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2.2 O critério material do ISSQN

2.2.3 Atividade-meio e atividade-fim

A matéria ora analisada surge como nítido desdobramento da diferenciação entre obrigação de dar e obrigação de fazer, requerendo importantes reflexões quanto às atividades-meio e atividades-fim no bojo da complexidade dos contratos de prestação de serviços, surgindo, indubitavelmente, muitas dúvidas sobre a incidência do tributo, tendo em vista determinadas atividades realizadas pelos contratantes.

191 ISS..., cit., p. 299. 192 ISS..., cit., p. 299.

Aires F. Barreto é preciso: “A designação da ação humana pode representar: a) um ato, fato ou etapa para a consecução de um fim; b) o próprio fim ou objeto”.193

A existência de um contrato e prestação de serviços, sobretudo, abarca um conjunto de atividades a serem desenvolvidas pelo devedor da relação jurídica estabelecida, que terá seu dever extinto com o adimplemento da obrigação assumida. A dificuldade reside no fato de que todo contrato possui uma atividade-fim, a qual denominamos finalidade pactuada. Sendo assim, é de imperiosa relevância distinguir-se o comportamento-fim pactuado dos “meios” empregados pelo prestador para alcançar tal finalidade.

Torna-se bastante relevante para afastar qualquer espécie de confusão sobre as expressões uma atenta análise de seus aspectos semânticos. Desse modo, os próprios autores empregam expressões distintas. Enquanto Aires F. Barreto194 adota os vocábulos “atividade-meio e serviço-

fim”, Marcelo Caron Baptista195 prefere “prestação-meio e prestação-fim”. Manifestamos

predileção pela expressão empregada por Aires F. Barreto.

Diferentemente da atividade-fim, que é única, a atividade-meio poderá apresentar-se também unicamente ou dentro de um conjunto de “ações-meio”, não sendo possível, porém, dedicar a essas ações tratamento jurídico específico dissociado da atividade-fim.

Sendo assim, o tratamento jurídico será uno para a prestação de serviços em sua totalidade, não havendo a fragmentação entre a consistência do esforço humano e as chamadas ações intermediárias.196 Desse modo, podemos concluir que serviço (entendido aqui como prestação) sempre será uno, descabendo assim adotar-se a expressão prestação-meio.

A prestação de serviços exige, em muitas situações, o desempenho de atividades de planejamento, estudos, orçamentos, análise de informações etc., não se confundindo essas ações com o objetivo almejado.

Desta feita, a análise isolada da atividade realizada pelo devedor/prestador poderá representar: uma atividade-meio, cuja ação viabilizará a concretização do fim colimado; e, de outro lado, poderá representar a própria atividade-fim almejada pela contratação dos serviços.

Aires F. Barreto ressalta:

193 BARRETO, Aires F. ISS..., cit., p. 299.

194 ISS – Atividade-meio e serviço-fim. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo: Dialética, nº 5, p. 81, fev.

1996.

195 ISS..., cit., p. 282.

É preciso discernir, concretamente, essas situações: (a) as atividades desenvolvidas como requisito ou condição para a produção de outra utilidade qualquer são sempre ações-meio; (b) essas mesmas ações ou atividades, todavia, consistirão no fim ou objeto, quando, em si mesmas, isoladamente consideradas, refletirem, elas próprias, a utilidade colocada à disposição de outrem.197

O cumprimento da obrigação assumida pelo devedor quando da celebração do contrato de prestação de serviços poderá ser representado por um ato unitário, facilmente identificado. Nessa situação, o comportamento do devedor/prestador coincidirá com a própria atividade fim, inexistindo atos preparatórios ou preliminares (ações-meio) para ultimação da prestação de serviço.

De outra forma, há casos em que a própria prestação de serviços está consubstanciada nos chamados “atos complexos”, que por sua vez consiste em diferentes etapas, mas sempre com o intuito de concretizar a atividade-fim.

Nesses termos, manifestamos entendimento que, por uma coerência semântica, o vocábulo prestação deve ser adotado somente para fazer alusão à atividade-fim, pois, embora a mera atividade possa consistir na própria prestação, esta por sua vez pode ser constituída por uma ou várias atividades organizadas em etapas. É pela atividade-fim que restará definida a incidência ou não do ISSQN.

Marcelo Caron Baptista apresenta-nos oportuna colocação:

A prestação de serviço tributável pelo ISS é, pois, entre outras coisas, aquela em que o esforço do prestador realiza a prestação-fim, que está no centro da relação contratual, e desde que não sirva apenas para dar nascimento a uma relação jurídica diversa entre as partes, bem como não caracterize prestação de serviços de transporte interestadual, intermunicipal ou de comunicação, cuja tributação se dará por via do ICMS.198

Frise-se, novamente, que o imposto incide sobre prestação de serviços, e não sobre etapas ou procedimentos adotados para sua ultimação, não sendo possível considerar cada atividade- meio como atividade autônoma daquela que constitui a atividade-fim.

O próprio Poder Judiciário já manifestou de há muito entendimento nesse sentido, sob a égide da Constituição pretérita através do julgamento do RE 97.804/SP, cuja ementa fazemos questão de destacar:

197 Curso..., cit., p. 375. 198 ISS..., cit., p. 286.

Tributário. Imposto sobre Serviços. Atividades Bancárias. Custódia de Títulos. Elaboração de cadastro, expediente. Serviços sem autonomia própria. Inseparáveis da atividade financeira, que não suscitam o imposto municipal sobre serviços. Exceção consignada na própria lei municipal para as instituições financeiras.199

Conclui-se que o ISSQN deve incidir sobre as atividades-fim, e nunca afetando as denominadas atividades-meio, já que estas representam apenas o “pelo” qual seja atingido determinado “fim”, qual seja, a própria prestação do serviço.

Outrossim, embora não seja nosso intento tratar neste trabalho de dissertação todos os aspectos conturbados do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza, delimitamos nosso objeto de estudo em relação àqueles que julgamos mais relevantes, dentre os quais destacamos o papel da lei complementar na matéria em comento não apenas em relação ao referido imposto municipal, mas também ao seu papel no sistema constitucional tributário.