• Nenhum resultado encontrado

1.1 COMO SE CONSTITUI O TRABALHO ACADÊMICO (O ENSINO, A PESQUISA E A

1.1.2 A atividade de pesquisa

A noção de pesquisar, de indagar, está na base da pessoa humana, no seu interesse natural pela

descoberta. A pessoa é um ser que pergunta. O pesquisador, de forma científica, apóia-se em

teorias, métodos e técnicas, com a pretensão de conhecer, como qualquer pessoa (TRIVIÑOS,

2003). Defende Triviños (2003), a idéia da formação do educador como pesquisador em todos os

níveis de ensino, e não somente na universidade.

Com a pesquisa permeando a alma do professor, independente do nível de ensino no qual atua,

acredito que esta prática se refletirá também no fazer acadêmico da universidade, que receberá

um aluno voltado ao ato de pesquisar como atividade inerente ao processo de ensino.

Há intelectuais, como Zabalza (2002), que alimentam ideologicamente as políticas neoliberais,

que valorizam o ensino em detrimento da pesquisa e defendem que o professor não precisa ser,

necessariamente, um pesquisador. Investigação e ensino não necessitam caminhar juntos, ressalta

o autor.

Essa é uma visão linear que também perpassa pelo processo de formação do professor, pois, para

o autor, ser professor é ter um domínio técnico do conteúdo e ser conhecedor de aspectos

didático-metodológicos para atingir o fim último do trabalho acadêmico, isto é, que o aluno

aprenda.

Não concordo com a tese de Zabalza (2002); considero que todo professor, especialmente o

pesquisador deve ser contemplada em todos os níveis de ensino e não somente na universidade

(TRIVIÑOS, 2003).

Corroboro com Chauí (1999), quando diz que a pesquisa pede reflexão, crítica, enfrentamento

com o instituído, a descoberta, a invenção e a criação. É o trabalho do pensamento e da

linguagem, para pensar e dizer o que ainda não foi pensado nem dito. É uma visão compreensiva

de totalidades e sínteses abertas que suscitam a interrogação e a busca, uma ação civilizatória

contra a barbárie social e política.

Com o incremento nos cursos de pós-graduação, houve também um incremento no número de

títulos de doutor obtidos pelo corpo docente das universidades. Atualmente, os professores com

título de doutor representam o maior percentual, quanto à titulação dos professores (Vide

Quadro 1).

TITULAÇÃO UFSC (%) UFRGS (%)

Doutorado10 937 (57%) 1200 (59,8%)

Mestrado 496 (31%) 524 (26%)

Especialização 114 (7%) 141 (7%)

Graduação 84 (5%) 145 (7,2%)

Total 163111(100%) 201012(100%)

Quadro 1: Quantitativo por titulação, de professores do ensino superior da UFSC e da UFRGS, em 2002

Em 1993, por exemplo, a UFSC contava apenas com 26% do seu corpo docente com o título de

doutor. Em resposta à política de produtividade exigida pela sociedade neoliberal, essa

10

Nas fontes pesquisadas, não está discriminado o quantitativo de professores que possuem pós-doutorado. De acordo, com informações obtidas junto às universidades investigadas, este dado está incluso no dos professores com doutorado.

11

UFSC em números (2003).

12

universidade pública federal teve um aumento quantitativo extraordinário, nestes últimos dez

anos, de 215% (UFSC, 1996a).

A titulação de doutor, atualmente, é a mínima exigida para os concursos públicos de docentes, a

priori, nas universidades federais. Essa exigência é salutar, em certo sentido, pois possibilita uma

formação com maior nível de qualificação do corpo docente. Todavia, o que questiono é esta

qualificação, muitas vezes acrítica, apenas para atender requisitos do processo avaliativo das

instituições e legitimar as exigências das políticas públicas.

De acordo com dados obtidos junto às universidades, relativos ao ano de 2002, a UFSC conta

com 57% e a UFRGS com 59,8% do seu corpo docente com título de doutor. Há um estímulo à

formação docente, pelas políticas públicas educacionais, no sentido da obtenção do título de

mestre e/ou de doutor, sendo um requisito no processo de avaliação do Sistema de Avaliação da

Educação Superior do Ministério da Educação (MEC) e no processo interno de avaliação de

desempenho do professor.

Com o aumento quantitativo de professores doutores nas universidades, há um relevante

incremento nas publicações científicas e na criação de grupos de pesquisa. Outros fatores também

possibilitam este incremento na produção acadêmica: os critérios exigidos para a obtenção da

Gratificação de Estímulo à Docência (GED), o estímulo à produtividade do trabalho acadêmico e

os trabalhos de parcerias com órgãos financiadores para a realização das pesquisas, entre outros.

Em contrapartida, este professor-doutor, no topo da carreira docente, encontra-se em uma

Enfrenta inúmeros desafios, desde as condições materiais, estruturais, econômicas, até a falta de

pessoal técnico-administrativo e de professores, o que, muitas vezes, acarreta-lhe sobrecarga de

trabalho.

A UFRGS, por exemplo, em 1993 tinha 228 grupos de pesquisa. De acordo com o dados de

2003, há um crescimento, nos últimos dez anos, de 128%, passando para 522 grupos de pesquisa

(BRAGA, 2003). A decorrência é lógica: com o melhor nível de qualificação docente, há uma

maior exigência de produtividade acadêmica.

Nas palavras de Ristoff (1999), a racionalidade financeira é um matador silencioso que vem

degradando algumas atividades da universidade. Dentre elas, destaco a pesquisa, pois, sem

recursos para a sua viabilização, o professor é compelido a buscar recursos externos à

universidade, correndo o risco de ter que privatizar os resultados das suas pesquisas.

Com isto, um novo cenário surge na academia, no processo de constituição do trabalho

acadêmico, no processo de constituição da pesquisa. Dois aspectos são destacados por Santos

(1999, p. 201), que os considero essenciais nesta relação entre universidade e recursos externos;

universidade e produtividade: “a natureza da investigação básica e a das virtualidades e limites da

investigação aplicada nas universidades.”

O incitamento da procura dos recursos externos, não estatais, implica uma pressão no sentido do

privilegiar a investigação aplicada em detrimento da investigação básica, por dois motivos

Há uma diferença de tempo de maturação entre os órgãos financiadores e a universidade. Estes

órgãos necessitam de agilidade nos resultados, pois o mercado lhes exige. Por outro lado, a

universidade necessita de tempo para a maturação das suas pesquisas. Essa diferença de tempo

de maturação e a necessidade e agilidade pelos recursos financeiros impulsionam as pesquisas a

serem mais ágeis, aplicadas, e a terem resultados mais imediatos, de forma que a pesquisa básica

ainda se concentra quase que sem apoio financeiros externos, no interior das universidades.