá e até fazem mais felizes as crianças porque elas vão lá, elas dão trabalhinho, dão uma historinha, dão um livrinho, elas ensinam a pintar, a colar. [...] Eles vão lá ler uma historinha, fazem joguinhos, as crianças ficam bem loucas na cama. [...] Daí era pra fazer um textinho, era pra contar, era pra imaginar, e fazer de novo um texto. [...] É ótimo. (INTERAÇÃO)

O relato denota que a escolarização não está voltada apenas para a aprendizagem do aluno, mas para a interação nesse lugar que, num primeiro momento, parece apático. Dessarte, as aulas despertam a alegria nos pacientes, que podem ter contato com o desenvolvimento integral.

Acerca da mãe do menino com baixa visão, ela confirmou que aconteceram os atendimentos educacionais, mas o seu filho, em alguns momentos, não estava disposto a participar da aula. Recebe. Das “profes” como ele fala. Elas iam lá, ás vezes, ele não queria.

Porque ele diz que não gosta muito de estudar. [...] Folhinhas, desenho para pintar, atividade também (PERMANÊNCIA).

Tal situação, relatada por essa mãe, pode ser frequente quando a educação acontece no espaço da saúde, pois o tratamento faz com que, nem sempre, o aluno esteja disposto ou tenha condições físicas e psíquicas para participar da aula. Esse posicionamento atento para com o interesse e as condições biológicas do paciente vai ao encontro de uma acessibilidade atitudinal, afinal, as bolsistas respeitaram o desejo do menino, procurando momentos oportunos para promover o atendimento educacional.